SISTEMA DE COTAS: AÇÃO AFIRMATIVA E/OU AÇÃO DE EQUIPARAÇÃO?

Arivaldo Caudas1

Hanna Martins2

Joyce Pacheco3

Maria Augusta Lima das Neves4

    Josane Daniela Pinto5      

RESUMO

                Esse artigo tem como principais objetivos: discutir as questões que permeiam a criação do sistema de cotas raciais nas universidades brasileiras, debater e justificar a implantação desse sistema como ação afirmativa de equiparação social e mostrar os prós e os contras dessa ação governamental.

                Alguns autores evidenciam certa discriminação na criação e na aplicação dessa política por perceberem que ela só confirma a discriminação racial já existente na sociedade. Porém, existem aqueles que visam provar através de fatos históricos e dados estatísticos que a implantação desse sistema é uma forma de inserção das classes menos favorecidas (devido à cor da pele ou etnia a qual pertença) na educação e consequentemente nas suas áreas de atuação profissional.

                O tema proposto levanta e provoca grandes debates, o que contribui para o elevado número de indagações e discussões a respeito da aplicação e o uso devido do sistema de cotas, e se esse sistema tem sido, ou não, uma ação afirmativa de inclusão da comunidade negra nas universidades brasileiras.

                O sistema de cotas é uma ação realmente necessária? A cor da pele e o histórico social influenciam no número de negros nas universidades brasileiras? A solução para uma educação igualitária seria o sistema de cotas? A comunidade negra tem sido a única beneficiada com a legislação dessa ação política? Por essas e por outras questões, esse artigo vem como forma de complementação de conhecimento sobre o uso eficaz do sistema de cotas e das medidas tomadas para o sucesso dessa ação de equiparação social.

           

Palavras-chave: Negro. Discriminação. Política. Cotas. Projeto.

 

INTRODUÇÃO

                Como o Brasil foi o último país no mundo a abolir a escravidão em 1988, ele acarretou para si o fardo social que se estenderia até os dias atuais, pois todo esse processo de desenvolvimento da sociedade brasileira esbarra no período histórico sofrido pelos negros na época da escravidão.

            Mesmo depois da abolição da escravatura, o negro não possuía os mesmos direitos que os brancos, talvez essa seja a razão central para que houvesse a formulação e a necessidade da criação de uma ação política de equiparação. A comunidade negra sempre lutou por uma sociedade sem discriminação, e através de ações persistentes e reivindicações, pressionaram o governo à criação de uma ação política afirmativa voltada para essa comunidade, que há vários anos vem lutando para a reparação e equiparação dos direitos da comunidade negra no país.

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1Aluno do curso de Letras da Escola Superior Madre Celeste; E-mail: [email protected]

²Aluna do curso de Letras da Escola Superior Madre Celeste; E-mail: [email protected]

3Aluna do curso de Letras da Escola Superior Madre Celeste; E-mail: [email protected]

4Mestre em Gestão e Desenvolvimento Regional, Especialista em Gestão Educacional, Graduada em Pedagogia, Professora     Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Pará, Faculdades Integradas Ipiranga, Universidade Estadual Vale do Acarau, Faculdade Pan Americana, Orientadora do artigo; Email: [email protected]

5Mestre em Linguística Aplicada, Professora Universidade do Estado do Pará, Escola Superior Madre Celeste, Coordenadora do Curso de Letras; E-mail: [email protected]

                A solução encontrada pelo governo para amenizar os padrões de desigualdade racial existentes, foi criar uma política de equiparação eficaz, formulada a partir do reconhecimento de discriminação racial denominada: Sistema de Cotas.

                O Sistema de Cotas foi criado com o intuito de acelerar a inclusão social de grupos considerados à margem da sociedade, para beneficiá-los com uma porcentagem de vagas exclusivas nas universidades brasileiras, pois estes teriam maior dificuldade para aproveitarem as oportunidades de trabalho e educação, além de sofrerem discriminações por causa da cor da pele e/ou histórico social.

 VESTÍGIOS DA ESCRAVIDÃO NA SOCIEDADE

                O racismo constituiu-se historicamente, e isso é um fato social. Essa afirmação confirma, mas não justifica as diferenças que envolvem cidadãos de raças diferentes. A escravidão foi um fato econômico, e não racial, por isso, a genética comprova que a cor de pele, em si, é um elemento incapaz de indicar a ascendência real de uma pessoa, por isso não adianta tratar os indivíduos com um tratamento universal, se eles são desiguais não somente em termos étnicos, mas também em outras formas de distinções sociais, como disse Goldberg:

 Quero sugerir que embora a raça tenha tendido historicamente a definir condições de opressão, ela pode, sob uma interpretação culturalista (...) ser o lugar de um contraataque, um solo ou campo para deslanchar projetos de libertação ou a partir do qual se poderia expandir a(s) liberdade(s) e abrir espaços emancipatórios. (1995, p.211)

                 As pessoas não podem ser tratadas exatamente da mesma forma apenas por serem de raças diferentes, a realidade social evidencia uma diferença histórica entre grupos específicos, mas o fato de um ou outro grupo não ter privilégios equiparados não significa dizer que esse não seja capaz de alcançar espaços maiores na sociedade na qual está inserido, com ações e projetos que os libertem de uma visão histórica distorcida sobre suas condições reais de igualdade, como observou Pierucci:

 No fundo, tudo se passa no campo das esquerdas como se aqueles que defendem a diferença e a celebram soubessem que transportam uma carga explosiva que, mal usada, pode detonar um potencial destrutivo cujos alvos serão, com toda a certeza, os indivíduos e os grupos mais frágeis, subordinados, oprimidos, discriminados e estigmatizados que de saída se queria defender, promover, resgatar, libertar e assim por diante. (1999, p. 49)

 Nessa perspectiva, pode-se dizer que há espaços institucionais que determinados grupos étnicos não têm acesso por não possuírem recursos e muito menos a oportunidade de exercerem seus direitos como cidadãos que são, pois a elite sempre terá benefícios sociais reais e não somente ônus meramente ideológico.

 AÇÕES AFIRMATIVAS IMPLANTADAS NO BRASIL

                Ações afirmativas como essa já não são aplicadas pela primeira vez no Brasil. Podemos citar ações que propiciaram benefícios às pessoas portadoras de deficiência física e até políticas públicas voltadas à garantir patamar de igualdade entre homens e mulheres. Porém, as cotas para negros pode ser considerada uma ação relativamente recente no Brasil, ação afirmativa essa que diferentemente dos outros sistemas de discriminação positivas anteriores, causam muita polêmica e prolongados debates entre indivíduos com distintas opiniões sobre as mesmas.

             De acordo com leis constitucionais é obrigatória a reserva de vagas em concursos públicos que serão destinadas à portadores de necessidades especiais.  Observa-se, porém  que, o emprego ou cargo não exija plena aptidão física. Isso marca o inicío da reserva de vagas para grupos específicos no Brasil. Com o tempo, outros grupos sociais passam a pleitear a cotização de vagas para "Assegurarem" uma participação mínima em certos setores da sociedade como as universidades públicas.

  A adoção de reserva de vagas nas universidades, começa em 2000, com a aprovação da lei estadual 3.524/00 de 28 de dezembro de 2000. Esta lei garante a reserva de 50% das vagas, nas universidades estaduais do Rio de Janeiro, para estudantes das redes públicas municipal e estadual de ensino. Esta lei passou a ser aplicada no vestibular de 2004 da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e na Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF). A lei 3.708/01 de 9 de novembro de 2001, institui o sistema de cotas para estudantes denominados negros ou pardos, com percentual de 40% das vagas das universidades estaduais do Rio de Janeiro. Essa lei tem como critério ate entao a cor da pele e questões socio-economicas.

No Brasil, no que diz respeito a educação, temos o programa de bolsa escola,que favorece as populações de baixa renda e as incentiva a a mantere  seus filhos estudando. Objetivando, dessa forma, combater o trabalho infantil. Como podemos ver, é claramente utilizado  o critério econômico para oestabelecimento dessa política.

Já a nivel de ensino superior ainda não há um consenso sobre que rumo deve ser seguido para a melhoria do mesmo temos o projeto de lei n. 73/99 que estabelece reservas de vagas nas universidades públicas para alunos que tenham cursado o ensino médio em escolas públicas e que leva em conta, também, a percentagem de negros e indígenas nos respectivos estados da federação.

As primeiras propostas do governo federal para a reforma das universidades públicas contemplavam cotas sociais e raciais, mas devido a pressões da sociedade e o fato de já haver em tramitação no congresso o projeto de lei n. 73/99 essa questão foi retirada da pauta da atual proposta de reforma.

Em termos de experiências, diversas universidades públicas no país já adotaram o sistema de reserva de vagas para negros e indígenas. O Programa Universidades para Todos (PROUNI) também assegura a inclusão de alunos de escolas públicas em instituições  privadas de educação superior, e entre esses alunos leva em consideração o  percentual de negros e indígenas da população deste estabelecimento de ensino.

De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei 9.394/96) é dever das universidades o estabelecimento dos critérios que devem ser utilizados na seleção dos estudantes, tendo em vista a repercussão desses critérios sobre o ensino médio. Essa lei tem amparo no artigo 207 da Constituição Federal que garante às universidades autonomia didático-científica.

 DECISÃO E REPERCUSSÃO DO SISTEMA DE COTAS

A aprovação pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no que diz respeito ao sistema de cotas foi confirmada no dia 9 de maio de 2012, sistema esse já adotado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). As cotas nessas universidades concederam benefícios somente a pessoas de cor negra e parda diferentemente das outras formas já instituídas, que as concediam independentemente da cor ou raça, com o objetivo de “exterminar” desigualdades amparadas em discriminação em relação a sexo, condição econômica e não racial.

A decisão foi tomada no julgamento do Recurso Extraordinário (RE 597285), com repercussão geral, em que um estudante questionava os critérios adotados pela UFRGS para reserva de vagas. A universidade destinava 30% das 160 vagas a candidatos provenientes de escola pública e a negros que também tenham estudado em escolas públicas (sendo 15% para cada), além de 10 vagas para candidatos indígenas.

Foi relator do recurso o ministro Ricardo Lewandowski, que votou pela constitucionalidade do sistema por entender que os critérios adotados pela universidade gaúcha estavam em conformidade com o que já havia sido decidido na ADPF 186, em que o Plenário confirmara a constitucionalidade do sistema de cotas adotado pela Universidade de Brasília (UnB). O Debate sobre a constitucionalização de cotas no contexto brasileiro coloca em pauta inumeras questoes delicadas.

A relação do indivÍduo e a sociedade, a relação da universidade e a sociedade, a questão do preconceito racial, e atpe mesmo de uma possivel segregação de uma raça já sofrida séculos atrás tais argumentos ora enfatizam problemas mais internos da universidade e suas implicações administrativas, ora levantam questões de natureza mais política e filosófica que se referem ao modelo de sociedade que desejamos.

Um argumento significativamente relevante em favor das ações afirmativas é o da necessidade de reconhecimento de todos os grupos sociais como iguais, nesse caso possibilitando essa interação entre as “raças” nas universidades essa meta poderia ser alcançada com maior facilidade.

 CONCLUSÃO

Na medida em que que o vestibular deixa de lado uma população tão numerosa como a dos negros e pardos brasileiros, passa-se a idéia de que o lugar que forma a elite nacional pode prescindir da contribuição de quase metade da população brasileira.  Esse argumento tem a ver, em parte, com o significado dos modelos para as novas gerações. É importante para os jovens negros verem outros negros bem sucedidos como profissionais nas áreas do Direito, Medicina, nas atividades de pesquisa etc

Fica claro, que essa legislação surgiu com o objetivo de saldar o débito existente em nossa sociedade com os afro descendentes, com base nos seus longos anos de lutas por um espaço no meio social, bem como galgar posições igualitárias no plano de ensino, saber e conhecimento. Além disso, as ações afirmativas propostas pelo governo buscam extinguir as discrepâncias entre as elites, os pobres, os afro-descendentes, as mulheres, os analfabetos, entre outros, com formas de inserção das classes minoritárias no plano geral de sociedade passível de direitos e deveres como a Lei maior nos assegura. As cotas podem contribuir para a diminuição do abismo entre brancos e negros, mas não podem ser as únicas alternativas formas de melhoria no convívio e a integração social dessas etnias.

Cientes de que o sistema de cotas no Brasil segue um modelo importado de um país onde a realidade racial se opõe não em uma inexistência, mas sim com menor intensidade, devemos entender em que contexto ele pode ser aplicado a nossa nação- uma vez que a nossa realidade não está  pautada apenas na questão racial, mas sim quanto a sua classe econômica, étnica, cultural, etc.

 Sabemos que são divergentes as opiniões a cerca do sistema de cotas no Brasil e que em virtude dessas divergências são inúmeras as discussões quanto a sua aplicabilidade, vantagens e desvantagens, a quem esse sistema favorece e qual, de fato, é o objetivo desse sistema. Mas o que se deve entender é que, independentemente desse sistema funcionar ou não, há uma real necessidade de ultrapassarmos as barreias do preconceito social, quer seja racial, cultural, étnico, entre outros, e nos adaptarmos às diferenças sociais.

Por tanto, tentar entender o sistema de cotas como um meio de inserção de negros, índios, ou qualquer outra classe marginalizada em meios educacionais ou sociais, não nos remete a solução, mas sim apenas uma forma de amenizar o problema de discriminação que vem sendo construído ao longo dos anos.

 REFERÊNCIAS

 ALEXY, Robert, Teoria dos Direitos Fundamentais, Trad. Virgílio Afonso da Silva. 5. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2008.

 GOLDBERG, D. T. Racist culture: philosophy and the politics of meaning. Cambridge, Mass: Blackwell Publishers, 1995.

http://brasilescola.com/educacao/sistema-cotas-racial.htm

http://[email protected]

http://g1.globo.com/vestibular-e-educacao/noticia/2012

 PIERUCCI, F. Ciladas da diferença. São Paulo: Editora 34, 1999.