Imaginem vocês: Eu, um professor de Matemática e Física, no meio do ano letivo, estressado com algumas turmas que me tiram do sério, parado em frente a uma academia de dança, pensando se entrava ou não.

Entrei com o objetivo de conhecer as opções de danças oferecidas. Tinham aulas de: dança de salão, lambaeróbica, jazz, dança moderna, dança de rua, ballet, dança clássica, samba e outras. Como um desafio, resolvi entrar na aula de dança de rua.

O primeiro dia foi difícil, fiquei sem graça, pois não conhecia ninguém, afinal de contas, me achava totalmente sem ritmo e estava preocupado com os meus alunos que eu tinha acabado de dar aula naquele dia. Alunos que não queriam nada com os estudos, que conversavam o tempo todo, não prestavam atenção na minha aula, enfim: eu não sabia mais o que fazer com aquela turma. Bom! É melhor eu voltar a falar da minha incrível jornada à dança.

Comecei, observando que a instrutora de dança propôs alguns passos simples e à medida que começamos a nos mexer ela observava cada um de nós. E a cada observação feita, ela mudava os movimentos e observava, mudava o ritmo e observava, se aproximava de cada um, corrigia alguns movimentos e elogiava o que cada um trazia de si como o estilo próprio para o passo que ela tinha proposto e observava. Eu já estava gostando, pelo menos aquela sensação boa me fez esquecer a dificuldade de ser professor no ambiente difícil que é a sala de aula, onde alguns alunos não sabem nem ler direito, outros que não sabem nem as operações matemáticas essenciais como dividir, somar... Culpa dos professores das séries anteriores deles. Isso não é problema meu.

 Voltando a minha turma da dança, lembrei-me que depois de alguns dias de treinamento, percebi que a instrutora começou a montar a coreografia de acordo com a gente, com o nosso jeito, estilo, “sei lá”. Eu até contribui para a coreografia com algumas idéias de movimento. Dá pra imaginar eu, que nem me acho com jeito pra dança, participando ativamente do processo de criação de um passo rítmico? Fazer parte do processo de criação fez eu me sentir, também, responsável por tudo que estava acontecendo. Eu não faltava às aulas. Ficava contando os dias e as horas para ir ao treinamento. Mas, eu estava interessado em aprender, ao contrário dos meus alunos da escola que estavam faltando muito. Alguns, eu até achava bom que eles faltassem porque eles atrapalhavam a aula. Ainda bem que eu nunca propus a eles, desenvolver algum projeto. Primeiramente que eles não mereciam e depois que não tinham maturidade para isso e muito menos capacidade para programar uma culminância de algum projeto.

Falando em projeto, depois de alguns meses de treinamento, a instrutora de dança nos surpreendeu dizendo que faríamos uma apresentação no encontro das academias de dança da cidade. O nosso grupo recebeu a notícia com um “certo” medo. Alguns alunos da dança rejeitaram inicialmente a proposta, dizendo que não tínhamos estilo e talento. Outros acharam que o grupo não tava unido para isso. Mas, a confiança que a instrutora demonstrava ter no grupo nos motivou para a aceitação da idéia, porém tínhamos a partir daquele momento um objetivo, um sentido para os treinamentos que inicialmente era só de desenvolver a coordenação motora e praticar um exercício físico. Essa apresentação gerou um comprometimento de todos nós, agora, dançarinos, porque passamos a nos preocupar com as roupas de apresentação, com a afinação da coreografia, nos preocupávamos até quando alguém ficava doente, pois precisávamos de todos se sentindo bem no dia da apresentação e o mais interessante: Começou a ficar claro para a gente que cada um de nós era importante em todo o processo, sem contar que eu não conseguia mais imaginar a minha vida sem alguns amigos que conheci durante os ensaios da dança.

No dia da apresentação começou a passar um filme de tudo que aconteceu na minha cabeça. Percebi que aqueles momentos na academia de dança já faziam parte da minha história. A emoção que todos expressavam através dos choros e abraços, na verdade era o reconhecimento sobre a importância do processo de treinamento. A apresentação era só um detalhe diante dos dias de treinamento, das relações de amizade, aprendizado e contribuição que se estabeleceu. Naquele momento a emoção era fruto da saudade de tudo que aconteceu naquela sala de dança da academia.

Marcelo Oliveira