CENTRO ENSINO SUPERIOR DO AMAPÁ –CEAP

Danúbia Vilhena de Souza

Caroline Góes

Fabyola Farias

Tami Martins

Bianca Façanha

"LEIA ESSE ARTIGO!"

SUBLIMINAR, SOCIEDADE, SIGNOS, E DISCRIMINAÇÃO

Macapá/Ap

2009

1- INTRODUÇÃO

Não exatamente como gotas de água, se bem que a água seja capaz de, lentamente, perfurar o mais duro granito, antes como gotas de lacre líquido, gotas que aderem, se incrustam, se incorporam a tudo em que caem, até que, finalmente, a rocha nada mais seja que uma única massa escarlate. Até que o espírito da criança seja essas coisas sugeridas e que a soma dessas coisas sugeridas seja o espírito da criança. E não apenas o espírito da criança, mas igualmente o espírito do adulto, e para toda a vida. O espírito que julga, deseja e decide, constituído por essas coisas sugeridas. Mas todas essas coisas sugeridas são aquelas que nós sugerimos, nós! (HUXLEY, 1996, p. 26)

Esse trecho do livro Admirável Mundo Novo de Adous Huxley, constitui um discurso exaltado de um dos personagens da história, referindo-se aos resultados tangentes da hipnopedia, descrito pelo mesmo indivíduo como a maior força moralizadora e socializadora de todos os tempos.

Enquanto dormem os indivíduos são submetidos a lições que constituem a base da sociedade montada por Huxley (1996, p.44) em seu livro futurista. Com base na teoria de indução através do subconsciente embasasse a cena. Um mundo dividido em castas, de regime totalitarista, configurado pelo conformismo e pela descrença de emoções sendo absolvido pelos indivíduos, aproximadamente cerca de sessenta e duas mil vezes para cada ensinamento, durante o sono. "Cada um pertence a todos os outros", cita um dos ensinamentos hipnopédicos, que remetem a unidade e a aversão ao individualismo.

Uma mentira contada mil vezes torna-se, então, verdade. Como cita o provérbio. A teoria incorporada à metodologia moralista exposta no livro de Huxley (1996) baseia-se na repetição e na indução subliminar. Huxley não foi um dos primeiros a referenciar-se à mensagem subliminar. Existem registros referentes a estudos antecessores até mesmo à palavra subliminar. Seu conceito em si foi divagado por diversos estudiosos como Aristóteles, Demócritos, Epicuro entre outros.

"Por definição, subliminares são as mensagens que nos são enviadas dissimuladamente, ocultas, abaixo dos limites de nossa percepção consciente (medidos pela ergonomia) e que vão influenciar nossas escolhas, atitudes, motivar a tomada de decisões posteriores." Cita Flávio Calazans (2009a) em seus estudos sobre mensagens subliminares.

Havia, no entanto, o descaso quanto ao tema até 1957. Ano em que James Vicary lançou experimentos que dariam forma ao termo subliminar e associariam o mesmo à mídia até os dias atuais. Valendo-se de sua crença no poder de indução ao subconsciente humano, Vicary divulgou um experimento famoso, que até hoje é utilizado como exemplo em referência à teoria subliminar. Vicary teria adicionado frames por frações de segundo a cenas de alguns filmes, com o auxílio de um aparelho chamado taquitóscopio. Essas cenas eram imperceptíveis ao consciente humano, porém seriam, segundo a teoria, absolvidas pela retina e levadas ao subconsciente onde seriam armazenadas fazendo da informação aderida influente na reação do receptor. As mensagens adicionadas foram Drink Coke (Beba Coca, traduzido) e Eat Popcorn (Coma pipoca, em português). Os estudos de Vicary revelaram que o consumo de ambos os produtos subiram consideravelmente nas seções em que foram exibidas as mensagens e é citado em palestras e estudos referentes às mensagens subliminares. Os dados até mesmo sustentam teorias acerca do tema.

Porém muitas das vezes o que falta na citação dessa experiência é a admissão, do próprio Vicary, de que ela foi baseada em uma pesquisa falsa. Em entrevista a mesma revista que publicou o estudo, em 1962, James Vicary admitiu estar sofrendo muita pressão dos investidores na época, e por isso teria forjado resultados para comprovar sua teoria sobre a mensagem subliminar.

Verdadeiras ou não, suas experiências inspiraram toda uma nova corrente de pensamentos, estudos e conspirações acerca da mensagem subliminar. Contestando sua capacidade de influência, persuasão, percepção e até mesmo sua existência.

O campo do subliminar já explorado por outras ciências, como a psicologia, foi então levado a público de diversas formas. Muitas das vezes sendo reconhecido como um recurso inapropriado por valer-se da absorção de informações inconscientemente, não dando aquele que as absorve a opção de resistir as mesmas. (CALAZANS, 2009c)

Nesse ponto é importante ressaltar duas vertentes do conceito de subliminar. A percepção subliminar e a persuasão subliminar. Sendo a primeira comprovada cientificamente. Enquanto que a segunda perpassa um campo incerto nos estudos referentes. A percepção subliminar é a capacidade do ser humano de captar de forma inconsciente informações e estímulos fracos demais para provocar uma resposta consciente. Ou seja, mensagens ignoradas por nossos sentidos conscientes, seriam absorvidas, interpretadas e armazenadas por nosso subconsciente.

Já a persuasão subliminar seria a capacidade que uma mensagem teria de influenciar o receptor. Segundo a hipótese, toda mensagem subliminar tem um determinado grau de persuasão, e pode vir a influenciar tanto as vontades de uma forma imediata (fazendo por exemplo, uma pessoa sentir vontade de beber ou comer algo), como até mesmo a personalidade ou gostos pessoais de alguém a longo prazo (mudando o seu comportamento, transformando uma pessoa tímida em extrovertida). Esse grau de persuasão deveria variar de acordo com o tempo de exposição à mensagem, e a personalidade do receptor.

Em Admirável Mundo Novo cita-se o exemplo de uma criança que após receber, durante o sono, informações acerca do Rio Nilo não sabia responder nada que se referisse ao mesmo, no entanto reproduziria com exatidão o conteúdo da mensagem. Informação absorvida, armazenada, porém não interpretada, revelando a ausência de seu significado, deixando apenas os signos, as palavras. O que no livro foi interpretado pelos personagens, que idealizavam uma sociedade a qual pudessem conter, como uma grande descoberta que foi, porém, explorada da maneira errada. Onde seus antecessores quiseram atribuir ensino intelectual aos receptores, os personagens atribuíram um ensino moral, que seria sustentado não só por esse estímulo auditivo-subconsciente, mas também por diversos outros métodos de associação, durante o crescimento dos indivíduos, até formarem o ser considerado perfeito, estável e saudável, cumprindo aquilo que lhe era designado sem questionamento. Feliz por ser quem era fazendo o que fizesse.

Muitas teorias conspiratórias acerca de mensagem subliminar são publicadas e divulgadas pela internet, algumas mistificando a teoria subliminar como demoníaca, manipuladora,

O que influencia muitas das vezes aquilo que é conhecido como pareidolia, também definida como validação subjetiva ou uma forma de auto-ilusão. Nesse caso, uma pessoa costuma usar de seu conhecimento, vivência e suas opiniões pessoais, imprimindo suas idéias naquilo que ela está analisando causando uma distorção. O resultado, é que ela cria um novo significado para aquilo que ela está vendo. (WIKIPÉDIA, 2009)

O que resulta em uma obsessão por encontrar significados subliminares em diversas informações que às vezes não as possui.

Muitos dos estudiosos da área admitem existência subliminar e até mesmo defendem o ponto de vista ainda cientificamente duvidoso acerca de sua persuasão no individuo receptor, porém estes mesmos distinguem os subliminares que são forte fonte de estudo daqueles que são mera criatividade sem foco de seus observadores. Como exemplifica Calazans (2009a) em seu blog, acerca do caso da "Coca-Cola invertida".

Munido não só de justificativas lingüísticas, Calazans (2009a) destrincha diversas motivações para desacreditar esse caso, que constitui basicamente na crença de que a logo brasileira da Coca-Cola possui um sentido novo quando observada invertida, ou através da garrafa vazia ao olhar pelo rotulo sobre a luz pela parte de dentro da mesma onde o verso mostra a suposta mensagem, ou espelhando o rótulo em um espelho simples, constituiriam invertida a frase: "aloDiabo".

Assim como exemplifica o autor, por ser um produto internacional, a Coca-Cola nãopossui semelhante signo com o mesmo significado nas demais versões, como a americana, o que comprova o descaso ao acrescentar mensagens desde teor somente na versão da língua portuguesa. A ignorância e o fanatismo de muitos internautas levam-nos a citar que em cada versão da Coca-Cola exista uma mensagem subliminar adequada a língua na qual esta foi impressa. Porém nenhum deles chega a citar algo mais além da Coca-Cola (versão em português). O que nos leva a falsear tal teoria até que ela seja fundamentada de forma mais coesa. (CALAZANS, 2009a)

As mensagens subliminares apesar de tangentes têm como reação algo intangível por nossos estudos e consequentemente por nossas crenças. O que ela manifesta significantemente ao receptor é variável, inconstante, e não provado. E qualquer julgamento quanto o intencional de seus mensageiros não chega a ser realmente reconhecido com veracidade.

Temos contato com diversas mensagens que tem variados níveis de subliminar e supostamente de persuasão. Não só em imagens como exemplificado por Vicary em seu experimento cinematográfico, mas também em recursos sonoros, assim como mostrado por Huxley (1996) em Admirável mundo novo. Os recursos de imagem e som também se associam para montar diversas mensagens absorvidas subconscientemente provocando sensações dentre elas alegria, euforia, felicidade, necessidade, conforto e até medo.

Um exemplo que se tem da utilização subliminar de sons é encontrado no filme O Exorcista lançado em 1973, dirigido por William Fredkin. Em diversas cenas do filme, principalmente nas cenas principais, nas quais o espectador é introduzido ao suspense, ao nojo, ao espanto, ou então ao medo por efeitos sonoros adicionados ao fundo. Como por exemplo o som de um enxame de abelhas zunindo que foi mixado e adicionado às cenas pois, segundo Friedkin, todos os humanos reagem com medo e ansiedade ao som das abelhas, mesmo se nunca ouviram tal som, este desperta o desejo de fugir, esconder-se, e o medo de sofrer dores. Incorporando então a função de causador de sensações semelhantes à mixagem dos zunidos no decorrer da associação visual com as cenas do filme. (CALAZANS, 2009b)

A percepção subliminar dá-se de diversas formas, através dos diversos meios de comunicação. Alcançando um numero incontável de receptores e causando (ou não) ainda inestimáveis reações. Sejam elas em campanhas publicitárias como na campanha da Chevrolet de 1989, onde o jingle da campanha possuía um ritmo que remontava os sons dos batimentos cardíacos de uma mãe ao amamentar o filho, o que traria uma sensação de conforto e segurança associada ao carro vendido pela campanha, segundo Rodrix, publicitário da campanha, que diz ter inspirado-se na banda Pynk Floyd que utilizara-se do mesmo recurso em alguns de seus shows (CALAZANS, 2009b). Ou em imagens adicionadas a filmes, artes plásticas, cartazes, quadrinhos etc.

A técnica subliminar em si pode ser dividida entre sintática e pragmática. Quando sintática, viria a reforçar a informação que está explicita, tendo relação com a mensagem e o contexto na qual é inserida. Quando pragmática não teria relação com o conteúdo na qual é encontrada. (OLIVEIRA, 2009)

Os subliminares sintáticos por sua vez são encontrados com muita freqüência, e são de certa forma, benignos. Seria um meio de intensificar a mensagem que está sendo enviada, associando-a subconscientemente ao assunto ao qual se refere. Como exemplifica Ivan Carlo (2009) acerca do filme "Clube da Luta", no qual o protagonista possui uma personalidade múltipla interpretada por Brad Pitt. No início do filme a segunda personalidade ainda não foi associada a história porém ela aparece subliminarmente em diversos trechos, passando pelo protagonista, ou até mesmo em cenas na qual sua imagem é inserida e em seguida apagada, preparando o espectador para o fato de queo protagonista e o personagem de Brad Pitt, que é inserido depois na história são, na verdade, a mesma pessoa.

Também cita como exemplo de subliminar pragmático a cena da animação da Disney, Bernardo e Bianca, na qual os personagens passam por uma janela na qual se vê uma mulher com os seios a mostra. Sendo esse subliminar totalmente fora do contexto do filme infantil e da mensagem transmitida pelo mesmo. Tanto que a imagem nem mesmo é uma animação.

Segundo pesquisadores chineses e americanos, imagens eróticas ressaltam-se como instintivamente mais interessantes. Em sua pesquisa foram apresentadas imagens eróticas de forma subliminar em um ruído (imagem de estática, como quando não há nenhuma canal de tv sintonizado) à quatro grupos de voluntários, homens e mulheres heterossexuais, e homens e mulheres homossexuais. Onde era pedido que se apontasse o ponto na tela que mais lhes chamasse a atenção no decorrer da exibição. Esse estudo, segundo Yi Jiang e seus colegas americanos da Universidade de Minnesota (EUA) comprovaram não só que as imagens subliminares que mais chamavam atenção eram eróticas como também dependiam da orientação sexual de cada grupo entrevistado. Homens heterossexuais tiveram sua atenção despertada por mulheres nuas, e mulheres, também heterossexuais, direcionavam-se a imagens de homens nus. Enquanto que homens homossexuais reagiam como o grupo feminino heterossexual e as mulheres homossexuais reagiam tanto quanto o primeiro quanto como o segundo grupo citado. (IMAGEM, 2009)

Os subliminares pragmáticos tanto erótico, como comercial, ou até mesmo de caráter político ou pejorativo, são aplicadas muitas das vezes com o intuito de vender um produto, associar algo a uma sensação contraria àquela transmitida pela mensagem original, ou transmitir uma mensagem extra que difere do conteúdo exposto pelo explicito associando-a por exemplo à sexo, prazer, etc.

Enquanto que os sintáticos são apenas um recurso metalingüísticos que configura a mensagem principal reforçando-a.

Esse recurso metalingüístico é considerado por muitos, inclusive pelo estudiosos Flávio Calazans (BAZININI;CALAZANS, 2009) e Ivan Carlo (2009) constante na literatura, em quadrinhos, filmes, etc. Não só como freqüente mais também necessário, pois muita das vezes a ênfase que introduz ao receptor configura sentido maior a obra facilitando a compreensão e criando meios de interpretação mais amplos ao que está impresso, escrito ou exibido.

Porém, segundo Calazans (BAZANINI; CALAZANS, 2009) as mensagens de teor pragmático teriam um caráter desapropriado, chegando mesmo a ferir o livre-arbítrio e configurando crime, tendo em consideração a sua metodologia de persuasão ao receptor que é incapaz de identificá-las ou resistir-lhes. Implicando assim em sua liberdade de expressão e no seu potencial consumidor.

As mensagens subliminares estão em diversas peças que compõe o nosso mundo, basta saber se, assim como Huxley (1996) advertiu-nos, elas se tornarão armas contra o consciente, ou serão desacreditadas com o tempo, fazendo com que nós, seres humanos, sedentos por poder encontremos algo menos incerto para o controle da mente que tão pouco entendemos e tanto exploramos.

Estaremos neste artigo explorando não só a abrangência inusitada do subliminar sintático em mensagens de teor Moral como também explanando acerca da discriminação social. Com embasamento semiótico acerca do vestir como identidade cultural. E associação de neo-revolucionários contemporâneos ao que chamam de panfletagem subliminar, constituindo, como estes mesmos afirmam, em usar "o feitiço contra o feiticeiro", baseados na subversão e na interrupção do cotidiano como arma para a disseminação de suas idéias.

II. O QUE AS ROUPAS FALAM E O QUE FALAM DAS ROUPAS

Um dos produtos também vendidos pela mídia através de campanhas com conteúdo subliminar ou não, é a moda. Ela não só é referenciada como também interfere, integra e depende dos meios de comunicação. É o que costumam chamar de círculo vicioso. Compram-se roupas que estão na moda. A moda é regulada pelas tendências exibidas em personagens televisivos, em revistas, que por sua vez premeditam aquilo que será vendido. Sendo comprado por aqueles aos quais foram introduzidas as tendências, assim como também são neles baseados. Sendo que o que há no mercado em maior quantidade é aquilo que é mais procurado, sendo isso consequentemente aquilo que estiver na moda.

A cultura de massa transpõe barreiras antes inimagináveis, com pontos positivos e negativos no decorrer de sua introdução na sociedade e no individuo. Geralmente influenciando não só o mercado consumidor a consumir aquilo que consequentemente consomem com mais voracidade como também influenciando a disponibilidade de qualquer outra coisa que não seja aquela indicada.

A roupa em si é um signo. E representa significado. Inúmeros significados. Que interdependem tanto do indivíduo que as utiliza, as características das peças em si, quanto do meio no qual se insere, assim como a época a qual pertence. Citado por Solange Silva Moreira (2009), Malconl Barnard, autor do livro Moda e Comunicação, publicado em 1996 e traduzido para o português em 2003, cita:

Ela é de opinião que a linguagem consiste de palavras, gramática e sintaxe, e que está ali somente para expressar conceitos e significados. Trata-se de uma visão mecanicista da linguagem e do significado, que conduz a uma explicação mecanicista do significado em moda e indumentária, em que os significados dos trajes parecem preexistir, sendo selecionados e combinados para compor um conjunto ou ensemble.

Enquanto declara reconhecer que a moda possui significados, porém desacredita que tais elementos possam ser compreendidos como uma linguagem. Ponto no qual discorda Solange Silva Moreira (2009) em seu trabalho Apontamentos para uma teoria semiótica da Moda. Solange Moreira baseia-se no fato de que para que haja comunicação é necessário o intercâmbio de informação, codificada como mensagem. Sendo a moda constituída de significado que é interpretado como mensagem pelos receptores, tanto aqueles que a utilizam quanto aqueles que a vêem, dependendo do contexto na qual ela se insere. Como cita a mesma ao contrariar Barnard:

…para haver comunicação é necessário o intercâmbio de conteúdo, ou informação, codificada na forma de mensagem. E o que é um código ou uma codificação utilizada para transpor informação em mensagem senão a própria linguagem? E mais: o que são os mecanismos de seleção e combinação senão mecanismos de constituição das próprias linguagens, sejam elas sonoras, visuais, verbais ou híbridas? Fazer uso desses mecanismos, seja qual for o sistema de signos utilizado, significa estabelecer uma codificação. E estabelecer uma codificação, por sua vez, significa constituir uma linguagem. Ao prender-se a uma noção restrita de linguagem, limitando o termo à sua manifestação enquanto código verbal, Barnard acabou por restringir, também, os resultados de sua investigação. (MOREIRA, 2009)

Ambos, porém concordam veemente que a roupa é um signo, leia-se roupa como conjunto que engloba não só vestimenta como blusas, calças, etc. Mas também como todo e qualquer parte que componha aquilo que o individuo está usando, desde acessórios, sapatos, até maquilagem, etc. Pois todos constituem parte daquilo que está sendo analisado. Acessórios, maquilagem, blusas, brincos, entre outros, podem identificar um grupo, faixa etária, etnia, tendência sexual, situação social, profissão, entre outros aspectos de caráter tanto individualistas quanto de massa.

Aplicando a objetivação ao vestuário temos que, enquanto signo, uma peça de roupa é determinada, causada, por um objeto. E obviamente sabemos que o objeto primordial, determinante do signo roupa não é outro senão o corpo. Entre o signo e o seu objeto se estabelecem relações de determinação e de representação. O objeto determina o signo que, por sua vez, representa o objeto. Da mesma forma, primordialmente, é o corpo que determina a roupa, ainda que mais não fosse, pelo simples fato de determinar as medidas e as formas básicas que ela vai ter. Em vista disso, a roupa representa esse corpo para o qual foi criada. É no corpo que encontramos a referencialidade e aplicabilidade primeira da roupa, pois é o corpo que se configura, primordialmente, como objeto da roupa enquanto signo. (MOREIRA, 2009).

Quanto a signo entendemos, segundo a semiótica, como construção cultural de uma representação de um significado a partir de um significante.

A noção de signo é básica na lingüística. Signo é a menor unidade de um código dado, e é o meio pelo qual a mensagem se configura, a qual melhor interpreta aquele que melhor conhece os signos de determinada linguagem.(BARBOSA, 2009).

Para Baudrillard, citado por Maria Elisa Barbosa (2009), a roupa é uma das mais importantes expressões não verbalizadas do eu que passa de controle social. Por meio dela incorpora-se o individualismo ao mesmo tempo em que se anseia pela identificação da mesma a integração social. A moda é um dispositivo social. Segundo Baudrillard, citado no mesmo artigo, "se a modernidade define-se pela hegemonia do código, a moda, enquanto dimensão total dos signos é sua instância emblemática. A moda constitui uma ruptura profunda no pensamento discursivo, mergulhando-o na irreverência absoluta, ela desarticula o esquema tradicional da representação".

Iniciam-se os rituais do dia. Em meio ao supermercado, uma criança usando apenas uma tapa sexo, e com grandes argolas espalhadas pelo rosto e orelhas, o corpo pintado, ainda exalando um cheiro ocre das tinturas naturais e com selvageria nos olhos inicia a dança que é de praxe em um ritual de maturidade. À sua volta outra meia dúzia de homens com roupas semelhantes, porém com enormes círculos de madeira enfiada no lábio inferior dançam entoando enquanto giram entorno da criança a ser iniciada. Os transeuntes, assustados tentam assimilar a cena. Em pleno século XXI aquilo é, no mínimo discordante da sociedade em que vivem, principalmente dos clientes que costumam freqüentar supermercados como aquele.

Essa cena fictícia encontra-se exatamente deslocada e simula a ênfase da significância da roupa como forma de signo social. Mesmo que não estivessem dançando, ou que mesmo não fossem mais do que um, haveria o choque provocado pelo desacordo do grupo e local social no qual se encontraria esse individuo, destacado principalmente pela sua vestimenta (tapa-sexo, colares, penteado, acessórios, etc.).

É pré-estabelecido que vivemos em uma sociedade democrática, regida por leis impressas nas constituições por nós criadas, dentro destas discorremos sobre diversas situações que abrangem o comportamento do individuo enquanto participante do grupo que chamamos de sociedade. Assim como existem leis que nos regem como membros desta mas que não estão exatamente impressas. Ficam acima da divulgação, mas baseiam-se no senso comum, que somente indivíduos do mesmo âmbito social dividem. Um índio é um índio, se veste como índios, e se comunica em sua língua nativa. Seu lugar claramente seria uma aldeia e não um supermercado. A roupa que ele veste significa mais para ele do que para os receptores daquela forma de expressão de moda.

Ao olhá-lo, interpretasse: índio. Porém na sua tribo, onde ele divide sua cultura com os demais, ao olhá-lo podem surgir várias interpretações que variam de acordo com cada observador. Suas pinturas pelo corpo podem indicar que ele é o chefe daquela tribo ou que não caça mais. Seu tapa sexo, pelas cores ou formato, pode muito bem indicar seu estado civil, ou seu grau de maturidade, assim como quaisquer outros acessórios que componham suas vestimentas vêem a remeter uma abundancia de significados.

Mais uma vez enfatizando, que os melhores leitores da mensagem são aqueles que melhor conhecem os signos que a configuram. Uma mensagem pode dizer mais do que explicita, dependendo de seus receptores. Assim como em mensagens subliminares como vimos anteriormente.

"Abriram-se os olhos de ambos, e percebendo que estavam nus coseram folhas de figueira, e fizeram cintas para si." (GENÊSIS, 2009)

A Bíblia Sagrada explicita os primórdios da vestimenta como comportamento pelo pudor. Cobrir a nudez revelada pela serpente indutora que fizera Adão e Eva serem expulsos do paraíso ao comerem o fruto proibido. É, porém uma norma válida mais explicitamente para as sociedades que se desenvolveram muito propriamente depois dos primórdios da raça humana. Sociedades como a que concebeu as escrituras do livro sagrado.

A moda, por assim dizer, acompanha o homem a partir do momento pré-histórico no qual ele começa a viver em grupo, onde são necessários signos que identifiquem e organizem, auxiliando na sobrevivência do grupo, que é maior do que os anteriores. Antes disso as roupas nada mais eram do que um recurso de caráter protetor.

No livro infanto-juvenil O Mágico Desinventor de Marco Túlio Costa (2001), também de caráter futurista nada otimista assim como Huxley, oautor prevê que em conseqüência da poluição e do crescimento populacional demográfico, além do conseqüente esgotamento de recursos naturais, chegaremos ao ponto de retornar a essa condição, no qual as roupas servem para vestir e nada mais. Onde nada significam pois tampouco importam, tendo em vista que em conseqüência da quase destruição do planeta assim como a quase extinção da raça humana por suas próprias atitudes elas nada mais representam em caráter social, já que todos encontram-se impreterivelmente engajados em reverter o máximo possível os danos causados ao planeta, danos estes que afetaram não só o meio em que vivem mas também sua estrutura física e biológica, transformando-os em figuras exógenas, mas o que lhes permitira a sobrevivência tendo em vista que sobrevive, não o mais forte, mas aquele que melhor se adapta.

Esse seria no caso um dos futuros alternativos exibidos a algumas crianças que encontram-se com o Mágico Desinventor, assim chamado pois no presente desinventa grandes descobertas e feitos da humanidade que em sua opinião nada mais são agora do que um intensificador da destruição eminente do que um facilitador da convivência quase mínima entre os componentes da sociedade, que mais vêem televisão do que olham uns para os outros. Portanto ele trata de desinventar a televisão, os carros, as armas, o dinheiro, etc., entre outras coisas.

O livro em seu decorrer mostra estes futuros alternativos que não são assim tão fictícios e até mesmo tem um aterrador senso de continuidade com o que sucede-se agora. A abordagem quanto a isso nesse futuro alternativo, que é assistido por duas das crianças, onde os seres sobreviventes tentam por meio da tecnologia, que desenvolve-se o suficiente ao ponto de auxiliá-los em sua sobrevivência e tentativa de resgate dos recurso naturais e da verdadeira raça humana antes das mutações, é uma crítica intensa à sociedade na qual vivemos, com padrões expressamente fúteis que deterioram biologicamente o planeta, pelo consumismo, pela grande produção de lixo e pela exploração exacerbada dos recursos naturais.

Já no futuro a espécie que sucede a nossa conceitua tanto o consumismo, quanto a questão monetária e seus adventos como moda, mídia, produto, etc., como dispensável. Não vestiríamos peles de animais como nossos antepassados pré-históricos, mas sim algo nada individualista ou atrativo, porém diferente de um uniforme, que pretende caracterizar um grupo, seriam apenas roupas para estarmos vestidos. E nada mais. Diferente da visão futurista de Huxley (1996) em Admirável mundo novo, no qual a moda seria mais uma arma utilizada como forma de identificação de castas e controle social. Denotando ainda significado social a roupa.

Nos dias atuais o significado da roupa é abrangente e variado, além de ser destrinchado de fora para dentro no conceito. Uma roupa feminina, por exemplo, ao ser utilizada por uma mulher, a identifica em diversos conceitos e consequentemente ao grupo no qual ela se encaixa, sua roupa diz a qual grupo ela pertence, ou deseja pertencer.

Independente da variação de exposição do corpo existem elementos que a identificam. Alguém totalmente coberto por uma burca, leva-nos a deduzir: mulher, iraniana ou afegã, cultura islâmica, de uma família rígida, pois a burca, diferente do xador que deixa os olhos amostra, cobre toda a sua usuária, dos pés a cabeça.

O que muitas das vezes é interpretado por ocidentais como nós como uma censura à mulher no Irã ou no Afeganistão, é muitas das vezes defendidas pelas mesmas como apropriadas, analisando seu lado, elas estão protegidas, anônimas e imaculadas atrás do tecido. Sua cultura também foi enraizada ao ponto daquilo ser praticamente natural. E obviamente descende do costume vestuário de proteção contra areia e calor do sol de seus ancestrais que habitaram essas regiões áridas quentes, secas e desérticas. Além de ser interpretado por muitos dos lideres dessas culturas como um mandamento do Corão.

A nossa indignação quanto a burca se compara a indignação de suas usuárias acerca do biquíni. É simplesmente um dos elementos que constituem uma cultura. Influenciado pelas condições climáticas, posição geográfica, desenvolvimento histórica, política e religião.

Etnia, sexo, religião, grupo familiar. Tudo identificado através de um único signo, a burca. Mesmo que essa mulher não viva nas regiões determinadas por essa interpretação, o grupo ao qual pertence está principalmente lá. E tendo em vista que não somos conhecedores de todos os significados que este signo possui podemos estar perdendo muito mais informação por ele transmitida. A cor por exemplo pode indicar se a usuária é casada, solteira, adolescente, senhora, etc. Informação que os integrantes dessa cultura podem identificar e defender de forma mais adequada do que os demais receptores da imagem visual de alguém vestindo uma burca.

Assim como a roupa é de caráter cultural, ela simultaneamente é também de caráter temporal e é afetada pela época a qual pertence e consequentemente o âmbito cultural da mesma. Roupas do século XV, por exemplo, diferem incomparavelmente com as roupas da década de 50 do século XX, que por sua vez distinguem-se das de hoje. Existe também o fato de que a moda está sempre se reinventando, pegando novos conceitos e resgatando antigos valores. Por isso contemplamos certas vezes algumas peças ou coleções inspiradas na moda de outras épocas.

Essas diferenças temporais são fortemente influenciadas por fatores culturais, como movimentos revolucionários contra o poder, como a moda Hippie que pregava a paz e a aversão a guerra. Ou até mesmo adaptando-se a vetores de outros seguimentos, como estilos musicais em apogeu na época, como por exemplo, a moda inspirada por Elvis Presley durante sua carreira de sucesso nos anos 50.

Porém no século XXI no qual vivemos existem ainda critérios fortes levados em conta quando trata-se do vestir como objeto de estudo. O conceito cultural é forte, e ele está co-relacionado ao conceito temporal, ambos por sua vez não deixam de remeter-nos ao conceito social. Aquilo que é vestido remonta não só suas características de caráter étnico-cultural como também revelam sua classe social econômica, sendo conseqüente desta as características do próprio objeto de estudo. Ou seja, o signo roupa remete ao poder aquisitivo, enquanto que o poder aquisitivo determina o signo roupa, por sua vez.

Serão 80 segundos diante ao semáforo de trânsito, na avenida principal da cidade, cansado pelo longo dia de trabalho, o empresário escorasse no vidro e olha para a rua. O que observa é um prédio luxuoso, no qual adentram pessoas bem trajadas com vestidos longos e fraque. Entre esse edifício e o vizinho, porém existe um intervalo. Um misero espaço envolto na escuridão somente maculada pela luz da lua. Ao observar atentamente, vê uma mulher, jogada ao chão. Suponhamos então duas possibilidades, primeira: a mulher em questão está muito bem vestida assim como as pessoas nos arredores do prédio luxuoso. E segunda: a mulher está vestida com trapos, seu cabelo está desgrenhado e seus pés descalços.

Nesse contexto qual seria a reação do individuo observador em ambos os casos?

Na primeira situação provavelmente seria levado a conclusão de que aquela senhora elegante havia passado mal ou havia sido atacada e deixada inconsciente no beco escuro. A reação seria estacionar e ir ajudá-la ou no mínimo avisar alguns dos passantes elegantes sobre o paradeiro de uma mulher que obviamente pertencia a seu grupo e fora deixada entre os prédios.

Na segunda situação o máximo de reação que se poderia obter seria a pena, ou a indignação, e até mesmo repulsa. Apesar de a mulher poder estar inconsciente pelos mesmos motivos que sua versão elegante, um transeunte identificaria rapidamente sua classe social, suas condições financeiras, alem de sua suposta tendência a criminalidade e se afastaria ou a ignoraria.

A última cena não carece de imaginação exacerbada para sua montagem. É uma cena típica das cidades metropolitanas. E a reação a sua existência apesar de variável é bastante hegemônica. Existe certa banalização e conformismo quanto as diferenças sociais. A identificação do contexto no qual se insere o individuo, determina o "quanto ele vale" basicamente, na sociedade atual. E a sua aparência é não só reforçada por suas roupas, como também por suas escolhas musicais, sua linguagem corporal, e linguagem falada.

A roupa é significado enquanto designifica o homem em si. Ela transmite mensagens que indicam etnia, religião, tendência sexual, nacionalidade, posição geográfica, configuração climática de onde habita etc. Mas sua leitura é feita por indivíduos que por sua vez, tem gostos, medos, preferências, crenças, etc. A maioria descrita na forma de vestir, porém, o que a roupa "cala" é de ordem psicológica. A roupa cala o caráter e a moral, que são preconcebidos por suposição a partir desses outros fatores que ela transmite tão claramente.

Tanto que ao soar de um alarme na porta do shopping, os olhares incriminadores fixam-se na pessoa mais pobre e mal vestida que se encontra próximo. Enquanto que, digamos hipoteticamente, a razão dá-se pelo furto feito por um senhor que caminha tranquilamente em seu terno risca de giz.

A moda torna-se nesse ponto, não só um fator de significância e caracterização expressiva de uma cultura que vivem em sociedade em determinado espaço de tempo. Agora ela também configura um elemento auxiliador da discriminação social, que segundo a jornalista Monique dos Anjos (2009), para o portal de notícias da editora Abril, tem ganhado maior amplitude no cenário nacional em detrimento da discriminação racial. Tendo essa segunda como uma extensão da primeira, tanto por associação quanto por herança histórica que relacionam alguns grupos raciais como menos favorecidos consequentemente até os dias de hoje.

III. FEITIÇO CONTRA O FEITICEIRO

Ao chegar ao shopping de Curitiba, o individuo se dirige para a área de alimentação com o intuito de comprar um lanche no estilo fast-food em uma das representantes da multinacional empresa de gêneros alimentícios, Mc'Donalds. Porém ao chegar a esse símbolo da globalização, do capitalismo, e da hegemonia americana, ele depara-se com nada mais que vinte crianças. Nem um pouco incomum, levando em consideração que o público infanto-juvenil compõe uma grande parte do público consumidor atingido pela empresa americana, não fosse o fato dessas vinte crianças serem todas crianças de rua.Facilmente identificadas por sua indumentária, ou seja suas roupas, pela pouca higiene e seus hábitos pouco refinados enquanto comiam seus Mc'Lanches.

Esse fato desafiava não só o senso comum quanto a moral e a ética, assim como o senso de justiça e os preconceitos enraizados na mente de cada um dos passantes e clientes. Tendo em vista que aquele irremediavelmente não era o lugar daquelas crianças sujas, surge a aversão. Existe certa disposição de pensamentos calados que se intercalam acerca da cena. O preconceito quanto àqueles menos favorecidos. A aversão aos preconceitos que vêm sendo disseminada e proclamada pela sociedade nos últimos anos. Tão contraditórios como o próprio individuo observador que se considera culto, justo e liberalista, e ao mesmo tendo se abstém de dividir seu espaço com aqueles que se descaracterizam como pertencentes de seu grupo social.

Essa cena, descrita, é o ato de numero 8, relatado no livro Manual Prático de Delinqüência Juvenil, livro de relatos fictícios ou não de um grupo de jovens brasileiros que residem em Curitiba. O grupo inspirado em Hakim Bey entre outros pensadores e filósofos revolucionários e neo-situacionistas, em sua maioria contra o "sistema", tornou seus atos públicos através da rede. Mesmo sua publicação é de caráter contraditório ao que se espera atualmente. No inicio do livro nos deparamos com uma confronta ao conceito de direitos autorais:

IMPORTANTE (Leia isso antes de prosseguir)

É permitida a reprodução total ou parcial dos textos contidos neste livro mesmo que a fonte, a obra e o autor não sejam citados Estão todos autorizados a copiarem os textos, modificarem o que quiserem, assumir a autoria e utilizarem para o que bem desejarem. (ALMEIDA, 2009a)

Para o grupo, a propriedade privada constitui um roubo. Seus atos principalmente tem como alvo o que eles chamam de "Império", que seria neste caso a sociedade capitalista encarnada pelos governos, empresas e mídia, e também pelas pessoas. Como eles mesmo citam ao introduzirem algumas de suas filosofias: "Estamos em Território Inimigo & o Inimigo está em nós. A primeira Grande Batalha contra o Império deve se dar dentro de Nossas Cabeças"(ALMEIDA, 2009a). Onde instigam o conhecimento dos preconceitos, dogmas e limitações, não só impostas pela sociedade e cultura na qual nos inserimos, como também o auto-conhecimento desses valores que nos foram inseridos no decorrer de nosso desenvolvimento fisiológico e psicológico nesse meio.

Inspirados em Hakim Bey (2009) e sua teoria das Zonas Autônomas temporárias, embasada em núcleos de sociedade aleatórios como de piratas, onde os códigos e as leis dominantes não significam o mesmo que compare-se ao senso comum de justiça pregado pela sociedade que se desenvolve paralela a essa. Incorporando grandes pensadores assim como religiões livres, como a religião Discordiana, onde cada um seria mais ou menos como um papa. E baseando-se em tudo isso e em nada do que isso os responsabilize. Este grupo denomina-se delinqüentes, não pelo rótulo pejorativo da profanação do que é valioso, mas pelo "estupro" das idéias e do que torna o que quer que seja valioso. Se é que algo o seja além do ser humano em si.

O principal objetivo do Manual segundo os mesmos seria não apenas divulgar esses atos contra o Império, mas também disseminar seus ideais contra o comodismo dado pelas novas gerações. A inserção de valores se dá sem resistência, e até mesmo com aceitação pela sociedade na qual vivemos. E mesmo que hajam novas idéias e a contestação dessa influência social por inúmeros indivíduos, estes mesmos se abstraem do "agir", e limitam-se ao "registrar". Tornando-se na opinião dos "delinqüentes" mais acomodados que os alienados grupos sociais aos quais se dirigem, pois diferentes destes, os contestadores seriam conhecedores daquilo ao qual se acomodam e modelam.

Os atos foram originalmente descritos por um dos indivíduos do grupo, que atende pelo pseudônimo de Ari Almeida (2009a), em seu blog denominado DELINQUENTES. Não existem fotos ou registros quaisquer que comprovem a existência dos demais integrantes do grupo, ou mesmo os atos subversivos descritos no blog que foram posteriormente incorporados ao Manual. Ari articula (2009b),emum de seus blogs, fala que o anonimato dado a seu grupo é arma para sua existência, considerando o fato de que seus "ataques" geralmente constituem crimes na Constituição, contra à propriedade privada, atentado ao pudor, etc. Como eles mesmo descrevem, é um vandalismo. Porém não apenas caracterizado pelo fato de interferir no cotidiano com discrepância aos valores sociais vigentes mas também como forma de co-relacionar à novos valores, ou mesmo o resgate de conceitos humanísticos através do "estupro" da rotina pelo que é considerado "proibido", "anormal" e "subversivo".

"TERRORISMO POÉTICO, ARTE, SABOTAGEM, TEATRO SECRETO, RELIGIÕES LIVRES, CONCEITOS DISTORCIDOS, IDEOLOGIAS SAQUEADAS, PIRATARIA DE IDÉIAS, SABOTAGEM CULTURAL." (ALMEIDA, 2009) Eis algumas palavras-chave, retiradas da própria obra, que descrevem bem o conteúdo e a inspiração dos relatos.

Dentre as façanhas descritas estão ataques à C&A, e o anteriormente descrito, ao Mcdonald's, Bancos entre outros representantes cabalísticos do Império. Os delinqüentes de Ari julgam o seu vandalismo poético e conferem a ele a subversão subliminar auxiliada pelo teatro de improviso e por idéias neo-liberalistas que vinculam claramente à liberdade de expressão. Com o objetivo de chacoalhar o cotidiano, desviar os passos atraírem-se os olhos, liberarem-se os conceitos e expurgarem os preconceitos. Fazer pensar. Lembrar que essa é uma função completamente natural do nosso organismo. A qual ainda não se descobriu como cobrar impostos sobre, mas já se descobriu inúmeras maneiras de evitá-la. Uma dessas "maneiras" sendo até mesmo vandalizada por eles no Ato de numero 9, a televisão.

"Solidão: o espaço entre o carro e a televisão." Inspirados nesse hai kaide Paulo Leminski ( apaut ALMEIDA, 2009a), os delinqüentes compõe uma cena de interferência no qual utilizam-se do teatro de improviso, panfletagem subliminar, assim como também da arte. Após encenarem uma cena de discussão para poderem distrair e invadir um prédio residencial em Curitiba, os delinqüentes atiram do alto do mesmo uma televisão velha, conseguida em uma sucataria, contendo dentro dela 57 panfletos.

Ao colidir com o chão com todo o cuidado para que não viesse a machucar passantes, a televisão quebra-se soltando alguns dos panfletos pela calçada. "Olhe o que a TV pode fazer com você.", e "Olhe o que você pode fazer com a TV." São algumas das frases que compunham a panfletagem. Os transeuntes que depararam-se com a cena foram surpreendidos pela retórica da mesma e a contextualização. Alguns não saberiam dizer se tratava-se de alguma estratégia de marketing de novas mídias ou pura critica social. Porém contemplaram pensativos, alem de espantados àquele pedaço (despedaçado) de objeto cheio de conceitos novos. (ALMEIDA, 2009a)

O mais fascinante acerca do inventário ideológico disseminado por esse grupo é sua concepção do subliminar, geralmente utilizado, na opinião dos mesmos, pelas mídias de massa e governos para a inserção de seus valores na sociedade. Eles por sua vez, declaram utilizarem-se dessa "arma", que tão fortemente serve ao Império, contra o mesmo. "Poderosos Feitiços Publicitários iludem nossos Desejos mais Puros, Belos & Loucos." Os citam acerca da mídia, assim como também descrevem o plano de ataque ao qual adotam com auxílio do subliminar:

"Os Protestos & Discursos não devem mais ser Espalhafatosos & Coniventes com a lógica do Espetáculo & da Mídia. Devem ser em Silêncio & Invisíveis: SUBLIMINARES. Uma Terrível Conspiração agindo no subconsciente das pessoas." (ALMEIDA, 2009a)

Pois desacreditam do ativismo global que pouco comove ou influência os detentores do poder. O comodismo banalizou toda e qualquer manifestação de caráter ativista solidário. Passeatas contra a paz são muito bem noticiadas e elogiadas, porém tampouco evitam que canhões de guerra adentrem fronteiras e ceifem vidas inocentes por motivos de caráter político, aquisitivo e/ou econômico. O povo não mais é ouvido por que pouco fala. A voz do povo é a voz de Deus. E acerca de tudo isso conclui-se que, então, Deus cala-se?

Aconselham então que antes que se repreenda o preconceito, ele seja expurgado de dentro para fora. Pois o campo mais perigoso que o Império habita é onde ele vem sendo melhor recebido, nossas mentes.

Por isso que ao depararem-se com os meninos de rua em um shopping Center, muitos ficariam empacados entre sua aversão, seus preconceitos sociais, sua moral e sua boa educação. Alguns não sabendo se deixam o recinto ou ignoram a interferência. Ao identificar o signo roupa inadequado, contextualizando o teor social que descrevem, muitos nem mesmo dão-se ao trabalho de mascarar seus preconceito, e como descreveu Ari (2009a) acerca do ato, retiram-se das mesas, procuram outras lanchonetes, ou simplesmente encaram enojados a cena.

O objetivo do grupo pode ser contestado como controverso nesse ato, por adquirir um produto que simboliza não só o capitalismo, como também a globalização, todos alvos dos delinqüentes em suas ideologias cortantes. Porém assim como dito por Vinicius, um dos integrantes do grupo, o ato tinha em mente algo que faria os fornecedores dos produtos desejarem poder pagar o triplo para que o dinheiro não fosse entregue a eles por aquele grupo de crianças de rua. O que foi facilmente comprovado, sendo que a cada lanche comprado por um dos meninos equivaliam basicamente a três clientes que desistiam da compra e se dirigiam a outra lanchonete.

O subliminar de Ari (2009a) e seus Delinqüentes nem sempre dá-se pela panfletagem, mas também pela realização do ato. Seus "ataques" geralmente estão tão absortos de conceitos que muitas das vezes poderiam passar como sendo apenas vandalismo se mal interpretados, porém ainda assim acrescentam o valor subliminar da interferência que dá-se ao serem realizados. Eles fazem pensar, no mínimo, porque alguém faria algo assim, o que vem acontecendo com a sociedade, por que há a contestação da vida que se leva, e qual o objetivo que se aplica a essas atitudes indulgentes.

Obviamente, assim como qualquer ação e reação, existem inúmeros lados a analisarmos quanto a seus atos. Não só contestando a veracidade dos mesmos, como também analisando seu potencial indutor de caráter liberalista ou como recurso de diversão e promoção na rede. Assim como eles mesmos afirmam não serem de confiança, é importante destacar que suas intenções e relações com a realidade são de caráter duvidoso. Apesar de engenhoso e instigante.

Com estes atos atos descritos em pequenos textos que juntos formam o Manual de Delinqüência Juvenil, Ari Almeida (2009a) e seus amigos descrevem os subversivos, inusitados, bem humorados, e pouco prováveis ataques ao "Império" destacando sua ideologia de revolução subliminar. A revolução que se dá de dentro pra fora. Não tão utópica quanto a Marxista, nem tão séria quanta as demais. Descritas de forma curta, grossa, verossimilhante ao diálogo em si. Contadas por Ari enquanto trabalha em um escritório do Sistema. Atrás de seu pseudônimo que não somente o protege quanto o mistifica e o desacredita. Fato que somente o diverte mais ainda. Ele desacredita de si mesmo e nos estimula a duvidar de qualquer um inclusive nos mesmos. Não mantém prova de seus relatos. Apenas os descreve. E nos intriga. Mais um objetivo: concluído.

IV. A MENDIGA COM CARTÃO DE CRÉDITO.

Baseados em dois atos do Manual Prático de Delinqüência Juvenil (ALMEIDA, 2009a), o Ato 8, dos meninos de rua no Mc Donald's, e o Ato 12, que consiste em mais uma inserção de um elemento descaracterizado em um ambiente hostil, um salão de beleza de alta-classe recebe sua cliente mais marcante, uma catadora de papelão, é que montamos um "Ato" para a aplicação dos conceitos englobados neste artigo.

A idéia principal surgiu a partir do relato de uma das realizadoras deste artigo. Um caso de preconceito no atendimento, em uma das lanchonetes de fast-food do principal Shopping Center da cidade de Macapá, no Amapá. Portanto roupas largas e velhas após sair de um trabalho da faculdade, ela dirigiu-se a lanchonete, e diferente dos demais clientes, que ostentavam vestimentas consideradas mais distintas, foi destratada, ignorada e teve um atendimento diferenciado incorporado pelo preconceito acerca de sua aparência que implicava em um conceito de poder aquisitivo que destoava do ambiente em questão.

Surgiu então a idéia de repetir essa cena, dessa vez intencionalmente, fazendo registro videográfico que registraria a reação não só dos funcionários dos estabelecimentos que compõem o Shopping em questão ma também dos freqüentadores do mesmo.

Um dos componentes do grupo caracterizou-se a parecer de origem humilde. Cabelo desgrenhado, roupas destoantes e velhas, nenhuma maquiagem. Nesse ponto do trabalho podemos remeter-nos ao conceito de quebrar preconceitos de dentro pra fora. Pois a própria atriz sentiu-se mal trajando-se desta forma. Seu pensamento voltou-se a imagem que passava, e seus próprios preconceitos se dirigiram ao espelho enquanto montava-se a personagem.

O grupo se dividiu da seguinte forma. A personagem mal-vestida, que circularia pelo recinto, freqüentando lojas e a praça de alimentação, e As responsáveis pelo registro dissimulado, que filmariam de longe, não entrando em contato com a primeira, para que não comprometessem a integridade do trabalho, fazendo assim que não se percebesse tratar de um evento experimental de caráter sociológico.

Foi criado um texto poético que ilustrava o preconceito, e impresso em alguns panfletos. Alguns ficariam com o grupo de registro caso fosse impossível de serem entregues pela Personagem.

O grupo com as câmeras adentrou primeiro no Shopping Center, mesclando-se com os demais, simulando pessoas interessadas em tirar fotografias e filmar alguns produtos através das vitrines. O que não é nada incomum hoje em dia, pessoas tirando foto e passeando com câmeras pelo shopping enquanto conversam e fazem compras.

Ao aproximar-se do estabelecimento a Personagem, logo sentiu o preconceito saindo do estacionamento. Enquanto esperava alguns minutos para que o grupo de registro se infiltrasse sem que se pudesse fazer relação entre ela e as demais integrantes, procurou guardar na bolsa acessórios que destoavam do papel que encenava, chaves do carro, celular, etc., e que também denunciariam a falsidade daquilo que expressava suas vestimentas. Enquanto remexia na bolsa um casal que passou por ela se afastando assim que se depararam com sua figura. A mulher segurou a bolsa de mão preta com mais firmeza e lançou um olhar recriminador enquanto seu rosto distorcia-se em uma expressão de nojo.

Detalhe importante é que nossos sentidos se co-relacionam de diversas maneiras. O feio, o sujo e o fétido, estão incrustados em nossas mentes, e muitas das vezes não conseguimos dissociá-los uns dos outros. A personagem estava, sim, mal-vestida, mas não estava suja, muito menos fedia. Porém a aversão que sentira era associada a impressão visual de que por conseqüência ao seu mal-vestir com certeza estaria suja e consequentemente mal-cheirosa.

Ainda esperando do lado de fora, viu repetir-se o evento do afastamento por mais três vezes. Duas jovens com estimadamente 15 ou 16 anos, trajando roupas explicitamente de grife, confirmada ou pelos nomes estampados nas blusas ou no jeans ou pelas etiquetas brilhosas evidentes. Ambas conversavam confortavelmente até depararem-se com a personagem, o que interrompeu não só a conversa, como também o caminho que seguiam, decidindo utilizar outra entrada. Uma família que atravessava a rua, distraída com o tráfego de carros que influenciava sua travessia. Ao chegarem a calçada e depararem-se com a personagem entreolharam-se, e assim como as jovens utilizaram a outra entrada. E por último uma senhora muito elegante que torceu o nariz com o olhar altivo, como que esperando que lhe fosse pedido esmola somente para que negasse de imediato, mas passou desafiadora ao lado da integrante do grupo mal-vestida.

Após receber a confirmação por meio de um telefonema de apenas um toque de que as demais estavam posicionadas, infiltradas e esperando, ela adentrou o shopping, sendo olhada pelos seguranças com certa desconfiança.

Passou cabisbaixa por alguns indivíduos, percebendo que viravam seus olhares para ela assim que se cruzavam. Chegou ao ponto de encontro no qual estavam as câmeras e iniciou-se uma árdua caminhada. Aparentemente sem pretensão. Sendo acompanhada de longe pelo grupo de registro.

É tangente o preconceito não-verbalizado dos funcionários das lojas. Principalmente do balcões que são distribuídos em diversos pontos do shopping. Esses balcões possuem produtos a mostra, ao alcance do toque e até mesmo para experimento, como por exemplo, o balcão que vende maquiagens no primeiro andar. O que era temido pela funcionária que observava nossa personagem, era o furto. Nela não havia um olhar particularmente de repulsa, mas sim olhos dilatados de medo ou precaução. Pude perceber que ela se reconfortou ao olhar para um dos lados e ver um dos seguranças do local observando a cena na qual se inseria a Personagem de nosso trabalho.

O alvo-principal escolhido seria o restaurante de massas no último andar. Este possui uma decoração refinada, de conceito clean, e possui freqüentadores de porte muito distinto. O objetivo seria circular um pouco enquanto se decidia o prato, fazendo-se perceber sua presença, e registrando o que ela provocava, nos clientes e nos funcionários.

Por mais incrível que pareça ao se dirigir ao caixa recebera, contrária às expectativas, um ótimo atendimento. O alvo-principal havia talvez percebido as câmeras direcionadas a cena, locadas com o grupo em uma lanchonete próxima, ou simplesmente era muito bem treinado e educado. Algo que não poderemos esclarecer com firmeza. Apesar da notória surpresa ao ver que o pagamento da compra seria realizado com cartão de crédito.

Após o fracasso de registrar preconceito nesse local, seria impossível fazer a panfletagem no mesmo, sendo que ela não teria o sentido e o impacto desejado.

Ocorria agora um desafio de atuação ainda maior, tanto para a Personagem, que não estava nenhum pouco confortável com a hostilidade dos passantes, quanto para o grupo de registro, que agora teria de atuar tanto quanto ela, fingindo passear enquanto conversavam e acompanhavam a trajetória dissimuladamente. Seriam um grupo de amigas, andando despretensiosamente com as câmeras em punho. Dando a maioria das cenas registradas certa irregularidade de ângulos e foco, devido a adversidade de passar despercebido o registro.

Entrando em uma loja de brinquedos, A personagem não foi atendida, ou questionada por seus interesses, o que também não é tão incomum, e até mesmo muito menos incômodo. Sentiu-se mais a vontade para andar, percebendo estar sendo seguida sutilmente por um dos funcionários. Ignorando o fato empenhou-se em apertar o máximo de brinquedos que possuíssem "Try Me" (experimente-me) em suas embalagens, aqueles que soltam sons ao serem tocados, ou mesmo mostram articulações inusitadas. Isso obviamente incomodou os funcionários que antes conversavam desinteressados, mas que agora apenas observavam calados. E um deles continuava sua perseguição sutil através das estantes, acompanhando-me de longe, discretamente. Ele com certeza receberia um panfleto na saída.

Foi então que o grupo de registro entrou na loja e recebeu uma atenção bastante preocupada, acredito eu, por portarem câmeras. Houve então a confusão por parte do perseguidor discreto e ele posicionou-se mais ou menos no corredor central, no caminho da entrada e saída, de onde teria uma visão ampla da loja e de todos aqueles cliente "suspeitos" que a ocupavam naquele momento.

Chegou o momento de sair, e junto com um sorriso simpático, a entrega do panfleto ao perseguidor discreto. É notável certa resistência para receber tais coisas. Ao passear pelo centro comercial da cidade vê-se milhares de panfletos, dos mais variados temas (desde campanhas políticas, alistamento militar até "pais de santo"), todos jogados nas calçadas e ruas, ou sendo distribuídos por pessoas eufóricas e insistentes que os empurram aos que atravessam seus caminho. Apesar de certa resistência, o funcionário aceitou o panfleto. E então a personagem se foi. A compreensão do Ato talvez tenha lhe ocorrido já que o leu e olhou mais uma vez para a pessoa mal-vestida que lhe sorrira ao entregar-lhe aquele papel.

O próximo alvo foi uma loja de sapatos caríssimos, havia algumas senhoras experimentando alguns pares enquanto contemplavam-se no espelho da loja, ao verem nossa personagem refletida nele viraram-se, para depois retornarem ao assunto que comentavam antes da interrupção visual da garota mal-vestida. Ela por suas vez circulou pela loja, tocando em alguns sapatos que lhe interessaram, verificando preços. As atendentes por sua vez não lhe dirigiram a palavra, ou mesmo sorriram-lhe como faziam ao responder qualquer pergunta acerca do acervo das senhoras em frente ao espelho. Houve um comentário maldoso sussurrado de uma para a outra com o seguinte questionamento: "Quê que ela quer aqui?".

Apesar de intrigante este último recinto, o local no qual se deu o maior preconceito foi uma renomada loja, também de calçados, onde são vendidos sapatos com valor até mesmo superior à dois mil reais.

Ao entrar na loja, assim como nas demais, não houve qualquer atendimento, nem mesmo um cumprimento de "boa noite". O que não foi tão estranhado até o momento em que adentraram na loja duas mulheres de mais ou menos 30 a 40 anos de idade. O rostos mórbidos das funcionárias que olhavam nossa integrante do grupo contorceram-se em um sorriso seguidos de um "Olá, boa noite" que sucedeu uma conversa entre clientes e funcionária acerca do que procuravam, qual numero calçavam, entre elogios sobre as roupas e etc. Essas funcionárias com certeza mereciam receber panfletos. Não acreditamos, porém que o leriam. Ou entenderiam, se o lessem.

Coisa que não aconteceria. Pois antes de se retirar da loja, a Personagem mal-vestida aproximou-se da funcionária mais próxima, a mesma que atendia tão bem as senhoras, e lhe ofereceu com um sorriso um panfleto. Recebendo em resposta da mulher uniformizada a seguinte frase: "Eu não posso pegar 'isso' (expressão de nojo direcionada ao panfleto) eu tenho que atender a 'cliente'!(enfatizando algo que potencialmente não considerava que nossa personagem fosse)". Dando as costas a figura pasma de nossa personagem. Pode o preconceito ser expresso de forma tão explicita assim?

Infelizmente, os diálogos não puderam ser captados no registro videográfico, devido a distância de segurança do grupo de registro e os sons externos de conversas aleatória entre outros sons que ressoavam pelo shopping.

Havia mais uma loja nos alvos da equipe. Uma loja de presentes e lembranças que inaugurara a não muito tempo na cidade. Ao entrar na loja, como de costume na foi atendida. Logo em seguida a sua entrada o grupo de registro passou pelas portas como um grupo aleatório, distinto da Personagem. Foram atendidos, sendo perguntados se estavam procurando algo em especial e convidados a ficarem a vontade para olhar as novidades que chegaram a não muito tempo no lugar. O que deixou livre para circularem enquanto registravam a personagem ficar confortável sem ter sido convidada a tal, observando alguns produtos.

O ápice do preconceito nesse estabelecimento foi percebido ao perguntar o preço de um dos produtos a um funcionário, que pediu para que outra funcionária fosse responder a essa pergunta. Ao aproximar-se ela enfatizou a localização do preço em um produto igual que estava ao lado do primeiro, acrescentando: "Sessenta e seis reais." Enquanto lançou um olhar que implicava aquilo ser caro para ser adquirido por alguém como quem a questionara. Foi então decidido que seria feita ali mais uma compra. E mais uma panfletagem.

A personagem achou um objeto que a agradou, por um preço razoável. Aproximou-se de outro funcionário e perguntou: "Boa noite, os senhores trabalham com comissão neste lugar?". Ao receber a resposta positiva do mesmo, perguntou então: O senhor então poderia me vender isto aqui?". A "funcionária dos R$66,0" olhou assustada em direção a cena.

No balcão do caixa o tratamento já era diferenciado, já que aquela pessoa a sua frente havia instantaneamente se transformado, de preocupação à cliente. Mais uma vez a surpresa ao receber o cartão de crédito das mãos da mesma. Destrinchou-se uma conversa amigável com a Personagem enquanto a compra era concluída e assim que finalizada ela foi acompanhada até a porta pelo funcionário que não necessariamente lhe atendera, mas a quem a compra seria comissionada. Foi pedido a ele então que desse a "funcionária dos R$66,0" um panfleto. Ele concordou sem entraves.

Estava finalizado o ato. Mas até que a personagem se retirasse do local, ainda havia o um preconceito hostil tangível.

V. CONCLUSÃO

Embasados na aplicação do conceito de subliminar tanto no "Ato" em si, quanto na panfletagem que foi feita após a sua realização. O subliminar atendeu ao subversivo conceito de extenuar preconceitos, e teria, portanto relação com o decorrer da Ação em si, podendo então ser considerado sintático pois teria a função de agente intensificador do significado da mensagem. Assim como também foi utilizado seguindo os conceitos do Manual Prático de Delinqüência Juvenil, sendo que tinha como objetivo despertar o pensamento acerca do tema, o auto-conhecimento das atitudes daqueles que foram afetados pelo ato diretamente e incorporar o conceito de valorização do ser acima daquilo que ele aparenta.

Com base no conceito social empregado ao signo Roupa, e sua caracterização sendo aplicada há um contexto social que difere do ambiente ao qual pertence, expressamos abertamente seu caráter limitador e fronteiriço, que divide em grupos os usuários do signo em questão. Assim como também explicitamos a discriminação social, por intermédio de representar uma personagem cujo o signo Roupa passasse a clara mensagem de tratar-se de uma pessoa de poder aquisitivo fraco, pertencente à classe econômica baixa, que ao freqüentar um local de hábito da classe média (e classes superiores) se destacava por supostamente não pertencer àquele cenário.

A atenção despendida pelas pessoas que entraram em contato de alguma forma com o Ato ressalta que nossa "movimentação" do cotidiano foi bem sucedida. Mesmo aquelas que somente observaram a Personagem passear pelo shopping, tiveram despertados em si uma série de conceito referentes à sociedade, economia, preconceito, etc. Esperamos que, não só de forma que esses conceitos que emergiram na superfície de sua mente tenham sido sentidos, mas como também tenham sido subitamente repreendidos pela fraca moral e ética que é ensinada nos dias atuais. Tornando esses indivíduos confusos quanto sua própria forma de agir e pensar. Revelando-os feios à quem mais nobres eles aparentam, eles mesmos.

Assustou-nos perceber não a discriminação social em si, mas sim a não preocupação de seus agentes em escondê-la. Vivemos em um país com heranças históricas traumatizantes para a maioria dos grupos menos favorecidos, heranças essas que configuraram os prelúdios não só da situação econômica da população, mas também os conceitos de suas pretensões primitivas onde o homem subjuga o homem levando em consideração vestimenta, dinheiro, linguagem e bens, em detrimento do caráter, onde apesar dos avanços tecnológico, políticos, educacionais e sociais, o ser humano apesar de considerar-se culto, bem informado, educado e sociável , alimenta dentro de si preconceitos enraizados em seu íntimo, nem tão profundamente como esperávamos.

Os mesmos indivíduos que torcem pelo casal "Homem pobre, mulher rica"(e vice-versa) ficarem juntos na novela, são os que torcem o nariz ao verem alguém oriundo das favelas. E mesmo ao analisarem a situação dos casais de classes econômicas e sociais divergentes na vida real, suas primeiras suposições não começam com "deve ser o amor verdadeiro", mas sim "deve ser por interesse".

Mais do que saber que a discriminação existe, é senti-la na pele, como nossa Personagem. Que foi algumas vezes destratada, algumas vezes ignorada, mas sempre observada. Levando-nos a pensar que essa situação se repete a outros representantes das classes menos favorecidas que chegam a entrar em contato com o esse "mundo", que supostamente é de todos, já que é denominado "público" mas que porém excetua todo e qualquer individuo que não se encaixe a ele, se não sendo pela força então pela humilhação.

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