SISTEMA DE CONTROLE INFORMAL MODERNO:

A escola ludovicense e a manutenção do Labeling Approach  

Alberto Rachid Trabulsi Sobrinho[1]

Marcos Antônio C. Caminha[2]

RESUMO

Tratar-se-á com esse estudo analisar como a Escola contemporânea mantém os níveis de desigualdades sociais e criticamente tomar um posicionamento que permita uma reflexão sobre as condutas dos jovens de diferentes estratos sociais. Nesse sentido, analisaremos condutas de jovens oriundos dos meios sociais elevados e jovens dos mais baixos estratos socioeconômico. Objetiva-se, portanto, analisar condutas de adolescentes freqüentadores da rede particular e da rede pública de ensino na cidade de São Luís do Maranhão. Nesse contexto partiremos para uma reflexão sobre como as condutas são semelhantes e recebem da sociedade um tratamento diferenciado por conta da rotulação de marginalizado de uns e da proteção de outros embasando-se no poder econômico e/ou social. Para isso, buscaremos a teoria da Criminologia Crítica para embasarmos todo o artigo e as reflexões.     

Palavras-Chaves

São Luís. Escola. Maniqueísmo. Etiqueta 

1 Introdução 

Esse artigo apresenta como a Escola contemporânea contribui para manter o atual sistema neoliberal e suas desigualdades sociais. Nesse sentido, há dentro da sociedade sistemas que regulam a conduta dos indivíduos em favor da manutenção desse status quo. Portanto, há uma análise sobre a questão do sistema de controle formal e informal que compõe a sociedade burguesa atual.

          O sistema capitalista utiliza-se de práticas controladoras para manutenção do status deste quo. Nesse sentido, fizemos uma pesquisa de campo com jovens alunos de uma escola secundarista e alunos do primeiro ano de um curso superior em uma instituição que tem notoriedade social, ambas em São Luís do Maranhão.

         O maniqueísmo permeia a lógica burguesa e trata questões comportamentais de forma bem simples: os “bons” e os “maus”. Cabe uma reflexão sobre a relevância dessa teoria, tendo em vista que a rotulação – sustentada pela teoria do labeling approach - se faz embasada na lógica do ter e não do ser, portanto, as condições socioeconômicas do indivíduo ou da família ditam se o sujeito será etiquetado (mau) ou será protegido (bom) pelos sistemas formal e informal de controle social. 

         Nesse contexto, a teoria do Labeling approach indica que determinados indivíduos são etiquetados por conta da posição socioeconômica e que essa lógica para a rotulação A rotulação se mostra clara, alunos da escola pública secundarista recebem uma etiqueta de marginalizados e, conseqüentemente, de possíveis criminosos, em linha contrária, os alunos oriundos dos elevados estratos sociais - com um número maior de delitos - se colocam como inatingíveis pelo sistema jurídico-penal e pelo sistema de repressão ou molde da sociedade burguesa.

         Cabe ressaltar, o Estado burguês possui uma lógica que domina a sociedade atual e esta corrobora para a manutenção das desigualdades e, a Escola, que deveria ser um meio de quebra desse paradigma neoliberal de desigualdades sociais, contribui de forma evidente, contínua e “seletista” para manutenção esses aspectos.

                 

2 Noções de sistema de controle social

            Controle social é o “conjunto de instituições, estratégias e sanções sociais que pretendem promover e garantir referido submetimento do indivíduo aos modelos e normas comunitários” (Molina, 2002, p.133)[3]. Nesse contexto, é um sistema de forças coercitivas que regulam a vida em sociedade. Todo esse sistema regula as relações sociais e a conduta dos seres que estão dentro da sociedade. Nesse momento cabe ressaltar que esse sistema possui duas divisões, o sistema de controle formal e o informal. 

                  O controle social formal é formado por instituições estatais      como as polícias estaduais e federais, o Ministério Público estadual e federal, o Cárcere, e todo o aparato do sistema penal formal. No mesmo sentido e objetivo está o Sistema Controle Informal que é representado pelas as Escolas, os Centros Religiosos, a Mídia, o Mercado Neoliberal, e as Famílias. “Não se pode compreender o crime, a criminalidade e os criminosos sem compreender o controle social e penal que os constrói como tais” (Andrade, 2008)

                  Cabe ressaltar que esses sistemas de controle sociais se relacionam para que o objetivo de ditar a conduta humana se efetive. Nesse sentido, “Quando as instâncias informais do controle social fracassam, entram em funcionamento as instâncias formais, que atuam de modo coercitivo e impõem sanções qualitativamente distintas das sanções sociais.” Molina (2002, p. 134). No entanto, o controle social formal é claro e coercivo, já o poder do informal é sutil e está ligado aos valores, princípios e entendimentos sociais. No cotidiano, possivelmente já nos deparamos com situações em que alguns desses sistemas tolheram ou moldaram a conduta de indivíduos.                           

3 Noções de Labeling Approach

                  A teoria do labeling approach e a mudança do paradigma Criminológico (antes era o etiológico e passa a ser o da reação social) rompe com a Criminologia Positivista que embasava-se nos estudos de Lombroso (1983) e Ferri(1931) que tinham como base a potencialidade criminosa intrínseca(teoria ontológica[Andrade, 2003, p.35])  ao ser humano.

                  “Quando não consideramos como um simples ponto de partida, uma entidade natural para explicar, mas como uma realidade social que não se coloca como préconstituída à experiência cognoscitiva e prática” (Baratta, 2002 p. 86), portanto a nova Criminologia coloca-se uma ciência de analise das complexas relações sociais e os resultados que essas relações proporcionam[4].

                  É mister ratificar o conceito sobre labeling approach, portanto, é a teoria que coloca que o indivíduo é etiquetado como possível delinqüente embasado no sistema neoliberal de desigualdade social em que o poder econômico declara o lugar ocupado por cada cidadão, e o que determina esse lugar são as posses e o poder político-social. É, sem sombra de dúvida, uma rotulação negativa dada pelo Estado há algumas pessoas de forma seletista e por que não dizer, excludente, racista e sexista, seja em na formalidade do sistema penal ou mesmo nos sistemas informais de controle social. 

4 A Escola e a manutenção do status quo vigente

Existe uma correlação tênue entre as funções do sistema penal e a as funções da escola. As duas se empenham em manter a realidade social vigente e inclusive se completam, sendo essa segunda, uma instância inicial onde se manifestam diferenças e desigualdades sociais. Esta realidade se manifesta como uma desigual distribuição dos recursos e dos benefícios, correspondentemente a uma estratificação em cujo fundo a sociedade capitalista desenvolve zonas consistentes de subdesenvolvimento e de marginalização. (BARATA 2002 p.171)

Nas escolas estão explícitos vários valores da não reação social, o que denota a legitimação de um sistema de exclusão dominante e de marginalização precoce dos alunos (indivíduos). É interesse do Estado – enquanto manifestação política de uma classe dominante - que a seletividade, a exclusão social e a taxação de alunos pobres como criminosos, dentre outras coisas semelhantes, continuem a todo vigor, pois esse sistema encontra equilíbrio dentro dessas diferenças e dessas características.

Na tentativa de embasar um paralelo entre Instituições Particulares (geralmente freqüentadas pelos estratos elevados da sociedade) e Instituições públicas (freqüentada pelos estratos mais baixos da sociedade), elaboramos um questionário contendo perguntas a respeito de pequenos delitos deveras frequentes na sociedade brasileira.

É notório encontrar na sociedade valores maniqueístas que tem como características “uma forma de pensar simplista em que o mundo é visto como que dividido em dois: o do Bem e o do Mal.” (Lima, 2001) que os próprios indivíduos sofrem, contudo desconhecem que estão dentro desse contexto. Encontra-se também a ação severa do controle informal escolar que com mais facilidade e assiduidade rotula os estudantes das escolas públicas, ante aos das escolas particulares, de marginalizados, enquanto os alunos das escolas particulares não são atingidos por uma ação ou sanção do sistema formal por conta do poder sócio-econômico oriundo do neoliberalismo, visto que os delitos pesquisados foram mais freqüentes dentre esta última categoria.

Para a sociedade, os “maus” são criminosos ou pelo menos mais propensos a criminalidade, enquanto os “bons” são camuflados pela manutenção deste status quo vigente de dominação social. O status de criminoso é distribuído de modo desigual entre os indivíduos (BARATTA, 2002, p. 162).

Vera Andrade salienta:

A criminalidade se revela, principalmente, como um status atribuído a indivíduos mediante um duplo processo: a "definição" legal de crime, que atribui à conduta o caráter criminal, e a "seleção" que etiqueta e estigmatiza um autor como criminoso entre todos aqueles que praticam tais condutas. (ANDRADE, 2003, p. 41)

4.1 A pesquisa: uma experiência ludovicense

            Passemos agora para os resultados da pesquisa (ver anexo I). Portanto, foram consultados 30 alunos de uma instituição pública e 30 alunos de uma instituição particular e com média de 19 anos. Devido ao conteúdo delicado das perguntas, pois todas estavam relacionadas a crimes tipificados no Código Penal brasileiro (1940), pouparemos os nomes das instituições, bem como dos alunos que participaram da pesquisa.

Com critérios de cientificidade, contudo, elaborada sob moldes superficiais para tornar-se uma referência fidedigna para o estudo da criminologia, nossa pesquisa vem à luz comprovar as características de exclusão social, “etiquetamento”, maniqueísmo e de marginalização no seio da escola.

Estas evidências ficam claras, com antecedência às conclusões, posto que os alunos do último ano da escola pública ainda almejam – e muitos não terão sucesso – chegar ao nível superior de ensino, enquanto os que já estão no primeiro ano da faculdade particular em questão – embora tenham cometido mais delitos – já usufruem de sua imunidade enquanto parte de uma classe inatingível pelas rotulações dos sistemas de controle formal e pelo sistema de controle informal.

Óbvio, não estamos querendo, aqui, taxar este ou aquele aluno de criminoso ou mesmo tirar os méritos dos que conseguem ultrapassar os estigmas de sua referente classe social em prol de um futuro digno. Estaríamos com isso, apenas corroborando com o que somos totalmente contra. O objetivo é despertar o senso crítico e voltar os olhos com mais atenção para esse fato contundente e muito presente no ambiente escolar, que aqui pode ser chamado de exclusão, marginalização ou desigualdade social.

5 CONCLUSÃO

Em face das questões e dos métodos abordados para a elaboração deste presente trabalho é conclusão nossa que as características marcantes dos valores neoliberais vigentes consolidam as diferenças sociais e suas conseqüências dentro do ambiente escolar.

Um aspecto importante é a notoriedade com que os delitos pesquisados se mostraram mais presentes nos alunos da escola particular ante aos alunos da escola pública. Fato este que seria, no mínimo, contraditório, se não vivêssemos numa sociedade regida pelos ditames neoliberais e um sistema penal cuja função se faz instrumento das ideologias dominantes.

De certo, nos faz sentido instigar a classe acadêmica e as pessoas em geral a despertarem para uma reação crítica frente a esses aspectos neoliberais que “etiquetam” essas pessoas como criminosos, onde esse “ser” não corresponde, em sua maioria, a essa taxação. Percebe-se assim, que ficam intrínsecas as forças dos sistemas de controle formal e informal entrelaçadas em face da manutenção desse paradigma maniqueísta.  

REFERÊNCIA 

ANDRADE, Vera Regina Pereira de. Sistema penal máximo x cidadania mínima: códigos da violência na era da globalização – Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2003.

ANDRADE, Vera Regina Pereira de. Por que a criminologia ( e qual criminologia) é importante no ensino jurídico?  Revista Eletrônica de Ciências Jurídicas, 2008. Disponível em: http://www2.mp.ma.gov.br/ampem/artigos/Artigos2008/ARTIGO%20-%20VERA%20ANDRADE%20-%20ENSINO%20DA%20CRIMINOLOGIA.pdf>. Acesso em: Agosto 2009.

BARATTA, Alessandro. Criminologia Crítica e a Crítica do Direito Penal: introdução à sociologia do direito penal; Tradução: Juarez Cirino dos Santos. – 3º Ed. – Rio de Janeiro: Editora Revan: Instituto Carioca de Criminologia, 2002.

BRASIL. Código Penal. Organização do texto: Antônio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz dos Santos Windt e Livia Céspedes. – 2.ed. – São Paulo: Saraiva,2006.

LIMA, Raymundo de. Maniqueísmo: O Bem, o Mal e seus efeitos ontem e hoje.  Revista Espaço Acadêmico, ano I, num. 07, 2001. Disponível em: http://www.espacoacademico.com.br/007/07ray.htm.  Acesso em: Agosto 2009.

MOLINA, Antonio García-Pablos de & GOMES, Luiz Flávio. Criminologia. 4ª Ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunias, 2002.

ZAFFARONI, E. Raúl & PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. 5ª Ed. São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, 2004.



[1] Acadêmico do 9º período de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco - UNDB

[2] Acadêmico do 9º período de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco - UNDB

[3] No mesmo sentido, Zaffaroni (2004, p. 60), Sistema de controle “O certo é que toda sociedade apresenta uma estrutura de poder, com grupos que dominam e grupos que são dominados, com setores mais próximos ou mais afastados dos centros de decisão. De acordo com essa estrutura, se controla socialmente a conduta dos homens, controle que não só se exerce sobre os grupos mais distantes do centro do poder”

[4] Para complementar, ver ANDRADE, Vera Regina Pereira de. Sistema penal máximo x cidadania mínima: códigos da violência na era da globalização – Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2003. “O desvio e a criminalidade não são uma qualidade intrínseca da conduta ou uma entidade ontológica preconstituída à reação social e penal, mas de qualidade (etiqueta) atribuída a determinados sujeitos através de complexos processos de interação social”.