TRAÇANDO CAMINHOS

Existe uma grande diferença entre o que o mundo da realidade é fato e o que pen-samos que ele é. Quer dizer: o mundo que temos dentro da nossa cabeça nem sem-pre corresponde ao que existe fora dela.
Isso não significa que nós vivemos em mundos irreais ou falsos, como de início se pode supor quando colocamos uma proposição desse tipo. O mundo real não é uma mera ilusão, como ensinam algumas religiões, e também algumas variantes filosóficas.
O que na verdade existe é uma grande defasagem entre a realidade, tal como ela acontece, e a forma como nós a experimentamos em nossos sentidos. Vejamos um exemplo. Duas pessoas observam a mesma cena. Perguntemos a elas o que viram, ouviram e sentiram. Dificilmente as respostas serão coincidentes. Uma terá visto coisas que a outra não viu. Uma delas terá prestado mais atenção nos sons que a outra. Uma terá percebido melhor as condições ambientes de cheiro, aroma, tato etc. As-sim, cada pessoa, em face do mesmo fato, terá uma experiência diferente dele.
Todos sabemos que somos diferentes uns dos outros. Só não sabemos o quanto somos diferentes. Uns são mais outros são menos. E essas diferenças são produzidas pelo uso dos nossos sentidos. Quanto mais eu me aferro à minha visão de mundo, mais eu me afasto das pessoas que estão vendo outra coisa; quanto mais eu me ligo no meu diálogo interno, menos eu consigo ouvir a voz dos outros, quanto mais eu me afirmo em meus próprios sentimentos, menos eu consigo participar dos sentimentos alheios.
Faça a experiência. Tente ouvir e entender o que os outros estão dizendo sem calar aquela voz interior que já está dando a resposta antes mesmo do outro terminar de expressar o seu pensamento. Tente fazer uma imagem mental da informação que está recebendo sem antes limpar da sua tela mental a imagem que você mesmo faz daquela informação. Tente sentir um aroma, um tato, um paladar novos, sem tirar da sua mente as informações sobre aromas, tatos e paladares que você já tem registrados em sua mente.
Cada experiência vivida pelo nosso organismo é uma informação. E ela nos chega na sua totalidade. Mas a nossa mente registra somente uma pequena parte dela. Ela fil-tra a informação e registra somente a parte que ela julga útil, interessante, verdadeira, de acordo com as nossas crenças, valores, desejos e critérios de julgamento. É a parte da informação que a gente entende, aceita, acredita, aproveita. Essa é a verdade para nós.
A informação é organizada em nossa mente na forma de um processo. É o que chamamos de sabedoria. A nossa sabedoria a respeito daquela experiência. O restante dessa informação vai para o inconsciente. Fica jogada lá na forma de "notícias" desorganizadas. Fatos sem sentido, incompreensíveis, estranhos. Às vezes elas apare-cem nos nossos comportamentos em formas de sonhos, representações simbólicas, temores, fobias, desequilíbrios nervosos e outras anomalias comportamentais que não sabemos de onde vem nem como foram adquiridas.
Nossa mente se assemelha a um grande território cuja maior parte é feita desses fa-tos desconhecidos. É como um grande país ainda inexplorado, com uma população concentrada em um pequeníssimo núcleo urbano organizado. Este núcleo é o que chamamos de razão. O restante é o ignoto, o bizarro, o caos.
O que pensamos que o mundo é o mapa que fazemos dele. Esse mapa é feito de partes das informações que recebemos a seu respeito. Não existe verdade nem mentira nele. Apenas maior ou menor quantidade de informação que a mente considera útil. O problema é nós nos orientamos no mundo real com o mapa que fazemos dele. Toda pessoa tem um mapa muito pessoal do mundo. E nenhum mapa é mais verdadei-ro ou falso do que outro. O que eu penso do mundo não é mais verdadeiro nem real do que aquilo que você ou qualquer outra pessoa pensa.
A verdadeira inteligência não está em traçar mapas exatos do mundo real. Porque não é a realidade do mundo que nos limita, mas sim a pobreza do mapa que nós traçamos dele. Num território amplo e desconhecido como é o mundo real, vence aquele que conseguir traçar dentro do seu mapa a maior quantidade de caminhos possí-veis para chegar onde quer ir e não quem pensa que tem o melhor caminho.