Introdução

O Processo Penal Brasileiro é munido por vários princípios, dentre eles o Princípio da Verdade Real, segundo o qual o juiz tem o dever de buscar a realidade dos fatos delituosos, tendo sempre em foco o agente que cometeu a infração e em quais condições perpetrou, para se fazer justiça a quem mereça.
Porém, existem institutos processuais penais que impedem que essa liberdade de ir alem dos fatos trazidos aos autos sejam plenamente eficazes, como é o caso da revisão criminal "pro societatis". Isto porque, esse instituto concede prerrogativas ao réu, uma vez que da possibilidade da decisão ser revista quando for para beneficiá-lo, em outros termos, utilizada somente como meio de defesa.
Desta forma, se o réu utiliza meios ou provas ilícitas para obter uma sentença que extinga sua punibilidade, e se esses meios ilícitos forem descobertos ulteriormente, não haverá a possibilidade da decisão ser revista para declará-lo culpado, pois se trata de um instituto exclusivo da defesa.
Vejamos, então, que nem sempre a busca pela verdade real dos delitos prevalecerá sobre "vantagens" concedidas aos acusados.
Ao decorrer do artigo trabalharemos sobre essas "prerrogativas" concedidas aos "acusados" e as restrições que recaem sobre o poder estatal.

Palavra Chave: verdade real, revisão criminal, justiça.

Revisão Criminal Pro Societate: instrumento viável a garantir a efetividade da justiça
No Brasil, o processo penal tem como característica primordial o sistema acusatório, ou seja, o indivíduo como sujeito de direitos, garantido-lhes o devido processo legal, a ampla defesa e contraditório. Típico dos Estados Democráticos de Direito.
Entretanto, em muito, o sistema legislativo penal brasileiro vem favorecendo o condenado, atribuindo-lhe direitos como o princípio " in dúbio pro réu"e Revisão Criminal "pro societate".
Revisão Criminal " pro societate" tem cabimento quando os erros judiciais recaem em decisão de mérito absolutória com transito em julgado, ou seja, erros que ensejam a absolvição do culpado. Seria um mecanismo de defesa social.
Esse instituto apesar de ter sido abrigado por varias legislações, a exemplo da Alemanha, Áustria, Hungria, Sérvia, Rússia, Portugal, Suíça, Colômbia e Equador, não é aceita pelo ordenamento jurídico brasileiro. Isso porque, nas palavras de Hugo Nigro Mazilli, os interesses de segurança jurídica da sociedade e os interesses do Estado não podem sobrepujar o fundamental status libertatis.
Os adeptos dessa corrente afirmam que não haveria segurança jurídica para o absolvido que, indefinidamente, pudesse estar exposto a renovação do processo. Dizem, ainda, que o Estado já teve a chance de provar a imputação, sem lograr êxito e que, portanto, o réu poderia ser prejudicado se, com o passar do tempo, a coleta de provas para a sua defesa restasse impossibilitada.
Porem, no presente trabalho, aderir ao posicionamento daqueles que defendem a instituição do supra instituto por acreditar que a revisão criminal "pro societate" esta diretamente ligado a justiça, princípio que deve se prevalecer sobre o status libertatis individual.
O fundamento que justifica a aplicação desse instituto é o mesmo fundamento utilizado para justificar a utilização da revisão criminal pro reo, qual seja, o erro judiciário. Assim, da mesma forma que o condenado deve ser protegido de uma decisão que contenha vícios a sociedade deve ser tutelada de uma decisão que absolve um culpado.
A absolvição indevida de um culpado pode acarretar em conseqüências maléficas, não só para a sociedade mas ao judiciário também, tais como: degradação do judiciário, descontentamento com a atividade legislativa, possibilitaria o aumento de incidência desse meio torpe, incentiva a vingança privada e estabelece um sentimento de revolta gerando uma grande desordem social.
Além desses prejuízos, a proibição desse instituto afronta diretamente um dos princípios mais importantes do processo penal, o princípio da Verdade Real. Esse princípio defende uma maior proximidade do provimento jurisdicional com a realidade fática, em outras palavras, determina que o fato em análise no processo deve corresponder ao que esta fora dele, em toda sua plenitude, sem quaisquer artifícios, sem presunções, sem ficções. Deve haver a pesquisa do que realmente aconteceu, a fim de que a realidade possa se transmitir com absoluta fidelidade aos autos.
Então, se você proíbe que o Estado reveja uma decisão eivada de vícios, você não permite que a Verdade Real seja alcançada.
A Constituição de 1988 protege a coisa julgada, não permitindo que tal matéria seja apreciada novamente, porém, a coisa julgada que não contenha defeitos ou irregularidades, que representa a correta e justa aplicação da lei ao caso concreto.
O princípio da proporcionalidade que, por sua vez, determina que deve estabelecer um equilíbrio entre interesses conflitantes dentro de um caso concreto, é utilizado pelas doutrinas mais modernas, como um meio hábil a justificar a revisão criminal em prejuízo do réu.
È sabido que a permissão desse instituto levará ao conflito de princípios, a saber: princípio da coisa julgada e o princípio da justiça. Como forma de solução, esses princípios devem ser valorados ate que um ceda para que o outro prevaleça.
Se aplicarmos o princípio da proporcionalidade, não restará duvidas de que o princípio soberano da justiça irá se sobrepor sobre todos os outros, permitindo, dessa forma, a revisão criminal em prejuízo do réu.
É de supra importância que o judiciário tenha em mente que os interesses e direitos de uma pessoa, no caso o acusado, não pode prevalecer sobre o direito coletivo à justiça e a segurança, sob pena de sofrer uma manifesta agressão ao Estado Democrático de Direito.
O STF já vem entendendo que, em alguns casos, a revisão criminal em prejuízo do réu é cabível, levando a crer que a possibilidade de sua adoção não é totalmente descabida. A exemplo, o instituto " morns omnia solvit" determina que com a morte do acusado a sua punibilidade será extinta. Começaram a utilizá-lo como instrumento de impunição, uma vez que apresentavam certidões de óbito falsas. Nesses casos, o STF passou a permitir a retomada da persecução penal.
O objetivo desse trabalho não é defender a utilização exacerbada desse instituto, mas ressaltar a importância deste para se ter justiça ao processo e o alcance da Verdade Real. O razoável seria o legislador prever essa modalidade de revisão e descrever, taxativamente, o seu cabimento.
Por fim, a adoção da revisão criminal "pro societate" pelo ordenamento jurídico brasileiro, como alternativa ao alcance da verdade real no processo, em muito contribuiria para o alcance da justiça, objetivo primordial do processo.

Conclusão

Diante todo o exposto no presente trabalho, depreende-se que o Princípio da Verdade Real tem grande preponderância no Processo Penal, isso porque, admiti-se a utilização de todos os meios permitidos em direito para que os fatos levantados sejam o mais real possível.
Como forma de garantir esse princípio supra mencionado chegou-se à conclusão que a revisão criminal pro societate deve ser permitida, uma vez que essa revisão tem o fito de fazer justiça, além de garantir a segurança jurídica do ordenamento.
Ademais, o mesmo fundamento utilizado para criar a prerrogativa aos condenados de terem as decisões revistas, é defendido na revisão pro societate. Enquanto na primeira oportunidade busca-se a segurança do condenado frente aos erros judiciais, na segunda busca-se a segurança da sociedade em ter que conviver com um criminoso.
Enfim, conclui-se que a efetivação da justiça deve ser vista como um instrumento fundamental para a segurança social e, portanto, a utilização da revisão criminal em benefício da sociedade é de supra importância, além de estabelecer uma situação de igualdade entre réu e o Estado, já que a prerrogativa da revisão será utilizada tanto como instrumento de defesa como de acusação.

Bibliografia
- SOARES, Clara Dias. Artigo " A Proibição da Revisão Criminal Pro Societate como uma limitação ao Princípio da Verdade Real no Processo Penal Brasileiro". Analista Processual do Ministério Público Federal.
- BARRETO, Cunha. Revisão Criminal. Revista dos Tribunais, São Paulo, v 87, n 749, p.795-805, mar/abri 1998.