Vivemos numa encruzilhada. Em nossostempos, na sociedade de consumo, o que conta é o que você tem ou consegue ostentar. Ser sábio ou não, ter estudado ou não, parece algo insignificante. Se você estudou ou não isso tem pouca importância diante da capacidade de consumo: você tem capacidade de consumo, então você vale, pois nesse caso demonstra ter. Afinal, o que o fato de ter frequentado esta ou aquela instituição de ensino pode ajudar a se sobrepor aos outros, se a onda do mundo é a capacidade de ostentação? Paradoxalmente em relação ao principio aristotélico da identidade, a pessoa é não o que é, mas o que parece ser; as pessoas são vistas não em sua essência, mas em sua aparência. A aparência é a essência da sociedade atual, vamos dizer assim, apenas para abusar da aliteração.

Isso posto, podemos reafirmar: estamos numa encruzilhada da história: antigos hábitos e novas posturas se opõem. Neste ponto é que podemos colocar nossa questão, sobre estudar. De fato, se pensarmos o mundo e as relações sociais a partir desse valor – capacidade de ostentação – estudar não é importante, mas pode ser, além de um detalhe, algo útil, para mais se sobrepor aos demais: "tenho um diploma!"... estuda-se, portanto, não em busca do saber, mas na perspectiva do aparecer. Desse ponto de vista, estudar passa a ser mais um mecanismo de ostentação, e, sendo assim, esse estudo é inútil como caminho para a sabedoria, pois sua finalidade é utilitária, ostentatória. E quem assim procede, não estuda, apenas passa pelos bancos escolares – quem sabe, até, ocupando o lugar de quem gostaria de estudar...

Mas vejamos mais algumas dimensões do estudar; ou do processo de manter-se constantemente em processo de formação.

É verdade que tem muita gente que não está estudando para aparecer socialmente; ou apenas para ter o canudo como escada e status. Tem muita gente, e sabemos disso, que leva a sério seu ofício de estudante. São esses que fazem nosso ofício de professor valer a pena!

Entretanto, e isso é a mais pura verdade, tem muitos outros que estão estudando para "se dar bem" financeiramente. "Estou fazendo esse curso para arrumar um bom emprego e me dar bem na vida" dizem muitos de meus alunos, quando indago sobre seus objetivos de vida, no primeiro dia de aula. E, infelizmente, nessa resposta existem alguns equívocos, para a motivação do estudar: o primeiro é o fato de "estudar para ter um bom emprego". Esse ainda não descobriu que o volume de novas vagas de emprego decresce na mesma proporção que aumenta a população; não foi avisado que anualmente o número de pessoas que entram no mercado de trabalho é maior do que o número de pessoas que se aposentam (ou morrem) deixando os postos de trabalho à disposição dos novatos; portanto não adianta estudar para ter um bom emprego, se não há emprego. Isso dito de outra forma requer a afirmação de que as empresas não crescem ao ponto de produzir, anualmente, mais e novos postos de trabalho absorvendo todos os novos candidatos às vagas.

Outro equivoco é uma repetição do que foi dito acima: os empregos estão diminuindo. Novas tecnologias estão automatizando e ocupando, cada vez mais, os postos de trabalho. E isso nos leva a outro equivoco: quem estuda em função do emprego acaba não desenvolvendo o espírito crítico, criativo, empreendedor. E sem capacidade empreendedora num mercado de trabalho em que decresce o numero de empregos, o camarada corre o risco não só de ficar para trás, mas, concretamente terá cada vez menos chances de encontrar um empresário que necessite de um cumpridor de ordens. Além disso, tem um outro equivoco, tão grave quanto os demais: quem estuda pelo emprego, não estuda, está apenas buscando um "canudo", um diploma, um certificado... esse, também estará condenado a fracassar, pois sairá do final do curso tão incapaz quanto entrou, pois não valorizará a busca do saber. Esse tipo está focado no final do curso, para pegar o certificado, quando sabemos que na atual conjuntura não são os certificados que contam, mas os conhecimentos relevantes e a capacidade de criar novas soluções.

Se o que conta é a capacidade criativa e empreendedora, e isso não é uma disciplina que conste do currículo de qualquer curso, então por que estudar? Essa parece ser a grande questão de quem não se propõe a ser estudante.

Não pretendemos ser guru da reforma social, mas podemos dizer que se as oportunidades para quem estuda estão em declínio, para quem permanece parado no tempo as oportunidades são "bananeira que deu cacho". Se admitimos que o mundo está numa encruzilhada, implica dizer que estamos em tempos de tomadas de decisões. Isso nos leva a afirmar a importância da história e da filosofia. A história para nos ajudar a olhar o passado e aprender suas lições; a filosofia para nos ajudar a refletir sobre as possibilidades. Importa desenvolver a postura do historiador e do filósofo: para sermos capazes de perscrutarmos as possibilidades. A história e a filosofia nos ajudam a perceber que ao longo dos tempos, nos momentos em que a humanidade se viu em encruzilhadas, não foram as respostas exatas que mostraram o caminho, mas os caminhos foram sendo criados a partir das perguntas dos que não se enquadravam nos moldes preestabelecidos.

Então estudar para quê? Para não morrermos com as respostas prontas atoladas na garganta. Já cantou a Rita Lee: "Mas todo mundo que é genial/ Nunca é descrito como normal". A humanidade saiu das encruzilhadas quando foi capaz de "passar a borracha" nas seguranças. Atente para os versos de Raul Seixas, falando do "carimbo positivo da ciência que aprova e classifica / O que é que a ciência tem? / Tem lápis de calcular / Que mais que a ciência tem? / Borracha pra depois apagar. Você já foi ao espelho, nego? Não? Então vá!".

Neri de Paula Carneiro – Mestre em Educação, Filósofo, Teólogo, Historiador.

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