Tô saindo... Fui...

            “Tô saindo... Fui...”. Essa expressão, nos chamados tempos modernos, tornou-se comum em muitos lares brasileiros. Outrora e, não muito outrora, os jovens ao saírem de suas casas para o passeio de fins de semana, esses, eram feitos com horário pré-estabelecido pelos pais, em especial pelo pai e, isto era como um costume que se tornara em um valor, e em um valor moral. E quando o jovem, seja ele ou ela, não chegava no horário, os pais ficavam em pânico e mal conseguiam dormir. Ficavam com medo de que algo pudesse acontecer. A violência e o uso de drogas já existiam,  porém, não era tão acentuado como nos dias atuais.

           Assim como ir a igreja aos domingos, confessar e comungar, tomar a benção do padre, que só andava de batina e com colarinho clerical e beijar sua mão, eram coisas sérias. Os homens crentes, ou seja, os protestantes, em sua maioria andavam de terno e em geral com a Bíblia embaixo do braço. As mulheres, normalmente de cabelos compridos, sem maquiagem ou decotes, com suas saias ou vestidos bem abaixo dos joelhos, estavam sempre sérios.

            Poder-se-ia acreditar que existia um temor a Deus? Temor não no sentido de medo, mas, de respeito, e esse respeito estendia-se à família, à escola e à toda a sociedade.

           Então, sair de casa para ir à praça, nos fins de semana, sempre era com horário pré-estabelecido e por vezes ir ao baile, o que geralmente acontecia uma vez por mês.  Baile era coisa chic, dançava-se de rosto colado ao som de músicas, em sua maioria românticas, todavia, era necessário ter uma companhia, e esta deveria ser de confiança dos pais. Isso não era diferente para o namoro; sempre tinha a chamada “vela”, ou seja, aquela companhia para “vigiar” o namoro, geralmente a irmã. Por vezes a vela até ajudava, fazendo vista grossa.

           Incluo-me nessa história, lá em Ribeirão Vermelho, cidade ostentada pelo maior complexo ferroviário da América Latina e pelo majestoso Rio Grande, onde outrora, fora navegável. Na década de 70, quando namorar era com hora marcada, na sala, no fim de semana e no máximo chegando até as dez da noite. O horário era até as nove, e se passasse, o pai dela começava a raspar a garganta e por vezes bradar: “Carmélia, quero dormir”, ou seja, têm um intruso e se ele não for embora eu não durmo, isso quando não ia pro sofá e assentava-se exatamente no meio. Bom era o fim de semana que ele não estava em casa, eu ia até para cozinha e por vezes assentava no rabo do fogão, e tomava café ficando até mais tarde, ou seja, até as dez e meia, claro que a mãe, Dona Carmélia, ficava ali com a gente, mesmo morrendo de sono. Melhor que isso era na despedida, ai sim, era a hora do abraço e do beijo, nada demorado.

            Não tinha reclamação. Era costume. Era valor e valor moral.

           Nessa época, tomar a benção dos pais, não participar de assuntos dos pais, dentre outras coisas, eram atitudes importantes. A virgindade, era coisa séria, considerada a honra da família, e coitado daquele pelo qual a menina perdesse a virgindade, normalmente era obrigado a casar-se e, gostando ou não da menina, não vestida de branco, pois, casar-se nessa época, vestida de branco, significava a pureza da noiva, e isto por causa da honra se caso não casasse, a garota ficava falada; claro que haviam meninas que já eram ativas sexualmente, mas estas eram consideradas “espertas”, pois não ficavam esperando neném ou com o “bucho cheio”, expressão usada na época. “Eram virgens”. Não se sabe por que para os homens era diferente.

          Hoje, ao contrário, virgindade é coisa que se leiloa. Seria pelo fato de estar rara? Fazem-se muitas piadas a respeito, e isso entre as próprias meninas. É interessante pensar sobre esse leilão. Geralmente, em um evento desses existe a figura do leiloeiro e do produto, que normalmente está a vista dos expectadores interessados ou não. Começa com um lance mínimo e vai alcançando valores considerados até absurdos, e a pergunta que todos aguardam é: Quem dá mais? E, ao fim de uma espera que não é longa, ele, o leiloeiro, diz: Dou-lhe uma, dou-lhe duas e... Dou-lhe três. Aguarda por alguns instantes e, se não houver mais lance, ele grita: Vendido! Então bate o martelo.

            O comprador vê o produto, examina, e se não tiver muito conhecimento, convoca um perito para verificar a autenticidade do que esta sendo comprado. Então leva o objeto para casa e vai expô-lo em um ambiente para que todos que o visitem vejam e admirem.

            E no caso do Hímen, quem vai vê-lo? Onde ficará exposto? Que tipo de mercadoria é essa? Se assim pode ser chamado. Neste caso, existe o perito para comprovação, mas o comprador, em sua ignorância, será capaz de pelo menos visualizá-lo? Poder-se-ia dizer: Pagou, mas não levou. Questão difícil. Mas essa é uma questão do humano, que por vezes paga caro para ter um “suposto” prazer, mesmo que seja momentâneo tal quando se faz o uso de álcool e outras drogas, pois estas levam o sujeito a ter até alucinações. É uma escolha. Usar ou não usar. Ela escolhe vender e ele escolhe comprar.

            Mas, e nos tempos chamados modernos? Foi esticando o horário e o costume, o valor foi se esvaindo e acabou. Assim como todo bom chocolate, os costumes chegam ao fim. Os pais “sabiam” onde os filhos estavam e, sem dúvidas nenhuma,  eram enganados.

           Nos dias atuais, o horário de sair é o horário que outrora era estabelecido para chegar, é o horário em que muitos e muitas estão se aprontando, ou seja não tem mais horário, não se vai mais a praça, não se passeia, não têm mais baile, e quando os pais por ventura perguntam aonde se vai, poderá ter como resposta: “Vou pra balada”, “Vou por ai” e, por vezes, não há resposta. E o horário de chegar é depois das três da manhã, e isto quando chegam. Acabou o limite.

            Poder-se-ia perguntar: houve uma inversão de valores? Acabou a moral? Acabou o temor a Deus? Está havendo uma desestruturação familiar? Perguntas muito difíceis de serem respondidas. Atualmente tornou-se muito comum, em algumas famílias, avós criarem netos, cuja mãe não sabe quem é o pai.

          O que se pode notar é que muitas crianças, adolescentes e jovens estão sem nenhuma perspectiva para o futuro. O imediatismo tomou conta, e muitos, completamente perdidos, encontraram respostas no uso de drogas lícitas, ilícitas e em pequenos furtos. O diálogo familiar já não existe mais. Já na década de 50 a dupla sertaneja, Tião Carreiro e Pardinho, que fez muito sucesso, cantava uma música que tinha como titulo “A Vaca Já Foi Pro Brejo” e, a letra desta música trata exatamente do momento atual e, em alguns versos diz:

“Mundo velho está perdido, já não endireita mais
Os filhos de hoje em dia já não obedece aos pais
É o começo do fim, já estou vendo sinais
Metade da mocidade estão virando marginais...
É um bando de serpente, os mocinhos vão à frente
As mocinhas vão atrás...

O filho parece rei, filha parece rainha
Eles que mandam na casa e ninguém tira farinha
Manda a mãe calar a boca, coitada fica quietinha
O pai é um zero à esquerda, é um trem fora da linha...
Cantando agora eu falo, terreiro que não tem galo
Quem canta é frango e franguinha...

Estamos no fim do respeito, mundo velho não tem jeito,
A vaca já foi pro brejo...”.

            É interessante notar que, algum tempo depois, uma nova música foi lançada, porém esta diz que não é mais necessário se preocupar com o pudor, a moral ou mesmo o respeito para com o outro e a si mesmo. Não precisa mais esperar a hora do beijo, e beijo é coisa do passado, a onda hoje é outra é “Namorar Pelado” e diz: (Rapazolla)

“Beijo na boca é coisa do passado
A moda agora é...é namorar pelado
Beijo na boca é coisa do passado
A moda agora é...é namorar pelado...

A moda agora é...kero ouvir kero ouvir
Beijo na boca é coisa do passado
A moda agora é...é namorar pelado
Beijo na boca é coisa do passado
A moda agora é...aí fala serio ...”

            Parece estar se vivendo uma época em que o ser humano já não se lembra mais de qual é o propósito da vida. Essa geração, independente de classe social, de credo ou raça, que esta fazendo essa escolha, colherá seus frutos. O pior não acontece porque as misericórdias do criador do universo, Deus, se renovam a cada manhã.

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