Difícil compreender que as pessoas que mais deveriam garantir a integridade física e mental das crianças e adolescentes, garantindo o convívio sadio e uma vida digna e feliz, são responsáveis por tamanha crueldade com os infantes.

 

Eis a Síndrome da Alienação Parental!

 

E foi no ano de 1985 que o psicólogo americano Richard Gardner descreveu a Síndrome da Alienação Parental como sendo "um distúrbio da infância que aparece quase exclusivamente no contexto de disputas de custódia de crianças. Sua manifestação preliminar é a campanha denegritória contra um dos genitores, uma campanha feita pela própria criança e que não tenha nenhuma justificação. Resulta da combinação das instruções de um genitor (o que faz a "lavagem cerebral, programação, doutrinação") e contribuições da própria criança para caluniar o genitor-alvo. Quando o abuso e/ou negligencia parentais verdadeiros estão presentes, a animosidade da criança pode ser justificada, e assim a explicação de Síndrome de Alienação Parental para a hostilidade da criança não é aplicável". (GARDNER, 1985, p.2).

 

Com o passar dos anos, foram surgindo vários estudos e análises de casos, restando cristalina a necessidade de regulamentar as situações de alienação parental, cada vez mais constantes.

 

Em 26 de agosto de 2010 restou promulgada no Brasil a Lei n.º 12.318, que definiu em seu artigo 2º:

 

"Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou o adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ou estabelecimento ou à manutenção de vínculo com este".

 

A legislação busca conceder maiores poderes aos Magistrados, com o intuito de garantir os direitos das crianças e adolescentes, vítimas dos abusos causados por seus responsáveis (àqueles que deveriam preservá-los), punindo e inibindo os descumprimentos dos deveres inerentes à autoridade parental ou decorrentes da tutela ou guarda do menor.

 

Ressalta-se que o causador dos abusos praticados com as crianças e adolescentes não são exclusivamente os genitores (mãe ou pai), podendo, portanto, serem vítimas dos avós maternos ou paternos, tutores ou guardiões.

 

O parágrafo único do artigo 2º descreve, por oportuno, um rol meramente explicativo, acerca das formas de alienação parental. Veja-se:

 

"I – realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade;

 

II – dificultar o exercício da autoridade parental;

 

III – dificultar o contato da criança ou adolescente com genitor;

 

IV – dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar;

 

V – omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço;

 

VI – apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou o adolescente;

 

VII – mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avós."

 

A razão dos abusos, conforme análise dos casos, demonstram a tentativa de vingança de um dos genitores, diante da ocorrência da separação/divórcio. O egoísmo se sobrepõe acima de qualquer sentimento de amor existente pela criança e adolescente que lhe compete a guarda, o zelo e o cuidado.

 

Importante destacar o brilhante comentário da advogada e ex-desembargadora do Tribunal de Justiça do RS, Maria Berenice Dias:

 

No entanto, muitas vezes a ruptura da vida conjugal gera na mãe sentimento de abandono, de rejeição, de traição, surgindo uma tendência vingativa muito grande. Quando não consegue elaborar adequadamente o luto da separação, desencadeia um processo de destruição, de desmoralização, de descrédito do ex-cônjuge. Ao ver o interesse do pai em preservar a convivência com o filho, quer vingar-se, afastando este do genitor (DIAS. 2006).

 

No mesmo sentido, Goudard descreve que:

 

O genitor alienante se considera o único bom genitor. O intuito, inconsciente ou não, é rejeitar, até mesmo destruir, o outro genitor e reparar sua ferida narcísica. Este genitor possui, aparentemente, toda a sua sanidade mental e sabe sempre apresentar os fatos sob um aspecto que o favorece (GOUDARD. 2008, p.19).

 

O perverso narcísico continua sua caçada. Usar as crianças é o “meio” mais sensível, aquele meio que mais atingirá o outro. Portanto, programando as crianças para detestar o outro, o perverso amplifica o fenômeno que ele desencadeou e sabe intuitivamente que é o melhor meio de destruir infalivelmente o outro em tudo o que lhe é mais sensível, em prazo mais ou menos longo. Ele aumenta seu “estoque de armas” da guerra que ele declarou ao longo do tempo, sob a aparência de amor e de cônjuge “perfeito” (GOUDARD. 2008, p. 21).

 

De acordo com Richard Gardner e Maria Regina Fay de Azambuja, o genitor alienador apresenta algum nível de desequilíbrio emocional ou psicológico, acompanhado de ansiedade. Outrossim, teria uma imagem distorcida de si mesmo “vendo-se como vítima de um cruel tratamento dispensado pelo ex-cônjuge” (Azambuja, p. 3).

 

Com relação ao sofrimento do genitor alienado nada mais propício que descrever a triste carta deixada por um pai, pouco antes de assassinar o filho e suicidar-se:

 

Aos meus amigos, Em primeiro lugar, saibam que estou muito bem e que a decisão foi fruto de cuidadosa reflexão e ponderação. Na vida, temos prioridades. E a minha sempre foi meu filho, acima de qualquer outra coisa, título ou cargo. Diante das condições impostas pela mãe e pela família dela e de todo o ocorrido, ele não era e nem seria feliz. Dividido, longe do pai (por vontade da mãe), não se sentia bem na casa da mãe, onde era reprimido inclusive pelo irmão da mãe, bêbado e agressivo, fica constrangido toda vez que falam mal do pai, a mãe tentando sempre afastar o filho do pai, etc. A mãe teve coragem até de não autorizar a viagem do filho para a Disney com o próprio pai, privando o filho do presente de aniversário com o qual ele já tanto sonhava, para conhecer de perto o fantástico lugar sobre o qual os colegas de escola falavam. No futuro, todas as datas comemorativas seriam de tristeza para ele, por não poder comemorar em razão da intransigência materna. Não coloquei meu filho no mundo para ser afastado e ficar longe dele e para que ele sofresse. Se errei, é hora de corrigir o erro, abreviando-lhe o sofrimento. Infelizmente, de todas as alternativas foi a que me restou. E pode ser resumida na maior demonstração de amor de um pai pelo filho. Agora teremos liberdade, paz, e poderei cuidar bem do filho. Fiquem com Deus! (AZAMBUJA. p. 14).

 

Por sua vez, as crianças e adolescentes vítimas da Síndrome da Alienação Parental podem desenvolver inúmeras consequências, como: distúrbios psicológicos como depressão, ansiedade e pânico; utilizar drogas e álcool como forma de aliviar a dor e a culpa; cometer suicídio; não conseguir uma relação estável quando adulta; possuir problemas de gênero, em função da desqualificação do genitor atacado; e repetir o mesmo comportamento quando tiver filhos.

 

Cumpre, desta forma, ao Magistrado, sendo verificada a ocorrência de Alienação Parental, aplicar medidas que visem proteger as vítimas (genitor e menor alienado), dos eventuais abusadores, reprimindo e punindo rigorosamente tais atitudes.

 

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

 

AZAMBUJA, Maria Regina Fay de. Síndrome de alienação parental. Palestra para Escola Superior da Magistratura. Curso de atualização para magistrados – direito civil. Disponível em: http://www.escoladaajuris.com.br/cam/sindromedealienacaoparental.pdf Acesso em: 13 set. 2013.

 

DIAS, Maria Berenice. Síndrome da alienação parental, o que é isso? 2006. Disponível em http://www.alienaçãoparental.com.br/biblioteca. Acesso em: 17 set. 2013.

 

GARDNER, Richard A. O DSM-IV tem equivalente para o diagnóstico de síndrome de alienação parental (SAP)? 2002. Disponível em: http://www.alienacaoparental.com.br/biblioteca Acesso em: 13 setl. 2013.

 

GOUDARD, Bénédicte. A síndrome de alienação parental. 2008. Tese (Doutorado em Medicina) Faculdade de Medicina Lyon-Nord – Universidade Claude Bernard Lyon, França, 2008. Disponível em: http://www.sospapai.org/documentos Acesso em: 27 set. 2013.

 

SILVA, Denise Maria Perissini da. Psicologia jurídica no processo civil brasileiro. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2006.