“TORTURA DEMAIS NA TERRA QUE DIZ NUNCA”

 

No fundo no fundo, grande parte do público leitor ou expectador, sente-se atraído por histórias e estórias de bandidos.

Reais ou fictícios, no telejornal, nos livros ou no cinema, a vida perigosa e aventureira dos marginais mostram um mundo de romance, mistério e emoções que seduzem homens, mulheres e crianças desde sempre.

Al Capone, Billy the Kid, Madame Satã, Barrabás ou Lampião se conservam na memória de muita gente, demonstrando que se hoje os bandidos estão sendo glamourizados, conquistando admiradores nos filmes e nas novelas, isso não é novidade: na verdade eles sempre foram temidos em primeira instancia e admirados em seguida e sempre estiveram presentes nas telas, nas letras e principalmente, estão presentes na vida real.

Os bandidos de todos os tipos praticantes de todas as modalidades de crimes estão à solta fazendo vitimas, destruindo patrimônio alheio, provocando dores, prejuízos e dando muito trabalho para todos os órgãos de segurança pública e se perpetuando na memoria de suas vitimas por conta dos traumas causados.

Isso tudo somado torna necessária à ação dos policiais para um efetivo combate que neutralize e impeça a atuação dos bandidos.

As forças de segurança pública, constituídas e instituídas pelo estado de direito, são investidas de autoridade e meios materiais para coibir e impedir a ação dos marginais, utilizando meios que em caso de necessidade incluem até a força letal. Por definição os policiais são cumpridores, representantes e guardiões das leis, tendo a missão de preservar a ordem, orientando e impedindo que quaisquer cidadãos descumpram as leis.

O exercício do policiamento está subordinado ao teor das leis vigentes, aos procedimentos padronizados das corporações a que pertençam e não existe prerrogativa do policial ou de qualquer pessoa para descumprir uma lei em defesa do cumprimento de outra lei; o combate aos criminosos precisa necessariamente, ocorrer de acordo com os princípios e termos legais.

Existem muitas reclamações diretas e indiretas contra os termos das leis brasileiras. As reclamações mais frequentes dão conta de que nossas leis favorecem os criminosos ao ponto de tornar o crime compensador e em muitas situações e circunstancias, penalizar a própria vitima do crime, invertendo a consequência lógica esperada.

Criminosos de alta periculosidade chocam o país praticando crimes hediondos, são identificados e presos pela policia, são julgados e condenados a altas penas de prisão, mas poucos anos ou meses depois, de maneira incompreensível para a população em geral, os criminosos recebem benefícios de relaxamento de prisão, progressão de pena para regime semiaberto, liberdade provisória obrigatória e por aí vai.

É pública e notória a insatisfação de expoentes da sociedade e da população em geral com este tipo de situação, não obstante às explicações e justificativas de juristas, magistrados e autoridades judiciais, indicando os motivos legais pelos quais os criminosos são beneficiados.

Essa contradição produz um paradoxo envolvendo as questões da justiça brasileira e dizem respeito aos deputados e senadores eleitos pelo voto popular. Os políticos são pessoas que surgem do seio do próprio povo. Até então vivem como povo e teoricamente possuem os mesmos anseios e sentimentos do povo do qual fazem parte e em dado momento resolvem ingressar na vida pública, prometendo defender os interesses da população na condição de seus representantes.

 

A principal atribuição dos deputados e senadores é criar novas leis para resolver problemas para os quais não exista previsão legal definindo a forma de agir, modificar as leis que se revelarem incompletas ou ultrapassadas por algum motivo ou circunstancia e revogar as leis que se revelarem prejudiciais e equivocadas ao serem aplicadas.

O grande mistério é; por que os deputados e senadores não cumprem corretamente este papel?

O povo, muitas autoridades judiciais, muitos policiais e muitos parlamentares manifestam contrariedade contra diversas leis e benefícios vigentes que favorecem os criminosos e apesar disto, mesmo tendo poderes para isso, estas leis não são ajustadas para atenderem as legítimas demandas que são reclamadas.

Com isso acontece o quê na prática?

Ocorre o aumento da criminalidade e corrupção entre os mais diversos grupos sociais e instituições e é semeado o ódio e o desejo de vingança entre todos os integrantes da nossa sociedade constituída de povo, autoridades, políticos e pelos próprios criminosos.

As pessoas que foram vitimas e tiveram familiares assassinados por criminosos, sofreram uma perda incomensurável em caráter definitivo e são obrigadas a observar com justificada revolta, os criminosos receberem penas temporárias de caráter transitório.

Muitos policiais investigam e identificam criminosos arriscando até a própria vida em suas capturas e observam decepcionados a impunidade através da libertação de pessoas comprovadamente criminosas, tornando inútil todo o trabalho realizado e risco sofrido para responsabilizá-los.

Procuradores e promotores de justiça sofrem derrotas nos tribunais em situações em que a culpabilidade de criminosos acusados é conhecida, mas diante da argumentação das defesas embasadas em dispositivos legais, não se torna possível à aplicação da penalidade que o senso comum considera justa e o criminoso fica livre para cometer novos crimes.

Juízes e Magistrados muitas vezes contrariados, se vêem obrigados à proferirem sentenças das quais discordam intimamente, pois são obrigados ao cumprimento fiel dos termos legais em vigor, mesmo que tal cumprimento, beneficie direta ou indiretamente o próprio criminoso.

Os políticos, a minoria deles, são favoráveis à introdução de novas leis atualizadas, que cumpram um papel adequado de punir criminosos e praticar justiça de forma equilibrada e ao mesmo tempo convivem com outros políticos, a maioria deles, que pensam de forma inversa, criando leis dúbias e maliciosas que podem beneficiá-los no futuro. Esta é uma provável forma de auto proteção, supondo-se a possibilidade de falcatruas ocultas do presente, se tornarem públicas no futuro, quando então será possível se beneficiar das próprias leis estrategicamente criadas.

Com todo este panorama onde o funcionamento regular, honesto, justo e eficaz não acontece, todos os atores e protagonistas sociais se sentem prejudicados.

Muitos são diretamente atingidos pela criminalidade e experimentam um elevado nível de insatisfação e outros observam o avanço da criminalidade em sua própria região e em todo o país e experimentam um elevado nível de preocupação, receio e insegurança sendo cidadão comum, autoridade ou policial. Resultado; todos compartilham o sentimento do medo e do desejo de reagir e se auto proteger.


 

Está aí plantada a semente do linchamento; quando de alguma forma um criminoso é surpreendido e dominado pelas próprias vítimas, o conjunto de situações mal resolvidas explode e a percepção de justiça reclama a aplicação imediata, da primeira pena capital que a imaginação sugerir.

Em geral não se cogita apenas conter o bandido e chamar a policia para que a policia cumpra seu papel legal e planejado de acordo com os procedimentos da corporação.

Não ocorre reflexão de que agir diretamente contra o bandido sem ser policial, caso seja ultrapassado os limites da mera contenção, comete-se crime passível de penalização. Nas redes sociais existem filmagens absurdas de pessoas comuns, agredindo com extrema ferocidade algumas pessoas acusadas de crimes. Já vimos também, relatos de casos em que posteriormente, verificou-se tratar-se de equivoco atingindo-se acusados injustamente.

A tônica da justiça particular, tem forte inspiração na “Lei de Talião” que preconiza o “olho por olho”, mas a falta de parâmetro para definir o que seja “olho” leva os “justiceiros” a cometer excessos criando contradição até do principio da própria “Lei de Talião”, ou seja, muitas vezes cobra-se do bandido, um preço superior ao custo do crime cometido.

Muitos policiais, que são profissionais treinados no combate ao crime, incorrem no mesmo problema e em função de uma revolta pessoal com os desdobramentos e mecanismos da justiça da qual fazem parte, cometem excessos incluindo o assassinato indevido e mal disfarçado de criminosos, fazendo com que o policial seja processado posteriormente.

Muitos policiais com isso perdem um bem significativamente precioso que possuem que é a condição de ser policial. O tempo todo, muitos policiais estão sendo investigados pelas Corregedorias das Policias, cujo trabalho é incessante por conta de policiais que se desviam pelos descaminhos do crime ou da decisão de praticar uma justiça pessoal e particular.

Fazer justiça com as próprias mãos leva pessoas comuns, autoridades e policiais para a prisão.

Nas redes sociais verificam-se abertamente sessões de torturas diversas praticadas de forma cruel e impiedosa que nos remetem à barbárie.

Aparentemente muitas pessoas se identificam e apreciam a pratica da tortura levando-se em conta o elevado número de visualizações dos vídeos e as muitas manifestações de apoio.

Vídeos de bandidos sendo executados ou de bandidos já executados também são apreciados e estimulados coletivamente o que também contradiz nossas leis, quando confrontadas com o entendimento favorável à tortura e a execução sumária que aparentemente predomina nas manifestações populares e de vários representantes da lei em geral.

Observando estes fatos, cabe fazer algumas indagações e considerações; por que no Brasil a pena de morte não está regularmente instituída, se uma possível maioria aprecia tanto a condenação à morte de criminosos diversos?

Por que no Brasil existe uma lei contrária à tortura se a tortura é uma forma de punição, considerada válida e apoiada por grande número de pessoas?

O mundo atual, não pode conceber a instituição oficial de castigos físicos sistematizados para punição de crimes cometidos, mas o nosso mundo brasileiro em particular, aceita prazerosamente conviver com a aplicação indiscriminada de castigos físicos de elevado grau de violência, praticada por cidadãos comuns e agentes públicos diversos.


 

O nosso mundo brasileiro em particular, aceita a ideia de instituir leis “politicamente corretas” no parlamento, para criticá-las indignadamente quando as mesmas leis são postas em prática ao processar o policial ou cidadão acusado de excesso no combate ao crime.

Talvez esteja faltando definir mais precisamente o conceito de justiça.

Sabe-se claramente o que é crime e entende-se perfeitamente que é necessário conter o criminoso e impedir a ocorrência de novos crimes.

Sabe-se também que o criminoso além de ser impedido de cometer novos crimes, deve ser penalizado com a perda da liberdade por conta do crime cometido.

Sabe-se ou entende-se que seja desejável a existência de uma possibilidade de ressocialização do criminoso após o cumprimento da pena de perda da liberdade.

E sabe-se que o espaço de tempo correspondente à duração da pena imposta, deverá apresentar consonância com a gravidade do crime cometido, ou seja, deve-se penalizar crime mais grave com mais tempo de prisão e crime menos grave com menos tempo.

O que importa é quê o tempo de duração da pena do criminoso previsto no julgamento seja cumprido sem interrupções até o final.

É preciso entender que o crime cometido não diminui sua dimensão com a passagem do tempo; se uma pessoa foi morta, ela estará morta definitivamente, se um bem foi destruído o bem estará irremediavelmente perdido, consequentemente a punição precisa necessariamente ser aplicada em toda a sua extensão, para que o ciclo estabelecido seja encerrado em conformidade com a tratativa estabelecida em lei e para que a justiça declarada transmita à vitima do crime o sentimento da existência de reparação.

Talvez então, nos falte a serenidade necessária para contribuir da forma que for cabível para que a aplicação das penas obedeça à todos os princípios envolvidos; chamar a polícia para atender as ocorrências, se for possível agir para conter o criminoso, simplesmente conter o criminoso cuidando da própria segurança e chamar a polícia em seguida. A polícia vindo, deverá cumprir com profissionalismo os protocolos e procedimentos regulamentares para os quais tenha sido treinada e a Justiça deverá cumprir rigorosamente seu papel de julgar, considerando os ritos estabelecidos e aplicar a lei correspondente.

O que precisa mais do que nunca é aperfeiçoar-se as leis e códigos instituídos com a máxima urgência possível.

É claríssimo que existem leis absurdas que beneficiam criminosos, é claríssimo que ao longo de nossa história recente os benefícios que foram concedidos aos criminosos são excessivos.

Está claríssimo que os parlamentares que elegemos até hoje são incapazes, corruptos e contribuíram de forma decisiva mais para nos prejudicar do que para viabilizar um funcionamento equilibrado, justo e correto de nossa sociedade.

Está claríssimo também que tudo isso misturado desorganizadamente, deteriora os costumes e contribui para um comportamento coletivo arbitrário e em desacordo com as leis que nós próprios criamos.

Não está claro, entretanto, qual será o caminho que devemos seguir considerando tantas variáveis.



 

Em se tratando de poder, o único poder efetivo do qual o povo dispõe é o poder do voto para eleger políticos, mas os atuais políticos eleitos são ruins e os futuros candidatos são no mínimo uma grande interrogação; manter-se-ão fieis às necessidades e aos compromissos que assumirem ou repetirão os desvios de conduta de seus antecessores?

Bem, os políticos que se desviarem das melhores condutas, precisam se preocupar com essa nova era em que vivemos; vivemos na Era da Comunicação digital.

O Poder da comunicação instantânea nos foi dado.  

Essa força descomunal aciona um mecanismo gigantesco que não pode ser contido quando desencadeado; basta que caia no gosto popular.

Essa força é a viralização; agora, quaisquer desvios de conduta, improbidades e todas as espécies de ações ou iniciativas serão gravadas em áudios e vídeos sujeitos a divulgação e compartilhamentos com elevado potencial de viralização, expondo tudo aquilo que for indevido e reprovável para um povo cada vez mais critico e consciente de seus próprios direitos.

Os desvios serão menos tolerados e só sobreviverão os politicos corretos, honestos e competentes; o Povo se tornará cada vez mais consciente e os mecanismos de percepção e combate das corrupções e improbidades estão em franco e irreversível desenvolvimento; o risco de quem se desviar do bom caminho aumenta a cada dia, graças ao trabalho incansável de Procuradores e Policiais Federais: não tem volta e o futuro será bom apenas para os bons, pois para os maus, haverá um inevitável encontro com a justiça antes ou depois do Foro Privilegiado.

Tudo começou com uma operação chamada “Lava Jato” que tem tudo para seguir em frente, apesar dos múltiplos ataques e tentativas de embaraço.

Não importa, o Brasil será melhor depois de tudo isso.


 

Set/2017                                     ISAC BISPO RAMOS