SÍNDROME DE BURNOUT: UMA ANÁLISE PSICOJURÍDICA[1] 

Camila Ferreira da Silva[2]

Érika Tamires Ferreira Fernandes³

Rafael Barbosa Ramos4 

RESUMO: A Síndrome de Burnout tem sua origem na atividade laboral, aliada às pressões prolongadas que uma pessoa sofre ante os fatores estressantes, emocionais e interpessoais relacionados ao trabalho. Trata-se de uma doença psicológica caracterizada pela manifestação inconsciente de esgotamento profissional, reconhecida como um risco para diversas profissões. O presente artigo tem como escopo demonstrar o conceito, as características e o diagnóstico da doença, bem como seu amparo legal pelo direito constitucional, trabalhista e previdenciário. Serão analisadas, ainda, as questões referentes ao reconhecimento da doença e o cumprimento das garantias legais pelo empregador.  Através dessa pesquisa, consegue-se apontar a importância da prevenção à ocorrência da Síndrome de Burnout, a começar pelo ambiente de trabalho, de maneira a satisfazer os interesses do empregador sem sobrecarregar o empregado. Um ambiente de trabalho saudável torna possível a integração do empregado ao trabalho, estimulando-o de modo a caracterizar um ganho para o empregador, pelos resultados na produção, e para a sociedade, com a redução dos casos de afastamento. De modo amplo, evidencia-se que a Psicologia Jurídica e o Direito são saberes complementares, perfeitamente capazes de estabelecerem uma visão apta a enfrentar os novos problemas da sociedade moderna sob uma nova ótica.

PALAVRAS-CHAVE: Síndrome de Burnout. Legislação trabalhista. Relação de emprego.

 

ABSTRACT: The Burnout Syndrome has the labor activity as source, associated with prolonged pressures that a person suffers when faces work-related stressors, emotional and interpersonal factors. It is a psychological disease characterized by unconscious manifestation of professional fatigue, recognized as occupational hazard for some kinds of jobs. This article has the objective to demonstrate the concept, the characteristics and diagnosis of the disease, as well their legal guarantees. Issues related to the recognition of the disease and the compliance with legal guarantees by the employer will be analyzed. Through this research, it is possible to point out the importance of preventing the Burnout Syndrome occurrence, starting from the work environment in order to satisfy the employer’s interests without burdening the employee. A healthy work environment makes possible the integration of the employee to work, stimulating it, in order to characterize a gain for the employer, by the results in production and society, with the reduction in cases of removal. Broadly, it is clear that the Forensic Psychology and Law are complementary knowledge perfectly capable of establishing a vision able to cope with the new problems of modern society in a new light.

KEYWORDS: Burnout Syndrome. Labor law. Employment relationship.

Sumário: 1. Introdução; 2. Desenvolvimento; 2.1 Sindrome de Burnout: Conceito, diagnóstico e tratamento; 2.2 Síndrome de Burnout frente à legislação trabalhista; 3. Discussão; 3.1  Questões conflitantes na relação empregatícia e a manifestação da Síndrome de Burnout; 4. Considerações finais; 5. Referências.

1. INTRODUÇÃO

“O trabalho dignifica o homem.” A frase utilizada por Benjamin Franklin é comumente repetida pelo mundo. Contudo, para que a dignidade de fato exista é de principal relevância o respeito aos Direitos Trabalhistas conquistados ao longo do tempo.

A primeira Constituição Brasileira a tratar do Direito do Trabalho foi a de 1824 que, sem aprofunda-se no assunto, apenas concedeu a liberdade de exercício de ofícios. Diz o art. 179:

A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte.

(...)

XXV. Ficam abolidas as Corporações de Officios, seus Juizes, Escrivães, e Mestres. (Constituição de 1.824)

Após a abolição da escravatura, em 1888, os direitos dos trabalhadores se intensificaram, haja vista que os imigrantes europeus da época gozavam de espírito sindicalista e passaram a reivindicar por medidas protetivas aos trabalhadores.

Mais tarde, na primeira era Vargas, com a promulgação da Constituição de 1934, o trabalhador passou então a ser amparado com diversas normas constitucionais. Daí em diante normas esparsas de regulamentação do trabalho foram criadas, surgindo então a necessidade de sistematização de tais normas. Em 1943, na “Segunda Era Vargas”, foi aprovada a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), Decreto-Lei n° 5.452, cujo principal objetivo era a unificação de toda legislação trabalhista existente no ordenamento jurídico brasileiro.

Somente em 1988, com o advento da atual Constituição Brasileira que os direitos trabalhistas se tornaram Princípios, Direitos e Garantias Fundamentais, Individuais e Coletivas, dentre eles: jornada de trabalho de oito horas diárias e 44 horas semanais; décimo terceiro salário; direito ao aviso prévio; afastamento remunerado, este por sua vez, financiado pela Previdência Social a partir do 16º dia de afastamento, evitando a onerosidade do empregador.

No Brasil, segundo dados da Previdência Social, doenças mentais são a segunda maior causa de afastamento do trabalho, de incapacidade permanente e de invalidez. Dado ao ambiente de trabalho atual, a própria Organização Mundial de Saúde (OMS) afirma que em alguns anos esses transtornos mentais assumirão o primeiro posto no que se refere aos afastamentos. A chamada Síndrome de Burnout ou Síndrome do Esgotamento Profissional se destaca nesse contexto.

2. DESENVOLVIMENTO

2.1 SÍNDROME DE BURNOUT: CONCEITO, DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO

O termo vem do inglês burnout, que seria para o português “combustão completa”. O indivíduo então com o desgaste e a exaustão emocional se sente queimar de dentro pra fora, como se sua energia se esvaísse ao final do processo. A pessoa acometida por essa síndrome se consome internamente, tanto fisicamente quanto emocionalmente. Tem-se muitas vezes a dificuldade em diagnosticar a doença fora do contexto trabalhista, por esta demonstrar sintomas comuns a depressões e transtornos de ansiedade.

A Síndrome de Burnout surgiu a partir da década de 70 com um estudo. Freunderberger, um pesquisador, começou a observar alguns comportamentos e ele não entendia bem o que estava acontecendo. Não é depressão, não é transtorno, não é um distúrbio, mas algo está acontecendo que leva as pessoas a desistir do seu trabalho (FERRACIOLLI, 2012).

Para a psicóloga social Cristina Maslach, a síndrome se enquadraria em três aspectos. Num primeiro plano caberia o esgotamento emocional, que trata das sensações relacionadas ao trabalho, e das atividades a este relacionadas. Haveria também a despersonalização, que seria a expressão do “contexto interpessoal onde se desenvolve o trabalho do sujeito, e a diminuição das conquistas pessoais, representando a auto-avaliação que o indivíduo realiza do seu próprio desempenho ocupacional e pessoal” (FIRME, ALVES, ROQUE, 2007). Existiria ainda a diminuição da realização pessoal, que leva à falta de confiança do indivíduo e à auto-avaliação como um ente negativo no ambiente de trabalho.

Para os estudiosos, a interação com o público seria fator importante no desenvolvimento da Síndrome do Esgotamento Profissional, considerando-se fator de risco principalmente aos trabalhadores das áreas da saúde. Contudo, professores, atendentes, pessoas que lidam com o público em geral, e até mesmo casos de grupos de executivos demonstraram o desenvolvimento da síndrome em maior número. No decorrer do estudo desta doença, foi proposto um modelo hierárquico com diversas etapas que se sucedem, segundo FARBER, que consistiria em

entusiasmo e  dedicação,  frustração  e  ira,  e  inconsequência (percepção  de  falta  de  correspondência  no  trabalho, abandono  de  compromisso  e  implicação  no  trabalho, vulnerabilidade pessoal, esgotamento e descuido, constituirá o estado final, caso não receba um tratamento adequado) (FIRME, ALVES, ROQUE,  apud MANASSERO, FORNÉS, FERNÁNDEZ, VÁZQUEZ, & FERRER,2007).

A síndrome então se desenvolveria em estágios, não como uma pronta resposta ao estresse imediato. A frustração com alguns momentos ou situações no dia a dia do trabalhador é comum, mas a constante exposição a ela corroboraria para o esgotamento emocional, causando raiva pela situação e a perda do interesse pelo trabalho, motivo pelo qual a Síndrome de Burnout também é conhecida por Síndrome da Desistência. Acontece que a situação se torna desgastante e, sem o devido tratamento como transtorno psicológico, a saída para o indivíduo acaba sendo se afastar da causa do problema.

Dada a manifestação e os estágios da síndrome, são notados sintomas psicológicos e dentro contexto do ambiente de trabalho, no que se refere aos primeiros sintomas, surge problemas psicossomáticos (uma espécie de resposta do organismo aos problemas oriundos da mente), depressão, sentimentos de culpa, ansiedade, cólera, baixa tolerância a frustrações, atitudes negativas em relação a si mesmo e ainda a tendência ao abuso de substâncias psicotrópicas. Por outro lado, há também sintomas que aparecem relativamente ao trabalho, como a queda do rendimento do trabalhador, falta de motivação e atitudes negativas para com o trabalho, absentismo, atrasos frequentes e pausas alongadas durante a jornada de trabalho, falta de compromisso, insatisfação com as tarefas desempenhadas e a intenção de abandonar o trabalho. Cabe ressaltar que todos esses sintomas podem coexistir durante a manifestação da síndrome, não sendo obrigatório o aparecimento de todos.

McCornnell fala dos sintomas físicos (psicossomáticos) associados à síndrome, que seriam “a fadiga, a sensação de exaustão (cansaço crônico), a indiferença ou frieza, a sensação de baixo rendimento profissional, frequentes dores de cabeça, distúrbios gastro-intestinais, alterações do sono (insônia) e ainda dificuldades respiratórias”. (FIRME, ALVES, ROQUE, 2007).

O médico Dráuzio Varella afirma que “o diagnóstico leva em conta o levantamento da história do paciente e seu envolvimento e realização pessoal no trabalho” (VARELLA, 2013). Assim, apesar das condições de trabalho serem o fator desencadeante, alguns indivíduos, como os mais dedicados e perfeccionistas nas suas funções, são mais propícios a desenvolver a síndrome.

Embora a literatura verse de forma escassa, são três as formas principais de tratamento, sendo elas a Psicoterapia, o Tratamento Farmacológico e as Intervenções Psicossociais. O primeiro está associado ao “processo de desinvestimento afetivo no trabalho que antes era objeto de todo ou grande parte desse investimento. O paciente necessita, por tanto, de tempo e espaço para repensar e ressignificar sua inserção no trabalho e na vida” (FILHO, JARDIM, RAMOS, 2004). Já a prescrição de medicamentos, como antidepressivos e ansiolíticos, depende da manifestação de quadros de depressão e ansiedade, sendo recomendadas também substâncias para combater sintomas como insônia. Cabe ressaltar que a prescrição de medicamentos é sempre acompanhada pelo tratamento psicoterápico. Já as Intervenções Psicossociais surgem da necessidade de afastamento do empregado do ambiente de trabalho

“Cabe ao clínico avaliar cuidadosamente a indicação de afastamento do trabalho através de licença para tratamento. O clínico deve envolver o paciente nesta decisão procurando ajudá-lo tanto a afastar-se do trabalho, se necessário para o tratamento, quanto a voltar para o trabalho quando recuperado.”

A Previdência Social, através da Caracterização de Acidente de Trabalho (CAT) e do afastamento remunerado, fornece apoio financeiro para o trabalhador, como garantido na legislação nacional, fornecendo ao empregado mais tranquilidade para a reabilitação.

2.2 SÍNDROME DE BURNOUT FRENTE À LEGISLAÇÃO TRABALHISTA

O ambiente de trabalho contribui de forma basilar para a preservação da saúde mental do empregado. Dada à sua profunda relevância, a saúde do trabalhador e o meio ambiente do trabalho foram elevados a direito social de natureza constitucional, cujo cumprimento é imposto por lei ao empregador.

No entanto, é passível de se verificar, nos diversos ramos do trabalho, a insurgência da Síndrome de Burnout ou Síndrome do esgotamento profissional, marcada pela conjunção de fatores internos (subjetivos) a fatores exógenos, capazes de criar um ambiente de trabalho patogênico, extremamente gravoso ao patrimônio laboral do trabalhador, conforme ficou demonstrado.

Dada à necessidade de prevenção e de tratamento, a Síndrome de Burnout foi incluída pela Previdência Social no Código Internacional de Doenças, no grupo de Transtornos mentais e do comportamento relacionados com o trabalho (Grupo V – CID-10), cuja relação com o direito do trabalho macula-se ao “ritmo de trabalho penoso” e a “outras dificuldades físicas e mentais relacionadas com o trabalho”.

Por tratar-se de uma doença psíquica, considerada doença ocupacional, muitos consideram a Síndrome de Burnout um acidente de trabalho. Para elucidação, o art. 19 da Lei nº 8.213/91 conceitua o que caracteriza acidente de trabalho:

Art. 19. Acidente de trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11 desta lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.

É evidente que a Síndrome de Burnout enquadra-se no conceito supra, posto que trata-se de uma perturbação funcional causadora da perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho. Por complemento, se analisado o art. 20 da Lei 8.213/91, não resta dúvidas da relação da Síndrome ao acidente de trabalho.

                                                  Art. 20. Consideram-se acidente do trabalho, nos termos do artigo anterior, as seguintes entidades mórbidas:

                                                  I - doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social;

II - doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, constante da relação mencionada no inciso I.

Como previsto no art. 20, II da Lei 8.213/91, a Síndrome de Burnout relaciona-se diretamente com as condições de realização do trabalho, principal causadora do estresse ocupacional.

A Constituição Federal de 1988 prevê, em seu artigo 7º, inciso XXII, como dever do empregador, a redução dos riscos inerentes ao trabalho por meio de normas de saúde, higiene e segurança. Desta feita, como categoria de bem de uso comum do povo, é dever do empregador assegurar aos empregados um ambiente de trabalho sadio tal que, ao ser demitido, esteja apto e gozando da mesma saúde física e mental em que se encontrava na época da sua admissão.

Nesse diapasão, a Consolidação das Leis do Trabalho também assegura ao trabalhador a proteção à saúde física e psíquica, como dever do empregador, a fim de se evitar o surgimento de doenças ocupacionais, conforme o artigo abaixo transcrito

Art. 157  – Cabe às empresas: I – cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho; II – instruir os empregados, através de ordens de serviço, quanto às precauções a tomar no sentido de evitar acidentes do trabalho ou doenças ocupacionais; III – adotar as medidas que lhes sejam determinadas pelo órgão regional competente; IV – facilitar o exercício da fiscalização pela autoridade competente.

Consoante a isso, entendimentos jurisprudenciais reconhecem a Síndrome de Burnout como ensejadora de indenização, desde que caracterizada a relação de causa (da execução do trabalho ao estresse laboral) e consequência (diagnóstico da síndrome). Segue decisão do Tribunal Regional do Paraná, que reconheceu do tema

                                         TRT-PR-09-09-2011 EPISÓDIO DEPRESSIVO GRAVE. SÍNDROME DE BURNOUT. NEXO DE CAUSALIDADE COM O TRABALHO CONFIGURADO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. Hipótese em que constam nos autos atestados médicos e declarações firmadas por psiquiatra que revelam que a reclamante sofreu tratamento especializado por quadro de transtorno depressivo grave, com diminuição do desempenho profissional, esgotamento emocional, despersonalização e perda de produtividade ("síndrome de Burnout"), e que a sua saúde física e mental estava sendo abalada no local de trabalho. O INSS reconheceu, por meio de parecer técnico médico pericial, o nexo causal entre a atividade da autora e a doença apresentada, justificando a concessão do benefício como acidentário, com CID F322, que corresponde a episódio depressivo grave sem sintomas psicóticos. É fato notório que a categoria em questão é vitimada pela "síndrome de Burnout", justamente em razão dos métodos de gestão assediosos, das situações com que lidam os trabalhadores, da excessiva cobrança quanto ao cumprimento de tarefas, aliada a uma jornada de trabalho exaustiva, o que sugere, inclusive, inversão do ônus da prova, no caso, despiciendo. Recurso ordinário da autora a que se dá provimento para reconhecer a responsabilidade civil da ré pela doença que a acomete e condenar a reclamada ao pagamento de indenização por danos morais.

Ademais, a Lei 8.213/91, que cuida dos Planos de benefícios da Previdência Social, trata dos direitos e garantias do trabalhador acometido pela Síndrome de Burnout, garantindo-o a permanência de seu contrato de trabalho na empresa por, pelo menos, doze meses, dentre outras providências abaixo referidas

Art. 118. O segurado que sofreu acidente do trabalho tem garantida, pelo prazo mínimo de doze meses, a manutenção do seu contrato de trabalho na empresa, após a cessação do auxílio-doença acidentário, independentemente de percepção de auxílio-acidente.

Destarte, cabe ao empregador encaminhar o trabalhador ao tratamento médico especializado de maneira a não querer eximir-se de sua responsabilidade legal frente ao problema enfrentado pelo funcionário.

 

3. DISCUSSÃO

3.1 QUESTÕES CONFLITANTES NA RELAÇÃO EMPREGATÍCIA E A MANIFESTAÇÃO DA SÍNDROME DE BURNOUT

É certo que a pressão exercida no cenário econômico acaba por refletir nas relações de trabalho. Partindo dessa análise, tornam-se perceptíveis os motivos causadores de conflitos na relação de empregado e empregador.

O empregador, assumindo todo o risco do empreendimento, precisa obter meios para lidar com o mercado cada vez mais competitivo. Em virtude das dificuldades encontradas, principalmente devido aos encargos trabalhistas e tributários, os empregadores são levados a fazer o máximo com os recursos humanos que já possuem, impondo metas incompatíveis com os limites do exercício da atividade pessoal e abusando da cobrança de resultados dos seus empregados.

Apesar da proteção fornecida pela CLT em seu segundo capítulo, que trata da duração do trabalho, a jornada de labor é frequentemente desrespeitada, posto que o empregador, a fim de aumentar a produtividade da empresa, faz uso indiscriminado da prestação de horas extras pelo trabalhador. Como resposta a tal corriqueiro abuso, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) foi levado a editar a súmula 85, relativa à jornada de trabalho.

I – A compensação de jornada de trabalho deve ser ajustada por acordo individual escrito, acordo coletivo ou convenção coletiva.

II – O acordo individual para compensação de horas é válido, salvo se houver norma coletiva em sentido contrário.

III – O mero não-atendimento das exigências legais para a compensação de jornada, não implica a repetição do pagamento das horas excedentes à jornada normal diária, se não dilatada a jornada máxima semanal, sendo devido apenas o respectivo adicional.

IV – A prestação de horas extras habituais descaracteriza o acordo de compensação de jornada. Nesta hipótese, as horas que ultrapassarem a jornada semanal normal deverão ser pagas como horas extraordinárias e, quanto àquelas destinadas à compensação, deverá ser pago a mais apenas o adicional.

Nota-se que a súmula coloca o trabalhador sob a proteção das convenções coletivas e ainda limita a prestação das horas extras para que a situação não se torne perpétua.

Apesar da inegável culpa do empregador, o trabalhador contribui com parcela da responsabilidade, expondo a parcela subjetiva do problema associado à jornada de trabalho. Muitas vezes, por dedicação pessoal, o indivíduo coloca sua vida social e familiar subjulgada à profissão, excedendo suas 44 (quarenta e quatro) horas semanais de trabalho e usando do tempo de descanso para a realização de atividades relativas ao seu cargo. Deste modo, a atividade laboral ultrapassa os limites do espaço de trabalho, principalmente por conta das novas tecnologias de dispositivos móveis, que disseminam o trabalho por meio de emails e mensagens instantâneas.

As pressões do mercado de trabalho não refletem somente na concorrência entre sociedades empresárias, mas também nas questões relativas à mão de obra. A grande exigência por qualificação pressiona os trabalhadores a expandir seu currículo e a buscar atualizações, devido à oferta de emprego ser menor do que a demanda. Ou seja, há sempre mão de obra excedente disponível e o empregado sente-se ameaçado no seu posto de trabalho. Dessa forma, diante de um ambiente de crise externa (econômica) e interna (mental), acaba desenvolvendo inseguranças.

Outro ponto que se destaca é o lado subjetivo na relação de emprego. Muitas vezes a dedicação no ambiente de trabalho não resulta na compensação esperada pelo empregado. O idealismo e a preocupação extrema em desenvolver bem sua atividade, sobretudo diante da auto-imposição de metas que se tornam cada vez mais inalcançáveis ao longo do tempo, geram uma enorme frustração para o trabalhador.

Dentro desse contexto, entra a figura do empregador como responsável pela saúde e bem estar no ambiente de trabalho. Identificar e distinguir a Síndrome de Burnout é, de fato, um trabalho complexo. Com a banalização do estresse, grande parcela dos empregadores tende a limitar sua visão a respeito dos transtornos psicológicos entre estresse e depressão, quando na verdade consistem em doenças distintas da síndrome. O estresse é compreendido como

uma reação do organismo, com componentes físicos e/ou psicológicos, causada pelas alterações psicofisiológicas que ocorrem quando a pessoa se confronta com uma situação que, de um modo ou de outro, a irrite, amedronte, excite ou confunda, ou mesmo que a faça imensamente feliz (LIPP, MALAGRIS, 2001).

Já a depressão é

um conjunto de alterações comportamentais, emocionais e de pensamento, tais como, afastamento do convívio social, perda de interesse nas atividades profissionais, acadêmicas e lúdicas, perda do prazer nas relações interpessoais, sentimento de culpa ou autodepreciação, baixa auto-estima, desesperança, apetite e sono alterados, sensação de falta de energia e dificuldade de concentração (CALÓ, 2005).

O estresse se diferencia da Síndrome de Burnout por ser uma reação imediata, e em certos estágios até positiva.  Em se tratando da depressão, nesta há “uma maior submissão à letargia e a prevalência aos sentimentos de culpa e derrota, enquanto nas pessoas com Burnout são de desapontamento e tristeza. A pessoa que vivencia o Burnout identifica o trabalho como desencadeante deste processo” (PEREIRA, 2002). Ademais, falta de informação é o que corrobora essa falha de identificação da Síndrome.

 

5.  CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conciliar a saúde psicológica do trabalhador sem perder a produtividade é um dos desafios do empregador. A estratégia organizacional da empresa é fundamental como pré-condição para a prevenção da Síndrome de Burnout, bem como buscar meios de fornecer atenção psicoterápica aos empregados. É importante tentar identificar os processos de degradação psicológica desde as primeiras manifestações, a fim de evitar que o indivíduo chegue a estágios avançados do Burnout, bem como de outros distúrbios. Contudo, uma vez acometido da síndrome, o trabalhador deve receber atenção psicoterápica e ter assegurados os seus direito de Previdência Social.

 

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[1]Artigo científico apresentado como requisito para conclusão da disciplina de Psicologia Jurídica, sob coordenação da Prof.ª Ms. Georgita Maria Jardim, realizado no curso de Direito da Unimontes, no ano de 2013.

[2] Acadêmica de Direito na Universidade Estadual de Montes Claros.

³ Acadêmica de Direito na Universidade Estadual de Montes Claros.

4 Acadêmico de Direito na Universidade Estadual de Montes Claros.