SINOPSE DO CASE DE DIREITO TRIBUTÁRIO I 1

 

Leonardo Leitão Salles2

Antônio de Moraes Rego Gaspar3

DESCRIÇÃO DO CASO

Em 05/03/2012, a empresa PLANETA VERDE LTDA., situada em São Luís/MA, recebeu cobrança de Taxa de Funcionamento, cujo prazo para pagamento expirou em 11 de junho de 2011.

Inconformada com o elevado valor e pelo fato de que não poderá exercer suas atividades sem o pagamento da referida taxa, a empresa questionou administrativamente a cobrança. Em resposta ao contribuinte, o Fisco Municipal informou que a referida taxa havia sido instituída pela Lei Complementar nº. 100/2006 (lei fictícia) e que o valor devido havia sido calculado em consonância com o artigo 15 dessa lei, que conta com a seguinte redação: "a base de cálculo da taxa é corresponde a R$ 100,00 (cem reais) por metro quadrado edificado".

Em virtude de ter obtido resposta administrativa que não atendia às suas expectativas, a empresa PLANETA VERDE LTDA., recusou-se a efetuar o recolhimento da referida taxa, motivo porque seu nome foi inscrito em Dívida Ativa.

Com fulcro nessas informações, profira sua posição acerca da fixação da base de cálculo da Taxa de Funcionamento.

  1. 1.      IDENTIFICAÇÃO DO PROBLEMA

Questão principal: No contexto da situação apresentada, a base de cálculo da referida taxa apresenta-se adequadamente estabelecida?

Questões secundárias:

a)         Aponte os critérios materiais genericamente previstos para a espécie tributária “taxa”;

b)        Aponte os limites para instituição da base de cálculo das taxas, à luz da recente jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e da doutrina majoritária.

 

  1. 2.      IDENTIFICAÇÃO E ANÁLISE DO CASO

 

2.1 DESCRIÇÃO DAS DECISÕES POSSÍVEIS

Pela legalidade da cobrança da taxa de funcionamento

 

A taxa é uma das formas de tributo, sendo uma obrigação imposta as pessoas físicas e jurídicas a serem recolhidos valores pelo Estado. No caso das taxas, esta é uma exigência pecuniária a pessoa privada ou jurídica para a utilização de serviços fundamentais ou pelo exercício do poder de polícia. O Estado, exercendo determinada atividade, cobra a taxa do contribuinte que faz uso daquela atividade exercida pelo Poder Público, as taxas vinculam, portanto, uma contraprestação direta daquele que se utiliza do serviço prestado pelo Estado.

A Constituição Federal brasileira dispõe em seu art. 145 a competência para a instituição de tributos, que segue:

Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:

I – impostos;

II – taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição;

 Conforme dispõe o artigo 145 da CF/88, o fato gerador da taxa como tributo, é em razão do exercício regular do poder de polícia ou ainda pela utilização de serviços prestados ao contribuinte pelo Estado. Pelo caráter contraprestacional das taxas, visto que nela existe um benefício ou vantagem para o contribuinte, por este motivo estas não são isentas, salvo se houver previsão legal que a determine, é o que dispõe o art. 177 do CTN:

Art. 177: Salvo disposição de lei em contrário, a isenção não é extensiva:

I – às taxas e às contribuições de melhoria;

As taxas se diferenciam dos impostos, pois quando paga-se uma taxa tem-se em contrapartida prestação de um serviço público pelo Estado, sendo, portanto, um tributo vinculado ao fato gerador. Enquanto nos impostos, estes são tributos não vinculados quanto ao fato gerador, o que significa que sua cobrança não depende de uma atividade estatal específica.

O art. 77 do Código Tributário Nacional:

Art. 77: As taxas cobradas pela União, Estados, Municípios e Distrito Federal, no âmbito de suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição.

Parágrafo único: A taxa não pode ter base de cálculo ou fato gerador idênticos aos que correspondam a imposto nem ser calculada em função do capital das empresas.

 

A taxa de polícia é conhecida também como taxa de fiscalização, realizado pela Administração Pública, em virtude do exercício de atividades econômicas dependerem de concessão ou autorização do Poder Público. No caso em análise, a empresa Planeta Verde recebeu a cobrança de Taxa de Funcionamento, que é uma taxa que tem como fato gerador o exercício do poder de polícia pelo Município, mediante a realização de diligências, vistorias ou outros atos administrativos vinculados às atividades econômicas.

No estudo das taxas como tributo instituído por lei, é relevante tratar da base de cálculo deste tributo, que segundo o entendimento de Eduardo Sabbag (2012), “a base de cálculo (ou base imponível) é uma grandeza dimensional do fato gerador, ou seja, uma perspectiva que o dimensiona, com o intuito de permitir, aritmeticamente, no cotejo com a alíquota, a detecção do quantum debeatur, para a devida quantificação do tributo”.

Segue o entendimento do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 549.085:

Ementa: Ementa: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TRIBUTÁRIO. TAXA DE LICENÇA ONEROSA PARA CONSTRUIR INSTITUÍDA PELO MUNICÍPIO DE GOIÂNIA/GO. CONSTITUCIONALIDADE. ADOÇÃO DE ELEMENTOS DA BASE DE CÁLCULO PRÓPRIA DE IMPOSTOS. POSSIBILIDADE. SÚMULA VINCULANTE 29 DO STF. AGRAVO IMPROVIDO. I – É constitucional a adoção, no cálculo do valor de taxa, de um ou mais elementos da base de cálculo própria de determinado imposto, desde que não haja integral identidade entre uma base e outra (Súmula Vinculante 29 do STF). II Agravo regimental improvido.

 

 

Tal entendimento é o mesmo seguido pelo Superior Tribunal de Justiça, como no caso do julgamento do REsp 200159 SP, que segue:

TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. TAXA DE RENOVAÇÃO DE LICENÇA DE LOCALIZAÇÃO. LEGALIDADE. SÚMULA Nº 157/STJ. CANCELAMENTO. TAXA DE FUNCIONAMENTO. LEGALIDADE DA COBRANÇA RECONHECIDA PELO STF.

I. A Primeira Seção, no julgamento do REsp 261.571/SP, em 24/04/2002, afastou a incidência do enunciado da Súmula nº 157/STJ, em face da posição adotada pelo Supremo Tribunal Federal, pela constitucionalidade da taxa, cobrada pelo Município, na renovação de licença para localização de estabelecimento comercial e industrial.

II. No que diz respeito a taxa de fiscalização de funcionamento, a jurisprudência deste Tribunal e do Pretório Excelso têm se manifestado pela legalidade de sua cobrança, em razão do poder de polícia exercido pelo Município. Precedentes do Pretório Excelso.

III. Embargos de divergência rejeitados.

Portanto, a fixação do quantum debeatur não poderá levar em consideração circunstâncias estranhas à taxa, sob pena de confundir-se o que é imposto com taxa ou contribuição de melhoria. Tal proibição é flagrante ao se observar o disposto no § 2° do art. 145 da CF/88, bem como no parágrafo único do art. 77 do CTN:

Art. 145, §2°, da CF: As taxas não poderão ter base de cálculo própria de impostos.

Art. 77, parágrafo único, CTN: A taxa não pode ter base de cálculo ou fato gerador idênticos aos que correspondam a imposto, nem ser calculada em função do capital das empresas.

Conforme entendimento sumulado pelo Supremo Tribunal Federal, na Súmula Vinculante de número 29, que considera: “É constitucional a adoção, no cálculo do valor de taxa, de um ou mais elementos da base de cálculo própria de determinado imposto, desde que não haja integral identidade entre uma base e outra”.

Desta forma, pode-se observar que no caso em análise, a cobrança da Taxa de Funcionamento para a empresa Planeta Verde LTDA é um exemplo do exercício do poder de polícia, ou seja, do poder de fiscalização, sendo, de acordo com o entendimento adotado pelo STF e pelo STJ nas jurisprudências apresentada, na Súmula Vinculante de n. 29, no § 2° do art. 145 da CF e parágrafo único do art. 77 do CTN, a cobrança da referida taxa e a base de cálculo desta se encontram devidamente adequadas.

Pela ilegalidade na cobrança da taxa de funcionamento

Como já mencionado, a cobrança da taxa é uma das formas de tributo, sendo instituída por Lei, e uma exigência pecuniária as pessoas físicas ou jurídicas para utilização de serviços prestados pelo Poder Público ou pelo exercício do poder de polícia. No caso em análise, em que a empresa Planeta Verde LTDA recebeu a cobrança de Taxa de Funcionamento, não houve comprovação acerca da efetivação do exercício do poder de polícia pelo Município de São Luís.

O entendimento que a cobrança da taxa de funcionamento deve ser devida ao se restar comprovado o exercício, por parte do Município, da prestação do poder de polícia, é adotado pelo Supremo Tribunal Federal, como nos casos dos julgamentos dos RE 140.278/CE e do RE 354.280/MG, que seguem:

EMENTA: (...) TAXA DE LOCALIZAÇÃO E FUNCIONAMENTO. ARTIGO 145, II, CF. FISCALIZAÇÃO. PODER DE POLÍCIA. SUMÚLA 279. (...) 2.Interpretando essa norma, assim como as que a precederam, seja na Constituição anterior, seja no Código Tributário Nacional, a jurisprudência do STF firmou-se no sentido de que só o exercício efetivo, por órgão administrativo, do poder de polícia, na primeira hipótese, ou a prestação de serviços, efetiva ou potencial, pelo Poder Público, ao contribuinte, na segunda hipótese, é que legitimam a cobrança de taxas, como a de que se trata neste Recurso: taxa de localização e funcionamento. 3. No caso, o acórdão extraordinariamente recorrido negou ter havido efetivo exercício do poder de polícia, mediante atuação de órgãos administrativos do Município, assim como qualquer prestação de serviços, efetiva ou potencial, pelo Poder Público, ao contribuinte, que justificasse a imposição da taxa em questão. (...) (RE 140.278/CE, 1ª T., rel. Min. Sydney Sanches, j. 27-08-1996).

EMENTA: Recurso extraordinário. Renovação de licença de localização e funcionamento. - O acórdão recorrido, ao fundar-se, também, em que a cobrança da taxa de renovação de licença para localização e funcionamento era indevida por falta de comprovação do exercício, por parte do Município, da atividade de fiscalização, nada mais fez do que, quanto a esse fundamento suficiente "per se" para mantê-lo, seguir a orientação predominante nesta Corte (assim, a título exemplificativo, nos RREE 140.278, 115.213, 115.983, 190.126 e 259.980). Recurso extraordinário não conhecido.

Nos dois julgados do Supremo Tribunal Federal, reitera-se o entendimento que a cobrança de taxa de funcionamento é indevida na falta de comprovação por parte do Poder Público, do efetivo exercício do poder de polícia, da sua atividade de fiscalização. No caso em análise, não foi comprovado pelo Poder Público a efetivação do exercício do poder de polícia, razão pela qual a cobrança da Taxa de Funcionamento da empresa Planeta Verde LTDA configura-se como indevida.

Ainda no tocante à ilegalidade da cobrança da referida taxa, a empresa só recebeu a cobrança da Taxa de Funcionamento no dia 05/03/2012, com prazo para pagamento expirado desde o dia 11/06/2011, estando, portanto, há aproximadamente 9 (nove) meses vencido.

No que diz respeito aos critérios materiais genericamente previstos para a espécie tributária taxa, ou seja, o fato gerador deste tributo é disposto no art. 145, II da CF, que dispõe:

Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:

I – impostos;

II – taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição;

Segundo Amaro (2013), “o fato gerador da taxa não é um fato do contribuinte, mas um fato do Estado. O Estado exerce determinada atividade e, por isso, cobra a taxa da pessoa a quem aproveita aquela atividade”. O que significa dizer que o fato gerador da taxa é um fato do Estado, pois o Estado que irá exercer determinada atividade, que irá gerar uma contraprestação por parte do contribuinte que fizer uso desta, através da utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, ou ainda no caso do exercício do poder de polícia, ou seja, o poder de fiscalização exercido pelo Estado.

Desta forma, se encontra configurada a ilegalidade na cobrança da Taxa de Funcionamento a empresa Planeta Verde LTDA, uma vez que não restou comprovada pelo Poder Público a efetivação do exercício do poder de polícia, e a referida Taxa foi recebida com o prazo para pagamento já expirado há aproximadamente 9 meses.

CRITÉRIOS E VALORES

 

Princípio da Transparência: o Poder Público deve ser transparente ao exercer suas funções, devendo comprovar a efetivação do exercício do poder de polícia, que justifica a aplicação da arrecadação das taxas.

Princípio da Legalidade: Por se encontrar prevista em lei a cobrança da referida taxa, bem como sua constitucionalidade assegurada por entendimentos do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça.

Princípio da Isonomia Tributária: previsto no art. 150, II, da CF.

Princípio da Retributividade: Segundo este princípio, as taxas possuem finalidades compensatórias. Através delas, a pessoa pública irá se ressarcir das despesas que teve com o serviço público ou para a prática do exercício do poder de polícia.

 

REFERÊNCIAS:

 

AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 19 ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

BRASIL, Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Brasília, DF: Senado, 1988.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp. 200159/SP. Brasília, DF.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 549.085 RE 354.280/MG RE 140.278/CE Brasília, DF.

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 17 ed. São Paulo: Saraiva, 2006.

SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.