A doutrina jurídica brasileira ensina a muito que os princípios constitucionais não se sobrepõem uns aos outros e quando ocorrem conflitos entre estes, vem a necessidade do uso de interpretação jurídica habilitada aliada ao senso-comum para a solucionar tais questões. No caso das revistas realizadas nas empresas, o eminente conflito se demonstra no choque entre os incisos X e XII, ambos do art. 5 da Constituição Federal de 1988. O primeiro inciso versa sobre a proteção à intimidade e privacidade de todos os cidadãos e o segundo inciso atesta o direito legítimo à propriedade. 

No presente conflito se verifica o conflito de interesses existente entre o trabalhador que procura legitimamente resguardar sua privacidade e o empregador que busca também legitimamente resguardar seu patrimônio.  Assim, necessárias algumas medidas para se trilhar o meio-termo necessário à existência de um ambiente de trabalho saudável.

Inicialmente, o  Tribunal Superior do Trabalho em vários de seus julgados já delineou distinção entre os tipos de revistas, a íntima e a pessoal. Revista íntima é aquela que adentra na intimidade física dos empregados de maneira humilhante Exemplo de revisa íntima seria a obrigação do obreiro retirar sua roupa para averiguação na saída de seu local de trabalho. Necessário frisar que tal modalidade de revista é utilizada também em presídios e é até mesmo proibida pela CLT ao sexo feminino, conforme comanda o art. 373-A, dando a dimensão de sua gravidade.

A utilização de revista íntima,  é desaconselhável em qualquer situação vez que a tecnologia existente pode substituir a citada revista por métodos menos invasivos, como por exemplo, a existência de câmeras de monitoramento, a utilização de detectores de metais, entre outros que evitem a desproporcionalidade da exigência da invasão à intimidade dos obreiros. 

Em julgado recente prolatado pela Sétima Turma do TST, houve a condenação de empresa ao pagamento de R$30.000,00 em decorrência de revista íntima abusiva.[1]

Na ementa de tal julgado, os ministros definem de maneira clara a natureza vil da revista íntima:

1.4. Não há nada e nenhuma norma que autorize o empregador ou seus prepostos a obrigar empregados ao desnudamento para revistas. 1.5. Não há revista íntima razoável. O ato em si constitui abuso de direito e, diante do regramento constitucional, é ilícito. O direito de propriedade não se estende a ponto de permitir ao empregador dispor da intimidade de seus empregados, submetendo-os, cruelmente, a humilhações, às quais se curvam pela necessidade de conservação do emprego. Não é razoável tolerar-se a recusa a valor tão básico, cuja reiteração, por certo, redunda em rigorosa modificação do espírito e em irrecusável sofrimento para o trabalhador. (TST-RR-45200-53.2012.5.13.0024. Ministro Relator: Alberto Luiz Breschiani de Fontan Pereira. 7a Turma.)

Portanto, o uso de métodos de revista que afetem a honra obreira devem ser extintos da prática empresarial, nos termos postos pelo órgão máximo da Justiça Obreira, sob risco de incorrer em dano à moral passível de ressarcimento. 

A outra modalidade de revista, a revista pessoal, seria a verificação de bolsas e sacolas sem o contato físico com os revistados. A revista aos bens resguarda o patrimônio empresarial até o limite do bom-senso se atendo a objetos e não às pessoas.

Para a efetividade da prática é necessária a realização do ato de maneira moderada, impessoal e indiscriminada, além da publicidade da existência do procedimento, ou seja que todos saibam que o ato será realizado. 

Quando exercida nos moldes delineados anteriormente, a revista pessoal é visualizada pela jurisprudência majoritária do TST como exercício do poder diretivo do empregador, nos moldes apostos pela CLT. Em julgados recentes que demonstram esta assertiva, decidiu o TST:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. DANOS MORAIS. FISCALIZAÇÃO. BOLSAS, SACOLAS E MOCHILAS. A fiscalização feita com moderação e razoabilidade não caracteriza abuso de direito ou ato ilícito, constituindo, na realidade, exercício regular do direito do empregador. A fiscalização de bolsas, sacolas e mochilas dos empregados, sem que se proceda à revista íntima, mas apenas visual, e em caráter geral, relativamente aos empregados de mesmo nível hierárquico, não configura excesso do empregador. Agravo de instrumento a que se nega provimento." (AIRR - 160/2008-004-19-40.0 Data de Julgamento: 02/09/2009, Relatora Ministra: Kátia Magalhães Arruda, 5ª Turma, Data de Divulgação: DEJT 11/09/2009.)

 INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - REVISTA EM BOLSAS E SACOLAS DOS EMPREGADOS. I - A revista realizada com moderação e razoabilidade não caracteriza abuso de direito ou ato ilícito, constituindo, na realidade, exercício regular do direito do empregador, inerente ao seu poder diretivo e de fiscalização. II - Dessa forma, a revista em bolsas, sacolas ou mochilas dos empregados sorteados para tanto, sem que se proceda à revista íntima e sem contato corporal, mas apenas visual do vistoriador, e em caráter geral relativamente aos empregados de mesmo nível hierárquico, não denuncia excesso do empregador, inabilitando a autora à percepção da indenização por danos morais. IV - Recurso não conhecido. (RR-12187/2006-008-09-00.0 Data de Julgamento: 24/06/2009, Relator Ministro: Antônio José de Barros Levenhagen, 4ª Turma, Data de Divulgação: DEJT 07/08/2009).

 

Chega-se a conclusão de que não há personagens certos e errados, devendo o obreiro, o empregador e o operador do direito laboral chegar a entendimento nesta zona nebulosa do que é possível ou não a cada caso prático. Todavia, deve-se ter em mente que, apesar das controvérsias ainda existentes sobre a temática das revistas, o Tribunal Superior do Trabalho já sedimentara alguns pontos da discussão que ajudam a entender melhor o tema, devendo ser estudados e debatidos pelas partes interessadas.



[1] http://www.tst.jus.br/materias-especiais/-/asset_publisher/89Dk/content/id/3314963