TRANSMISSÃO DE OBRIGAÇÕES

   

Fábio Ferro Fontes e Rômulo Frota de Araujo[1]

 

SUMÁRIO: Introdução;.1 Cessão de Crédito; 2 Cessão de Débito(Assunção de Dívida); 3 Cessão de Contrato; 4 Outras formas de transmissão; Conclusão; Referências.

RESUMO

Refere-se as formas de transmissão de obrigações como a Cessão de Crédito, a Assunção de Dívida, Cessão de Contrato.  Mostrando-se as peculiaridades de cada uma, assim como seus efeitos e finalidades.

   PALAVRAS-CHAVE

Transmissão de Obrigações; Contrato; Transferência; Cessão de Contrato

 

INTRODUÇÃO

Observamos que dentro do âmbito contratual podemos ter a substituição das partes do negocio, ou mesmo uma transferência de obrigações, mas é importante constatar que o objeto da relação obrigacional permanece intacto, pois se muda seria iniciado um novo negócio jurídico.  Analisaremos ainda, que pode-se transmitir uma vantagem, por meio de cessão de crédito, na qual direitos são conferidos a outrem. Logo na cessão de débito um dever é estabelecido a terceiro e na de contrato, ocorre simultaneamente uma transmissão de dever e direito.

O que norteia essas transmissibilidades são os princípios básicos das relações contratuais, como a proporcionalidade e a boa fé. Além do caso das cessões faremos menção a outros tipos de transmissão e acabaremos com equívocos existentes entre as mesmas, como no caso da cessão de crédito e o endosso.

CESSÃO DE CRÉDITO

Essa transmissão ocorre quando se altera o credor, quando há a translação de crédito, ocorre uma mudança subjetiva, ou seja, as partes da relação são alteradas. Um credor primitivo transfere o crédito que iria receber para outro. Essa sessão pode ser classificada como gratuita quando o valor anterior é mantido, ocorre entre familiares, quando um pai quer ajudar um filho por exemplo. Já a onerosa é aquela em que se tem o intuito do lucro, aumenta-se o valor inicial, acrescenta termos acessórios para buscar assim maiores ganhos. A cessão de crédito ainda pode ser total, quando todo o crédito é repassado, ou parcial, em que o crédito é dividido, gerando assim mais de um credor da prestação inicial. Ainda temos a convencional, qualificada por ser um acordo entre as partes, dependendo da vontade dos envolvidos. Em contrapartida existe a cessão de crédito legal, prevista no ordenamento, independe das partes. Por exemplo, a cessão de acessórios, juros, mora, cláusulas penais, acompanha a cessão da principal.

E por ultimo temos a judicial que é aquela oriunda de sentença, como exemplo temos os casos de sentença condenatória, em que o credor é substituído sem sua vontade, assinação ao credor do crédito do devedor e adjudicação no juízo divisório( crédito aos herdeiros do credor)

Observamos a presença de requisitos para o desenvolvimento dessa cessão. Inicialmente deve ser comprovada a capacidade genérica do adquirente (cessionário), ele deve ter capacidade jurídica para adquirir o negocio e em seguida o cedente (credor) deve comprovar poder de disposição (titularidade). Se o credor for incapaz, a transmissão só será possível com autorização jurídica, pois apenas o consentimento do administrador legal não é suficiente. Ainda se o cedente for representado por um procurador, esse só poderá realizar as atividades, com uma procuração lhe dando as atribuições do negocio. Um credor falido não poderá realizar cessão de crédito, haja vista que deve quitar os negócios já existentes. Não pode haver sessão de credito de um valor já penhorado, pois esse valor não está mais disponível, percebemos que o credor tem de agir de boa-fé. O objeto da prestação tem que ser lícito e possível, para o crédito poder ser cedido.

Entretanto, dependendo da natureza do negocio, os créditos procedentes de direitos personalíssimos, ou créditos de fins assistenciais, como crédito alimentício e salarial não estão disponíveis para transmissão. A lei promove algumas restrições a essa cessão, não são cedíveis heranças de pessoas ainda vivas, créditos já penhorados (repassados), assim como obrigações de fazer infungíveis, que tem caráter pessoal, não transmissível. Quando ocorre a cessão da obrigação principal, transmite-se também os acessórios do crédito, como: direito a juros compensatórios, mora, correção monetária, cláusula penal entre outros. O cessionário tem todas as vantagens e acessórios do credor. Não há uma forma especifica de cessão, pré-estabelecida, havendo sempre um acordo, ela é consensual, depende da vontade das partes.

Contudo, ainda temos que mencionar os efeitos dessa transmissão, que basicamente é a constituída de transmitir para o cessionário a titularidade da relação cedida (mesmos direitos do antecessor). Além do mais seus efeitos são entre as partes, já que não há mudança do objeto. O cedente não responde pela dívida, mas tem responsabilidade para com o cessionário, pelo fato de existir um crédito a se receber. O cessionário assume o risco de uma possível insolvência do devedor, e em caso de morte do credor primitivo, o novo credor (cessionário) permanece no negócio.O cedente não pode agir dolosamente, o crédito repassado não pode conter vícios, ilegitimidades.  Na ausência de crédito o negocio se torna nulo, já que não pode ocorrer a cessão de crédito alheio. O cedente tem que prestar informações necessárias sobre o negocio, além de entregar documentos indispensáveis e probatórios da transferência.

CESSÃO DE DÉBITO (Assunção de Dívida)

É chamada de assunção de dívida pelo Código Civil, assim como na cessão de crédito, há uma mudança subjetiva, permanecendo intacta a parte objetiva, a relação obrigacional é preservada, ocorre apenas uma alteração no pólo passivo da relação creditória, muda-se o devedor, contudo o credo deve se avisado, é necessária a anuência do credor, ele tem que dar o seu consentimento. Assim a divida vai para um terceiro e seus encargos também são repassados, mas as garantias especiais que o primeiro devedor tinha não serão transmitidas, pois não fazem parte da dívida, um exemplo disso é um desconto dado pelo credor, é apenas um beneficio a mais, não é uma garantia real. Se o cessionário for insolvente e o credor não sabia desse detalhe no momento da transmissão, pode-se exigir a volta do cedente, do devedor primitivo. Maria Helena diz:

“a cessão de débito é um negocio jurídico bilateral, pelo qual a devedor(cedente), com anuência expressa ou tácita do credor, transfere a um terceiro(assuntor ou cessionário) os encargos obrigacionais, de modo que este assume a sua posição na relação obrigacional, substituindo-o, responsabilizando-se pela divída com todos os seus acessórios”[2].

A cessão pode ocorre por delegação, quando há troca entre os devedores, ocorre com o consentimento do devedor. A cessão de débito por delegação poderá ser privativa ou liberatória, quando o cessante se dispensa, não se responsabilizando perante o cessionário pela insolvência deste. Ainda pode ocorrer a delegação cumulativa, em que o devedor continua no negocio, mas somente será acionado se o cessionário não cumprir a obrigação, o devedor inicial responde subsidiariamente pelo negocio. Entretanto, temos também a expromissão, em que o credor troca o devedor por terceiro sem a anuência do mesmo, pode acontecer de forma espontânea, quando um terceiro resolve assumir a divida, por exemplo um filho com pena do pai, assume a prestação em seu lugar.

Na delegação a prestação acontece entre um terceiro e o devedor primitivo, com o consentimento do credor, já na exoneração o devedor primitivo permanece alheio as negociações. Como já mencionamos os efeitos dessa cessão são a liberação do credor, transferência do débito, cessação de privilégios e garantias pessoais, sobrevivência das garantias reais e possibilidade de o adquirente do imóvel hipotecado tomar a seu cargo o pagamento do crédito garantido.

CESSÃO DE CONTRATO

Ela é constituída quando se transmite o todo, não apenas direitos ou somente deveres, mas ambos, se for transmitido apenas um, não será cessão de contrato e sim de crédito (direitos) ou de débito (deveres). Portanto deve haver uma substituição da titularidade contratual de uma das partes, de forma integral, total. Não se altera o teor do contrato, muda-se um dos titulares do negocio jurídico. Somente é previsto em nosso ordenamento as cessões de crédito e débito, mas não é por isso que a cessão de contrato será considerada ilegal, tendo em vista que a mesma é muito utilizada ainda que sem previsão em lei. De acordo com palavras de Silvio Rodrigues: “a transferência da inteira posição ativa e passiva, do conjunto de direitos e obrigações de que é titular uma pessoa, derivados de contrato bilateral...”. É assim caracterizada a cessão de contrato por esse autor.

Existem alguns requisitos que devem ser respeitados para que ocorra essa cessão. Primeiramente o contrato tem que ser bilateral, e deve ocorrer também a prestação correspectiva, simultânea entre as partes, ou seja, cada parte vai ter direitos e obrigações no negocio. O contrato tem que ter disponibilidade de sucessão, cedido de forma global. Além disso, o cessionário não pode receber somente benefícios, deve arcar com deveres também, a outra parte envolvida precisa consentir, concordar com a cessão. Por fim a obrigação não pode ter características pessoais e nem mesmo cláusulas proibitivas.  De acordo com as palavras de Flavio Tartuce, “Para que a cessão do contrato seja perfeita, é necessária a autorização do outro contratante, como ocorre com a cessão de debito ou assunção de dividia. Isso porque a posição do devedor e cedida com o contrato.”[3]

Entre os efeitos dessa transmissão podemos enumerar alguns, como: o primeiro efeito é a transferência de crédito e débito a um terceiro individuo. Outro efeito é que o negocio permanece, ocorre a subsistência da obrigação e ainda há a liberação do cedente, que passa a sua titularidade a outro. Vejamos agora algumas jurisprudência sobre o assunto:

Ação declaratória de reconhecimento de validade de negocio jurídico com sub-rogação – Exclusão do pólo passivo de execução – Impossibilidade. Não e possível o reconhecimento de validade de negocio jurídico referente a transferência de imóvel financiado para terceiro, chamado “contrato de gaveta”, quando o banco credor não consentiu com a substituição do devedor. No caso de inadimplência do contrato de financiamento, na execução deve figurar no pólo passivo os devedores originários, porque não há como se reconhecer o adquirente do imóvel hipotecado, em face da ausência de anuência do credor[4]

Ação declaratória de quitação de divida, c/c revisional de contrato – Extinção do processo, sem julgamento de mérito, em relação a primeira autora, por ilegitimidade ativa ad causum – Inocorrência – Decisão reformada – “Contrato de gaveta” – Reconhecimento de validade – Realidade Social – Precedentes jurisprudenciais – Recurso conhecido e provido. O direito a moradia e um direito supra constitucional e supraestatal, sendo anterior a Constituições e aos próprios Estados. Logo, temos que o direito a moradia surge com o próprio homem. O reconhecimentos a validação do chamado “contrato de gaveta”, bem como o reconhecimento da legitimidade da agravante, não causam nenhum gravame a instituição financeira agravada[5]

OUTRAS FORMAS DE TRANSMISSÃO

Temos ainda outras formas de transmissão de obrigações, além daquelas já mencionadas anteriormente. Falaremos agora do endosso, mas primeiramente precisamos fazer uma distinção importante, existem dois mecanismos contratuais referentes a circulação de crédito, quando falamos em transmitir direitos creditórios, temos a cessão de crédito, contudo, se a transferência desses direitos creditórios estiver documentada em títulos, caracterizando um regime cambiário, ocorre o chamado endosso. É o que Maria Helena Diniz no diz: “o credor (endossante), transfere seus direitos creditórios que estão documentados em um título à ordem de outrem (endossatário)”. O endosso oferece maiores garantias a terceiros interessados, o que o torna mais confiável e simples. O endossante tem garantido a quitação da prestação, diferente da cessão de crédito a qual a garantia é apenas na existência de um crédito a se receber, não garantindo o seu pagamento por parte do devedor.

Ainda como vantagens do endosso podemos citar que, o endossatário não recebe exceções pessoais que seu antecessor trazia, já a cessão permite tais exceções do cedente ao cessionário. Em nosso Código Civil, no art. 294, está previsto que o devedor pode opor ao cessionários as exceções, mas apenas no caso de cessão. O endosso é mais facilmente negociável e mais demandado, devido a sua garantibilidade maior. Podemos comprovar isso com os ensinamentos de Fabio Ulhoa Coelho:

"Se querem titularizar instrumentos mais facilmente negociáveis, devem optar pelos títulos de crédito (nota promissória, letra de câmbio etc.); caso desejem restringir a circulação dos direitos correspondentes ao negócio que celebram, convém adotar os instrumentos do direito civil". [6]

Assim como, temos a figura do usufruto, que é conferido a alguém, de forma temporária, é um direito de usar algo de outrem, retiram-se de coisa alheia seus lucros e utilidades que ela produzir, ou seja, usufrui-se dela, sem alterá-la substancialmente. O objeto do usufruto pode ser bens móveis, imóveis e até patrimoniais. Um exemplo disso é uma sucessão hereditária na qual o testador impõe que seu patrimônio seja dotado de ônus de usufruto. Outro exemplo é quando o titular de uma empresa resolve cede-la a terceiros, para que os mesmos a utilizem. Em casos de separação conjugal, também vemos a figura do usufruto, quando, por exemplo, uma pai deixa um determinado bem para o filho, uma casa, e esse não pode modificá-la, apenas usufruir dela.

Por fim, temos a penhora que é uma transmissão de obrigação feita para que outro negocio jurídico seja garantido. A penhora é caracterizada, quando existe uma dívida e ocorre a solicitação de um bem do devedor, como forma de garantir a execução da obrigação. Um exemplo disso é o conhecido “cheque calção” que serve como meio de garantia, no caso de um contrato de aluguel, por exemplo, não seja respeitado, o “calção” será usado como forma de afiançar o adimplemento.

 

CONCLUSÃO

O trabalho apresentado nos mostrou os diferentes modos de transmissão de obrigação, esclarecendo assim a finalidade de cada uma e acabando com possíveis equívocos que acorriam entre esses tipos de transmissibilidades, tratando assim da essência de cada uma, para esclarecer de forma abrangente e eficaz a sua relevância para nós.

REFERÊNCIAS

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil volume II. Sao Paulo, Editora Saraiva, 2005.

            DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro teoria geral das obrigações.

RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Parte Geral das Obrigações. 30 ed. atual. vol 2. São Paulo: Saraiva, 2006. 

TARTUCE, Flavio. Direito Civil. São Paulo, Editora Método, 2008.



[1] Alunos do terceiro período de Direito Noturno do Centro de  Ensino Superior Dom Bosco (UNDB).

[2]            DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro teoria geral das obrigações.  pg. 449.

[3] TARTUCE, Flavio. Direito Civil. São Paulo, Editora Método, 2008.p. 290

[4] TARTUCE apud Tribunal de Alçada do Paraná, Apelação cível 0142096-8-Londrina, Juiz convocado Jucimar Novochadlo, Sexta Câmara Cível, Julg.:13.05.2003, Ac.:171183, Public.:30.05.2003, 2008, pg. 291

[5] TARTUCE apud Tribunal de Alçada do Paraná, Agravo de instrumento 0192880-5-Curitiba, Juiz Sonia Regina de Castro, Quinta Câmara Cível, Julg.: 12.06.2002, Ac.: 145211, Public.: 02.082002. 2008, pg.292

[6] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil volume II. Sao Paulo, Editora Saraiva, 2005. p.100