Seleção de Conteúdos: um pressuposto necessário nas discussões do Currículo de Ensino.

Iza Aparecida Saliés

Para alguns teóricos do currículo a antiga lista de conteúdos das disciplinas escolares, deixou de ter prioridade. Hoje a recomendações é que o conteúdo não precisa ser necessariamente o eixo importante para as discussões curriculares na escola, considerando que a linearidade das disciplinas escolares deixou de ter importância pela interdisciplinaridade e a contextualização dos conteúdos, concepções pedagógicas que dispensam a hierarquização das disciplinas.

Sedimentados na concepção de que as disciplinas escolares não precisam ser hierarquicamente organizadas no currículo, então, faz-se necessário refletir sobre o que se pretende com os conteúdos escolares, o que ensinar para quem ensinar e como ensinar de modo que a contemplar a educação básica com uma educação na perspectiva da formação integral do ser humano.

Quando estamos discutindo o que ensinar e o estamos ensinado surge ai uma grande dúvida para o professor, que conteúdo selecionar para a compreensão e o entendimento de determinado assunto que preciso ensinar? Qual é a relevância social desse conteúdo? Que conteúdo da minha disciplina pode possibilitar a interdisciplinaridade na área de conhecimento? Que conteúdo é de fato significativo para o aluno?

Com essas indagações precisamos parar e refletir sobre o que estamos ensinando para nossos alunos e o que está de fato surtindo efeito na aprendizagem deles. Só assim, poderemos conseguir entender que o professor está ensinado não representa necessariamente o que o aluno precisa, deseja, e que saber e ou aprender.

Como reverter à disparidade que há entre o que ensina e o que o aluno precisa aprender? Presos à antiga listagem de conteúdos da capa do livro didático, determinados professores encontram dificuldade em mudar sua prática de planejamento na hora de selecionar conteúdo, quando suscita essa necessidade verificamos certa resistência por parte dos professores em inovar suas cristalizadas práticas.

A discrepância que há entre a listagem de conteúdos e apenas uma questão metodológica, considerando que temos que estabelecer o que realmente preciso ensinar. É tão visível, que pouco se discute a seleção de conteúdos como um exercício necessário para compor e recompor as disciplinas dos componentes curriculares da educação básica.

Precisamos lembrar que quem está estudando tem expectativas quanto a sua escolarização, precisa saber o que vai aprender o que precisa aprender e o que vai servir para ele (a). A escola enquanto espaço de ensino e aprendizagem deve ter o compromisso não só de ampliar o acesso, mas também, de viabilizar a construção de conhecimento científico, suficientes para fortalecê-lo para a cidadania, para a vida e para o mundo do trabalho.

A nova escola, esse onde o aluno pode participar, ou seja, a democrática, nela o aluno precisa saber e entender o que precisa aprender como vai ser a sua avaliação, conhecer a proposta pedagógica da escola, o trabalho do professor e mais, participar como protagonista do processo de ensino e de aprendizagem, numa interface aberta, transparente e sem restrições, como também, com o devido respeito.

Agindo assim, o professor ficará mais seguro para diagnosticar e saber como está a sua turma, assim sendo, o professor estabelece uma relação amigável e de confiança com seus alunos, oportunizando a participação de todos nas discussões sobre os temas, eixos e até conteúdos que estudarão durante o ano letivo.

O professor ao escolher seus procedimentos metodológicos de ensino, selecionar os conteúdos da sua disciplina, o que é necessário e significativo para seus alunos, suas escolhas precisam ser fundamentadas num contexto bem próximo da realidade vivenciada por eles (as).

Sampaio (1995) faz a seguinte pergunta, o segredo da qualidade do conhecimento escolar está no currículo de ensino? Para ela os conteúdos precisam dar pistas para o trabalho pedagógico do professor e possibilitar mais flexibilidade, como também facilitar a formação dos alunos, que em muitos casos são economicamente e socialmente vulneráveis e marginalizados pela própria escola.

Então o professor pode indagar como valorizar os saberes que o aluno já possui de modo que eles possam servir de referencial para a seleção de conteúdos? Que conteúdos são necessários para ampliar sua compreensão de mundo? Que conceitos ensinar nos respectivos componentes curriculares das matrizes da educação básica, que sejam capazes de contextualizar com os conhecimentos do aluno, ou seja, da sua realidade com os conhecimentos científicos?

Ao discutir currículo, disciplina e área de conhecimento o professor precisa ter a clareza e o entendimento para selecionar conteúdos que possa ser socialmente relevante, que seja amplo quanto ao aspecto global, que valorize o regional e local, como deve também, atender as complexidades do mundo contemporâneo, as exigências da sociedade, das tecnologias, sempre na perspectiva da construção de conhecimentos que sirvam para a vida do aluno.

Assim, ao selecionar os conteúdos de forma ampla, discutida, pensada e repensada, fundamentada num currículo que não seja centrado apenas em conhecimentos básicos das disciplinas, apesar de encontrarmos os professores que insistem nessa prática, que ainda é comum nas escolas.

Precisamos alertar os professores para não deixar acontecer velhas práticas que freqüentemente se diluem no dia a dia da escola, pois alguns ainda persistem em trabalhar com conteúdos antigos, porém conceituados de clássicos, mas que na realidade podem estar promovendo o insucesso dos alunos.

As pesquisas realizadas no campo do currículo têm contribuído consideravelmente para melhorar as práticas escolares, e também traz no seu bojo contribuições e alertas, suficientes para compreender que o currículo oculto, aquele que de fato acontece na sala de aula é bastante diferente do currículo recomendado pelos Sistemas de Ensino.

Segundo Apple a King (1985, p.51), essa reflexão é importante porque o professor que compreende sua posição e suas práticas no contexto mais amplo está em melhor situação para entender o que, quando e como pode alterar em seu trabalho.

Para finalizar e concordando com os autores citados neste texto, afirmo em dizer que a prática pedagógica do professor que até pouco tempo era uma ação realizada entre quatro paredes, onde a relação professor, aluno, conteúdo, prova, avaliação acontecia sem o devido reconhecimento da pessoa interessada que é o aluno, as atividades pedagógicas importantes da escola ainda acontecem sem a devida participação do ator principal, o aluno, mas já estamos mobilizando para que seja efetivada realmente a participação dos alunos nas discussões curriculares da escola.

Referências

APPLE, Michael W. Repensando ideologia e currículo. In: MOREIRA, Antonio Flávio, SILVA, Tomás Tadeu (orgs.) Currículo, cultura e sociedade. São Paulo: Cortez, 1994. P.39-57.
GIMENO SACRISTÁN, José. Escolarização e cultura: a dupla determinação. In: SILVA, Luiz Heron et al. Novos mapas culturais, novas perspectivas educacionais. Porto Alegre: Sulina, 1996. p.34-58.
LEITE, Siomara B. Considerações em torno do significado do conhecimento. In: MOREIRA, Antonio Flávio (org.) Conhecimento educacional e formação do professor. Campinas: Papirus, 1995. p.11-25.
SAMPAIO, Maria das Mercês F. Problemas da elaboração e realização do currículo. Idéias, São Paulo, n.26, p.143-50, 1995.
SAMPAIO, Maria das Mercês F. Ensinar e Aprender: Reflexão e Criação.Vol.1.
SANTOS, Lucíola L. C. P., MOREIRA, Antonio Flávio. Questões de seleção e de organização do conhecimento. Idéias, São Paulo, n,26, p.47-65, 1995.
SILVA, Tomás Tadeu. O que produz e o que reproduz em educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1992