A qualquer tempo, sem muitos rodeios, sem amaciar os ouvidos de quem quer que fosse, suas palavras eram pronunciadas, se assim fosse necessário. Era do tipo que defende a tese: "quem pergunta quer saber". Possuidora de um vasto vocabulário, que aprendi a reconhecer como próprio de sua formação, típica das interioranas, guardava as respostas na ponta da língua.

Apesar de não ser letrada, aprendeu a ler e escrever, o que não lhe garantiu fazer o uso adequado da nossa língua, e em algumas palavras se confundia na pronúncia. Era indiferente às regras fundamentais do nosso idioma, mas, diante da sabedoria nata de uma mulher superior aos infortúnios por que passara, isso pouco importava. Expressava-se bem em suas colocações. Sempre tinha respostas inteligentes, saía-se muito bem de situações embaraçosas e "levar desaforo para casa", jamais!

Com muita frequência usava ditados para expor suas ideias, como se jogasse com as palavras. Recordo-me de algumas das suas falas. "Enquanto o cão esfrega o olho" era uma expressão que dizia, em outras palavras, que a pressa é inimiga da perfeição. Se deixássemos falha em algum serviço de casa ela aplicava esse termo para dizer que o tempo dedicado a ele foi pouco, por isso a qualidade ficou comprometida.

Reclamar era com ela mesmo. Se perguntassem o que achava de algo, dizia "eu não acho nada, tudo o que eu quero é comprado". Muito "delicada", minha mãe. Se permanecesse a perturbação, era incisiva: "vai 'atentar' o cão com reza!" Ansiosa, se queria algo rapidamente, não se satisfazendo com a lentidão de quem a atendia, dizia: "quem quer vai, quem não quer, manda".

Fui criada assim, ouvindo essas pérolas. Lembro de uma história do saco e do bisaco. Era quando pedíamos algo que dividiríamos com outra pessoa. Um dia desses meu irmão mais velho, em sua simplicidade, explicou-me que bisaco era uma espécie de sacola à tiracolo, na qual punham o que colhiam, para depois colocar no saco, que ficava mais distante da plantação.

Se chegasse em casa um menino chorando por causa de encrenca na rua, podia preparar os ouvidos: "boa romaria faz quem em sua casa fica em paz." Dizia isso, mas antes repetia que nunca foi mulher de tomar satisfação com a mãe de fulano ou de sicrano por causa de "confusão de menino". Justificava que não podia questionar algo que não testemunhou. E quem garantiria que o filho dela seria o certo? E dizia mais: "as crianças se perdoam na mesma hora, e voltam a brincar juntas, enquanto as mães deixam até de se falar, tornam-se, muitas vezes, inimigas".

Costumava dizer assim: "a neguinha bota a saia no dente e vai-se embora". Essa expressão eu nunca ouvi ninguém mais falar. Nem entendia direito o seu significado, mas sabia que era uma chamada, ao meu atrevimento de sair sem pedir permissão. Quando criança, eu gostava muito de ficar nas "casas alheias", como ela dizia, referindo-se a casa de vizinhos onde eu ficava horas esquecidas. Voltava ao anoitecer, muitas vezes perdendo a hora da refeição. Ela perguntava se eu já havia comido e, com a minha resposta negativa, dizia: "o galo onde canta, janta".

Sobre comportamento, ela dizia que "pau que nasce torto, até a cinza é torta". Ao se ver diante de uma "persona non grata", sussurrava ao ouvido de quem estivesse por perto: "o cão quando não vem, manda o secretário".

As duas eleitas melhores, por mim: uma, a frase que ela usava diante do impossível, quando se negava a fazer algo que fugia dos seus valores: "mas nem que o cão toque rebeca no inferno". Era usada no mesmo sentido de "nem que a vaca tussa"; a outra, era "a nêga já cresceu o beiço!". Eu não sabia reagir de outra maneira quando não conseguia seu consentimento para fazer algo.