Eduardo Silva Merçon SUMÁRIO: Introdução. 1 Direito Ambiental: considerações gerias; 2 Patrimônio histórico; 3 Tombamento; 4 Função social e tombamento ; Conclusão; Referências. PALAVRAS CHAVE: Meio Ambiente. Patrimônio. Propriedade. Proteção. Tombamento INTRODUÇÃO Faz-se necessário para introduzir o tema principal, entender como é contemplado no direito brasileiro, o meio ambiente, o patrimônio histórico e cultural e o tombamento. Esse trabalho trata a respeito da possibilidade de prevalência do interesse público frente ao bem estar social de acordo com os princípios norteadores do Direito Ambiental. Quando se fala em meio ambiente, pode-se obter uma conceituação bem ampla, uma vez que não limitando a relação do ambiente ao homem, mas sim a todas as formas de vida. "Enfim, o conceito de ?ecossistema? denomina todas as interações do meio físico com a espécie que nele habita e vive". Há ainda que se estabelecer suas limitações, em que sempre são confrontados os interesses individuais com os coletivos, fazendo com que se assegure a supremacia do interesse público, baseando-se na garantia constitucionais do cumprimento da função social. Busca ainda entender como a preservação do patrimônio histórico e cultural nacional através do tombamento afeta garantias reais, de forma que o indivíduo tem seus direitos constitucionais legalmente limitados. Por fim, o tombamento é a forma em que a legislação respalda esse direito. É o registro feito junto ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional ? IPHAN, nos livros do tombo. Assim sendo, o tombamento como proteção ao patrimônio histórico e cultural nacional, é uma forma de o mundo moderno assegurar que as suas raízes não se perderão no tempo. 1 DIREITO AMBIENTAL: CONSIDERAÇÕES GERAIS Em uma primeira abordagem, sobre o tema em questão, vale ressaltar o significado da palavra natureza, que ao contrário de que muitos pensam, possui vários conceitos ao seu respeito que se distingue do meio ambiente. Para ser ter uma idéia inicial, natureza é tudo aquilo que constitui o Universo; força ativa que estabeleceu e conserva a ordem natural de tudo quanto existe, a essência de tudo. Posteriormente, com a intervenção humana na natureza durante a revolução industrial, o antigo conceito que se tinha de natureza, vai perdendo suas características, abrindo espaço para uma nova designação da natureza; o meio ambiente. Nessa perspectiva com a intervenção humana direta na natureza, convêm conceituar Meio Ambiente. Segundo Paulo de Bessa Antunes: Meio ambiente é uma designação que compreende o ser humano como parte de um conjunto de relações econômicas, sociais e políticas que se constroem a partir da apropriação econômica dos bens naturais que, por submetidos à influência humana, se constituem em recursos ambientais. No que diz respeito à relação entre o homem e a natureza, ambos vêm evoluindo e se desenvolvendo de maneira diretamente proporcional a evolução do ser humano. Para tanto vem havendo uma mudança nos papéis de dominante e dominado nessa interação, pois, enquanto antes, havia uma submissão do homem à natureza, hoje é ela que se submete ao homem. Assim, a partir do crescimento desordenado da população urbana e destruição em massa das matérias-primas para garantia de obtenção de bens de produção, percebeu-se após análises e projeções futuras, que o impacto causado no meio ambiente era grave e destrutivo e a necessidade de protegê-lo para que as futuras gerações mantivessem alguma qualidade de vida era imediata. Essa explicação de certa maneira vem a "ferir" o instrumento máximo que rege a pátria brasileira, que é a Constituição Federal de 1988, pois em seu artigo 225, parágrafo único; afirma que: Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Para tanto, vale a pena destacar a preocupação com a degradação ambiental, ocasionada pelo acelerado processo de industrialização, pelo qual o homem passou a utilizar os recursos naturais de maneira mais rápida e irracional, alertando assim as autoridades para uma intensificação do processo legislativo, com o intuito de buscar a proteção e preservação do meio ambiente. O alicerce para a prevenção do meio ambiente e da sociedade como um todo, se deu na intervenção da esfera jurídica em matéria ambiental. Para Toshio Mukai: O Direito Ambiental (no estágio atual de sua evolução no Brasil) é um conjunto de normas e institutos jurídicos pertencentes a vários ramos do Direito, reunidos por sua função instrumental para a disciplina do comportamento humano em relação ao seu meio ambiente. Destarte, tem como características principais a transindividualidade, a indivisibilidade e titulares indeterminados - interligados por circunstâncias de fato. Transindividuais, pois transcendem o indivíduo, ultrapassando o limite da esfera de direitos e obrigações de cunho individual. Indivisível, porque não há como fracioná-lo. Trata-se de um objeto que, ao mesmo tempo, pertence a todos, porém ninguém especificamente o detém e por último possuem titulares indeterminados e interligados por circunstâncias de fato, pelo o fato de não terem como precisar quais são os cidadãos atingidos por ele. Por fim, o Direito Ambiental seria um Direito "horizontal" que cobre os distintos ramos do Direito (privado, público e internacional), e um Direito de "interações", que tende a interferir em todas as áreas jurídicas para nelas introduzir a idéia ambiental. Porém vendo de outro ponto de vista, o Direito Ambiental deve ser delimitado por uma série de círculos concêntricos, que explique o caráter total ou parcialmente ambiental da norma jurídica. 2 PATRIMÔNIO HISTÓRICO Patrimônio Histórico pode ser definido como um bem material, natural ou imóvel que possui significado e importância artística, cultural, religiosa, documental ou estética para a sociedade. Estes patrimônios foram construídos ou produzidos pelas sociedades passadas, por isso representam uma importante fonte de pesquisa e preservação cultural. No entanto, há uma preocupação mundial em preservar e restaurar os patrimônios históricos da humanidade, mediante leis de prevenção e reparação que garantam a manutenção dos caracteres originais. Internacionalmente, a UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Cultura, Ciência e Educação) é o órgão responsável pela definição de regras e proteção do patrimônio histórico e cultural da humanidade. Já no Brasil, a entidade que se responsabiliza desempenhar tal função é o IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional). Destarte, quando um imóvel é tombado por algum órgão do patrimônio histórico, ele não pode ser demolido, nem mesmo reformado, podendo apenas passar por processo de restauração, seguindo normas específicas, para preservar as características originais da época em que foi construído, uma vez que, havendo reconstrução ou repaginação de imóveis, móveis ou bens naturais os mesmos perderão o seu valor histórico e simbólico perante a sociedade. O IPHAN dividiu o os patrimônios em dois grupos: os imateriais e materiais. Os primeiros consideram em seu regimento expressões, conhecimentos, práticas, artefatos, lugares e grupos. Os patrimônios materiais compreendem os bens culturais e bens móveis e imóveis, sendo que estes podem ser exemplificados como belas artes, sítios arqueológicos e acervos museológicos. A Constituição Federal contempla a essencialidade de se proteger o patrimônio histórico e cultural, e em seu artigo 216, estabelece os bens que, se devidamente enquadrados nos descritos, serão considerados patrimônio cultural, e, portanto, legalmente protegidos. Art.216. Constitui patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem: I - as formas de expressão; II - os modos de criar, fazer e viver; III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas; IV - as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais; V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico. O patrimônio histórico é a representação da cultura e da memória de um povo, e como tal, deve ser preservado pelo Estado para ser imortalizado e repassado através das gerações para que as criações, aprendizados e histórias não se percam no tempo. Portanto, quando relacionado ao resgate da identidade histórica ou cultural do indivíduo, passa a ter relevância para a sociedade como um todo, estabelecendo um vínculo entre ele e os seus antepassados. 3 TOMBAMENTO No Brasil, a proteção do patrimônio cultural, denominado patrimônio artístico e nacional, é regulamentada pelo Decreto-Lei nº 25 de 1937, que disciplina o instituto do tombamento, o processo de tombamento de um bem, os efeitos jurídicos produzidos pelo instituto e as sanções advindas da inobservância das restrições que recaem sobre o bem tombado. O tombamento é um ato administrativo realizado pelo Poder Público com o objetivo de preservar, por intermédio da aplicação de legislação específica, bens de valor histórico, cultural, arquitetônico, ambiental e também de valor afetivo para a população, impedindo que venham a ser destruídos ou descaracterizados. Para Paulo Affonso Leme Machado, "tombar um bem é inscrevê-lo em um dos livros do ?Tombo?, existentes no anteriormente chamado ?Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional?, ou no livro apropriado da repartição estadual ou municipal competente." O artigo 4º do Decreto-Lei nº 25/37 prevê quatro livros do tombo, nos quais deverão ser feitas as inscrições dos bens culturais. O Livro do Tombo Arqueológico, Etnológico e Paisagístico, que são as coisas pertencentes às categorias de arte arqueológica, etnográfica, ameríndia e popular, e bem assim as mencionadas no § 2º do citado art. 1º; o Livro de Tombo Histórico que se refere às coisas de interesse histórico e as obras de arte histórica; o Livro do Tombo das Belas Artes são as coisas de arte erudita nacional ou estrangeira; E por fim, o Livro do Tombo das Artes Aplicadas que são as obras que se incluírem na categoria das artes aplicadas nacionais ou estrangeiras. A inscrição num dos livros do tombo determina uma diretriz de conservação estabelecida pelo órgão responsável pelo tombamento, conferindo-lhe também critérios para apurar eventual dano sobre o bem cultural. Consoante o texto constitucional: (artigo 216, § 1º), o Poder Público tem o dever de preservar o patrimônio cultural. Constata-se, assim, a competência material comum de todos os entes federativos, com fundamento no artigo 23, incisos III e IV, da Constituição Federal. No tocante à competência legislativa sobre a matéria, pelo artigo 24, inciso VII, a União, os Estados e o Distrito Federal têm competência concorrente para legislar sobre a proteção do patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico, cabendo à União o estabelecimento de normas gerais e aos Estados a competência suplementar. A competência do Município para legislar sobre o assunto em tela está fundamentada no "interesse local" expresso no artigo 30, inciso I, do texto constitucional. Nesse sentido, o Município detém competência para instituir sua própria legislação a respeito do tombamento, nos moldes do artigo 30, incisos I e II, da Constituição Federal, podendo acrescer outras regras às normas gerais, diante do interesse local de preservação de bens culturais vinculados ao seu território. Existem três maneiras de classificar o tombamento. Sendo que uma delas é doutrinária, referindo aos seus destinatários. Podendo ser: individual, quando tratar de um bem específico; ou geral, quando tratar de um bairro ou cidade ? por exemplo, o tombamento do centro histórico de São Luís que foi efetuado por área e não nos imóveis. E as outras duas estão previstas no Decreto-Lei nº 25/37, em seus artigos 5º, 6º, 7º e 8º, que se subdivide em três tipos com base na manifestação de vontade: de ofício, voluntário e compulsório. 4 FUNÇÃO SOCIAL E TOMBAMENTO O direito de propriedade passou por profundas mudanças desde a sua consolidação durante a Revolução Francesa. Na modernidade é natural que se trate a propriedade não de forma absoluta, mas de maneira que se encontre um equilíbrio entre as disposições privadas e o entendimento por socialização. O ponto de equilíbrio entre o interesse coletivo e o interesse individual é que leva a justa aplicação do direito de propriedade. Mesmo em países como o Brasil em que, assegura a inviolabilidade dos direitos concernentes a vida, à liberdade, à segurança e a propriedade, ela está condicionada a uma função social (art. 170, III). O artigo 1.288 do Código Civil reafirma o direito à propriedade prevista na Constituição Federal, concomitantemente, prevê a função social do direito de propriedade em seu parágrafo 1º quando afirma que: § 1º - o direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas. Destarte, defende-se a normalização da restrição da propriedade através do instituto do tombamento, como imposição do Estado, para prover uma adequação do bem imóvel, como dotado de extrema relevância cultural, ou seja, o interesse coletivo deve se impor sobre este bem. O importante é constatar que essa função social pode ser acompanhada por uma funcionalidade, isto é, conseguir fazer fluir uma reutilização do bem tombado. È fundamental destacar que o proprietário do bem protegido tem o direito de utilizar o seu imóvel da forma que desejar - o tombamento não pode preservar o uso, mas apenas dos valores simbólicos. Entretanto, para que ocorra a preservação é necessário o acompanhamento de técnicos. A importância na área de turismo é primordial para atingir essa função social. Mas, a inserção do Patrimônio Histórico na sociedade significa a conscientização da população do que aquilo representa para a sua vida no presente, no passado, mas também para o futuro. Os bens conservados tornam-se um dos mais atraentes apelos para a vinda do turista. Desde que não se descuide da sua aparência física, não desvirtue a sua função e não destrua as suas características originais. A função social do patrimônio histórico está nas atitudes das pessoas do local ao saber cultuar e preservar, nascendo aí um envolvimento que resgata a identidade, motivo de orgulho próprio, e mais, oferece a oportunidade de atrair turistas. Assim o turismo é positivo e todos ganham. Em suma, o local tombado pode ter várias utilidades, moradia, mercados comerciais, locais de eventos, desde que desta funcionalidade não restar qualquer agressão à estrutura física do imóvel - a intenção não é proibir, mas sim preservar. CONCLUSÃO Após o exposto, pode-se verificar a aplicabilidade do Tombamento como instituto necessário para a preservação do Patrimônio Histórico Cultural Nacional, no intuito de resguardar a identidade cultural de um povo. O estudo dos elementos do meio ambiente proporcionou acompanhar-se o desenvolvimento da matéria do conceito individual, para sua inserção num contexto social, como parte de um conglomerado de diferenças sociais que compõem a cultura nacional. Nesse raciocínio O Patrimônio Histórico e Cultural surge como uma forma de perpetuar a identidade de uma nação, trazendo em seus elementos o registro dos antepassados e seu desenvolvimento até a atualidade. O tombamento surge como uma forma alternativa de assegurar a preservação e conservação do patrimônio histórico e cultural nacional sendo efetuado um procedimento que vai desde a notificação do proprietário ou requisição, passando por análises técnicas, até culminar no registro do imóvel a ser preservado em um dos livros do tombo. Por fim, o estudo mostra que a propriedade tem o seu limite estabelecido pelo cumprimento do bem estar social. Sendo que essa função possui relevância para o patrimônio histórico e cultural nacional e, através do tombamento é possível uma perpetuação das raízes para as futuras gerações. REFERÊNCIAS ANTUNES, Paulo de Bessa. Natureza, meio ambiente e dano ambiental. Disponível em: . mai. 2009. DA SILVA, Fernando Fernandes. As Cidades Brasileiras e o Patrimônio Cultural da Humanidade. Salvador: Peirópolis. 2003, p. 123. SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 30ª Edição, São Paulo: Editora Malheiros, 2008. MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 13ª edição. São Paulo: Malheiros, 2005. MANZATO, Maria Cristina Biazão. A transferência do Direito de construir como forma de indenização ao proprietário de bem tombado. Disponível em: . mai. 2009. MUKAI, Toshio. Direito Ambiental Sistematizado. 6ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2007 UNESCO. Disponível em: http://www.brasilia.unesco.org/. mai 2009.