Só um pedaço de pizza.


S
eus olhos de sub-nutrido, pousaram o olhar faminto nos pedaços de pizza simetricamente colocados numa bandeja. Como digno representante do povo e desempregado que era, meteu a mão no bolso, onde deveria estar o dinheiro. Não estava.

Perdera?  Fora roubado?  Onde?  Como?  Quando? Quem?

Milhares de interrogações inúteis desfilaram por sua mente.

Reviu a fome comendo gente, além de si mesmo. Ouviu “heróis” falando muito e fazendo nada. Assistira a morte de muitas amizades e tudo parecia, apenas, um “vídeo-tape do futuro”.

Sentiu saudade de um tempo que teve para viver, mas não viveu. De tudo que poderia ter feito, mas não fez.

Olhou mais uma vez para os pedaços de pizza convidativos. Mas teve de conviver com mais aquela perda.

Depois, bem, depois verificou que o dinheiro perdido, ou roubado, não daria mesmo para comprar nem meio pedaço de pizza. Sentiu uma dupla sensação de vazio: no estômago pela fome, na alma pela decepção de existir dessa forma.

Como consolo, recolheu seu olhar faminto e saiu caminhando pela rua, com as mãos vazias enfiadas nos bolsos idem.

Enquanto andava, tentava calcular quanto deveria ter custado (e a quem), toda aquela propaganda política que emporcalhava mais ainda a cidade.

Respirou fundo, tentando se convencer de que valia a pena, ainda, acreditar que um dia tudo isso mudaria...