As ruas esquinas e becos no Brasil Império são a melhor forma para se transmitir notícias, fazer política e desencadear movimentos sociais através da imprensa e do disse e me disse da população que transitam por estes lugares que são comuns a todos; pobres, ricos, letrados e analfabetos. As ruas no Rio de Janeiro entre 1820-1831 passam por grandes mudanças e transformações, estreitando os laços de convivência e abrindo brechas para movimentos sociais. PALAVRAS CHAVES: influência da imprensa, poder e política, privilégios, conflitos e abdicação

INTRODUÇÃO:

Durante o período imperial as ruas do Rio de Janeiro foram tomadas por uma atmosfera de intenso debate político. Em meio às disputas entre lusitanos e nativos e diferentes projetos de construção do Estado Nacional, e nesses espaços de sociabilidades nas ruas esquinas e becos juntamente com a imprensa são propícios as discussões, ao debate, a critica, a ação os conflitos e a política.

E quando se fala em imprensa temos que considerar que as próprias autoridades é que eram responsáveis pela maioria das publicações e até mesmo dos desencadeamentos dos movimentos sociais. Eles eram deputados, oficiais das tropas, membros da igreja, donos do comércio, livreiros, escritores... O mais importante é que todos pretendiam ser cidadãos. E tiveram uma grande participação na propaganda e no "disse me disse" levado com suas noticias e na preparação do movimento que culminou na abdicação de D Pedro I em 7 de abril de 1831.

Revelando sua influencia e contribuição na construção social e política da nação brasileira, ao difundir valores e opiniões [1]·. Os embates travados através da imprensa foram marcados pelos desacordos entre liberais e não liberais e dividiu os melhores homens no cenário político[2].

O interessante é que o Rio de Janeiro, não só pelo fato do imperador morar na cidade, todos os sentimentos estão à flor da pele, tudo é muito exagerado e ornamentado, como se fossem "ritos de poder", e nesses espaços públicos como nas ruas e que o prestigio e o desprestigio com a política e com o imperador vinha à tona. E nesses espaços é que esses ritos de poder eram sempre montados, onde até 1829 a mensagem central destacava o imperador, e seu papel tanto na independência e sua organização política do Império. A partir de 1830, as liberais, exaltados e moderados, começam a contestar toda essa ornamentação envolta dos acontecimentos do império.

INTERPRETAÇÕES DO QUE SE PASSA NAS RUAS DO RIO DE JANEIRO NO PRIMEIRO REINADO

O fato é que muito que se passava nas ruas do Rio de Janeiro e o que se dizia nos jornais não se pode dar muitos créditos, pois segundo Ângela Miranda Cardoso:

"Os jornais da época eram altamente politizados e seus relatos das festas e qualquer manifestação eram declarações políticas e não meras reportagens delas. Pois assim pretendiam construir a sua própria realidade política [3]."

A oralidade era a forma mais fácil de passar as noticias e divulgar a cultura política, pois grande parte da população ainda era analfabeta e apenas divulgavam o que ouviam falar em seu comércio ou nas ruas e transmitir da forma que entendiam a população mais abastada, pois segundo Pereira da Neves apenas os letrados se achavam no direito de entender e fazer política :

"No entanto, não pode haver duvidas de que, para os autores dos folhetos, era o letrado, sábio e prudente que conhecia a verdadeira política. os demais não passavam de "mequetrefes" que se metiam a "discorrer em política", dizendo "despropósitos e tolices, como os curandeiros e barbeiros da roça em medicina" ou demonstrando conhecer tanto dessa arte como o vigário conhecia de teologia. "[4]

Segunda Pereira tinha os lugares próprios para se discutirem política:

"O espaço em que se discutia essa cultura política nascente – sociedades literárias, clubes secretos, lojas maçônicas,, mesmo botequins- excluía, quase que por definição qualquer participação das camadas populares . " [5]

Mais o certo é que a população era muito bem informada. E de uma forma ou de outra as noticias chegavam e tinha repercussões nas ruas e até mesmo desencadeando movimentos sociais, e as idéias liberais eram bem aceitas na cidade do Rio de Janeiro.

Inicialmente, as principais temáticas que encadeavam os debates e (os embates) por meio da imprensa e do disse me disse nas ruas eram aquelas inseridas na separação do Brasil e Portugal. Sendo assim, os redatores orientavam e disputavam as opiniões relacionadas à separação dos Reinos.

O período mais coercitivo do Primeiro Reinado, iniciado com a dissolução da Assembléia constituinte em 1823, passando pela outorga da primeira constituição do Império, até as violentas repressões para com as opiniões e movimentos de oposição. E alguns redatores desafiavam o governo imperial, tentando combater as arbitrariedades do Imperador, trazendo a cena publica as necessidades de uma organização de uma Assembléia Constituinte no Império.

Com o fim da censura previa a imprensa em 1821, multiplicam-se os números de publicações a circular no Brasil. Mostrando a participação e militâncias das elites e de alguns setores das classes médias urbanas.

Portanto esse jornalismo que se desenvolveu no 1º Reinado era profundamente ideológico, militante e planfetário, seu objetivo, antes mesmo de informar, era tomar posição, tendo em vista a mobilização dos leitores para as diferentes causas. A imprensa se torna um dos principais instrumentos da luta política, era essencialmente de opinião.

"A linguagem, tanto dos jornais de oposição quanto dos governistas, era em geral extremamente agressiva e virulenta, marcada que estava pela paixão dos debates e das polemicas. A agressividade da imprensa - seja oposicionista ou governista, liberal ou conservadora – era reflexo do clima de exaltação e luta que marcou o processo de independência e o primeiro Reinado." [6]

Como estavam ligados a luta do seu tempo, os jornais seguiam a dinâmica dessas lutas, apareciam e desapareciam conforme os conflitos nos quais estavam envolvidos.

"Vários motivos explicam o nível de violência a que chegaram os debates na imprensa dessa época. O primeiro deles diz respeito ao próprio contexto de instabilidade política e falta de regulamentação em relação à imprensa.Passou-se da noite para o dia da censura previa à liberdade total,e os sujeitos ainda testavam os seus limites de sua atuação. Além disso, a popularização do prelo trouxe para as paginas dos periódicos elementos da oralidade no que essa tinha de mais popular e coloquial. E, por ultimo, é bom lembrar esse período marcou a emergência de uma elite que não tinha o habito de vida publica. O país estava se tornando uma nação independente, modelando suas instituições e aprendendo a se confrontar suas idéias num espaço publico. Nesse processo de aprendizado, de negociações e produções de consenso era normal que excessos fossem cometidos."[7]

E certo que a imprensa teve grande influência, nas atitudes da população do Império, e até mesmo as comemorações cívicas que já era tradições dessa época colonial que tomam outro caráter nos seus cortejos, onde a elite da cidade mostrava sua fidelidade ao monarca ou seu "servilismo" [8]

Na noite de 25 para 26 de março de 1830 houve mudanças significativas nos festejos do Primeiro Reinado. Liberais (exaltados e moderados) saem às ruas para comemorarem o sexto aniversário do juramento da constituição, com festejos, queima de fogos, nas praças reuniam grande numero de moradores para dar vivas cantando hinos ao imperador. E moradores iluminaram as janelas, embora não fossem convidados oficialmente pela câmara municipal.[9]

E em março de 1831 as noticias publicadas sobre a volta de D Pedro das Minas gerais, leva a cidade durante os dias 11, 12, 12 iluminarem-se, houve também muitos fogos de artifício bandas de musica. "A entrada publica" (desfile militar, Te Dèum e beija mão) reuniu uma boa parcela da população. mais segundo Antonio Borges da Fonseca , jornalista exaltado e redator de O Republico , viu algo diferente :

"nunca vi um acompanhamento mais desprezível, e de propósito não se faria ummelhor ultraje ao Imperadorque nesse dia só parecia imperador dos marinheiros. Procediam ao coche imperial seguramente 400 a 500 marinheiros, de jaqueta uns outros de rodaques, outros de casaca e quase todos de chinelos, e muitos esmolada mente vestidos.Além da tropa que por obrigação vinha forçada, nem um só brasileiro se aívia, e tudo era marinheiros e molecagem, que vinham dando vivas mui esfarrapadas, cujas maneiras muito deviam envergonharao Imperador." [10]

É certo que essas notícias causavam impactos na população e a imprensa sendo o meio de comunicação de grande relevância, levando as ruas sentimentos e fazendo com que revoltas internas surgissem entre a população. Essas tensões sociais e raciais subjacentes a violência sugere que o ataque a cidade como ocorreu na noite das garrafadas fosse:

"uma espécie de tentativa de demolição de um símbolo de poder, opressão e exclusivismo senhoriais da parte dos escravos e dos pardos e negros livres e libertos que participaram das manifestações." [11]

Entretanto convém também lembrar que essas notícias acabavam constituindo um espaço político aberto a todos. E grande parte da população participava dos acontecimentos seja dando a opinião ou espalhando no disse me disse. O que acabou por levar o imperador a abdicar o trono. E as informações agora afavor ou contra terá como alvo o seu sucessor D Pedro II.

CONSIDERAÇOES FINAIS:

A imprensa abre espaços até então fechados a maioria da população, espaços esses com símbolos de poder e políticos, capazes de fazer com que a massa populacional tomasse partido de um dos lados do conflito possibilitando que os acontecimentos que se passasse no Rio de Janeiro repercutisse por todo o Império influenciando a atuação dos exaltados e moderados na construção das lutas sociais no Brasil. Participando da vida política bem como do processo de construção do Estado Imperial, por meio de anúncios que ditava a vida cotidiana da população educando e formando pensamentos durante todo esse processo.

BIBLIOGRAFIA:

CARDOSO, Ângela Miranda "Ritual: princípio, meio e fim. Do sentido do estudo das cerimônias de entronização brasileiras", In.Brasil: formação do Estado e da nação, István Jancsó (org.) (São Paulo, 2003)

COSTA, Emília Viotti da.'Introdução ao estudo da emancipação política do Brasil'. In Da Monarquia a Republica: momentos decisivos. São Paulo: Unesp,1998.

HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil.26º Ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

LUSTOSA, Isabel. O nascimento da imprensa brasileira. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003.

MATTOS, Ilmar R. O tempo Saquarema. São Paulo/Brasília: Hucitec/INL, 1987.

MELLO, Evaldo Cabral de. 'Dezessete'.In A outra Independência .O federalismo Pernambucano de 1817 a 1824. Rio de Janeiro: Editora 34, 2004.

MOREL, Marco. Cipriano Barata na Sentinela da Liberdade. Salvador: Academia de Letras da Bahia; Assembléia Legislativa do Estado da Bahia, 2001.

_____;BARROS,Mariana Monteiro de.Palavra imagem e poder. O surgimento da imprensa no Brasil do século XIX. Rio de Janeiro: DP&A, 2003.

______"As transformações dos espaços públicos :imprensa ,atores políticos e sociabilidades na cidade imperial(1820-1840). São Paulo:Hucitec,2005.

NEVES, Lúcia Maria Bastos Pereira das. 'Parte I: O elenco e o cenário: idéias e indivíduos na circulação da cultura política da independência '. In Corcundas e Constitucionais. A cultura Política da Independência (1820-1822). Rio de Janeiro: FAPERJ, 2003.

RIBEIRO, Gladys Sabina, A liberdade em construção: identidade nacional e conflitos antilusitanos no Primeiro Reinado (Rio de Janeiro, 2002).

SOARES, Carlos Eugenio Líbano. A capoeira escrava e outras tradições rebeldes no Rio de Janeiro (1808-1850) (CAMPINAS, 2001).

SODRÉ, Nelson Werneck. História da Imprensa no Brasil.4.ed.Rio de Janeiro:Mauad,1999.

O Republico 21/03/1831. In: MOREL, Marco. Cipriano Barata na Sentinela da Liberdade. Salvador: Academia de Letras da Bahia; Assembléia Legislativa do Estado da Bahia, 2001.



[1]SODRÉ, Nelson Werneck. História da Imprensa no Brasil.4.ed.Rio de Janeiro:Mauad,1999.p 34.

[2] LUSTOSA, Isabel. O nascimento da imprensa brasileira. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,2003.p 18.

[3]CARDOSO. Ângela Miranda "Ritual: princípio, meio efim .Do sentido do estudo das cerimônias de entronização brasileiras",in Brasil: formação do Estado e da nação,István Jancsó (org.)(São Paulo,2003),pp552,596-97.

[4] NEVES, Lúcia Maria Bastos Pereira das. 'Parte I: O elenco e o cenário: idéias e indivíduos na circulação da cultura política da independência '. In Corcundas e Constitucionais. A cultura Política da Independência (1820-1822). Rio de Janeiro: FAPERJ, 2003. p104.

[5] Idem p104.

[6] LUSTOSA, Isabel. O nascimento da imprensa brasileira. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,2003.p 58.

[7] Idem p 16.

[8] Marco Morel,Cipriano Barata na Sentinela da Liberdade (salvador,2001), p 159.

[9] Carlos Eugenio Líbano Soares, A capoeira escrava e outras tradições rebeldes no Rio de Janeiro (1808-1850) (CAMPINAS, 2001) p. 38.

[10]O Republico, 21/03/1831.

[11] RIBEIRO. Gladys Sabina,A liberdade em construção : identidade nacional e conflitos antilusitanos no Primeiro Reinado (Rio de Janeiro, 2002),p 215,272-74,279.