1.            INTRODUÇÃO 

A hipercolesterolemia induz interações fisiopatológicas nas paredes das artérias, culminando agravamento da aterosclerose devido à liberação de componentes inflamatórios. Existem evidências de que a redução da LDL (lipoproteína de baixa densidade) e o aumento da HDL (lipoproteína de alta densidade) possibilitam a melhora dos processos inflamatórios contribuindo para a redução da incidência de problemas cardiovasculares. A LDL ativa a cascata inflamatória, o HDL neutraliza endotoxinas e lipolissacaridases, que reduzem a ação do fator de necrose tumoral, inibem a ativação de complemento e minimizam a indução de citocinas.

A aterotrombose é considerada a principal causa de morte na população mundial (52%), superando o câncer (24%) e doenças infecciosas (19%).

Inúmeros estudos têm sido realizados a fim de identificar maneiras de prevení-la. Pesquisadores verificaram que os fitoesteróis presentes nos vegetais tem capacidade de diminuir os nível de colesterol HDL e colesterol total sérico, o que reduziria os riscos de aterosclerose.

A elevada mortalidade associada às doenças cardiovasculares e o papel das dislipidemias nestas patologias, justifica a recomendação do uso de fitoesteróis na sua prevenção.

2.            FITOESTERÓIS

Os fitoesteróis são constituintes das membranas celulares das plantas, sendo responsáveis pela permeabilidade da célula, podendo ser biologicamente comparável ao colesterol nas células animais. Suas estruturas químicas são muito semelhantes. Eles encontram-se naturalmente presentes em nozes, óleos vegetais, feijão, cereais integrais, verduras e legumes. Apresentam-se sob a forma de pó branco, de odor doce, sendo solúveis em álcool e insolúveis em água.

(Molécula de Colesterol)                   (Molécula de Fitoesterol) 

Os fitoesteróis têm sido utilizados como suplemento alimentar, além de ser empregado na medicina e também utilizado na cosmética. Estudos demonstram que o consumo diário de 2 g de fitoesteróis reduza o colesterol e o LDL colesterol em aproximadamente 10%.

Alguns alimentos são muito ricos em fitoesteróis, porém, sua ingestão dentro das recomendações diárias contribui muito pouco para a diminuição do colesterol. Neste caso, a suplementação de tais compostos ajudaria na obtenção de melhores resultados. 

2.1 Adição de fitoesteróis a alimentos

Através da adição de doses farmacológicas de fitoesteróis a alimentos é possível aumentar sua disponibilidade na alimentação ocidental, pobre em alimentos vegetais. Os fitoesteróis são insolúveis em gordura e em água e tendem a formar cristais estáveis. Só foi possível adicioná-los a alimentos a partir da esterificação com ácidos graxos, tornando-os lipossolúveis. Por este motivo, foram primeiramente adicionados a margarinas e posteriormente, a alimentos pouco gordurosos graças à emulsificação com lecitina.

Em muitos estudos onde os fitoesteróis foram adicionados a bebidas com baixo teor de gordura, constatou-se uma diminuição do Colesterol LDL de 8,1% a 60%. A adição de fitoesteróis a leite desnatado mostrou-se três vezes mais efetiva do que sua adição a pão e outros tipos de cereais. Verificou-se que quando adicionados a formulações sem gordura, inibem de forma significativa a integração micelar e a bioacessibilidade do colesterol nas células do intestino.

2.2 Tabela de Conteúdo de fitoesteróis em alimentos. 

Fonte: Revista Fatores de Risco, nº 8 Jan-Mar 2008, Pag 53

3.            LIPOPROTEÍNAS PLASMÁTICAS (COLESTEROL)

As Iipoproteínas são responsáveis pelo transporte de lipídeos na linfa e no plasma, sendo compostas no seu interior por colesterol éster e triglicérides e na sua superfície e por apolipoproteínas, colesterol livre e fosfolípideos.

Essas lipoproteínas podem ser classificadas de acordo com o tamanho das partículas, ou em função de sua migração eletroforética, ou ainda através de sua densidade, em quilomícrons (QM), lipoproteínas de muito baixa densidade (VLDL), lipoproteínas de baixa densidade LDL e lipoproteínas de alta densidade (HDL)

Os quilomícrons são sintetizados pelas células intestinais (macrófagos) e são responsáveis pelo transporte dos lipídeos da Iinfa para a circulação sanguínea. As VLDL são secretadas pelo fígado, e responsáveis pelo transporte dos triglicérides  de origem endógena. Os triglicérides, tanto dos quilomicrons quanto das VLDL, são hidrolisados pela lipoproteína Iipase. Durante este processo são liberados ácidos graxos que serão armazenados no tecido adiposo e posteriormente utilizados nos tecido para produção de energia e glicerol que retorna ao fígado.

As LDL são responsáveis pelo transporte da maior parte do colesterol da circulação, e inúmeros estudos epidemiológicos demonstram grande relação entre sua concentração plasmática e doença coronariana.

As HDL participam do transporte reverso de colesterol, processo responsável pela retirada de colesterol das paredes arteriais, direcionando-o ao fígado. Também atuam na diminuição da proliferação de células musculares lisas e a oxidação das LDL, assim como a transformação de macrófagos em células espumosas na parede das artérias.

 As HDL também apresentam funções anti-inflamatórias, como a inibição de moléculas de adesão à monócitos (VCAM-1), molécula 1 de adesão intercelular (ICAM-1) e E-selectina, bem como modulam expressão de fator de necrose tumoral-alfa (T NF-α ) e Interleucinas (IL) e de seus respectivos receptores.

4.            FITOESTERÓIS E A REDUÇÃO DO COLESTEROL SÉRICO

No decorrer dos últimos cinquenta anos, inúmeras pesquisas foram realizadas e já foi provada a relação entre a redução do Colesterol Total e do Colesterol LDL e a ingestão dos fitoesteróis.

O efeito destes compostos é muito superior ao da fibra dietética. Como já vimos, o consumo de fitoesteróis em sua forma natural é muito limitado, sendo que sua ingestão média na dieta ocidental situa-se entre 200 e 400 mg/dia. Mesmo assim, verificou-se que essa ingestão diária se correlacionou com uma menor absorção de Colesterol e que um consumo adicional de 200 mg/dia levaria a uma diminuição de 3% do Colesterol Total.

O efeito de alimentos enriquecidos com fitoesteróis tem sido amplamente estudado e comparado ao efeito de dietas onde não ocorre a adição dos mesmos.

Segundo análise, a ingestão de 2 g de fitoesteróis por dia, adicionados a alimentos, resulta em uma redução média de 10 a 15% do Colesterol LDL, sem produzir efeito no Colesterol HDL ou nos triacilgliceróis. Se um indivíduo complementar 2 g/dia de fitoesteróis à uma dieta hipocolesterolêmica, a diminuição no Colesterol LDL é de 30%, o que reduziria o risco de doenças cardiovasculares em 25%. A suplementação com fitoesteróis se faz necessária, pois seria muito difícil ingerir 2 g/dia destes compostos apenas com alimentação comum.

4.1 Ações dos fitoesteróis

 

A absorção do colesterol pode ser influenciada pelos fitoesteróis. Os fitoesteróis apresentam uma dupla ligação na posição 5 e são classificados em esteróis e estanóis. Este último é produzido artificialmente por hidrogenação do esterol. Os fitoesteróis são mais hidrofóbicos e possuem grande afinidade físico-química pela micela (estrutura globular formada por um agregado de moléculas polares e apolares simultaneamente) quando comparado ao colesterol, favorecendo a maior permanência em seu interior. Por isso, deslocam colesterol para fora da micela, aumentando a sua excreção nas fezes (Figura 1).

4.2 Estrutura da micela e o mecanismo de competição entre colesterol e fitoesterol no interior dessa estrutura. 

              Figura 1

A)   Maior ingestão de fitoesterol

B)           Mecanismo de competição no interior da micela, o fitoesterol possui maior afinidade físico-química pela estrutura, dificultando a solubilização e incorporação do colesterol no interior da micela.

C)   Maior excreção fecal de colesterol.

Esta ação parece ser independente da quantidade de colesterol ingerida, conforme demonstrado em pacientes hipercolesterolêmicos (Kassis et al., 2008).

Os mecanismos de ação do fitoesterol na redução do colesterol plasmático ainda não foram totalmente elucidados. Possíveis ações moleculares do fitoesterol no interior do enterócito e do epatócito estão sendo sugeridas (Moghadasian e Frohlich, 1999; Calpe-Berdiel et al, 2009). Alguns estudos mostraram que a suplementação de fitoesterol alterou RNAm para HMGCo redutase e receptores de LDL in vitro e vivo, respectivamente (Field et al, 1997; Plat e Mensink, 2002a), sugerindo outras ações do fitoesterol independentes do mecanismo de competição com o colesterol. Além disso, os fitoesteróis parecem também aumentar a expressão do RNAm dos receptores de LDL em monócitos e linfócitos T em humanos (Plat e Mensink, 2002a).

Após serem captados pelo transportador NPC1L1 no enterócito, os fitoesteróis, assim como o colesterol, retomam rapidamente ao lúmen por intermédio das proteínas transportadoras ABCG5 e ABCG8. Uma ínfima parte pode ser esterificada pela ACAT2 e transportada posteriormente por Iipoproteínas e excretada pela bile (von Bergmann et al., 2005)

4.3 Formas de atuação dos fitoesteróis na redução do colesterol

No lúmen intestinal, os fitoesteróis e o colesterol são incorporados nas micelas e entram nos enterócitos pela bordadura em escova, através do transportador NPC1L1.  Aí o colesterol é esterificado pela acil CoA: colesterol aciltransferase (ACAT) e incorporado nos quilomicrons que são secretados para a linfa.

Isto ocorre à uma pequena parte dos fitoesteróis, pois têm pouca afinidade para o colesterol aciltranferase, ou seja, enquanto o colesterol é absorvido, os fitoesteróis praticamente não são. Apenas 0,5 a 1,9% dos esteróis ingeridos são absorvidos, sendo este valor para os estanóis de cerca de 0,04%. Uma vez no enterócito uma pequena parte do colesterol e a grande parte dos esteróis são excretados de novo para o lúmen através dos transportadores ABCG5 e ABCG8. Estes também estão expressos no fígado, motivo pelo qual a pequena porção de esteróis absorvida é mais rapidamente excretada para a bile que o colesterol, o que impede o seu acúmulo no organismo.

4.4 Diminuição da incorporação de colesterol na micelas a nível intestinal 

Os fitoesteróis vão competir, a nível intestinal, com o colesterol na formação das micelas, o que leva a uma redução da solubilidade deste. Isto porque, sendo mais hidrofóbicos que o colesterol, têm maior afinidade para as micelas. Assim o colesterol não entra no enterócito e é excretado. Também o colesterol endógeno contido nos sais biliares é afetado.

4.5 Aumento da expressão dos transportadores ABCG5 e ABCG8 

Os transportadores ABCG5 e ABCG8 influenciam a concentração sérica de esteróis e suas variações fenotípicas determinam a sensibilidade individual aos fitoesteróis. Os fitoesteróis induzem um aumento da sua expressão nas membranas do enterócito e do hepatócito, provavelmente por ativação do receptor X do fígado (LXR). Dessa forma, após o colesterol entrar no enterócito, a maior parte vai ser novamente transportada para o lúmen intestinal, diminuindo assim a quantidade absorvida.

4.6 Aumento da expressão do receptor LDL

 

Observou-se que o aumento da ingestão de fitoesteróis provocou um aumento do mRNA do receptor LDL e a sua expressão nas membranas celulares, o que leva a uma maior captação de LDL circulante e também a uma diminuição das IDL, e, assim sendo, a uma diminuição da síntese do colesterol LDL, provocando uma diminuição do colesterol LDL e  colesterol total.

4.7 Co-cristalização com colesterol 

Os fitoesteróis hidrolisados formam cristais mistos insolúveis com o colesterol, o que impede a absorção do mesmo.

4.8 Relação com estatinas

A ingestão de uma dieta enriquecida em fitoesteróis pelos doentes tratados com estatinas (droga farmacológica) vai potencializar o efeito hipocolesterolemiante destes fármacos.

4.9 Segurança

Recomenda-se a ingestão de no máximo 3 g/dia de fitoesteróis acompanhados de uma dieta rica em hortaliças. Desde que ingerida na quantidade indicada, até o momento não foram descritos efeitos colaterais e não há qualquer evidência de que a suplementação com fitoesteróis possa aumentar o risco de aterosclerose ou de diminuir a absorção de vitaminas lipossolúveis 

5. ESTUDO DE CASO

Foram selecionados 38 pacientes do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e os mesmos foram orientados a manter os mesmos hábitos alimentares e atividade física.

Receberam 400 mL/dia de leite de soja padrão (placebo) ou enriquecido com fitoesteróis (1,6 g/dia) por dois períodos de quatro semanas em que o estudo foi randomizado, cego e cruzado.

Resultados: O peso corporal foi mantido durante o estudo. O tratamento com fitoesterol reduziu o colesterol total em 5,5 %, a Iipoproteína de baixa densidade (LDL) em 6,4 % e os triglicérides em 8,3 %  e aumentaram as concentrações de campesterol e sitosterol no plasma em 18,9% e 21 ,6%, respectivamente. Não houve alteração nos valores de Iipoproteína de alta densidade (HDL). Com relação aos biomarcadores de aterosclerose, os fitoesteróis provocaram redução apenas na endotelina-1 em 11 %.

CONCLUSÃO 

Os mecanismos através dos quais os fitoesteróis levam a uma diminuição do colesterol não estão totalmente esclarecidos, porque o próprio mecanismo de absorção do colesterol não o está. As principais formas identificadas até o presente momento estão relacionadas com a competição pela integração nas micelas e um aumento da expressão dos transportadores ABCG5 e ABCG8, em nível intestinal, e dos receptores LDL, em nível celular. Os fitoesteróis mostraram-se eficientes na redução dos triglicérides, LDL Colesterol e do Colesterol Total Sérico.

Podemos concluir que alimentos funcionais enriquecidos com fitoesteróis poderão auxiliar de maneira significativa no tratamento das hipercolesterolemias.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Revista Factores de Risco - ISSN 1646-4834, Nº 8, ano 3 (Jan-Mar 2008), p 52-58 

Krause, alimentos, nutrição e dietoterapia/ L. Kathleen Mahan, Sylvia Escott Stump; (tradução Natália Rodrigues Pereira...et al.) – Rio de Janeiro: Elsevier,2010 

Abdalla, DSP. Nutrição – Fundamentos e Aspectos atuais. 2 Edição. Ed Atheneu, 2006 

Disp. em: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/5/5135/tde-12032010-154714/pt-br.php

Acesso em 27/04/2012

Disp. em: http://biblio.estesl.ipl.pt/cgi-bin/koha/opac-ISBDdetail.pl?biblionumber=8735

Disp. em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0066-782X2002001100005&lang=pt

Acesso em 27/04/2012

Disp. em: http://repositorio.bce.unb.br/handle/10482/5807

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Disp. em: http://www.moreirajr.com.br/revistas.asp?id_materia=1386&fase=imprime

Acesso em 27/04/2012