Quem se utiliza dos benefícios da internet e do correio eletrônico sabe da inconveniência em se receber mensagens indesejadas. Em segundos, a caixa de e-mails fica lotada de bobagens. É o spam, e, geralmente, são propagandas que querem nos convencer de alguma idéia, ou vender alguma coisa. Isso, somado as indesejadas chamadas telefônicas que invadem nossa privacidade, acaba por constituir-se em mais uma das ninharias estressantes em nosso cotidiano.

É bem verdade que a liberdade da livre expressão é um direito assegurado aos cidadãos, inclusive, por normas internacionais. A Declaração de Direitos do Homem, de 1789, por exemplo, dispõe que “a livre comunicação dos pensamentos e das opiniões é um dos direitos mais preciosos do homem; todo cidadão pode, pois falar, escrever, exprimir-se livremente, sujeito a responder pelo abuso desta liberdade nos casos determinados pela lei”.

Quem pratica o spam, em nosso país, também o faz sob o amparo legal e constitucional do direito de livre pensar e da livre expressão de idéias garantidas pelo artigo 5º. da Constituição Federal. Por outro lado, quem o recebe, tem, também, assegurado o direito constitucional com relação à preservação de sua privacidade.  Quer dizer: quem se expressa se expressa pelo direito de se expressar e quem se sente invadido, incomodado, argumenta que deve ter assegurado o seu direito de não ser assediado. A questão é tão grave que alguns provedores têm mecanismos para inibir essa invasão de privacidade, e, assim, proteger seus usuários dos malefícios do spam virtual.

Ocorre que, se observarmos bem, podemos verificar que o spam, como recurso de mídia, há muito migrou para além do espaço virtual, invadindo o dia-a-dia do espaço público. Este é um fenômeno que começa a ser identificado como "spam urbano", e, tal qual acontece no ambiente virtual, submete-nos a um meio ambiente altamente caótico e poluído, influindo no nosso comportamento, e, mesmo, na nossa saúde física e mental.

Em algumas sociedades, começa a surgir uma nova onda de reação e crescente preocupação com a prática agressiva de publicidade, em outdoors, shoppings, aeroportos, táxis, supermercados, consultórios e aonde quer que estes espaços sejam perniciosamente invadidos. E, algumas cidades, no mundo, já regulamentam essa questão.

Em nossa cidade, não é diferente. A mídia externa tem sido usada abusivamente. Inadvertidamente, instituiu-se a prática da publicidade de rua como mídia para qualquer mensagem. Mas, quem duvida que os folhetos entregues nos sinaleiros, embaralham-se e se confundem com as mais variadas informações, perdendo, consequentemente, a eficácia da informação que pretendem comunicar.  Será que, realmente, os outddoors perfilados e expostos por toda a cidade atendem à demanda da propaganda da mensagem que veiculam?  Que dizer das gigantescas propagandas nas laterais dos edifícios?

             Mesmo em meio aos mais agudos protestos de setores mais diretamente afetados, em 2005, o governo municipal da cidade de São Paulo fez um enfrentamento corajoso dessa questão. E, sob a lúcida coordenação de uma arquiteta urbanista - cujo texto inicial foi ampliado na Câmara de Vereadores – o 1º. janeiro de 2006 marcou, no Brasil, o início do combate ao spam urbano.

A partir daquela data, a promulgação da Lei Municipal Paulistana 14.233/06 - Cidade Limpa - inibe os exageros e regulamenta o uso dos espaços públicos com relação à exposição de outdoors, pinturas em prédios com fins publicitários, painéis luminosos gigantes, telões eletrônicos, faixas, banners, propaganda em táxis e, ainda, a distribuição de panfletos na rua. Além disso, também, limita tamanhos das placas indicativas das empresas. A redação do texto inicial de autoria da diretora do meio ambiente e paisagem urbana da Empresa Municipal de Urbanização, já restritivo, foi enfatizada com mais rigor pelos vereadores. A multa mínima para quem descumprir a lei foi fixada em 10 mil reais.

            O que é importante é que se saiba que a lei Cidade Limpa, da Prefeitura de São Paulo, objetivando remediar o caos urbano e a poluição visual da cidade não é pioneira no mundo, mas é a primeira adotada no Brasil. É corajosa, e, coloca em embate os opositores. Mexe em um mercado que emprega cerca de 20 mil pessoas e movimenta centenas de milhões de reais, só na cidade de São Paulo.

            É óbvio, contudo, determinar quem sai ganhando com a lei.  Como toda mídia exterior é compulsória, não há qualquer possibilidade de que o cidadão comum e usuário do espaço público tenha qualquer opção sobre as mensagens publicitárias que lhe são expostas na paisagem urbana. Afinal, não se podem fechar os olhos, na via pública e, mesmo que procure não captá-la, o indivíduo já foi capturado e induzido à interação com a mensagem já recebida. Ou seja, desde que se saia à rua,  nosso direito á liberdade de escolha já foi pro brejo.

            Em meio a tanta “desinformação poluente” em que nos vemos mergulhados, talvez, seja hora de questionar: deixar a poluição visual invadir nossa cidade - influir em nosso cotidiano, alterar nossa saúde - como já se pode constatar, é bom para quem, “cara pálida”? Que tal, se essa publicidade ostensiva, invasora do nosso meio urbano migrasse para os veículos impressos? Será que não alcançaria mais diretamente seus públicos, respeitando o direito do cidadão de desfrutar de uma cidade mais limpa e saneada dessa virose que se tornou o  spam de rua?

            Talvez pudéssemos iniciar um debate público sobre o assunto. É o que propomos agora. Com a palavra, os setores diretamente relacionados e os políticos de nossa cidade, antes que seja tarde demais, e, Campo Grande se veja totalmente poluída, oculta por um muro instransponível imposto pela utilização abusiva dos nossos espaços públicos, pelos quais pagamos – religiosamente e muito bem - com nossos IPTUs.