Universidade Federal da Paraíba

Núcleo de Pesquisas em Mídias Digitais e Processos Interativos - Numid

Orientação do professor Pedro Nunes Filho

Aluno Simão Vieira de Mairins

Resumo: Socialização do conhecimento através das revistas eletrônicas

Com a popularização da internet e o desenvolvimento de novos mecanismos dos sistemas de interação entre homem e computador, a produção e a difusão de informação científica passaram a uma nova fase. Num contexto em que as noções de tempo e espaço e, principalmente, os custos de uma pesquisa, estão distorcidos, em relação às formas tradicionais, publicar um artigo, ensaio ou revista, bem como encontrar subsídios teóricos e, até mesmo, práticos para tais produções se tornou mais fácil. No ambiente virtual que se convencionou chamar ciberespaço, uma cadeia une pontos distintos, de forma que todos eles sejam capazes de interagir instantaneamente. E é assim que este artigo pretende analisar as publicações eletrônicas, como uma forma de socialização do conhecimento científico, sem, no entanto, perder-se na utopia de que as novas mídias são, por si, a solução para o problema do acesso à produção intelectual.

Palavras-chaves: ciberespaço – socialização – revista eletrônica – conhecimento científico

Ciberespaço: a noção de universo paralelo

Religiões, literatos e cineastas, há muito tempo, já concebiam ou fantasiavam a existência de uma realidade concomitante à da humanidade. Seria um ambiente, ao mesmo tempo, real e imaterial, onde fosse possível estar sem ocupar um lugar físico, podendo, assim, contrariar as leis da física com relação a tempo e espaço.

Dois corpos ocuparem um mesmo lugar no mesmo instante, ou um corpo estar em dois locais ao mesmo tempo seriam coisas impensáveis. Mas, com a popularização da internet e a necessária criação da World Wide Web ou simplesmente www – a redefundadacomo recurso da internet para gerenciamento do novo ambiente que se formavafoi possível inserir a humanidade numa nova realidade, convertendo os devaneios da ficção ou as convicções das religiões em um fenômeno plausível. A partir daí, o ser humano começa a sair da compreensão clássica do lugar analítico e passa à sua percepção subjetiva.

Esse ambiente é o ciberespaço, formado por um conjunto de elementos que lhe conferem dinâmica e possibilitam a intervenção dos usuários. Isso através da internet, numa grande rede cujas ramificações são constantes, o que lhe confere o direito de ser infinita ou tender ao infinito.

Numa analogia bem ilustrativa e simples, pode-se imaginar o ciberespaço como sendo o universo, onde cada astro é um conteúdo, os quais estariam ligados por uma rede (a www) através de uma determinada tecnologia (a internet).

Ainda dentro desse espaço, que, assim como o universo, não tem arestas ou circunferência, está a interface responsável pelo elo entre homem e máquina, bem como entre os conteúdos disponíveis no ambiente virtual. É o conjunto de recursos dos sistemas hipermidiáticos, que congregam textos, sons e imagens.

A socialização da produção científica no ciberespaço

Com a distorção dos modelos tradicionais de espaço e tempo ocasionada no âmbito do universo virtual cibernético, assim como com o surgimento de novas mídias e mecanismos de pesquisa, o desenvolvimento científico adentrou em um novo momento. O encurtamento da distância geográfica entre pesquisador e fonte de subsídios teóricos, a instantaneidade no fluxo de informações, a possibilidade de mediação interativa dos recursos e gerenciamentos dos conteúdos e as facilidades na publicação de resultados (BORN e RIBEIRO, 2005), fazem do ciberespaço um grande instrumento - provedor e disseminador - para a produção de conhecimento científico.

O acesso a informações remotas ou o contato com um agente distante despenderiam tempo imensamente superior ao gasto via internet. A disponibilidade de obras on-line ou o conteúdo de bibliotecas internacionais, bem como a correspondência eletrônica através de e-mails ou fóruns virtuais reduzem drasticamente o abismo geográfico e, portanto, o espaço de tempo da pesquisa, e permitem a comunidade científica avançar a passos mais largos. (BORN e RIBEIRO, 2005).

Sobre isso, Lemos diz que:

A maior parte dos usos no ciberespaço deve-se a atividades socializantes, nas diversas facetas exibidas pela cibercultura, como nas experiências agregadoras da internet, através dos instrumentos socializantes.

(LEMOS 2000a: 92, 150. In: SANTAELLA, 2003)

Outro ponto relativo à relação agente x conteúdo x conteúdo no ciberespaço é a questão da interatividade. O conceito foi banalizado pela publicidade sensacionalista e aplicado sem o menor critério a qualquer produto tecnológico com o qual o ser humano pudesse interferir de alguma maneira. Mas a própria comunidade científica não é consensual no que diz respeito ao termo. Arlindo Machado expõe em seu artigo Hipermídia: o labirinto como metáfora, na coletânea A Arte no Século XXI: A Humanização das Tecnologias, que:

Já em 1932 Bertold Brecht (1967, p. 81-92) falava em interatividade ao se referir ao processo de inserção democrática dos meios de comunicação numa sociedade plural. [...] Nos anos 1970, Enzensberger (1979, p.25) pensou interatividade como um mecanismo de troca permanente de papéis entre emissores e receptores [...]. Na mesma época, Raymond Williams (1979, p. 139) dizia que a maioria das tecnologias vendidas e difundidas como "interativas" eram simplesmente "reativas", pois diante delas o usuário não fazia senão escolher uma alternativa dentro de um leque de opções definido.

(MACHADO, 1997).

Mesmo sem consenso sobre o que é ou não interativo no ciberespaço, o fato é que o ser humano pode intervir num contexto em que os conteúdos estão imbricados de uma forma que nunca seria viável nos modelos tradicionais de armazenamento de dados.

E, no que se refere à publicação de pesquisas ou estudos, o avanço está na fusão de todos esses fatores. Embora, hoje, o acesso à internet ainda não seja suficiente para que se possa afirmar que é um meio para a plena democratização do conhecimento, ele já um grande passo e com perspectivas, já que as tecnologias nesse âmbito continuam a se desenvolver e atingir um número maior de indivíduos.

O que é necessário, até mesmo para garantir a eficiência das mídias digitas como veículos de socialização do saber, é não ser perder na deturpação feita sobre a célebre frase de McLuhan: "O meio é a mensagem" (MCLUHAN, 1964. In SANTAELLA, 2003). O suporte, assim como a mensagem, é um elemento do processo de comunicação que produz sentido e que, portanto, também é mensagem. Mas não a restringe a si.

Sobre isso, Lunenfeld diz que:

Com essa afirmação, McLuhan estava justamente se desviando das tendências das teorias da comunicação em sua época, que separavam, de um lado, o modo como a mensagem é transmitida, de outro lado, o conteúdo da mensagem.

(LUNENFELD 1994a: 130. In SANTAELLA, 2003)

As revistas eletrônicas

As publicações científicas sempre foram essenciais para a difusão do conhecimento acadêmico. Desde muito tempo, atuam como o veículo propagador de resultados de pesquisas, tais quais as descobertas da genética e da astrofísica ou as teorias sociais.

Hoje, as coletâneas de artigos e revistas científicas impressas, por exemplo, ainda contribuem bastante para a divulgação de resultados da comunidade acadêmica e de pesquisadores em geral. Mas, nenhuma com a facilidade das publicações eletrônicas, tanto no que se refere à publicação (que, na internet, se converte em postagem que alimenta um espaço de determinado sítio) quanto ao que diz respeito à acessibilidade.

Sobre isso, Cláudia Born e Janile Ribeiro dizem:

A publicação dos periódicos pagos termina por limitar a divulgação do conhecimento, deixando-o restrito a um determinado número de especialistas que podem arcar com o custo do acesso. A revista eletrônica científica é uma forma de publicação periódica digital que surge como solução para este problema. A publicação no ciberespaço possibilita que os artigos estejam disponíveis em nível nacional e internacional. Essas revistas são utilizadas pelas universidades para apoiar a divulgação dos resultados de pesquisas científicas, criando mecanismos para legitimar e estimular a publicação dos trabalhos produzidos.

(BORN e RIBEIRO, 2005)

Inseridas no contexto descrito no tópico anterior, as revistas eletrônicas concretizam um dos mais eficazes meios de difusão de conhecimento acadêmico. Normalmente, alimentadas de forma colaborativa e com conselho editorial amplo, formado por pesquisadores de diferentes universidade e instituições de ensino, elas convergem num único espaço o que, tradicionalmente, ficaria disperso ou custaria muito para ser reunido numa coletânea, por exemplo.

Vale lembrar ainda que as publicações impressas são estáticas e lineares. No ciberespaço, os bancos de dados podem ser atualizados a qualquer momento. Além de que o leitor não é um mero receptor da mensagem veiculada, é um ator do processo comunicativo, seja ele circular – através de recursos para feedback, como comentários e canais para correspondência – ou interativo – pela abertura a qualquer produção que se encaixe nas normas da publicação.

A construção em cima de sistemas hipermidiáticos também confere às revistas eletrônicas a possibilidade de associar ao texto outros elementos. Pela imaterialidade do suporte, a convergência de textos, imagens (estáticas e dinâmicas) e sons através, simplesmente de elos que se convencionou chamar de hiperlinks ou somente links, através de um clique no mouse, é possível.Recursos antes inviáveis em um único suporte, hoje são plenamente cabíveis em ambientes do ciberespaço.

A estrutura, porém, da maioria das revistas eletrônicas, absorve pouca das inúmeras possibilidades do ciberespaço. No tocante a formas e conteúdos, elas são muito semelhantes às impressas, diferenciando-se pelo suporte, evidentemente, e por alguns recursos de interlocução com leitores e fornecedores de material (quase sempre, texto verbal).

Sobre isso, Pedro Nunes diz:

Faz-se necessário implementar cada vez mais, no ciberespaço e ambientes hipermídia, novas formas de comunicação, de apresentação e reorganização da informação, por exatamente se tratar de um espaço dinâmico, onde a dimensão técnica interage com a dimensão cultural, visto que ambas englobam a dimensão social e coletiva da rede. [...] Em se tratando de divulgação científica na rede, poucas revistas eletrônicas digitais vêm observando essas regras básicas da sintaxe digital.

(NUNES, online).

Conclusão

Passadas as euforias frutificadas diante do novo, a humanidade deve tender à compreensão do ciberespaço como um ambiente a mais no que tradicionalmente a ciência convencionou tratar por biosfera. Mas que ele não é um lugar com vida própria e depende da intervenção humana que abriga para estímulo de suas funções mecânicas.

Tratado de modo racional, o ciberespaço pode, sim, atuar como meio de transformação das relações humanas, alterando a forma como a informação de interesse público – seja ela de cunho político, científico, cultural ou social – é veiculada.

Para a produção acadêmica, em especial, o universos paralelo eletrônico se dispões de forma mais simples e fácil. Para as universidades e centros de pesquisas, o acesso a computadores conectados à rede é mais garantido do que à sociedade comum, que não tem livre acesso, devido a inúmeros fatores, dentre eles o ainda alto custo das tecnologias. Sem contar com a capacitação para gerenciar o uso dos meios digitais, de que a Academia desfruta em maior número, também.

Sabendo driblar os próprios ufanismos ao passo que explora o máximo possível dos recursos hiper e multimidiáticos do ciberespaço, os produtores de conhecimento científico terão nele mais que um instrumento de trabalho, um grande aliado imaterial, porém bastante real.

Referências

BORN, Cláudia e RIBEIRO, Janile. Estudo de Caso: A Revista eletrônica como um meio de divulgação da produção científica: estudo de caso da Revista Cybermídia. Maceió, 2005. Universidade Federal de Alagoas.

MACHADO, Arlindo. Artigo: Hipermídia: o labirinto como metáfora. In: A arte no século XXI: a humanização das tecnologias. Ed. da UNESP, São Paulo, 1997.

NUNES, Pedro. Processos de significação: hipermídia, ciberespaço e publicações digitais. Disponível em < http://www.ipv.pt/forumedia/6/8.pdf >. Acesso em 25 abril 2008.

SANTAELLA, Lucia. Culturas e artes do pós-humano: da cultura das mídias à cibercultura. São Paulo: Paulus, 2003.