TAMBOR DE CRIOULA[1]

preservação cultural

 

 

 

Kezia Letícia da Silva Veloso[2]

Leonardo Victor Paixão Mesquita

 

 

Sumário: Introdução; 1.Herança afro-descendente; 2. Tambor de crioula como bem cultural; 3. Proteção do tambor de crioula; 4. Organismos de proteção; Conclusão; Referencias bibliográficas.

 

 

 

RESUMO

 

A constituição de 1988 assegura o patrimônio cultural, este que pode ser material ou imaterial, assim o tambor de crioula se insere como bem imaterial, pois diz respeito à manifestação da cultura do povo afro descendente do Maranhão e tem seus bens reconhecidos pelo direito ambiental e tutelados pela carta maior.

 

 

PALAVRAS CHAVE

Patrimônio cultural. Tutela constitucional. Tambor de crioula. Bem ambiental imaterial.

 

 

Introdução

 

No processo de modernização da sociedade maranhense surgiu a proteção dos bens produzidos pelas comunidades culturais que ao longo do tempo foram ganhando singularidade.

Com o avanço da modernidade foi levado em consideração à necessidade de proteção das formas de expressão e como as pessoas se manifestavam nos lugares, assim ocorreu um impulso para a proteção dos bens de natureza cultural imaterial.

Essa tutela se deu devido à importância da continuidade dessas manifestações culturais e é por esse motivo que a constituição federal de 1988 dá proteção a esses bens.

No estado do Maranhão existem várias formas de expressão, de culturas distintas, dentre elas está o tambor de crioula e neste paper será relatado o tambor de crioula como bem ambiental de natureza imaterial e protegido pela carta maior.

  1. 1.                  Herança afro-descendente

 

O tambor de crioula é uma manifestação cultural afro-descendente que vem sendo desenvolvida desde os tempos da escravidão, como coloca Joan Botelho, “é uma das mais tradicionais danças do Maranhão, introduzida no estado por escravos africanos e praticada por seus descendentes” [3].

A continuação desse tipo de manifestação assegura a perpetuação da memória, considerando que há importância na difusão e reconhecimento da cultura de um determinado povo, levando em consideração a forma com que é, e sempre foi feito os rituais dessa dança que homenageia o padroeiro dos negros, São Benedito.     

A preocupação na proteção dessas manifestações vem de longa data, já que em 1936 foi criada a política de preservação do patrimônio cultural, já em 1958 houve a criação da campanha de defesa do folclore brasileiro e isso é uma forma de reconhecer a importância da preservação da cultura que um determinado povo deixou.

É de se perceber que isso é herança de cultura, então como José Afonso da Silva sustenta, “a constituição estatui que o Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais[...]incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais, destacadamente as populares, indígenas e afro-brasileiras”.[4]   

Então a constituição protege os bens seja ele de natureza material ou imaterial que é o caso do tambor de crioula desde que sirva como referência a identidade de um povo.

 

  1. 2.                  Tambor de crioula como bem cultural

 

O meio ambiente em sentido amplo diz respeito ao lugar onde vivemos, assim é confirmado por José Afonso da Silva quando ele afirma que "o ambiente integra-se, realmente de um conjunto de elementos naturais e culturais, cuja interação constitui e condiciona o meio em que se vive.” [5]

Levando-se em consideração o meio ambiente cultural do Maranhão é possível destacar a manifestação afro-descendente como citada, tambor de crioula, este indicativo anteriormente mencionado faz parte do desenvolvimento cultural e vem sendo passado de geração a geração servindo de continuidade histórica[6] que Machado acredita ser importante para ser registrado como bem imaterial e também como fator relevante para identidade da cultura maranhense.

Cláudia Macedo Vasques, técnica do IPHAN coloca que,

[...] o tambor de crioula no conjunto das expressões culturais identificadas no sítio inventariado de São Luis teve como intenção, além de salvaguarda de uma manifestação popularmente emblemática da região, dar continuidade ao estudo e valorização das tradições culturais de matriz afro- brasileiras do país[7].

 

Outro aspecto que faz considerar o tambor de crioula como bem imaterial é o tempo que este já vem sendo manifestado, o tambor no caso é herança do tempo da escravidão, como Machado menciona, “dez anos seria um prazo mínimo, uma década estria revelando a infância de um saber, de uma celebração, de uma forma de expressão e de um lugar” [8]

Assim o tambor de crioula sendo manifestação da identidade de um povo, é considerado bem ambiental e conseqüentemente patrimônio, pois não vale apenas o que tradicionalmente se tem como noção de patrimônio, sendo algo que está ligado diretamente ao âmbito do material, como as construções arquitetônicas não são necessariamente dessa forma, pois como coloca Gasparini, “patrimônio é a demonstração de uma cultura. São obras de um povo, físicas ou não, que revelam sua história e que na verdade representam-no”[9] 

 

  1. 3.                  Proteção do tambor de crioula

 

Os bens ambientais são tutelados pela lei fundamental e suprema do Estado brasileiro, o objeto dessa tutela é a proteção dos meios de se ter qualidade de vida que venha a sofrer riscos de impacto.

Então o tambor de crioula sendo patrimônio cultural maranhense, pois foi reconhecido como tendo um valor excepcional e singular, merece tutela como destaca Maria Cecília Fonseca:

A constituição de patrimônios históricos e artísticos é uma prática característica dos Estados modernos que através de determinados agentes, e como base em instrumentos jurídicos específicos, delimitam um conjunto de bens no espaço público. Pelo valor que lhes é atribuído, enquanto manifestações culturais e enquanto símbolos de nação, esses bens passam a ser merecedores de proteção, visando a sua transmissão para gerações futuras.[10]

A tutela do tambor de crioula esta conferida na carta constitucional, no artigo 215.

ART. 215 – O estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso as fontes de cultura nacional, e apoiará a valorização e a difusão das manifestações culturais.[11]

 

Conseqüentemente Marchesan coloca que,

O artigo 216 da constituição federal de 1988 conferiu ao patrimônio cultural o tratamento que lhe era devido, assegurando proteção legal abrangente de bens de natureza material e imaterial tomados individualmente, ou em conjunto, portadores de referencia a identidade, a ação, a memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira.[12]    

 

Há também incentivo além da proteção, pois o poder executivo deve dar impulso para os movimentos culturais, assim Ramassote coloca que:

 

Na relação com os grupos de cultura popular, em geral, e com o tambor de crioula, em particular os órgãos do executivo municipal e estadual responsáveis em incentivar e apoiar esses grupos tem investido em estruturas físicas, administrativas e financeiras como a construção de “viva”, que passaram a compor o circuito oficial de festas [...] As instituições estatais responsáveis por “salvaguardar”, “cuidar” e, em alguns casos “recriar” a cultura popular maranhense tendo divulgada as tradições, cultos, festas e outras formas  de expressão a partir da administração de recursos [...] estes dos órgãos oficiais e muitas vezes, submetendo-se a agentes políticos como vereadores, deputados e senadores com alguma influencia junto aos gestores da cultura local.[13]

 

Os “viva”, anteriormente mencionado, diz respeito ao plano de reavivar e dar preservação, pois busca junto com o estado, que naquele lugar ocorra as manifestações do tambor, garantindo que esta não venha a ser deixada a mercê do esquecimento e ainda buscando uma forma de proteção pelo fortalecimento da tradição sem mudança de detalhes na forma ou jeito de se manifestar.

  1. 4.                  Organismos de proteção

 

O Brasil tem uma organização que depende da União, dos Estados, do Distrito Federal, e dos Municípios, isso se dá pelo fato de ser uma República Federativa, então quando for levar em consideração a repartição de competência em matéria ambiental, há autonomia de algumas esferas.

No que diz respeito à matéria ambiental a constituição federal estabelece competências[14], que podem ser legislativas, executivas e administrativas, nessas é dado respectivamente o poder de legislar sobre a matéria ambiental, executar diretrizes e estratégias e finalmente é dado o poder de polícia com objetivo de proteger o meio ambiente.

Então para manter viva as tradições, herança coletiva de um povo, é importante que essas esferas de poder atuem para que as gerações vindouras possam desfrutar. Portanto, preservar seria buscar de alguma forma que esses bens pudessem permanecer entre nós, destarte Bogéa e Brito colocam que, “a preservação do patrimônio significa a manutenção da identidade adquirida com o passado, a vivência e a construção do presente, que somados vem contribuir os valores a serem preservados no futuro.” [15]

O tambor de crioula sendo uma herança cultural é possuidor de preservação, dentre elas há o inventário, o registro nas leis do planejamento urbano e o tombamento, mas como o tambor é bem imaterial é aplicável o inventário e o registro.

O inventário, uma das formas de preservação do tambor de crioula, se da dá pelo reconhecimento daquela manifestação, após esse reconhecimento, o poder público atua direcionando as leis, plano diretor e outros em prol desse bem, sendo que posteriormente é possível o registro.   

Depois de reconhecido o tambor de crioula, fica nas mãos dos gestores públicos atuarem como fiscalizadores, protegendo e preservando, como é o caso do instituto do patrimônio histórico e artístico nacional (IPHAN) que é o gestor de competência federal, assim como na esfera estadual o departamento de patrimônio histórico, artístico e paisagístico do estado do Maranhão (DPHAP/MA), e finalmente na esfera municipal, a fundação municipal de patrimônio histórico (FUMPH). 

 

CONCLUSÃO

 

Ao longo da história do Maranhão, ocorreram algumas manifestações culturais, algumas delas sobreviveram com o tempo, pois representavam fortemente a cultura de um determinado grupo, assim o tambor de crioula vem sendo fortemente desenvolvido até os dias de hoje.

Por este motivo, ele foi registrado como patrimônio cultural maranhense e por isso é considerado bem ambiental de natureza imaterial, no qual o estado exerce papel de protetor, seja como preservador ou até mesmo exercendo seu poder de polícia se for necessário.

É dado esse poder ao Estado pelo fato da constituição federal proteger as manifestações em alguns de seus artigos, permitindo também que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios atuem de forma executiva, legislativa e administrativa em prol se salvaguardar esse bem.

Por esse motivo foram criados alguns institutos como o IPHAN, que atua no âmbito federal e outros que apenas visam à proteção e difusão do tambor de crioula, assim, foram realizados projetos como os “viva”, que servem como difusão da cultura, pois é um meio de apresentação ao público.

O que importa na proteção de toda essa manifestação e difusão é que ela seja passada para uma geração futura podendo esta conhecer um pouco do que já foi vivido, reconhecendo assim, a importância da preservação do que é dado como patrimônio cultural material ou imaterial e que expressam toda uma riqueza de costumes, tradições e cultura de um povo.

 

 

 

 

 

 

 

 

                                                   REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

BOTELHO, Joan. Conhecendo e debatendo a história do Maranhão. São Luis: Fortcom gráfica e editora. 2008.

 

Cláudia Macedo Vasques. Registro do tambor de crioula no Maranhão. Disponível em: < http://www.google.com.br/search?hl=ptBR&q=Cl%C3%A1udia+Macedo+Vasques%2C+t%C3%A9cnica+do+IPHAN+&btnG=Pesquisa+Google&meta=&rlz=1R2RNWN_pt-BR&aq=f&oq =>. Acesso em: 18 de maio de 2009.

 

FONSECA, Maria Cecília Londres. Patrimônio em processo: trajetória da política federal de preservação no Brasil. Rio de janeiro: UFRJ/IPHAN, 1997.

 

GASPARINI, Audrey. Tombamento e direito de construir/ Belo Horizonte: Fórum, 2005.

 

MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 14. Ed. rev. Atual. Ampl. São Paulo: Malheiros, 2006.

 

MARCHESAN. Ana Maria Moreira; STEIGLEDER, Amelise Monteiro; CAPELLI, Silvia. Direito ambiental. 4ª ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2007.

 

RAMASSOTE, Rodrigo Martins, et al. Tambores da ilha. Textos- São Luis: IPHAN, 2006.

 

SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 21ª edição. São Paulo: Malheiros, 2002.

 

_____________________. Direito ambiental constitucional. 5ª edição. rev. atual. São Paulo: Malheiros, 2004.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



[1] Paper interdisciplinar elaborado para as disciplinas de direito ambiental e direito constitucional II, para obtenção de 2ª nota.

[2] Alunos do 4ª período do curso de direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco.

[3] BOTELHO, 2008, p. 262.

[4] SILVA, 2002, p. 817.

[5] Id. 2004, P.20.

[6] MACHADO, 2006, p. 928.

[7]Cláudia Macedo Vasques. Registro do tambor de crioula no Maranhão.

[8] MACHADO, loc.cit.

[9] GASPARINI, 2005, p. 41.

[10] FONSECA, 1997, p. 11.

[11] Constituição federal de 1988.

[12] MERCHESAN, 2007.p.93.

[13] RAMASSOTE, 2006, p.117.

[14] Poder de realizar funções.

[15] BOGÉA; BRITO, 2007, p. 31.