Segurança Jurídica, Precedentes Judiciais e sua Superação: ferramentas para a integridade da Jurisdição diante da necessidade de abertura do sistema:Teoria dos Precedentes Judiciais:conceitos, técnicas de aplicação, superação e segurança jurídica

Sumário: 1 Introdução; 2 Principais conceitos relacionados a teoria dos precedentes judiciais;2.1 Civil Law e Common Law; 2.2 Decisão judicial, jurisprudência, súmula, e precedente judicial;2.Ratiodecidendi e obiterdictum;3Técnicas de aplicação e superação dos precedentes judiciais; 3.1 Distinguishin; 3.2 Overruling; 3.3 Overriding; 3.4 Transformation; 4Segurança jurídica gerada pelos precedentes judiciais;5 Conclusão; 6 Referências.

RESUMO

Com a recente transição do CPC de 73 para o de 2015 o processo tem uma característica mais célere e objetiva. Em consonância a esta ideia, o NCPC fortalece o Poder Judiciário ao conferir maior liberdade aos juízes na interpretação e ressignificação das normas. Esta adoção da teoria dos precedentes judiciais pelo CPC, inerente ao sistema jurídico common law, apresenta-se como instrumento de uniformização da jurisprudência capaz de garantir a segurança jurídica ao melhorar o âmbito de previsibilidade confiabilidade e estabilidade do Direito. O presente trabalho objetiva expor os principais conceitos relacionados a Teoria dos Precedentes Judiciais, além de apresentar as classificações existentes, bem como os tipos de aplicação dos Precedentes Judiciais.

Palavras-Chave: Precedentes Judiciais.Segurança Jurídica. Código de Processo Civil.

1 INTRODUÇÃO

Os precedentes judiciais são utilizados há muito tempo por países estrangeiros, sendo um ótimo aliado na resolução das lides. Os precedentes foram utilizados anteriormente como instrumento para trazer equidade nas decisões, mas com interesse do soberano para que houvesse aceitação por parte do povo, assim, os precedentes judiciais surgiram para fazer com que os povo aceitasse o ordenamento criado pelo soberano, fazendo com que começasse a formação do common law um direito que tinha como base nos costumes, valores do soberano, e ordem jurídica imposta.

Assim, o sistema jurídico do common law deu origem aos precedentes judiciais. O Brasil adere ao sistema civil law, onde a lei é a principal fonte do direito, porém a grande surpresa é que cada vez mais os precedentes têm ganhado papel no ordenamento jurídico brasileiro com à crescente valorização deles na legislação como nas cortes superiores. Tal cenário só é existente devido o aumento da insegurança jurídica, decorrente da falta de previsibilidade das decisões judiciais, tornando-se necessário o estudo de alternativas de uniformização das jurisprundências para elevar o grau de segurança jurídica.

Apesar dos precedentes judiciais terem sido inseridos no ordenamento jurídico brasileiro de forma expressa no Novo Código de Processo Civil, ainda existe grande discussão acerca da teoria dos precedentes. Tal discussão tem escopo na questão da reprodução das decisões, se os precedentes geram insegurança jurídica, engessamento do judiciário e arbitrariedades.

Porém o atualsistema jurídico brasileiro se encontra em crise, isso está ocorrendo devido ao excesso de recursos aos tribunais superiores e a sorte dos jurisdicionados está relacionada ao juiz que irá julgar o caso. Isso ocorre devido as possibilidade de diversas decisões sobre a mesma regra jurídica. O Judiciário do civil law, preso à tradicional não vinculação dos precedentes, acaba por não se submeter ao princípio da igualdade no momento de decidir, na medida em que, diante de dada situação concreta, chega a um determinado resultado e, diante de outra situação concreta semelhante à primeira, chega a solução distinta.

Claramente, a adoção da Teoria dos Precedentes pelo Novo Código de Processo Civil busca dar mais celeridade ao processo e desafogar o judiciário, principalmente aquelas demandas de temas repetitivos, que através da uniformização dos precedentes, o Direito terá mais efetividade.

Diante da exposição feita, o tema proposto é de grande relevância, tanto no aspecto social, quanto no âmbito jurídico. Para grande parte da população, ter o seu processo e causa na justiça demorar vários anos e não haver previsão de findarpor falta de segurança jurídica nas decisões judiciaiscausa frustração e desconforto, e o presente trabalho tem como função expor não só os principais conceitos da Teoria dos Precedentes adotados pelo NCPC, mas apresentar classificações, técnicas e etc para que o leitor tenha ciência.

O presente trabalho instiga debates e críticas sob a Teoria dos Precedentes Judiciais, tendo ciência que o estudo apresentará impactos positivos e negativos, diretos e indiretos para a sociedade e a área acadêmica em geral.

 

2PRINCIPAIS CONCEITOS RELACIONADOS A TEORIA DOS PRECEDENTES JUDICIAIS

 

2.1 Civil Law e Common Law

 

O common lawe o civil lawaparecem como os mais expoentes sistemas jurídicos dos países ocidentais. Tais sistemas possuem diferenças marcantes, mas é certo também que “quebrando paradigmas, possuem pontos de aproximação e contato. Um dos pontos principais de distinção é naquilo que consideram como fonte criadora do direito”. (OLIVEIRA, 2014, p. 33)

O direito brasileiro adveio do sistema jurídico de civil law, o qual considera que a lei é a fonte primária do ordenamento jurídico. Referido sistema se diferencia, em alguns pontos, de outro importante sistema jurídico, o common law. Segundo esta última escola, “os juízes e tribunais se espelham no que já foi decidido anteriormente. Esse respeito ao passado é inerente à teoria declaratória do Direito e é dela que se extrai a ideia de precedente judicial’’. (DIDIER; OLIVEIRA; BRAGA, 2013, p. 385)

O Sistema de Common Law também é chamado de Sistema Anglo-Saxão pelo fato de ser uma estrutura mais utilizada por países de origem anglo-saxônica como Estados Unidos e Inglaterra. Nesse sistema, o direito se baseia mais na jurisprudência, trata-se de um conjunto de interpretações das normas do direito proferidas pelo Poder Judiciário. Nesse sistema também existe a lei, porém o caso é analisado principalmente de acordo com outros casos parecidos. (CARON, 2014, p. 68) Bobbio vem ressaltar que:

 

A common law não é o direito comum de origem romana, (...) mas um direito consuetudinário tipicamente anglo-saxônico que surge diretamente das relações sociais e é acolhido pelos juízes nomeados pelo Rei; numa segunda fase ele se torna um direito de elaboração judiciária, visto que é constituído por regras adotadas pelos juízes para resolver controvérsias individuais (regras que se tornam obrigatórias para os sucessivos juízes, segundo o sistema do precedente obrigatório) (BOBBIO, 1995, p. 33)

 

Após a conquista da Inglaterra pelos normandos em 1.066, o poder se tornou central. Antes da invasão normanda, o Direito era organizado pela Assembleia de Homens Livres (ContyCourt ou HundredCourt), o qual introduzia os costumes locais para decidir que parte deveria provar suas alegações. Depois do domínio normando, as Cortes foram substituídas por jurisdições senhoriais, no qual se aplicava um direito costumeiro. A formação do Common Law, ou melhor, o direito inglês comum presente em toda a Inglaterra, ocorreu nos Tribunais da Westminster, a partir do século XIII. (DAVID, 2002)

O Direito na Inglaterra não apenas aceitava o passado, como o glorificava. A Revolução Inglesa, diferente da Revolução Francesa, pretendia fortalecer o direito. Ademais, na Inglaterra “os juízes procuravam proteger os direitos individuais e frear os excessos de poderes do Rei, confirmando o respeito ao direito originário”. (MARINONI, 2013, p. 53)

O Civil Law tem sua origem histórica no Direito Romano, principalmente, devido à introdução neste ordenamento do Corpus Iuris Civilis pelo Imperador Justiniano, o qual pretendia unificar o Direito existente. Também, os textos produzidos no Direito Canônico e os estudos realizados nas Universidades fizeram com que fosse desenvolvido em certos países europeus o Direito escrito. Posteriormente, muitas dessas nações, ao colonizarem povos habitantes da África, América e Ásia inseriram seu sistema normativo vigente. (NOGUEIRA, 2014)

Na Revolução Francesa, defendia-se a separação de poderes, principalmente, para manterem separadas as funções de Legislativo, Executivo e Judiciário. Isto ocorreu, porque muitos juízes integravam ou estavam ligados à aristocracia, classe social esta que a Revolução pretendia acabar. Assim, o Novo Regime assegurou que os magistrados ficassem restritos a apenas aplicar as leis elaboradas pelo Legislativo.No Brasil, o sistema jurídico foi influenciado pelas regras do Civil Law português. Nesse sentido, notam-se que os vários diplomas legais, algumas vezes, não são suficientes para distribuição do direito, com a necessidade de preenchimento da interpretação por meio do exercício jurisdicional. (MARINONI, 2013, p. 53)

A doutrina clássica do Civil Law considerava a lei como fonte primária do direito e entendia que a jurisprudência não constituía fonte do direito. A lei foi considerada nos países de Civil Law, fonte primordial do direito. Nesses países, os juristas procuravam primeiro descobrir as regras e soluções dos textos legislativos, com auxílio de vários processos de interpretação, para que fosse encontrada a solução que correspondesse à vontade do legislador. Ocorre que esta análise está muito distante da realidade. Foi reconhecido e gradativamente inserido o papel criativo do juiz. Com efeito, a interpretação da lei unicamente considerada em seu texto, já não consegue, em todas as circunstâncias, conduzir a solução de Direito adequada. (DAVID, 2002) A exemplo disso vemos o Brasil, com a adoção do NCPC.

 

2.2 Decisão judicial, jurisprudência, súmula, e precedente judicial.

 

O Precedente Judicial, temática principal do trabalho que pressupõe uma maior segurança jurídica no judiciário brasileiro, não deve ter seu conceito confundido com o de outros institutos. Cabe ressaltarpor exemploque decisão judicial e precedentes não se confundem, posto que o precedente é a decisão judicial, caracterizada pela potencialidade de se estabelecer como paradigma, no sentido de orientar juízes e litigantes. Portanto, mesmo que todo precedente derive de uma decisão, nem toda decisão gera um precedente. (NOGUEIRA, 2014) Marinoni destaca a diferença entre esses dois institutos:

 

“[...] para constituir precedente, não basta que a decisão seja a primeira a interpretar a norma. É preciso que a decisão enfrente todos os principais argumentos relacionados à questão de direito posta na moldura do caso concreto.” “Portanto, uma decisão pode não ter os caracteres necessários à configuração de precedente, por não tratar de questão de direito ou se limitar a afirmar a letra da lei, como pode estar apenas reafirmando o precedente.” (MARINONI, 2013, p. 214)

 

Já a jurisprudência, por exemplo, tem seu próprio conceito elucidado, que é considerada como uma “série de decisões sobre uma mesma matéria proferida por Tribunais, que se baseiam nas normas jurídicas vigentes no Direito, servindo essas decisões de orientação para o magistrado no instante da interpretação e aplicação do caso concreto.” (NOGUEIRA, 2014, p. 27) Marcelo Alves Dias de Souza salienta que:

 

O termo jurisprudência é usado, no linguajar jurídico, em pelo menos quatro sentidos: a) como sinônimo de filosofia ou ciência do direito; b) significando uma série de decisões judiciais uniformes sobre uma mesma questão jurídica; c) representando, de modo menos preciso, o conjunto de decisões judiciais de um país como um todo; d) referindo-se, impropriamente, a uma decisão judicial “isolada”. (SOUZA, 2007, p. 41)

 

A súmula é o mecanismo utilizado para aferição da uniformização jurisprudencial de uma Corte, e permite identificar o entendimento de um tribunal sobre questão jurídica.Mônica Sifuentes explica que: “No âmbito jurídico, a súmula de jurisprudência refere-se a teses jurídicas solidamente assentes em decisões jurisprudenciais das quais se retira um enunciado, que é o preceito doutrinário que extrapola os casos concretos que lhe deram origem e pode ser utilizado para orientar o julgamento de outros casos.” (SIFUENTES, 2005, p. 237-238)

Por fim, o precedente judicial “é decisão de natureza jurisdicional e universalizável emanada pelo Judiciário, para que se retire norma jurídica a ser aplicada pelo órgão que o proferiu ou por outros, nos casos futuros similares a serem julgados.” (TARUFFO, 2007, p. 10)Para Marinoni (2013, p. 214) “consiste na decisão judicial que elabora uma tese jurídica”, e complementando Taranto (2010, p. 8) explicita que “o precedente tem a função de atribuir racionalidade”.LenioStreck ressalta que:

 

O termo precedente foi utilizado pela primeira vez em 1557. A doutrina dos precedentes consiste em teoria que alça as decisões judiciais como fonte imediata do Direito junto à equidade e legislação. Dessa maneira, a doutrina dos precedentes vincula as Cortes no julgamento de casos análogos. Essa doutrina, para ser aplicada, demanda dos juízes a avaliação de quais razões jurídicas foram essenciais para o deslinde das causas anteriores. (STRECK, 2013, p. 40).

No Direito norte-americano, o precedente “é regra jurídica usada pela Corte de última instância no local onde o caso foi decidido, aplicada aos fatos que criaram aquestão de mérito presente perante a Corte para a decisão.” (MELLO, 2005, p. 180)

 

2.3 Ratiodecidendi e obiterdictum

 

Precedente é uma norma construída pela jurisdição a partir de um caso concreto que pode se aplicar a casos futuros. Tal norma se encontra na fundamentação da decisão, tendo um nome técnico: ratiodecidendi. Na doutrina do staredecisis (precedentes obrigatórios), diz-se que os juízes e tribunais devem seguir os precedentes existentes, mas na realidade eles devem seguir a ratiodecidendi (razão de decidir) dos precedentes. Por esse motivo se torna muito importante identificar a ratiodecidendi porque apenas ela tem o efeito vinculante, obrigando os juízes a respeitá-la nos julgamentos futuros. (MELLO, 2008)

A ratiodecidendi trata-se da norma geral do caso concreto que sustenta a decisão judicial. Dessa forma a Súmula é o texto da ratiodecidendi. Inicialmente é importante observar que o juiz no momento de proferir sua decisão cria necessariamente duas normas jurídicas. (CARON, 2014) Marinoni explica essas normas jurídicas:

 

“As normas jurídicas criadas são: uma norma jurídica de caráter individual que representa a decisão para o caso concreto e outra norma de caráter geral, ou seja, trata-se de uma norma jurídica contida na fundamentação do julgado, criada para justificar a sua decisão. Aquela norma jurídica, de caráter geral, criada pelo magistrado e constante da fundamentação do julgado, que consubstancia a tese jurídica a ser adotada em determinado caso, é justamente a ratiodecidendi.” (MARINONI, 2011, p. 53)

 

A conceituação de obter dictum é o inverso do ratiodecidendi, é a proposição constante no julgamento, mas não necessária à decisão. Marcelo Dias ressalta que “Se uma proposição ou regra de direito, constante de um caso ou questão não faz parte da ratiodecidendi, é obter dictum, não obrigatória.” (SOUZA, 2007, p. 39) Já Luiz Guilherme Marinoni diz que “são proposições relativas às alegações que nenhuma das partes arguiu, sobre fatos hipotéticos ou questões que a decisão não esteja julgando.” (MARINONI, 2013, p. 279) Pelo fato de não gerar tanto debate, o obter dictumse difere do radio decidentinesse sentido.

 

3TÉCNICAS DE APLICAÇÃO E SUPERAÇÃO DOS PRECEDENTES JUDICIAIS

 

Os sistemas que admitem força obrigatória aos precedentes, denominado staredecisis, adotam técnicas de aplicação e superação destes, que permite uniformidade e estabilidade no direito.Segundo a doutrina do staredecisis, a vinculação ocorre de maneira horizontal, quando o mesmo tribunal está vinculado a seus precedentes e vertical, se os precedentes obrigam instâncias inferiores. A vinculação horizontal nos países de Common Law é relativa, já que, se a Corte segue seus precedentes pode também rejeitá-los, quando estes se tornam inadequados, em razão, por exemplo, de mudanças nos valores da sociedade. (SOUZA, 2007)

 

3.1 Distinguishing

 

O precedente se aplica a casos futuros. Dessa forma faz-se necessário analisar se o precedente anterior se aplica ou não ao caso, examinando o contexto fático de onde surgiu o precedente e verificar em que medida o caso atual se assemelha ao caso que gerou o precedente. É necessário confrontar o caso atual e o caso que gerou o precedente. Se os casos forem semelhantes, o precedente se aplica; se não forem semelhantes, não se aplica. Esse confronto (comparação) se chama “distinguishing”. E tal instituto é absolutamente indispensável na aplicação dos precedentes. A aplicação dos precedentes não é automática; é necessário verificar em que medida o caso atual comporta o precedente anterior. (CARON, 2014)Cruz e Tucci ressalta que:

 

“O precedente pode ser interpretado de forma restritiva ou ampliativa. Quando a Corte entender que ele atende o preceito de Justiça, poderá estender a aplicação do ratio como pode restringir caso, a aplicação possa ter resultado não desejado.62 Alguns Tribunais usam da distinção para não aplicar os precedentes que consideram ser decisões injustas. Com isso, o distinguishing deve ser empregado observado o limite no princípio da isonomia, pois o precedente tem como objetivo efetivar a igualdade entre casos semelhantes.” (CRUZ E TUCCI, 2014, p. 171-172)

 

A aplicação do precedente no caso em julgamento requisita a confrontação entre o caso a ser julgado e a decisão anterior que o precede, com o intuito de constatar se é adequada a utilização da ratiodecidendi da decisão que possa regular as consequências jurídicas do caso em julgamento. A técnica de confronto, no qual demonstre a inadequação do uso da ratiodecidendi em razão da diferença fática com o caso a ser decidido, é chamada de distinguishing.(MARINONI, 2013, p. 307)

 

3.2Overruling

 

Uma Corte realiza o overruling ao perceber que o seu precedente ou a decisão de tribunal de instância inferior se formou erroneamente ou é inadequado, em razão de mudanças sociais, as quais alteraram os direito julgado. Os requisitos para revogação de um precedente é quando surge uma inconsistência sistêmica ou ocorre perda de congruência social, porém antes de aplicar o overruling, a Corte deve realizar o juízo de ponderação, no intuito evitar a instabilidade aos jurisdicionados. (MARINONI, 2013)

Essa forma de superação revogaprecedentes tanto no plano horizontal (órgão revoga seu próprio precedente) como também no plano vertical (tribunal superior revogando um precedente de um inferior hierárquico). Essa superação do precedente judicial pode ocorrer com eficácia extunc (restrospectiveoverruling), quando o jurisdicionado é julgado com base na regra nova, mesmo que inexistente no momento do fato que deu ensejo à demanda, ou com eficácia ex nunc (prospectiveoverruling), quando a nova orientação do valerá da data da decisão em diante. (CARON, 2014)

É importante ressaltar que para que haja a superação do precedente por meio do overruling, é necessária a convicção de que o precedente anterior é inadequado à solução do caso que está sendo julgado, seja porque não atende mais aos anseios sociais ou seja por não se adequar ao sistema jurídico. Além disso, as vantagens causadas pela revogação, que inevitavelmente trará desconfianças e insegurança aos jurisdicionados.(OLIVEIRA, 2014)

 

3.3Overriding

 

O overridingconsiste na “revogação parcial de um precedente. Uma revogação que na verdade apenas restringe a incidência do precedente. Na aplicação dessa técnica, busca-se compatibilizar o precedente a um entendimento posteriormente formado, por meio de uma diferenciação que é consistente com as razões que estiveram à base da decisão que deu origem ao precedente.” (MARINONI, 2011, p.348)

No overriding, o “Tribunal restringe a incidência do precedente, como se fosse uma revogação parcial”. (NOGUEIRA, 2014, p. 36) Para Marinoni se “supõe que o litígio anterior, caso fosse visto na perspectiva da nova situação e do novo entendimento teria outra solução.” O overriding pode ser considerado como uma situação de desvinculação do precedente. (MARINONI, 2013, p. 45)

 

3.4Transformation

 

A transformationconsiste em conferir significado diverso ao precedente, o que, na prática, implica o seu abandono, a sua revogação, mas isso não é dito de maneira expressa. Nela há uma reconstrução do precedente, na medida em que são considerados relevantes fatos e argumentos considerados apenas de passagem anteriormente. (OLIVEIRA, 2014)

Ademais, a técnica da transformação consiste na reorganização do precedente sem revogá-lo. Apesar de a solução alcançada no caso em julgamento, ser incompatível com a ratiodecidendi do precedente, pretende-se compatibilizar o resultado do caso em julgamento com o precedente transformado, atribuindo relevância aos fatos. Apesar de se concluir pelo erro na tese (razão determinante) do pedido, admite-se que se chegou ao resultado correto. (MARINONI, 2013, p. 335)

 

4SEGURANÇA JURÍDICA GERADA PELOS PRECEDENTES JUDICIAIS

 

O Judiciário brasileiro é marcado infelizmente pela ausência de uniformização nas decisões judiciais. Consequentemente temos uma maior instabilidade e insegurança jurídica nessas decisões judiciais. A adoção da Teoria dos Precedentes pelo Novo Código de Processo Civil gera automaticamente uma maior segurança jurídica nas decisões judiciais. Estamos diante, de fato, de uma expressiva inovação, que flexibiliza a natureza até então cogente das regras que disciplinam os procedimentos em juízo. (WAMBIER & BASILIO, 2015)

Tereza Arruda Alvim Wambier (1997, p. 150) também defende a aplicação dos precedentes no Brasil, devido a sua importância na garantia da segurança jurídica: “Trata-se de uma conquista dos povos civilizados, que gera segurança, previsibilidade e se constitui numa defesa do sistema contra a arbitrariedade”.

Talvez possa ser levantado o questionamento de engessamento do judiciário, entretanto, apesar desse novo contexto, observa-se que comumente ocorre entendimento jurisdicional diverso em situações jurídica similares, o que gera instabilidade na jurisprudência. Assim, afirma Alfredo Buzaid que:

 

''É admissível decisão diferente para mesmo caso, desde que seja para se adaptar as condições econômicas sociais e políticas, porém quando as circunstancias não são alteradas tal procedimento debilita a autoridade do Poder Judiciário, ao mesmo passo que causa profunda decepção às partes que postulam perante os tribunais." (BUZAID, 1985, p. 14)

 

Nesse sentido, o respeito aos precedentes judiciais tem sido reconhecido no sistema de processo brasileiro. Sendo assim, o que é verificado nas mudanças ocorridas no âmbito processual é a adoção de procedimentos que visam fortalecer os precedentes na prática jurídica brasileira, especialmente nas estruturas do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça. Diante dessa realidade, os legisladores do Projeto do Novo Código de Processo Civil buscam disciplinar em seu texto mecanismos que almejam obter maior racionalidade e uniformidade da jurisprudência, fortalecendo, com isso, os precedentes dos Tribunais e dando maior segurança jurídica. (ALVIM, 2011)

5 CONCLUSÃO

 

Objetivou-se com esta abordagem expor de forma prática e fundamentada acerca da adoção da Teoria dos Precedentes Judiciais pelo Ordenamento Jurídico Brasileiro, e nos Tribunais Superiores.Como pôde ser notado, o Novo Código de Processo Civil recebeu tal teoria em seu escopo.

Primeiramente foi demonstrado os principais conceitos relacionados a teoria dos precedentes judiciais, tendo como principal objetivo familiarizar o leitor à temática, para que possa discernir com clareza as principais diferenças dos conceitos relacionados à Teoria dos Precedentes Judiciais.

Em seguida, foi feita a análise de técnicas de aplicação e superação dos precedentes judiciais. Tais técnicas podem ser de aplicação ou de superação. No caso se houver necessidade para que um precedente não traga prejuízos ao sistema processual brasileiro, as técnicas de superação estão a disposição do Judiciário para aplicarem nos casos necessários.

Por fim, é explicitadoa segurança jurídica que é gerada pelos precedentes judiciais. Pelo fato de o sistema judiciário do país ser moroso e bastante sobrecarregado, a teoria dos precedentes judiciais evidencia uma maior segurança jurídica nas decisões judiciais, bem como dar maior celeridade ao sistema judiciário do país.

Apresentou-se os aspectos históricos, conceituais e processuais , sem a pretensão de esgotar o tema. O presente trabalho soma para a boa compreensão jurídica acadêmica para a temática da Teoria dos Precedentes Judiciais.

Além disso, esse tema tem grande relevância para estudo das ciências processuais, especificamente na parte recursal, tendo em vista que, com a adoção da Teoria dos Precedentes Judiciais pelo Código de Processo Civil, há uma maior uniformização e maior efetividade na hora de aplicar os recursos cabíveis.

REFERÊNCIAS

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