Testamento Vital

 

Frente ao ordenamento Jurídico Brasileiro possibilidade ou impossibilidade.

 

Resumo:

Este artigo trata da possibilidade ou impossibilidade do Testamento Vital frente ao ordenamento Jurídico Brasileiro. 

Palavras – chave: Testamento, Testamento Vital; Eutanásia, Distanásia e Ortotanáisa; Vida; Ordenamento jurídico.

Sumário: 1 - Introdução, 2 – Testamento,  3 – Testamento Vital, 4 - Aspectos diferenciais importantes referentes à eutanásia, distanásia e ortotanáisa; Breve considerações constitucionais; conclusão.

Introdução

O Testamento Vital ao contrário do testamento comum produz seus efeitos em vida, pois tem como objetivo de deixar seu desejo expresso, enquanto este ainda possui estado de lucidez, para que quando este assim estiver desprovido de tal clareza de ideias possa externar seu desejo e não ser submetido nenhum tratamento meramente protelatório ao fim inevitável do fator morte. O testamento conforme já conhecemos possuiu, forma e requisitos claros e também estando plenamente amparado dentro de nosso ordenamento jurídico, porém o testamento vital ainda carece de mais esclarecimentos, mas deixa-se claro que é um desejo do paciente e ligado ao seu intimo, e por isso também deve estar isento de vícios que devem estar ausentes em qualquer testamento.

Os que pregam o direito de fazer valer este documento defendem que ele esta ligado a dignidade da pessoa humana e a um direito pessoal e assim como outros países o Brasil deveria também admiti-lo

Este artigo tem como objetivo tratar de alguns aspectos relacionados em torno deste documento e buscar a conclusão clara sobre a admissibilidade ou não deste existir e se o mesmo deve produzir seus efeitos que se pretende.

 

II - Testamento

Ato pelo qual o indivíduo dispõe com base na lei do seu patrimônio, após a sua morte. O artigo 1.857 do CC, assim preceitua: Toda pessoa capaz pode dispor, por testamento, da totalidade dos seus bens, ou de parte deles, para depois de sua morte.

É necessário destacar que se existirem herdeiros necessários, só poderá existir a disposição da metade dos bens, em função de que a outra metade é destinada a legítima, conforme o artigo 1.850 do CC são herdeiros necessários os descendentes, os ascendentes e o cônjuge.

Pode existir a revogação do total ou parcial através de outro testamento, é possível haver nomeação de testamenteiros, para se fazer cumprir o testamento, e também é admissível a remuneração do testamenteiro, denominada vintena podendo variar de 1% a 5%, de acordo com o juiz.

Sobre o testamento, relevante apontar algumas opiniões e considerações de alguns renomados doutrinadores. Assim diz Gonçalves, Carlos Roberto (Direito civil brasileiro/Carlos Roberto Gonçalves – 5. Ed – São Paulo: Saraiva 2011. P.226 e 227

O testamento, ao menos como ato de última vontade como o compreendiam os romanos no período clássico de seu direito, era desconhecido no direito primitivo. Nem sempre a lei e os costumes o admitiam, havendo legislações pelas quais eram punidos aqueles que pretendiam instituir herdeiros ao arrepio da lei. Na legislação chinesa,  pelos preceitos de MENG-TSEU, aquele que elaborasse um testamento contrariamente à legislação era punido com oitenta golpes de bambu.  

O direito pátrio consagrou, antes do Código Civil de 1916, as antigas modalidades testamentárias: aberto ou público, cerrado ou místico, particular ou ológrafo, nuncupativo ou por palavras. Quando o aludido Código foi elaborado, imprimiu-se à sucessão testamentária orientação segura e simples: as duas modalidades de sucessão convivem, sendo lícito dispor de parte dos bens ou da sua totalidade; é livre a instituição de herdeiro ou a distribuição de bens em legados; é reconhecida a liberdade de testar, na falta herdeiros necessários; é facultado gravar os bens de cláusulas restritivas, mesmo quando as legítimas; é franqueada a substituição do favorecido. O Código Civil de 2002 manteve, em linhas gerais, os mesmos tendo porém,  incluído o cônjuge sobrevivente entre os herdeiros necessários ( art. 1845) e condicionado a oneração dos legítimos à menção pelo testador, de uma justa causa.

Assim preceitua Dias, Maria Berenice (Manual das Sucessões 2ª edição revista, atualizada e ampliada ano 2011. p. 346):

O testamento é de tal ordem o alcance do princípio da autonomia da vontade, que é respeitado mesmo depois da morte. O testamento é a prova. Aliás, chega a ser chamado de “a lei do homem”. É considerado ato de última vontade para significar ser a derradeira decisão de uma pessoa sobre bens ou outros assuntos de seu interesse. Qualquer pessoa capaz pode testar, contemplando outras com seus bens e direitos (CC 1860). Pode deixar sua herança ou parte dela a quem desejar. O titular do patrimônio pode nomear herdeiros, a quem deixa ou todos os seus bens, ou fração deles. Também tem a faculdade de nomear legatários, destinando-lhes bens certos ou bens determináveis. Podem coexistir vários testamentos, desde que um não contrarie as disposições dos demais. O posterior pode manter o anterior, complementá-lo ou apenas ou apenas o alterar em parte. Neste caso, subsistem os dois. Conservam-se todas as disposições do primeiro que se harmonizarem com o segundo.

Existem alguns requisitos do testamento quando a sua forma, ou seja, para que o mesmo seja um ato perfeito pois cada vontade deve ser objeto de um testamento não cabe testamento abranger desejos de duas pessoas, ele constitui da manifestação única e exclusiva do testador, não esta condicionado e não depende à aceitação do beneficiário, mesmo se o herdeiro renunciar a herança, somente a eficácia do testamento ficará comprometida o testamento em si não, além disto o testamento é um ato personalístico, conforme preceitua o artigo (CC 1858) O testamento é ato personalíssimo, podendo ser mudado a qualquer tempo. Somente o testador pode realiza-lo e revogá-lo conforme artigo (CC 1969) O testamento pode ser revogado pelo mesmo modo e forma como pode ser feito.

Assim preceitua Dias, Maria Berenice (Manual das Sucessões 2ª edição revista, atualizada e ampliada ano 2011. p. 350):

Revogação – O testamento pode ser revogado (CC 1969). Mas as disposições sem conteúdo patrimonial, não. Continuam válidas, ainda que revogado o testamento. A revogação do testamento não demanda a necessidade de outro em substituição. Pode o testador limitar-se a revogar o testamento anterior, se o mesmo foi público. JÁ O testamento cerrado e o particular, basta serem rasgados ou inutilizados.

  

                                                 

III – Testamento Vital

O testamento vital é um documento com determinações antecipadas, que é feito por uma pessoa, enquanto este ainda se encontra em estado de clareza de ideias e lucidez, para que seja usado quando este não possa mais dizer a sua vontade de fato, neste documento é esclarecido sobre o tratamento médico no qual será submetido quando este estiver de posse de doença física e mental incurável e não for possível exprimir sua vontade.

O testamento vital é admitido em alguns países como o Uruguai desde 2009 e também em alguns países europeus e nos Estados Unidos, Apesar disto ainda não existe no Brasil norma jurídica que a ampare.

Os testamentos no Brasil de maneira geral surtem efeitos para atos que devam ser efetuados após a morte do indivíduo, porém o testamento vital ao contrário, a ideia e que ele produza efeitos durante o período aonde o individuo esta sem condições de expressar sua vontade a exemplo em um estado de coma.

Deve ser observado que o testamento deve preencher alguns requisitos como a capacidade do individuo se o mesmo foi efetuado sem vícios de consentimento, erros diversos que naturalmente inviabilizariam qualquer documento desta natureza, também cabem lembrar que a validade do testamento esta condicionado a um ato forma e solene, gratuito, imprescritível, tem seus efeitos após a morte e outro ponto importante diz respeito à revogação .

Assim preceitua Dias, Maria Berenice (Manual das Sucessões 2ª edição revista, atualizada e ampliada ano 2011. p. 380):

No Brasil não há autorização legal para a eutanásia e nem para o suicídio assistido, mas o direito a suspensão de esforço terapêutico encontra suporte na Constituição Federal que reconhece a dignidade da pessoa humana como fundamento do estado democrático (CF 1º III). O direito à morte digna é o reverso da moeda do direito à vida digna. Ao depois, de forma expressa está dito (CF 5. III): ninguém será submetido à tortura e nem a tratamento desumano ou degradante. É preciso fazer coro às palavras de Cristiano Chaves: não se pode deixar de disparar crítica ao legislador por ter deixando de tratar de importante discussão (ética, jurídica, religiosa e moral) acerca do direito de morrer dignamente.

O Código civil admite a recusa a determinados procedimentos médicos (CC 15) e a Lei Orgânica da Saúde (L 8.080/1990 7º III) reconhece o direito à autonomia do paciente. O Código de Ética Médica proíbe abreviar a vida do paciente, ainda que a seu pedido ou de representante legal, mas, nos casos de doença incurável e terminal, deve o médico oferecer todos os cuidados paliativos disponíveis sem empreender ações diagnósticas ou terapêuticas inúteis ou obstinadas, levando sempre em consideração a vontade expressa do paciente ou, na sua impossibilidade, a de seu representante legal. (41 parágrafo único).

IV – Aspectos diferenciais importantes referentes à eutanásia, distanásia e ortotanáisa.                                                                                                        

É importante tratar da diferenciação de cada um separadamente para entendimento inclusive dos aspectos legais que envolvem ambos os institutos e como estão correlacionados com o testamento vital.

Eutanásia é a morte provocada por sentimento de piedade à pessoa que sofre. A eutanásia vai se produzir quando houver o sofrimento, doença sem esperanças de cura, sofrimento de quem se encontra naquele estado, falta de esperança de uma vida, que pelo entendimento de quem a sofre, ausência de esperança de uma vida digna. Este entendimento da falta de cura a permanência neste estado é importante, pois do contrário, ou seja, se existe a possibilidade de recuperação, qualquer ação que ponha fim na vida desta pessoa é enquadrada diretamente como homicídio claro e tipificado no código penal, apesar de que mesmo eutanásia não é aceita por nosso ordenamento jurídico e também podendo ser classificada como homicídio ou induzimento, instigação ou auxilio ao suicídio, mas é importante diferencia-la para entendermos que se trata de situações diferentes apesar de não estar previsto em nossas leis.

Distanásia é o prolongamento artificial do estado terminal do paciente e consequentemente prolongando de  uma situação do estado final e inevitável da morte de uma pessoa. Conforme Maria Helena Diniz “ trata-se do prolongamento exagerado da morte de um paciente terminal ou tratamento inútil. Não visa prolongar a vida, mas sim o processo de morte (DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. São Paulo: Saraiva 2001).

Ortotanásia é a morte correta, a morte pelo processo natural, nesta situação a individuo já esta em fase de morte natural e o profissional médico apenas colabora para que ela siga seu curso, isto algo a destacar, pois a medicina ao longo do tempo se desenvolveu vários instrumentos tecnológicos e medicamentosos prolongam o que muitas das vezes é inevitável à morte do paciente e o desejo do paciente e em alguns casos é morrer dignamente juntamente com seus familiares e amigos, Então a ortotanásia pressupõe ao invés de se prolongar artificialmente o processo de morte (distanásia), deixa-se que este se desenvolva naturalmente. Somente o médico pode realizar a ortotanásia, e ainda não está  obrigado a prolongar a vida do paciente contra a vontade deste e prolongar sua dor. Neste caso não existe tipicidade pois, a morte já esta instaurada por um processo natural. O papel do médico neste caso vai em amenização da dor e conforto na medida do possível para o paciente e seus familiares.

V – Breve considerações constitucionais

A nossa constituição evidente que prevê um direito importantíssimo que é o super-direito a vida, ou seja, o este direito preza o direito de continuar vivo e exige também além da vida a dignidade.

Então a preservação da vida é uma proteção, uma garantia, um direito  é busca constitucional.

Assim preceitua Moraes, Alexandre de Direito constitucional/ (Alexandre de Moraes. – 27. Ed. – São Paulo: Atlas, 2011 páginas 34 e 39).

“A Constituição Federal garante que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito a vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. O direito à vida é o mais fundamental de todos os direitos, já que se constitui em pré-requisito à existência e exercício de todos os demais direitos.

A Constituição Federal proclama, portanto, o direito à vida, cabendo ao Estado assegurá-lo em sua dupla acepção, sendo a primeira relacionada ao direito de continuar vivo e a segunda de se ter vida digna quanto "à subsistência”.

“A dignidade da pessoa humana concede unidade aos direitos e garantias fundamentais, sendo inerente às personalidades humanas. Esse fundamento afasta a ideia de predomínio das concepções transpessoalistas de Estado e Nação, em detrimento da liberdade individual. A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte da demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos.

 

           

 

 

Conclusão

O testamento vital ainda não é aceito no Brasil, ele é apenas uma declaração antecipada de desejo para preservar a dignidade da pessoa humana que também é um direito de extremo valor em nossa sociedade.

A Medicina busca a vida, a garantir a vida do paciente, é difícil admitir a morte tanto por parte de quem esta doente quanto pela família o médico deve buscar de todas as formas possíveis a preservação da vida e garantir a dignidade do individuo, ou seja, o trabalho harmônico entre o paciente e sua profissão.

O testamento como já conhecemos é um instituto antigo que foi criado para preservar bens e produz seus efeitos após a morte, já o testamento vital produz efeitos em vida.

Como já esclarecido acima o individuo tem direito constitucional ter uma vida digna e se não existe possibilidade de recuperação do paciente e qualquer procedimento vai se constituir apenas protelação do fim, constituindo em ações muitas das vezes evasivas, dolorosas tanto físicas como psicológicas para quem esta nesta condição, quanto para a família, não vejo motivo algum para que não seja admitido o testamento vital, nada mais é que um documento que visa garantir a dignidade, a forma como este entende e deseja que e deva ser conduzido seu tratamento, muitas das vezes este quer estar do lado de quem ama e não perto de tubos em um quarto branco com uns profissionais de saúde, muitas das vezes este quer apenas deixar claro como quer que seja suas ultimas horas e também suas ultimas recomendações para familiares e para amigos, o desejo de ouvir uma música, o desejo de uma oração, a vontade de que o médico apenas permita que se utilize de medicamentos farmacêuticos necessários para um final da vida sem dor é diferente da eutanásia que não existe o perigo morte, neste sim a morte é inevitável, mas como dizer o que quero fazer se não estiver em condições de expressar a minha vontade, se eu não puder falar, ouvir e muito menos escrever neste caso, para esta situação somente me sobraria deixar claro as minhas intenções através de um testamento, de um documento que vai garantir o meu desejo, que nada mais é de continuar digno.

Infelizmente ainda não é admitido este tipo de testamento e as pessoas que quiserem valer deste direito devem buscar a via judicial, ou seja, o direito de não ver sua inevitável morte protelada e evitar tratamentos que não vão legar a lugar algum.

Bibliografia

Moraes, Alexandre de Direito constitucional/ (Alexandre de Moraes. – 27. Ed. – São Paulo: Atlas, 2011)

Dias, Maria Berenice (Manual das Sucessões 2ª edição revista, atualizada e ampliada ano 2011.

Gonçalves, Carlos Roberto (Direito civil brasileiro/Carlos Roberto Gonçalves – 5. Ed – São Paulo: Saraiva 2011.