A prática do desmatamento em áreas de florestas tropicais, em tempos passados, era uma atividade que pouco ou em nada sensibilizava a sociedade. Entretanto hoje, a devastação dessas florestas possuidoras de grandes recursos animais e vegetais, chegam a constituir-se em assunto de preocupação mundial. Segundo a literatura, o custo sócio-econômico e ecológico da destruição das florestas nativas tropicais é extremamente elevado, especialmente na Região Amazônica, onde centenas de imigrantes foram assentados fazendo uso da prática do desmatamento para dar lugar a exploração de pecuária extensiva e cultivo de lavouras com espécies ditas de ciclo curto, como arroz, milho, feijão e mandioca. Por outro lado nada é citado a respeito do custo/benefício proveniente da exploração desordenada da floresta nativa por madeireiros instalados em nossa região.
Atualmente muito se tem discutido no intuito de se criar um modelo de desenvolvimento sustentável para a Amazônia. Porém esta região que corresponde a 60% da superfície do território nacional ainda não dispõe de uma atividade agropecuária que norteie o seu futuro para um desenvolvimento econômico e social. Muitos fóruns locais, regionais, nacionais e internacionais têm tratado a problemática do modelo que deve ser implementado nesta região, sem no entanto ter alcançado o êxito desejado.
O surgimento do conceito de "desenvolvimento sustentável", no final da década de 1980, sinalizou também para a abordagem sociocultural das questões ambientais, através da maior responsabilidade dos atores sociais diante as questões atinentes ao meio ambiente e a erradicação da pobreza. Este conceito veio a reforçar a tendência de uma exploração ordenada e racional dos recursos naturais, em detrimento a modelos conservacionistas. Desta forma, o termo "desenvolvimento sustentável" tem a pretensão de significar a garantia de que uma nação pode se desenvolver sem comprometer as condições básicas ambientais necessárias às próximas gerações.
Sendo assim dentro deste enfoque, o uso dos sistemas agroflorestais designados também nos meios acadêmicos como SAF?s são freqüentemente apontados como uma das opções viáveis, quando se questiona estratégias de uso sustentável da terra em regiões tropicais do Brasil, especialmente em se tratando de áreas da Amazônia.
Apesar da popularidade crescente que os sistemas agroflorestais vêm experimentando, em muitas regiões, particularmente em áreas tropicais, ainda existem inúmeros questionamentos não respondidos, muitos deles, inclusive com respeito a questões básicas sobre as funções que estes sistemas podem exercer e as vantagens e desvantagens em comparação a outros sistemas de exploração da terra.
Entre outros conceitos, os sistemas agroflorestais podem ser entendidos como um nome coletivo para todos os sistemas e práticas do uso de terras, onde as espécies perenes lenhosas são deliberadamente plantadas na mesma unidade de manejo de terra com cultivos agrícolas e/ou animais, tanto em mistura espacial ou seqüencial temporal, com interações ecológicas e econômicas significativas entre os componentes lenhosos e não lenhosos (Lungren, 1987). Esta definição indica a natureza multifacetada dos sistemas agroflorestais, além do que, mostra as diversas funções que são importantes no manejo da terra.
Para implementação de um sistema, torna-se imperativo o diagnóstico da realidade em que o mesmo será inserido. Desta forma, deve-se analisar as características sociais da comunidade local (o nível educacional, estado nutricional, idade dos residentes, divisão de trabalho, etc..), as características ecológicas ( o solo, clima, biodiversidade, topografia, etc..), como também as características econômicas ( mercado, fluxo de caixa, etc..).
A própria geração de tecnologia deve ser baseada na produção atual. Algumas interrogações devem ser levantadas: Como é a estrutura social? Qual o potencial do solo ? Como se comporta o mercado? Quais as práticas de cultivo? . Pode ser que em algumas épocas do ano haja disponibilidade de mão-de-obra ou então que os períodos de entresafra tragam até fome. Um sistema agroflorestal não se desenvolve no escritório, mas sim no campo. Deve-se adotar uma atitude de ouvir o produtor, aprender como se utilizar da cultura popular, estabelecer uma fluência de comunicação. Os agricultores devem ser vistos como co-autores do trabalho, como agentes do processo.
O termo sistemas agroflorestais é relativamente novo, mas corresponde a práticas antigas, realizadas por populações tradicionais de mundo inteiro, tanto em clima tropical como subtropical. O que ele resgata é a necessidade de um novo modelo de desenvolvimento, com uma nova filosofia ? o desenvolvimento sustentável. Esse desenvolvimento deve ter base nas potencialidades do próprio sistema, ir a favor da natureza e não contra ela. As tecnologias utilizadas devem ser simples, práticas, de baixo custo de investimento. Os sistemas devem ser economicamente e socialmente viáveis. A sustentabilidade econômica e social pressupõe na sua inclusão a diversificação econômica, industrialização local, participação da população local e melhoria da qualidade de vida. Em termos de sustentabilidade ecológica são vitais os seguintes aspectos: a conservação dos recursos naturais e o uso intensivo de árvores, sendo que estas últimas têm papel fundamental na ciclagem de nutrientes, no equilíbrio hídrico e no controle da erosão.
Portanto para se estabelecer um sistema agroflorestal é necessário se conhecer a unidade física a ser trabalhada e identificar todas as suas potencialidades, especialmente a biodiversidade. Deve ser questionado qual o espaçamento e quando plantar, pois uma densidade muito grande de plantio causará menor produtividade devido à competição por água, luz e nutrientes. Por outro lado, um espaçamento muito grande será desperdício de espaço, o que fará a produtividade por área também ser baixa. Para determinar quando plantar deve-se levar em conta se haverá utilização de fogo, o que pode inviabilizar o plantio simultâneo de outras espécies. Outro fator a se considerar é que existem espécies que necessitam de sombreamento. Desta forma, a complexidade dos sistemas agroflorestais faz com que existam vantagens e desvantagem na sua adoção. Como vantagem pode ser mencionada: ação compensatória (maior eficiência na utilização dos fatores de produção ? água, luz e nutrientes), menor incidência de plantas daninhas, maior estabilidade ecológica, melhor alimentação para o agricultor, maior proteção do solo contra erosão, maior produtividade, melhor distribuição de mão-de-obra ao longo do ano, menor variabilidade na produção e menor risco econômico. Como desvantagem, pode ser citada: dificuldade de manejo das culturas, dificuldade no planejamento (maior complexidade devido as interações do sistema), eventual maior incidência de pragas e doenças e falta de pesquisa em sistemas agroflorestais no Brasil.
Pelas considerações observa-se que os sistemas agroflorestais não são as fórmulas mágicas para corrigir todos os males do setor agropecuário da Amazônia, mas representa um instrumento importantíssimo e um avanço significativo em direção ao desenvolvimento sustentável. O que fica patente, em função do conhecimento atual, porém, é que essa forma de exploração da terra, talvez mais do que outra, deva ser abordado com extrema cautela para cada região em que ocorrerá a sua adoção.

Emanuel Cavalcante- Pesquisador da Embrapa Amapá
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