REFLEXÃO DO Wallas Cabral Linguista Usp sobre SISTEMA APOSTILADO - Professora Silva convida os alunos para aprenderem "decomposição" pedindo para cada um trazer em um pequeno vidro algo orgânico. Observou o que aconteceu com as amostras por uma semana. Aos poucos, a diretora pediu para tirar alguns deles que estavam cheirando mal. Ficaram só alguns que tinham larvas.

Daí ela e os alunos pesquisaram mais e viram o que as larvas se transformaram: em moscas. E ouve interação dilógica entre eles e a teoria voltou-se à prática. Professora Cátia tinha um sistema de apostila altamente sofisticado com muitas imagens e setas e esquemas. A ordem é dar toda a informação sobre "decomposição" e essa informação deveria ser acompanhada com inúmeros exercícios, pois era assim que o material exigia e a escola confiava no material.

A professora Cátia era altamente capacitada e ela mesma se garantia de dar provas bem elaboradas, assim como slides etc. Meus amigos, o que acontece com esses dois exemplos é uma realidade atual no Brasil, o que ficou em último lugar no rank da educação entre 79 países investigados. Veja e sinta a situação: Numa interação comunicativa, especialmente no que tange ao poder da linguagem verbal e não verbal, há uma forte e frenética busca de ser entendido e entender o que se passa em um contexto entre dois interlocutores.

No aspecto neurolinguístico, vale interações como o tom de voz, os gestos, o olhar, as palavras; tudo quando se dirige uma informação a outra pessoa, tendo também um determinado enunciado proferido, pode ter valor de investigação, “interação dialógica” ou de mera formalidade e burocracia, “interações autoritárias”. O primeiro aspecto é o cerne do espírito construtivista que fez com que Paulo Freire, inclusive, mostrasse o aprendizado num diálogo partindo do saber da criança no presente, no momento. É a famosa “pedagogia da libertação”. Isso foi o que a professora “Silva” fez quando expôs um conhecimento “negociado”, “conversado” e administrado não apenas com a exigência do externo, na função da diretora, mas sim, do interno, com a sala. Já a professora Cátia demonstrou desde o início o saber tudo” o que é tipo de uma interação que respeita muita formalidade ao invés da real necessidade dos alunos em sala de aula. Não houve muito diálogo, mas sim, observações e conclusões que a própria professora fez questão de elaborar.

Isso faz inclusive refletir o sistema apostilado adotado hoje pela escola. Por mais que se diga algo sobre a autonomia do professor, o que passa a valer, de fato, é a obrigatoriedade do cumprimento dos exercícios e teorias exacerbadas num mínimo tempo possível, pois o valor da informação estaria assim acima da investigação e raciocínio. O que na verdade há é que o sistema parece não acreditar no potencial didático e metodológico do educador, fazendo um verdadeiro trabalho de imposição de valor em que preserve a ideia de que pelo material, sendo o professor bom ou não, estaria, assim, garantida a tão esperada qualidade de ensino que faria valer o contrato cliente/empresa dos pais dos alunos e na visão, infelizmente, dos próprios alunos. Nesse sentido, o professor fica sendo obrigado a manter uma interação autoritária para cumprir prazos e expectativas da escola. Porém, isso também promove a reflexão sobre a competência didática do professor em que passa a ser alvo de dois pontos de vistas altamente construtivo para a sua autorreflexão: a de ser um professor inventivo ou apenas informativo. Agora, quando Paulo Freire fala da visão construtivista, convida, de certa maneira, a sermos livres criando métodos diferenciados em que possa valer uma interação comunicativa verbal cada vez mais eficaz.

No primeiro caso, a professora Silva conquistou o conhecimento junto com os alunos. Aprenderam juntos e ela foi uma mediadora do processo. Os alunos vivenciaram a prática do aprendizado proposto. Isso pode ser chamado de libertação pois foi coroado com o sentido do aprendizado e não apenas com a informação dele.

(Escrito por Wallas cabral de Souza, Linguista USP e educador)