Terceiro Setor e a Inclusão Digital na Educação *

 

Vilmar Pedroso Guedes

Gerente de Projetos da

Intellectos – Centro de Pesquisa e Desenvolvimento Educacional

[email protected]

Márcia de Borba Campos

Professor Adjunto da

Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul

[email protected]

 

Resumo – Este artigo discorre sobre a atuação do terceiro setor e a sua relevância pelos serviços comunitários prestados às populações carentes, visando à redução das desigualdades sociais e regionais. Sua história data da metade do século XVI com a participação das igrejas cristãs na qual o Brasil mantinha um vínculo constitucional com a Igreja Católica, destacando-se as ações sociais desenvolvidas na época, principalmente, nas áreas da saúde e da previdência. Mas foi a partir de 1960 que o terceiro setor se fez presente, representado pelas organizações não governamentais que intensificaram suas ações de solidariedade e do exercício da cidadania. Com o advento da Internet e o acesso a novas tecnologias de informação e comunicação, o terceiro setor começou a expandir suas ações para diversas áreas do conhecimento. Na sequência, são apresentados exemplos de iniciativas que vem sendo desenvolvidas com o propósito de oferecer às pessoas que vivem à margem da tecnologia uma maneira diferente de se comunicar, de aprender, de melhorar seus negócios, praticando a inclusão digital. Para facilitar a inserção digital faz-se necessário o uso de grandes investimentos aliado à formação de parcerias para suprir a falta do Estado no atendimento das necessidades e anseios sociais da população.

Palavras-Chave – Terceiro Setor. Inclusão Digital. Informática na Educação. Escola de Educação Integral.

 

Third Sector and the Digital Inclusion in Education

 

Abstract - This article discusses the role of third sector and its relevance for community service to needy populations, aimed at reducing social and regional inequalities. Its history dates from the mid-sixteenth century with the involvement of Christian churches in which Brazil had a constitutional relationship with the Catholic Church, especially the social actions developed at the time, especially in the areas of health and welfare. But it was after 1960 that the third sector arose, represented by non-governmental organizations have stepped up their actions of solidarity and citizenship. With the advent of the Internet and access to new information technologies and communication, the third sector began to expand their actions to different areas of knowledge. Following, are show for the examples of initiatives that have been developed for the purpose of offering people who live in the threshold of the technology the one different way of communicating, learning, improve their business, practicing digital inclusion. To facilitate digital insertion it is necessary to use large investments coupled with the formation of partnerships to address the lack of the state in meeting the social needs and aspirations of the population.

Keywords - Third Sector. Digital Inclusion. Computers in Education. School Integral Education.

 

I. INTRODUÇÃO

 

Ao disponibilizar a todos um pouco da história das instituições pertencentes ao terceiro setor, nota-se, nitidamente, que elas vêm ganhando uma nova postura e encontrando novos espaços na sociedade, no sentido de reduzir, significativamente, a desigualdade social.

 

As desigualdades econômicas e sociais estão diretamente relacionadas à distribuição desigual das TICs (Tecnologias de Informação e Comunicação). Portanto, a inclusão digital merece um cuidado especial como ferramenta e nova forma cognitiva para promover o aperfeiçoamento e aprendizagem de seus usuários.

A economia de um país hoje não consegue se auto-sustentar sem o uso dos recursos da Internet, em termos econômicos, sociais e ambientais. Isto significa aplicar a tecnologia para o fortalecimento de suas atividades econômicas, organizacionais, educacionais e de auto-estima da população, melhorando a sua qualidade de vida. Assim sendo, ao promover a inclusão digital, ocorre maior motivação na utilização da Internet, aumenta a auto-estima, a qualificação, o desempenho profissional e o desenvolvimento pessoal e comunitário dos cidadãos e, certamente, acarretará uma consciência de cidadania, de ética e de transformação social (Carvalho, 2009; Cruz, 2004).

 

Para entender melhor suas diferenças, o primeiro setor é constituído pelo governo que tem sua representação política nas prefeituras municipais, governos estaduais e governo federal, além de outras instituições ligadas ao governo, como as Secretarias, as Autarquias, entre outras. Não exerce o lucro e procura sanar as desigualdades proporcionadas pelo mercado. O segundo setor refere-se ao Mercado, representado pelas empresas privadas com fins lucrativos, agindo em benefício próprio e particular, dependendo do lucro para sobreviver.

O terceiro setor é formado por organizações privadas, sem fins lucrativos, portanto, não visam o lucro e desempenham ações de caráter público, assistenciais, de caridade, promovendo a justiça social através de parcerias com o governo, com as empresas privadas ou com instituições internacionais. A sua origem vem do vocábulo Third Sector, usado nos Estados Unidos para definir as organizações sem vínculos diretos com o primeiro setor (público) e o segundo setor (privado) (Carvalho, 2009).

 

II. HISTÓRICO

 

O terceiro setor vem experimentando, ao longo dos anos, uma expansão considerada quase que extraordinária, por exercer uma função diferente de redistribuição de riqueza, na tentativa de sanar as desigualdades originadas pela movimentação do mercado. Para sobreviver, o terceiro setor necessita de elevados investimentos e de doações permanentes para atender as demandas sociais não resolvidas pelo Estado que vive em constante crise de legitimidade e se diz incapaz ou sem recursos para amenizar os problemas que assolam as áreas social, ambiental e cultural. Uma das soluções encontradas pelo terceiro setor é o estabelecimento de parcerias com o próprio Governo, com instituições empresariais e até com órgãos internacionais, visando desenvolver projetos sociais de grande penetração nas comunidades de baixa renda (Serviço de Apoio..., 2009).

Surgem novas palavras criando expressões e conceitos, como parceria, cidadania corporativa, responsabilidade social, investimento social privado, solidariedade, voluntariado, ampliando o relacionamento entre os três setores da economia brasileira. Começam a surgir, mais recentemente, projetos auto-sustentáveis, opostamente aos tradicionais que eram de caráter assistencialista. As organizações sociais começam a definir e a aplicar uma forma de gestão diferenciada e participativa, investindo em novas metodologias. Não possuem donos ou acionistas, não visam o lucro e investem sobremaneira na qualificação e no treinamento e capacitação de gestores sociais, além de facilitadores de equipes e de participação voluntária dos cidadãos para tratar das questões sociais. Nas parcerias realizadas com o Governo através de editais, licitações e mesmo com outras instituições privadas, as prestações de contas dos recursos a serem geridos pelo terceiro setor sempre estão presentes (Serviço de Apoio..., 2009).

Para melhor entender a trajetória do terceiro setor e o seu surgimento histórico no Brasil, apresenta-se a seguir um comentário das seis etapas descritas segundo artigo de Tanya L. Rothgiesser e que retrata as ações de filantropia desde a colonização portuguesa do século XVI até o século XXI (Costa, 2001; Rothgiesser, 2004; Serviço de Apoio..., 2009).      

Em 1543 (século XVI), durante o Império, foi criada a Irmandade da Misericórdia na Capitania de São Vicente, com a finalidade de prestar assistência aos desamparados. Existia na época um vínculo muito estreito entre o Estado e a Igreja Católica que tinha a responsabilidade de prestar assistência às comunidades carentes que eram atendidas também pelas Ordens Terceiras e pelas Santas Casas. Também participavam dessas benemerências os beneditinos, os franciscanos e as carmelitas que não mediam esforços para promover ações sociais de caráter assistencialista e que perdurou até o século XX.

Com a chegada da industrialização e da urbanização a partir de 1930, o Estado experimentou um status mais vigoroso e a sociedade começou a modernizar-se, suscitando o aparecimento de necessidades sociais mais complexas na população. Em vista disso, inúmeras instituições pertencentes ao terceiro setor, muitas das quais com sua representatividade indefinida, começaram a surgir para atender um hiato existente entre o Estado e a sociedade, fazendo com que, em 1935, o Estado Novo publicasse a primeira lei específica, regulamentando as regras para as entidades não governamentais, sem fins lucrativos e de finalidade pública. Na lei, a declaração de Utilidade Pública Federal constava em seu artigo primeiro que essas instituições deveriam servir desinteressadamente à coletividade. Nessa época, surgiram os termos filantropia e mecenato para qualificar as ações filantrópicas oriundas da elite da sociedade e que perdurou até os anos sessenta.

Entre 1960 e 1970, a comunidade se viu bloqueada pela ditadura militar e começou a criar movimentos direcionados à defesa da democracia e combate à pobreza. Eram as organizações não governamentais, participando de movimentos e exercendo as práticas de cidadania e de solidariedade.

 Entre o período de 1970 e 1990, as organizações não governamentais experimentaram um elevado crescimento, em vista dos problemas sócioeconômicos que o país estava passando naquela ocasião, principalmente pelo “enxugamento” das fontes de recursos internacionais que muito ajudaram o Brasil na prestação de serviços assistenciais. Destaca-se, também, a aprovação da nova Constituição em 1988 que mobilizou a sociedade e provocou melhorias substanciais na área trabalhista, na luta pela defesa dos direitos humanos, pela cidadania política e pelas demandas sociais da população. Esses fatores serviram de sustentáculo para aumentar a participação das organizações não governamentais no atendimento das necessidades prementes da população que cresciam e se tornavam cada vez mais complexas.

 A partir de 1990 até o fim do século XX, o terceiro setor se fortifica e para enfrentar as crescentes questões sociais, ambientais e culturais, o setor empresarial (segundo setor) se fez presente, criando suas fundações e institutos associados para fazer frente a essas demandas, através da criação de parcerias e estratégias de captação de recursos. Com a profissionalização, as experiências e os conhecimentos adquiridos pelas organizações não governamentais, o Estado passa a admitir e a aceitar seus méritos pela maneira como vinham se defrontando na resolução das questões sociais e começa a enxergá-las como parceiras e mediadoras de suas políticas.

Acontece que o Estado começa a ser visto como sem condições para atender com responsabilidade social a população carente, e o empresariado, notando a existência desse hiato, reuniu suas lideranças para fundar o GIFE (Grupo de Institutos, Fundações e Empresas), em 1995. Consubstanciado na mesma idéia, onze empresas se associam, em 1998, para dar existência ao Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social. Essas iniciativas demonstram a preocupação do setor privado em não só visar o lucro, mas também adotar condutas éticas voltadas para a realização de investimentos sociais privados, em benefício da sociedade. Com a intenção de voltar a atender mais eficientemente a área social, devido à erosão das políticas de proteção social, o Governo criou o Programa Comunidade Solidária que foi regulamentado, em 1998, através da Lei do Voluntariado.

No início do século XXI, exatamente em 2001, o “Ano Internacional do Voluntário” é instituído pela ONU (Organização das Nações Unidas). No Brasil, merecem destaques o 1o e 2o Fórum Social Mundial, reunindo pessoas para discutir melhorias na área social através do estímulo à realização de projetos auto-sustentáveis. Com a expansão das TICs e com o avanço da Internet nesta década, aliada à formação e ao fortalecimento das redes de trabalho criadas pelo terceiro setor, houve uma contribuição efetiva e, por que não dizer, bem intencionada para a melhoria da qualidade de vida e do bem estar da população carente até os dias de hoje (Franciosi, 2009).

Como pode ser observado, o terceiro setor vem, há algum tempo, buscando o seu espaço na sociedade, procurando estreitar, cada vez mais, o seu relacionamento com o primeiro e segundo setores. Em pauta, sempre está presente as questões sociais, as práticas tradicionais da caridade, da filantropia, da cidadania, da reciprocidade, da proteção ao patrimônio ecológico, da educação inclusiva e de campanhas educacionais. Sua constituição divide-se em três categorias que são as associações, as fundações e as organizações religiosas. São organizações não governamentais que procuram intervir organizadamente na sociedade, desenvolvendo ações em diferentes áreas. Destacam-se pelos seus atos de civismo, de cidadania, de mobilização social e pelo atendimento dos interesses das minorias, desenvolvendo projetos sociais de grande penetração nas comunidades de baixa renda, principalmente na área da inclusão digital (Faria, 2007; Associação..., 2009).

 

III. INCLUSÃO DIGITAL

  

A inclusão digital é uma preocupação de toda a sociedade, pois o acesso às TICs é uma maneira de promover a inserção de todos nessa nova linguagem, com a intenção de melhorar as suas condições de vida. Contudo, a disponibilidade de um computador com acesso à Internet e o simples conhecimento sobre o seu uso não é suficiente, porque está faltando uma condição básica para que uma pessoa esteja digitalmente incluída. Essa condição esbarra num ponto fundamental de limitação, ou seja, o que fazer com essas ferramentas. Sabe-se hoje que para combater a exclusão digital é imprescindível a realização de grandes investimentos em capacitação tecnológica e de pessoal, pois, no Brasil, cerca de 70% da população não tem acesso à Internet, segundo pesquisa realizada em 2007 pela ECA (Escola de Comunicações e Artes) da USP (Universidade de São Paulo) (USP, 2007).

Os programas de inclusão digital, principalmente na educação, são desenvolvidos pelo terceiro setor, com vistas ao preenchimento de uma lacuna deixada pelo Estado que carece de recursos e investe pouco, por exemplo, na educação, condição básica para o desenvolvimento humano. Sabe-se que a informática é de grande importância para a obtenção de conhecimentos e o fortalecimento das capacidades das pessoas e das redes comunitárias, passando pela educação infantil, pelo ensino de jovens e adultos, pelo ensino superior, pelo ensino profissionalizante, pelo ensino à distância e pelo ensino às pessoas com necessidades especiais.

Segundo Guilherme Lira (Educação..., 2006), Presidente da Sociedade Acessibilidade Brasil, menos de 20% da população brasileira mantinha computador em casa, conforme entrevista à TV Futura em outubro/2006. Concordando com (Da Costa, 2007), depreende-se daí que a maioria da população de menor poder aquisitivo não tem computador, freqüenta escola pública e, portanto, não participa de programas de inclusão digital, pois grande parte dessas escolas carece de infra-estrutura laboratorial para incluir seus alunos no mundo tecnológico. É do conhecimento de todos que a alfabetização digital em todos os níveis de ensino reza na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, desde 1996. Mas o que se vê hoje é o sucateamento das escolas públicas em todo o país, sendo que em muitas delas a energia elétrica não existe ou se encontra em situação precária, além de muitas salas de aula não oferecerem, também, as mínimas condições para a prática do ensino. Assim sendo, fica difícil implementar nas escolas públicas projetos de inclusão digital com toda a infra-estrutura laboratorial de acesso à Internet e pessoal capacitado para dar todo o suporte pedagógico, utilizando as ferramentas digitais.

Uma iniciativa que merece destaque e serve de exemplo para as Secretarias de Educação de outros Estados é o que fez a Secretaria de Educação de Pernambuco, promovendo parceria com uma associação francesa com a finalidade de levar a inclusão digital às crianças em idade de alfabetização, correspondendo-se com estudantes de outros países. Outro exemplo significativo é a parceria feita pela Secretaria de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior de Minas Gerais com a Empresa de Infovias para implementar o projeto de inclusão digital do estado, participando também empresas da iniciativa privada, como a FIC (First International Computer) do Brasil, objetivando levar o acesso à Internet a cinco mil escolas públicas em 150 cidades mineiras, a custo zero para o governo local (Cavalcante, 2009).

Destaca-se, também, como de grande relevância para reduzir a exclusão social e, concomitantemente, a inclusão digital, a implantação dos Centros Educacionais de Turno Integral patrocinados pelo Ministério da Educação com recursos do FUNDEB (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação) e com a contrapartida de municípios. São escolas que oferecem atividades curriculares e extracurriculares, como oficinas de apoio em áreas como informática, artes, música, dança, artesanato, artes cênicas, educação física e defesa do meio ambiente, etc. Como exemplo, entre outros já existentes no país, cita-se a Escola de Integração Zélia Barbosa Rocha da cidade de Arapiraca, Alagoas que atende cerca de 800 alunos da educação infantil até o último ano do ensino fundamental (Portal do MEC..., 2009) e o Centro Educacional de Turno Integral da cidade de São Borja, Rio Grande do Sul, com disponibilidade para 200 alunos até a 5ª série do ensino fundamental (Município..., fev./2010). Essas iniciativas demonstram, claramente, a importância do ensino em tempo integral com atividades extracurriculares, permitindo aos jovens uma oportunidade de melhorar seu desempenho escolar, condição básica para o exercício da cidadania.

Em termos de política educacional, foi realizada pelo MEC uma parceria com o MCT (Ministério da Ciência e Tecnologia), com a RELPE (Rede Latino-americana de Portais Educacionais) e com a OEI (Organização dos Estados Ibero-americanos) para criar o Banco Internacional de Objetos Educacionais. Trata-se de um repositório de conteúdos digitais, abrangendo a produção de conhecimento oriundo de diversos países e está integrado ao Portal do Professor, também do MEC. O propósito principal desse Portal visa manter e compartilhar recursos educacionais digitais de livre acesso cujos conteúdos são elaborados nos mais diferentes formatos, como áudio, vídeo, animação, simulação, software educacional, imagem, mapa, hipertexto, etc. A produção e disseminação de conteúdos, como esse, possuem um efeito multiplicador, uma vez que pode ajudar a disseminar valores e conhecimentos em diversos segmentos da sociedade, promovendo a inclusão digital e maior acessibilidade dos objetos educacionais (Relatório Elac..., 2010).

Inúmeras empresas promovem também a inclusão digital, através de parceria na elaboração de projetos, do incentivo à auto-sustentabilidade das comunidades, do empreendedorismo e de ações corporativas que favoreçam a inclusão digital na educação. Agindo dessa forma, com responsabilidade social, as empresas estão complementando ações de solidariedade às políticas públicas, auxiliando o desenvolvimento, a integração e o nível educacional das comunidades envolvidas. A responsabilidade social é um compromisso de todos e pode trazer como benefício resultados positivos, desde que seja executada de maneira consciente e com seriedade, proporcionando o desenvolvimento crescente de cidadania (Rothgiesser, 2004).

O terceiro setor vem encontrando formas e artifícios para desenvolver seus programas de inclusão digital, principalmente as organizações não governamentais que não medem esforços para estabelecer parcerias com diversas instituições no país inteiro, visando disponibilizar um ambiente de aprendizagem, de cidadania e de letramento a novos usuários da Internet. Para reduzir o índice de exclusão digital, faz-se necessária uma mobilização por parte das autoridades, priorizando a educação, mediante a adoção de um plano abrangente a nível nacional que se proponha a promover o acesso à rede, indiscriminadamente, atendendo crianças, jovens e adultos carentes (USP, 2007).

Um artifício muito bem planejado e colocado em prática para despertar o interesse da classe infanto-juvenil no desenvolvimento de suas potencialidades é o programa do Instituto Ayrton Senna que mantém uma parceria com a Microsoft para transformar as relações de ensino e aprendizagem nas escolas públicas de ensino fundamental, através da implementação do programa Sua Escola a 2000 por Hora. Em 2005 foram 66.300 crianças e jovens atendidos, 975 educadores envolvidos e 54 Municípios atingidos. A intenção é transformar as relações de ensino e aprendizagem nas escolas públicas, utilizando as TICs para melhorar e desenvolver o potencial dos alunos. A metodologia é muito difícil, pois induz a escola a revisar sua gestão, seus conceitos, seus métodos de ensino, seus conteúdos curriculares e, também, a maneira como professores e alunos definem e enxergam seus próprios papéis. O professor, por exemplo, deve agir como mediador pedagógico, como articulador, deixar os alunos terem o prazer das descobertas, compreensões e reconstruções de conhecimento. Sabe-se que teoria e prática não se separam e que a metodologia adotada deixa os alunos animados, permitindo ao professor acompanhar melhor todo o processo de aprendizagem e melhor conhecer sua turma, garantindo a consolidação da mudança de qualidade na educação (Cruz, 2004; (Microsoft..., 2008).

Desde 1999 a Fundação Vale vem desenvolvendo atividades de cidadania, promovendo a inclusão digital, mas em 2001 a Fundação fez parceria com CDI (Comitê para Democratização da Informática) no sentido de melhorar o atendimento às comunidades carentes, ampliando o impacto social de seus projetos. Com essa parceria, as Ilhas de Informática, ora em funcionamento, foram transformadas em EICs (Escolas de Informática e Cidadania), mudando substancialmente sua maneira de atuação, com a contratação de coordenadores e assistentes pedagógicos para fortalecer as Escolas recém criadas e melhorar a qualidade dos serviços prestados à comunidade. Dando continuidade à missão de melhorar o ensino nos locais em que atua, foi criada a Escola que Vale com a intenção de preparar os professores e os alunos da primeira à quinta série do Ensino Fundamental, oferecendo aprimoramento, atualização e planejamento pedagógico dos educadores e leitura, escrita, comunicação oral e acesso à Internet dos alunos. Seus projetos interdisciplinares têm ajudado, consideravelmente, crianças a aprimorarem a leitura, a escrita, trabalhar em equipe e a conhecer a história de sua região. Esse exemplo de cidadania tem provocado grandes transformações no ensino público, atuando com parcerias de instituições especializadas em programas educativos, beneficiando mais de 290 mil pessoas que participaram de seus programas, tais como professores, diretores, coordenadores pedagógicos, coordenadores locais, produtores locais e alunos (Cruz, 2004); (Fundação..., 2011).

O acesso às TICs, hoje em dia, é uma realidade como recurso facilitador e de grande uso em todas as áreas do conhecimento. Como solução para melhorar e aumentar o acesso da população aos telecentros, por exemplo, é necessária a realização de grandes investimentos na construção de novos telecentros e em programas livres e gratuitos. Todos os entes de uma sociedade são envolvidos pelas inovações que as TICs oferecem, como o Governo, as instituições públicas e privadas, as organizações não governamentais e os cidadãos. Para tanto, as parcerias são as melhores indicações para o governo incrementar e disseminar modelos de telecentros pelo território brasileiro. Os telecentros são espaços públicos de uso compartilhado e gratuito, dedicados ao desenvolvimento pessoal e comunitário e operados unicamente pelo governo, através de parcerias com instituições do segundo e do terceiro setor. Os telecentros devem ter acesso livre e universal, contribuindo assim para a melhoria da qualidade de vida das pessoas, facilitando o acesso a programas sociais e promovendo a educação e a inclusão digital (USP, 2007).

 

IV. CONCLUSÃO

 

O ponto crucial para se ter uma sociedade justa e participativa é a adoção de políticas públicas onde esteja presente a educação e a inclusão digital como fonte do conhecimento. Disponibilizar novas forças de produção para que estejam ao alcance de todos os usuários potenciais, pode ser uma alternativa para reduzir as desigualdades sociais que insistem em se manter acesas na sociedade brasileira (Silva, 2005).

A melhoria da qualidade do ensino e da aprendizagem, o convívio escolar e a oportunidade de aprender são condições essenciais para que os municípios brasileiros implementem escolas públicas de turno integral, aproveitando-se dos recursos oriundos do FUNDEB. As atividades curriculares e extracurriculares proporcionam mudanças qualitativas no cenário educacional, oferecendo oportunidades diferenciadas aos estudantes que dispõem de alimentação, higiene, desenvolvimento de habilidades e competências, preparando-os para o futuro em uma escola de qualidade. Nota-se que o Governo tem procurado lançar programas de inclusão social e digital através de seus ministérios e suas secretarias, mas o impacto dessas iniciativas não sofre uma solução de continuidade e, pelo que se observa, muitos programas perdem força e não alcançam os objetivos desejados. Enquanto isso, o terceiro setor vem procurando preencher essa lacuna mediante a adoção de iniciativas voluntárias, a fim de proporcionar às pessoas carentes a inclusão social e, também, a inclusão digital com o desenvolvimento de projetos específicos e de grande relevância. Mas para implementar projetos de inclusão digital, deve-se levar em conta os custos do software, direitos autorais, responsabilidade social e sustentabilidade (Franciosi, 2009).

As parcerias que o terceiro setor vem procurando fazer com órgãos internacionais, com as instituições empresariais brasileiras e com diferentes órgãos do Governo são insuficientes para atender programas de inclusão digital, dirigido à população carente. As novas e eficientes TICs deram um salto de dimensões gigantescas e para se ter um acesso livre e democrático a esses ambientes e que propicie a inclusão informacional, social, digital, educacional e profissional, o Estado precisa tomar parte dessa iniciativa de maneira concreta, criativa e de muita inovação. Para se ter uma idéia, iniciativas sociais como o Programa Bolsa Família que o Governo vem implementando, atualmente, não gera renda, não gera emprego, não resolve os problemas sociais das minorias, não melhora o sistema educacional e mantém as pessoas distantes das tecnologias emergentes, sem possibilidades de participar, produtivamente, da economia globalizada (Ramos, 1995).

A aplicação de grandes investimentos em educação e a modificação dos modelos atuais de ensino em todos os níveis e domínios pode reverter o problema da exclusão digital. Como exemplo, cita-se o modelo Finlandês que obteve sucesso na inclusão digital da sua sociedade, melhorando a qualidade de seu sistema educativo (Castells, 2005). Cita-se, também, os Estados Unidos cuja população faz parte de um sistema de gestão do conhecimento onde a educação é baseada no modelo de aprender a aprender ao longo da vida, tendo como objetivo aplicar esta capacidade de aprendizagem a todos os domínios da vida social e profissional (Castells, 2005). Com a incorporação das TICs ao processo educativo, pode-se concretamente oportunizar e implementar um novo paradigma pedagógico, com potencial para produzir novas e ricas situações de aprendizagem (Castells, 2005; Ramos, 1995).

Assim sendo, uma reforma estrutural precisa ser feita nas escolas em termos de gestão, de novos conceitos, de métodos de ensino e de conteúdos curriculares, a fim de preparar seus professores, como também a comunidade escolar e os próprios administradores para enfrentar os novos desafios proporcionados pelas tecnologias emergentes. Por exemplo, para implementar projetos de inclusão digital na educação, é necessário elaborar políticas e propostas pedagógicas que facilitem a construção do conhecimento, a compreensão e o desenvolvimento das habilidades necessárias para atuar na sociedade do conhecimento. A preparação do professor, portanto, é fundamental para que a educação dê um salto de qualidade e deixe de ser baseada na transmissão da informação. Ele precisa aprender como usar o computador como ferramenta, a integrar o computador nas atividades curriculares e ter o suporte de uma equipe capacitada e bem treinada para dar o apoio necessário e efetivo nesse novo papel (Valente, 1999a).

Em suma, a responsabilidade social não é só das empresas e de outras organizações privadas que trabalham com a transparência em seus negócios. O Governo, indubitavelmente, tem que ter essa responsabilidade encravada em suas iniciativas de inclusão digital e partir para a disseminação do uso do computador em todo o território nacional, privilegiando as escolas públicas, o incentivo do ensino à distância, a instalação de telecentros públicos, além do barateamento dos equipamentos e ferramentas, como computador, software livre, banda larga, que possibilitem a inclusão digital (Carvalho, 2009). Portanto, torna-se de fundamental importância a melhoria do sistema educacional público brasileiro, através da transformação, ou construção de escolas dignas de serem frequentadas, como o caso da escola de turno integral. Elas precisam estar equipadas com salas de aula e bibliotecas informatizadas e conectadas à rede, com laboratórios próprios e toda a infra-estrutura necessária ao bom desempenho do estudante. Neste contexto, não se pode esquecer a importância do envolvimento dos professores nos projetos de inclusão digital, enriquecendo o ensino através da prática da interdisciplinariedade. A capacitação de professores interessados em educar e orientar seus alunos na realização de pesquisas, na interpretação de textos, na aprendizagem colaborativa, na construção do conhecimento através da discussão e da reflexão é um dos fatores que pode fazer a diferença, como mecanismo para aprofundar o conhecimento dos estudantes e promover o exercício da cidadania. (Jul/2011)

 

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