TRANFORMAÇÃO DA EDUCAÇÃO EM MERCADORIA

  IVENS MESSIAS DE OLIVEIRA PEREIRA

 

Produção Apresentada ao Programa de Pós Graduação  Stricto Sensu, do IENS– Instituto  de Educação Superior e Capacitação Profissional Nação Santa, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Educação

Área de Concentração: Ciências da Educação

    

TRANSFORMANDO A EDUCAÇÃO EM MERCADORIA

 

Quando falamos em educação, temos como definição do termo que vem a ser é o processo que engloba os processos de ensinar e aprender, É um fenômeno observado em qualquer sociedade e nos grupos constitutivos destas, responsável pela sua manutenção e perpetuação a partir da transposição, às gerações que se seguem, dos modos culturais de ser, estar e agir necessários à convivência e ao ajustamento de um membro no seu grupo ou sociedade1.

            Segundo Fauconneta palavra educação tem sido muitas vezes empregada em sentido demasiadamente amplo, para designar o conjundo de influencias que, sobre nossa inteligencia, ou sobre a nossa vontade.

            Martins3 descreve  a educação como  um processo de emancipação dos seres humanos, sejam estes enquanto indivíduo ou enquanto classe. No entanto, por vivermos permeados de contradições, a educação pode mudar de acordo com o movimento da sociedade, possibilitando uma educação diferente, que traga transformações populares e sustentáveis para o povo brasileiro.

            Segundo Godotti4, o neoliberalismo concebe a educação como uma mercadoria, reduzindo nossas identidades a meros consumidores, desprezando o espaço público e a dimensão humanista da educação.

            Quando falamos de mercadoria, segundo o dicionárioweb5, “mercadoria“ significa aquilo que está à venda; que constitui objeto de comércio.  Logo, educação como mercadoria, seria algo como “educação que se compra” ou “educação à venda”

            De uma forma geral, até que não seria uma má idéia se a sociedade brasileira em geral aceitasse a educação como mercadoria, uma vez que, dessa forma, teríamos como verificarmos a qualidade da educação que estaria à venda, tais como Defesa do Consumidor6, que em seu artigo primeiro estabelece normas de proteção e defesa do consumidor, de ordem pública e interesse social. Em seu parágrafo terceiro, diz:

“Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.”

            Em seus parágrafos primeiro e segundo respectivamente, diz:

“Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.”

“Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.”

            Se entendermos educação como mercadoria, ou produto ou mesmo como um serviço, então teremos os estabelecimentos de ensino como sendo o fornecedor. Fazendo um link  entre as instituições de ensino e as instituições comerciais, então como aceitar um produto, neste caso, a educação, de qualidade duvidosa ou de má qualidade? Ninguém compra produto nessas condições, ainda mais em se tratando de um “bem durável”.

            Ao adquirirmos um produto, alguns cuidados especiais são levados em conta, tais como: Data de fabricação, fornecedor, fabricante, origem do produto, validade, qualidade, custo-benefício, dentre outros. Ninguém compra, por exemplo, um tênis furado, uma roupa rasgada ou um alimento estragado, pois está se pagando um preço por ele, está se pagando um valor por ele e muitas vezes caro.

            Tais cuidados poderiam ser transferidos  ao se “comprar” um certificado ou diploma. Quando se entra em uma instituição de ensino, seja ela  pública ou privada, seja de ensino fundamental, médio, técnico,  superior ou pós-graduação, tais cuidados deveriam ser tomados:

Quem  é essa instituição de ensino?

Qual a qualidade do ensino que se está comprando?

Quem são os fornecedores, nesse caso, além da instituição, os professores? 

Terá boa duração ou será um produto descartável?

É um produto legal, ou seja, há registro oficial, ou é “pirata”?

            Hoje a educação assim como as mercadorias ultrapassou fronteiras. Estudantes brasileiros viajam para outros paises em busca de novas tendências na educação e no aprendizado, assim como estudantes estrangeiros escolhem o Brasil para ampliarem as experiências adquiridas nos bancos escolares. Seja de maneira tradicional, presencial ou á distancia (EAD)  via internet. Assim também no comercio, hoje compramos mercadorias de todas as partes do mundo, seja em lojas localizadas no Brasil, seja em ambientes virtuais. Mas as exigências para ambas as operações são as mesmas.     

            O ensino no Brasil seja ele de nível fundamental, médio e superior é oferecidas por instituições públicas e privadas, nacionais e instituições internacionais através de convênio bilaterais. 

            Inúmeras IES brasileiras fazem a comercialização de diplomas e lucram muito com esse mercado clandestino. O ensino superior nas particulares se tornou mera mercadoria sujeita às ofertas do mercado de acordo com a lei da oferta e da procura, não seguindo nenhuma lógica de retorno em investimentos no ensino, na pesquisa e na extensão3.

            Por todo o País, as instituições privadas multiplicam-se rapidamente. De acordo com o último Censo da Educação Superior, elas já somam mais de 2.099 instituições – em 2000, esse número era menos da metade. Nelas estão 78% das matrículas no ensino superior e um poder de movimentação financeira de mais de R$ 28 bilhões anuais, de acordo com o último relatório do grupo Hoper, consultoria especializada em educação. O tamanho desses números impõe ao Ministério da Educação o desafio de não deixar que a educação se torne mero negócio. “Não há dúvida de que vamos precisar de mais gente e de pessoal especializado para dar conta dessa demanda”, diz Luís Fernando Massonetto, responsável pela recém-criada Secretaria de Regulação do Ensino Superior do MEC. O órgão, em funcionamento há menos de um ano, é uma resposta do Ministério aos mandos e desmandos perpetrados por instituições privadas8.

            Porém, quando o “produto” comprado, seja ele uma mercadoria qualquer  ou a educação não oferece a qualidade desejada, alguns problemas podem desencadear, tais comofalta de formação humanista, política, ética e seus resultados estão aparecendo: sociedade injusta e concentradora de renda, trabalhadores como a parte mais frágil e substituível no processo produtivo, disseminação da corrupção ( tão entrenhada que parece normal, especialmente para a juventude)7.  

            Muito embora o Brasil considera a educação como um direito e um bem público e não uma mercadoria ou um serviço comercializado, sujeito às leis do mercado, o Governo brasileiro compôs um Grupo Interministerial de Comércio Internacional de Mercadorias e Serviços, liderado pelo Itamaraty. O MEC tem participado das reuniões Subgrupo de Serviços desse Grupo Interministerial. Dentro desse espaço de articulação de diversos setores do Governo, o MEC tem sublinhado sua resistência ao tratamento da educação no mesmo patamar de outros bens e serviços comercializáveis9.

            Não se compra ou se vende educação. Não se encontra educação em shoppings ou supermercados, não há ofertas promocionais nem prateleiras.      Educação é a construção do patrimônio humano de uma nação, é o investimento na qualidade humana de um povo, é a concretização do potencial de civilização por meio do esforço coletivo do Governo e da sociedade civil. Nesse espírito, o Brasil acredita que a educação não é um serviço à venda, como qualquer outro, mas um patrimônio público fundamental para a consolidação da identidade nacional e fator de base para o desenvolvimento sócio-econômico, sobretudo no momento em que a informação tecnológica, o conhecimento científico e a criatividade constituem elementos chaves do progresso das sociedades pós-industriais9.

            Quando se trata a educação de forma mercadológica, vários serão os prejuízos nas próximas gerações, tais como já citado anteriormente, mas o maior desafio vem a ser como os jovens de hoje enfrentarão um futuro cada dia mais amplo de oportunidades, porém cada dia mais específico e especializado, embora cada ramo do conhecimento esteja sempre atrelado a outros campos dos saberes, como economia, política, matemática, ciências, etc.

            Com cada vez menos investimento na educação básica, a tendência é que, de acordo com que o aluno sem uma formação básica sólida, avança aos níveis mais elevados, maiores serão as dificuldades que o mesmo encontrará para seguir adiante em sua formação. Sem investimento na base da educação,  há um comprometimento de toda a formação deste aluno. Segundo o Ministério da Educação (MEC), o investimento para cada aluno fixou em pouco menos de R$ 2,1 mil o investimento anual mínimo por aluno nos primeiros anos do ensino fundamental da rede pública10. Num rápido cálculo, obtemos cerca de R$ 175, 00 por mês para cada aluno, ou ainda, se dividirmos esse valor por dia, chegamos a irrisórios R$ 5, 84. Ou seja, não cobre os gastos mínimos para uma boa educação.  Na contramão disso tudo, Barbara Bruns, economista chefe para educação do Banco Mundial para a região da América Latina e Caribe, nada contra essa maré. "O importante não é gastar mais, mas gastar de forma mais eficiente", diz a americana. Uma constatação que sustenta essa posição é o fato de os países membros da OCDE, os mais desenvolvidos do mundo, investirem menos do que o Brasil no setor: são 4,8% ante 5% dos PIBs nacionais, respectivamente. Deduz-se que não é por falta de dinheiro que a educação pública brasileira deixa muito a desejar. Dados da Corregedoria Geral da União (CGU), por exemplo, mostram que 35% dos municípios auditados apresentaram irregularidades na utilização dos recursos destinados à educação.11 Ainda segundo a Revista Veja, há           evidências de que parte dos recursos da receita tributária destinada à educação não consegue chegar às salas de aula, parte disso é resultado de uma má gestão, e não necessariamente de corrupção. Mas o fundamental é que o financiamento tem que chegar até a sala de aula. É na sala de aula que os recursos da educação se transformam em aprendizado.

            Em seminário realizado na Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da USP, no dia 2 de junho, sobre “Educação como serviço – Impactos sobre a universidade”, a USP demonstrou sua preocupação com o Acordo Geral sobre Comércio de Serviços (Gats), negociado no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC), que quer transformar a educação num item de serviços a ser negociado como mercadoria, neste evento fora produzido um relatório sobre o assunto.  Citando uma entrevista do professor aposentado da USP Simon Schwartzman – concedida ao jornal Folha de S. Paulo em março passado –, o relatório destaca que na indústria do conhecimento a educação transformada em negócio é uma tendência mundial. “Isso pode ser bom ou ruim. A educação é um produto como outro qualquer. Cabe ao usuário avaliar o que está comprando. Outro depoimento sobre o assunto presente no relatório é do filósofo e professor do Centro Brasileiro de Pesquisa (Cebrap) José Arthur Gianotti, que considera “ingênuas” as reações de indignação às propostas da OMC. O escândalo é fora de propósito porque o ensino foi mercadoria desde a gênese da educação formal, na Grécia antiga, onde os sofistas já cobravam uma contrapartida por suas lições. A questão é negociar até que ponto o Estado é soberano para determinar as políticas públicas de educação. Se adotarmos uma posição angelical, escandalizados porque o ensino virou mercadoria, acabaremos negociando em condições desvantajosas. Ainda de acordo com o relatório, a liberalização teria como conseqüências positivas o aumento dos investimentos  no setor, a ampliação dos benefícios oferecidos ao consumidor – quer pelo aumento de opções, quer pelo aumento da qualidade, quer ainda pela redução dos preços desses serviços –, a atualização tecnológica, o treinamento de pessoal e a integração cultural. Já as conseqüências negativas seriam  a desnacionalização do setor, o acirramento da competitividade, com prejuízo para os pequenos e médios empreendimentos, o agravamento do quadro das diferenças regionais – como conseqüência da desigualdade dos investimentos, que contemplarão os mercados  de maior atratividade econômica12.

 

         

        REFERÊNCIAS

 1.Educação. Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Educa%C3%A7%C3%A3o  acesso em 01/05/2012.

 

  1. FAUCONNET, P. Educação e Sociologia. 4ª. Edição. Ed. Melhoramentos, Tradução Lourenço Filho. UFRJ, 1955. Rio de Janeiro. Disponível em http://www.ia.ufrrj.br/ppgea/conteudo/conteudo-2007/T1-3SF/Suemy/Educ_Socied.pdf  acesso em 01/05/2012.

 

  1. MARTINS, T. Educação não é mercadoria. 11/08/2009. Disponível em: http://oglobo.globo.com/pais/noblat/posts/2009/08/11/educacao-nao-mercadoKaryne Dias Coutinhoria-212991.asp. acesso em 30/04/2012.

 

  1. GODOTTI, M. Lições do Fórum Mundial de Educação. 2011.  Disponível em:   http://www.forummundialeducacao.org/?p=1604 acesso: 30/05/2012

 

  1. DICIONÁRIOWEB. http://www.dicionarioweb.com.br/mercadoria.html

 

  1. Código de Defesa do Consumidor. Disponível em http://www.emdefesadoconsumidor.com.br/codigo/codigo-de-defesa-do-consumidor.pdf

 

  1. 7.    SANTOS, G. S. Educação e Mercadoria. 2011. Disponível em: 

http://www.diariodaclasse.com.br/forum/topics/educa-o-e-mercadoria    Acesso:30/04/2012.

 

 

  1. 8.     COSTA, R. Revista Isto É. Ed 2212, de 30 de março de 2012. Disponível em: http://www.istoe.com.br/reportagens/196908_SINAL+AMARELO+PARA+AS+UNIVERSIDADES+PARTICULARES?pathImagens=&path=&actualArea=internalPage. Acesso: 09/06/2012.

 

  1. 9.    GENRO, T. Educação e Globalização – Educação é mercadoria ou patrimônio coletivo ?.  Exposição do Senhor Ministro da Educação, Tarso Genro, na audiência pública da Comissão de Educação da Câmara dos Deputados Ministério da Educação. Brasília. (7/6/2005).

 

10. Radio Agencia NP., Governo vai investir  menos de R$ 2,1 mil por aluno em 2012. Disponível em: http://radioagencianp.com.br/10483-governo-vai-investir-menos-de-2-mil-e-cem-reais-por-aluno-em-2012%20. Acesso: 10/06/12.

 

11. GOULART, N. Brasil não precisa gastar mais com educação. Precisa gastar melhor. Revista VEJA/Entrevista.     Disponível em: http://veja.abril.com.br/noticia/educacao/brasil-nao-precisa-gastar-mais-com-educacao-precisa-gastar-melhor Acesso: 10/06/2012.

 

  1. 12.  LEÃO, IZABEL. Educação: Bem Social ou Mercadoria? Jornal da USP – Debate. No. 645, junho de 2003. Disponível em: http://www.usp.br/jorusp/arquivo/2003/jusp645/pag03.htm      Acesso: 09/06/2-12