1.A nova relação com o saber

O autor nos obriga a uma análise extremamente crítica quando tratamos sobre educação, em especial quando relacionada às novas mídias de comunicação e informação, assim, somos trazidos à realidade social presente: total transformação cultural e dos meios, em especial os da comunicação e da educação, traz-se a tona a máxima de que aquilo que aprendemos hoje como moderno e atual, amanhã já não passará do mais puro obsoletismo arcaico.

Para Lévy, o trabalho hoje é sinônimo de aprender, transmitir saberes (ensinar) e produzir conhecimentos, continua o texto a afirmar, inclusive, que o ciberespaço é hoje – por meio de suas tecnologias – cada vez mais reflexo das funções mentais humanas, como a memória, a imaginação e a percepção.

Ainda mais: como a maioria das informações, programas e conhecimentos cibernéticos são registradas por meio de documentos digitais, elas podem facilmente ser partilhadas entre um grande número de indivíduos.

O autor chama esse fenômeno de saber-fluxo, ou saber-transação e aponta serem necessárias, em decorrência desse fenômeno metamorfósico, duas grandes reformas dos sistemas de educação e formação. "Primeiro, a adaptação dos dispositivos e do espírito do aprendizado aberto e à distância no cotidiano e no ordinário da educação (...) a segunda reforma envolve o reconhecimento do aprendido." O autor acerta ao delinear que as pessoas aprendem não apenas na escola, antes detentora do monopólio do conhecimento, mas também no trabalho, com seus pares na sociedade, em casa, quando se divertem, etc. e tal mudança deve ser considerada como positiva, cabendo à escola, inclusive, auxiliar os educandos para se preparar para essa avalanche de conhecimento, inclusive sabendo valorizar também oaprendizado daqueles chamados "não-acadêmicos".

  1. A articulação de uma multidão de pontos de vista sem ponto de vista de Deus

Ao ler a última locução verbal, alguns diriam "Blasfêmia!" ou "Heresia!", o que o autor quer, em verdade, é chamar a atenção para o formato da World Wibe Web: ela é composta de bilhões de gotas de informação, formando assim, quase que a totalidade do conhecimento humano, em um verdadeiro oceano de conhecimento.

Para o autor, cada página é o reflexo de uma verdade, não estão presentes na internet hierarquias absolutas, cada sítio é um agente de seleção e uma resposta à uma determinada pergunta. Essa enorme relação não possui uma unificação superior, tudo se organiza quase que horizontalmente, sendo sugerido pelo autor, inclusive, que "novos instrumentos de indexação e pesquisa precisam ser inventados" (será que o google não dará conta do recado?).

  1. O segundo dilúvio e a inacessibilidade de tudo

O texto nos traz a seguinte questão: a web é mutável e instável, incontrolável nos padrões que se seguem, assim Roy Ascott, discorre sobre a inegável presença de um dilúvio de informação, contudo, diferente daquele primeiro, não teremos um refluxo, e será necessário a todos nós nos acostumarmos com a profusão caótica do conhecimento e da informação.

Esse fenômeno, ao que nos parece será irreversível, salvo se, segundo o próprio autor não ocorrer nenhuma catástrofe cultural, nenhum grande reordenamento, mas isso não nos parece possível, afinal, quem conseguiria controlar toda a sociedade e parar o olho do furacão?

Numa referência histórica, o autor nos remonta ao início de tudo: quando, no fim do século XVIII surge – por meio de Diderot e d'Alembert escrevem a primeira "enciclopédia", pois, até ali, poucos poderiam imaginar conseguir deter a maior parte do conhecimento, ou ao menos aquele que se fazia mais importante. À partir daí, inclusive em decorrência da velocidade na evolução cultural e do conhecimento (puxados pela revolução industrial e as que lhe sucederam), o conhecimento do mundo restou incontrolável e "de todos".

Assim, como para Noé lhe foi determinado escolher o que era mais importante, como podemos nós escolhermos agora? O autor sugere-nos substituir a grande e pesada arca por uma frota composta de pequenas embarcações de grande mobilidade, e ainda assim sugeriria que fossem todas amarradas umas às outras, de modo que toda pequena importância estivesse conectada, mais próxima assim do todo, que seria uma utopia, afinal o todo da informação é inalcançável.

Hoje, pois, as metáforas centrais da relação com o saber são a navegação e o surfe, que implicam uma capacidade para enfrentar as ondas, os turbilhões, as correntes e os ventos contrários numa extensão plana, sem fronteiras e sempre mutante. Em contrapartida, as velhas metáforas da pirâmide (escalar a pirâmide do saber), da escala ou do curso (já todo traçado) têm aquele cheiro gostoso das hierarquias imóveis de outrora.

Assim, resta-nos navegar nesse mar sem fim, sabendo onde e como localizar estes outros pequenos barcos, como meio de sobreviver neste oceano.

  1. Quem sabe? A reencarnação do saber

"As páginas Web expressam as idéias, os desejos, os saberes, as ofertas de transação de pessoas e grupos humanos", assim, partindo de tais pressupostos, devemos lembrar que, como uma ramificação da sociedade, a internet também é preenchida por pessoas: todo texto, toda imagem, toda página possui uma "assinatura", afinal, alguém inseriu "aquilo" a compreensão desta realidade nos leva a compreender que a internet não é assim tão "fria" quanto alguns tentam transparecer, afinal ela é ativa, repleta de vida borbulhante que encarna o conhecimento.

Para Levy, a mudança do meio se dá em função da tecnologia, afinal, quando o homem não dominava a escrita, a "guarda" e transmissão do conhecimento se fazia pela via oral, e por muitos anos se manteve assim, já com o advento da escrita, o conhecimento começou a ser ampliado e registrado de forma mais precisa, em especial com o surgimento da imprensa e do livro, desta forma, o conhecimento começa a perder o caráter e as impressões do indivíduo, e passa a ser mais "integro", e porque não dizer até mais "científico".

Desta arte, vemos que a mudança se repete tão somente em decorrência da evolução tecnológica, afinal, agora o conhecimento é armazenado na totalidade infinita da Web.

Temos assim que as instituições de ensino, em especial as universidades, apóiam-se, pois, sobre a interconexão em tempo real da comunidade científica, sua participação cooperativa nos eventos que lhe concernem, mais do que sobre a depreciação do evento singular que caracterizava a antiga universalidade das ciências exatas.

  1. A simulação: um modo de conhecimento próprio da cybercultura

A simulação é vista para o autor como uma ferramenta de interesse peculiar, uma vez que permite-nos multiplicar nossos conhecimentos (não substituí-los), servem como uma forma rápida e prática de multiplicar o conhecimento entre vários autores da construção de forma articulada e com o objetivo de agregar verdadeira sinergia nos trabalhos desenvolvidos, ou ainda servem também para armazenar e utilizar de forma prática toda esta informação, essa tecnologia é conhecida mais facilmente como sendo a de "inteligência artificial".

Com a ferramenta da simulação, podemos facilmente alterar determinados parâmetros e automaticamente verificar seus resultados, o que permite ampliar o conhecimento individual bem como a inteligência coletiva.

  1. Da interconexão caótica à inteligência coletiva

É certo que a origem e talvez a principal causa da desordem vivida na internet seja o fato de que a interconexão de todos com todos causa este transtorno, contudo, é essa gama de interligações que nos permite solucionar os problemas de forma prática, com efeito, essa interconectividade geral é que permite a ampliação da inteligência coletiva nas comunidades virtuais, e é desta ferramenta, a inteligência coletiva, que os indivíduos podem lançar mão quando sentem-se menos favorecidos frente ao caos vivenciado no oceano da informação.

Assim, diferente de outrora (e principalmente dos bons filmes de ficção), o objetivo maior não é criar uma máquina dotada de tamanha inteligência ao ponto de superar um homem, mas sim, dotar as comunidades, as coletividades, do conhecimento necessário para que cada pessoa possa beber desta fonte e se curar dos males que sofre, ou seja, talvez o benefício maior da internet, do ambiente web, seja o de criar relacionamentos sociais que permitam a cada indivíduo encontrar de modo específico meios para a resolução de seus problemas, seja aqueles de que ordem for.

Com isso, toda e qualquer política educacional deverá levar em conta que o ciberespaço será ferramenta fundamental da vida em sociedade.

  1. Mutações da educação e economia do saber – Aprendizado aberto e à distância

Já é de conhecimento geral que o sistema de ensino está saturado em razão de sua demanda: as cadeiras das universidades estão lotadas, e grande parte da população está ou quer estar estudando, desta arte, será muito difícil aumentar o número de docentes de modo proporcional à demanda, com isso, as instituições de ensino se verão obrigadas a encontrar alternativas, em especial aquelas que forem capazes de multiplicar o conhecimento dos professores, de modo a economizar em custos e baratear as infra-estruturas das escolas e universidades.

Para o autor, a demanda por formação não só está passando por um enorme crescimento quantitativo, como também está sofrendo alterações de caráter qualitativo, no sentido de uma crescente necessidade social de diversificação do conhecimento e da informação.

Os métodos tradicionais de padronização do ensino, de modo a ganhos em escala está prestes a sofrer grandes perdas, uma vez que o indivíduo, na qualidade de aluno está cada vez mais ávido por conhecimento especializado e de caráter individual.

Um fato é de que tanto as universidades, quanto as escolas de primeiro e segundo grau oferecem a seus alunos a possibilidade de navegação no oceano de informação que é acessível por meio da internet, sobre isso, inclusive, temos a nova legislação paulista que trata sobre a autorização para a aplicação de até 20% da carga horária do ensino fundamental para atividades à distância.

Em verdade, o autor traz à baila a pertinente questão de que especialistas sobre o assunto apontam para uma futura ausência de distinção entre ensino presencial e ensino à distância, afinal, com o uso das redes de telecomunicação e dos suportes multimídia, está integrando-se progressivamente aos meios de ensino clássico, nesse sentido inclusive, tal apontamento vem a somar com os trabalhos de Moran e Jeneviève.

  1. O aprendizado cooperativo e o novo papel dos docentes

Para Levy o ponto essencial é a mudança nos processos de aprendizado, melhorando sua qualidade; para ele o importante seria implementar novos paradigmas de aquisição do conhecimento, sendo o ideal, o aprendizado cooperativo.

Assim, alunos e professores tendem a aprender juntos, construindo o conhecimento por meio de ferramentas comuns e divididas entre as partes, sendo a formação contínua dos docentes uma das melhores aplicações dos métodos do aprendizado aberto à distância – AAD.

Para o autor, o docente deve deixar de ser um transmissor do conhecimento, para tornar-se um "animador da inteligência" coletiva dos grupos dos quais se encarregou, ou seja, caberá a ele, como um verdadeiro educomunicador, utilizar-se de todas as ferramentas tecnológicas disponíveis para incentivar seus tutelados a pensar e aprender, tendo como centro da atividade o acompanhamento e gerenciamento dos aprendizados, tornando-se um verdadeiro "gestor".

  1. Rumo à uma regulação pública da economia do conhecimento

Vemos que as pesquisas sobre o tema tem se voltado para diversos eixos: aquele que olha as ferramentas tecnológicas como substituto do professor estão fadadas ao erro: não há como computadores substituírem os docentes na construção do conhecimento. Já aquelas que entendem que o professor deve agir por meio de todas as ferramentas de comunicação e ensino disponíveis, ampliando a gama de conhecimentos a que os seus pares alunos poderão ter, agindo assim, preocupado com o interesse social que é o de ampliar os horizontes dos educandos, são as que mais encontram respaldo na atualidade e que – dentro do nosso entendimento – mais se aproximam da correção.

Mais uma vez, o autor acerta a mão quando diz que o profissional do ensino não deve fazer uso das ferramentas tecnológicas apenas por faze-lo, apenas para manter-se "na moda". O profissional docente deve estar preparado para utilizar da didática enquanto reflexão e aprimoramento do ato de ensinar de modo a acompanhar consciente e deliberadamente as mudanças sociais e institucionais vividas no seu meio, afinal, o que está em jogo não é apenas e tão somente a modificação do ensino presencial para os ensinos à distância e on-line, mas sim a mudança de um paradigma fixo e fortemente institucionalizado que sempre foi centrado na simples transmissão do conhecimento, para um modelo mais amplo onde existe um verdadeiro intercâmbio dos saberes, nele a escola é apenas mais um dos vários elementos que compõem o ensino.

Para isso, no que concerne à gestão pública como delimitador dos modelos de ensino a serem aplicados na sociedade, temos que alcançar o ensino formativo de qualidade a todos, com amplo acesso às ferramentas comunicativas gratuitas, sem negligenciar com isso a indispensável mediação humana do acesso ao conhecimento, transmitido a toda sociedade e não apenas à escola a responsabilidade pela formação do cidadão, de modo contínuo e personalizado.

Talvez esta seja a utopia desejável, e que em verdade em um futuro não tão próximo jamais será alcançável pela sociedade na forma em que ela se apresenta: uma sociedade que é formada pela divisão natural de incluídos e excluídos, antes presente na marginalização econômica e financeira, hoje, em decorrência desta primeira, aqueles que estão marginalizados (por não dizer excluídos) digitalmente. É verdade que muito se fala em inclusão digital, contudo, como exigir que o indivíduo, em especial a criança e o jovem sejam incluídos digitalmente se ninguém antes trouxer estes mesmos educandos para a margem do mínimo exigível da leitura e compreensão? Como exigir-lhes a utilização dos meios de comunicação midiáticas (e de multimídia) e a perfeita compreensão dos meios de massa, se eles não são sequer alfabetizados? Talvez, antes mesmo de pensarmos em ampliar (ou generalizar) o acesso às infotecas e congêneres, deveria o estado como ente normatizador e organizador da vida em sociedade buscar ferramentas para incluir estes cidadãos, de modo a buscar melhorar o equilíbrio e diminuir o chamado "abismo" entre aqueles que detém a informação e o conhecimento daqueles que sequer tem o acesso mínimo à educação formativa básica.

Temos então que Levy discorre sobre o tema aprofundando-o, contudo, temos que tais entendimentos devem ficar para uma construção futura entre os colegas, de forma a permitir uma continuação sempre mutável.