Existe uma preocupação que atormenta diversos ramos do conhecimento, como a Filosofia, a Sociologia, o Direito, dentre outros, e que concerne à procura da resposta do Estado que deve ser dada a pessoa que comete um delito, bem como se tal delito pode ser prevenido ou, no caso de não ser evitado, ao menos impedir ou reduzir para o futuro a sua ocorrência.

Em síntese, tais estudos procuram, grosso modo, verificar se a questão da criminalidade pode ser solucionada de maneira satisfatória, condizente com as características das sociedades.

Em que pesem os esforços neste sentido, as respostas levantadas não chegaram a um consenso claro e definitivo.

Nota-se que, no decorrer da história, o Direito Penal tem tentado responder a tais indagações.

Vale destacar que,ao utilizaram determinadas concepções, tais pensamento já não eram considerados satisfatórios.

Assim, as diversas soluções buscadas ao longo do tempo denominam as teorias da pena, ou seja, são opiniões cientificas que prescrevem as metas e tarefas do Direito Penal.

Obviamente que existem outras formas de reação social à prática de delitos, como a autotutelaque, muitas vezes, gera mais violência ainda. Todavia, o conceito de reação social ultrapassa a esfera legal para incluir-se em outra esfera de controle social.

 

1.1 Teorias de Prevenção e de Retribuição

 

A teoria preventiva da pena, também denominada teoria relativista, diz respeito à teoria que atribui à pena a capacidade e a missão de evitar que, no futuro, não se cometam delitos.

Sob o prisma dessa teoria, vê-se o encarceramento como um obstáculo ao cometimento de novos delitos àqueles que possuem tendência ao crime, e não como um castigo.

Nesse sentido, o que ensina Bitencourt (apud GROKSKREUTZ):

A formulação mais antiga das teorias relativas costuma ser atribuída a Sêneca, que, se utilizando de Protágoras de Platão, afirmou: "nenhuma pessoa responsável castiga pelo pecado cometido, mas sim para que não volte a pecar. Para as duas teorias a pena é considerada um mal necessário. No entanto, para as teorias preventivas, essa necessidade da pena não se baseia na idéia de realizar justiça, mas na função, já referida, de inibir, tanto quanto possível, a pratica de novos fatos delitivos.

 

A contribuição de GamilFöppel El Hireche (apud MORAES) se faz imprescindível ao falar em teoria relativa:

Superadas as teorias absolutas, compete, agora, fazer o estudo das chamadas teorias relativas, que buscam uma finalidade para a pena, razão pela qual esta deixa de ser um fim em si mesma, passando a ser vista como algo instrumental: passa a ser um meio de combate à ocorrência e reincidência de crimes, É notadamente uma perspectiva utilitarista.

 

Tais teorias possuem duas espécies: Preventiva Especial e Geral. A Preventiva Especial se refere ao delinquente concreto, no qual espera que a pena tenha um efeito ressocializador, já a Preventiva Geral refere-se à generalidade dos cidadãos, esperando que a ameaça de uma pena e a imposição e execução da mesma sirvam para intimidar os delinquentes potenciais e por outro viés para robustecer a consciência jurídica dos cidadãos forçando a crença no Direito Penal.

Como se percebe a preventiva geral tem o condão de ameaçar, avisar e então prevenir que o ilícito venha a ser cometido.

Nesse sentido, Bitencourt (apud MORAES):

[...] com a ameaça de pena, avisando os membros da sociedade quais as ações injustas contra as quais se reagirá; e, por outro lado, com a aplicação da pena cominada, deixa-se patente a disposição de cumprir a ameaça realizada.

 

Com o cumprimento da pena, para aquele que infringiu a lei e praticou uma conduta criminosa, passa a servir como exemplo aos demais que tendem a cometer algum crime. Ou seja, das duas formas ainda possui caráter de prevenção.

Nesse contexto, Eugenio RaúlZaffaroni (2001, p. 81), explica que:

No retribucionismo, que não enfrenta a crise de legitimidade do sistema penal, mas que a evita sem resolvê-la, deve também ser incluída areiteração atual da versão anglo-saxônica de Hart, para quem a pena selegitima em função de dois princípios: o da igualdade e o da liberdade. O princípio da igualdade significa que, quando alguém vive em sociedade semviolar o direito, encontra-se em uma situação diferente daquele que o fazviolando o direito, depreendendo-se, portanto, a necessidade de retribuir  ao violador do direito o mal que causou.  O “princípio da liberdade”, por seu lado, pressupõe que o viador do direito já calcula a pena de modo que, na opção pela violação dodireito, já se encontra a opção pelo castigo. grifo nosso

 

As teorias preventivas voltam-se para o presente e as teorias retributivas objetivam o fato passado que é a mera punição do crime.Vale destacar que há uma variante da teoria retributiva em que se assevera que a pena deve ser também para o autor do delito uma forma de penitência no qual ao cumprir o condenado paga seu ato injusto e sua culpabilidade pela conduta delituosa.

Com propriedade, Messuti (apud LANZA)[1] ao conceituar a teria da retribuição:

O conceito de retribuição tem uma importância fundamental para a vida social, responde à estrutura do intercâmbio, sem a qual a vida social não existiria. Cada prestação dá lugar a uma contraprestação. E, ao aceitar com toda naturalidade que a prestação qualificada dê lugar a uma contraprestação qualificada como positiva, haveria também que se aceitar que uma prestação negativa dê lugar a uma contraprestação negativa.

 

Assim, claramente se percebe que não objetiva a teoria do retributivismo nem reparação do dano à vítima ou perante a sociedade, tão pouco qualquer tentativa de ressocialização ou recuperação do delinquente.

De grande valia ao estudo da presente teoria, a fim de conhecer seu desígnio, os ensinamentos de Mirabete (apud GROKSKREUTZ)[2]:

As teorias absolutas (de retribuição ou retribucionista) têm como fundamentos da sanção penal a exigência da justiça: pune-se o agente porque cometeu o crime (puniturquiapecatum est). Dizia Kant que a pena é um imperativo categórico, conseqüência natural do delito, uma retribuição jurídica, pois ao mal do crime impôe-se o mal da pena, do que resulta a igualdade e só esta igualdade trás a justiça. O castigo compensa o mal e dá reparação à moral.

 

Vê-se então que para teoria em estudo a pena é um castigo pelo mal cometido, sem qualquer intento de reparar o dano causado.

Os filósofos Immanuel Kant e G. F. Hegel foram os maiores adeptos e defensores dessa teoria, uma vez que está diretamente ligada ao que vinculam por ética e moral. (MORAES, 2013)

Kant, em suas teses de definições da pena, sempre valorou a importância da espécie e medida da pena, explicando que cada um tem o castigo segundo a conduta ilegal que cometeu e na medida do mau que causou à coletividade. Vale dizer, ainda que a sociedade fosse dissolvida, era preciso executar o último assassino, para que cada um sofresse as conseqüências dos seus atos.Na mesma linha, Hegel afirmava que o delito caracteriza a desordem e o desrespeito a vontade geral da sociedade que simboliza a ordem jurídica do Estado. Assim, a pena vem para retribuir a má conduta do agente e para confirmar o querer geral, sendo estabelecida conforme a espécie do delito e na medida do mal causado à coletividade.

Ainda na visão de Hegel (Filosofia Del Derecho), a pena como castigo seria o que o delinquente teria direito, in verbis:

Somente através da aplicação da pena trata-se o delinqüente como um ser ‘racional’ e ‘livre’. Só assim ele será honrado dando-lhe não apenas algo justo em si, mas lhe dando o seu Direito: contrariamente ao inadmissível modo de proceder dos que defendem princípios preventivos, segundo os quais se ameaça o homem como quando se mostra um pau a um cachorro, e o homem, por sua honra e liberdade, não deve ser tratado como um cachorro.

 

Cumpre ressaltar que filósofos como Kant e Hegel defendiam a teoria retributiva e criticavam as concepções preventivas, pois segundo o pensamento destes autores tais concepções violavam a dignidade do ser humano e o convertiam em um meio para conseguir certos fins e não um fim em si mesmo.(BITENCOURT, 2012)

Na primeira metade do século XX, surgiam as teorias da união nas quais foram reunidos ambos os posicionamentos. Tais teorias asseveram que a pena deve servir para retribuir à culpabilidade, ou seja, punir o autor do delito, sem deixar, contudo, de possuir um efeito preventivo.

As teorias da união revelam ainda que existe um abismo e diversas contradições, muitas vezes insanáveis. Porém, pode-se interligá-las por intermédio do diálogo entre as diversas formas de compreender como a sociedade deve reagir frente à criminalidade, tendo por objetivo controlá-la e reduzi-la a níveis suportáveis para a convivência dos seus cidadãos.

No que tange às teorias preventiva e retributiva, nota-se que a diferença básica entre as duas está no fato de que a primeira evidencia que o Direito Penal deve-se ocupar sistemática e conscientemente de dar uma solução eficaz ao problema da criminalidade. Já a teoria retributiva não procura um fim real, tampouco as consequências que a pena possa ter tanto para o condenado como para os demais cidadãos.

Neste sentido, para o filósofo Hegel a pena era a negação da negação do direito, ou seja, a retribuição do delito. No tocante a Kant, tratava-se de um imperativo categórico o que para Hegel era um imperativo lógico. (BITENCOURT, 2012)

            Em outra distinção entre as duas teorias, nota-se que a teoria preventiva possui características de teoria relativa já que o sentido da pena se desenvolve a partir da imperfeição. A teoria retributiva possui característica de teoria absoluta no qual exige que a pena seja fruto da ideia de justiça ou de vontade geral na base em plano moral superior. (BITENCOURT, 2012)

Assim, percebe-se que as teorias da pena estão ligadas à cultura e não só em uma cultura jurídica específica, revelando em decorrência do contexto social e econômico nuance mais preventiva ou retributiva.Vale destacar que o aumento da criminalidade inquieta a opinião pública, não apenas pelo cometimento dos delitos mais graves como, por exemplo, o abuso sexual de menores- que provoca a repulsa na sociedade, mas o incomodo cotidiano por meio de pequenos delitos, como a mendicância, o uso de drogas, bem como ao fracasso da ressocialização no cárcere, os quais provocam um sentimento generalizado de impotência e uma resposta despreparada para o aumento da repressão punitiva sem análise dos efeitos inerentes e efetiva solução da criminalidade.

 

1.2 Ressocialização e a Pena de Prisão

 

A teoria da prevenção especial individual assevera que a finalidade das sanções penais, na forma de penas propriamente ditas ou de medidas de segurança deve ser a reinserção social ou a ressocialização dos autores dos delitos, os quais, a partir do cumprimento da pena, com as medidas preventivas, não venham a cometer novos ilícitos.Segundo esta teoria, a ressocialização está extremamente vinculada à execução das penas privativas de liberdade, sendo, assim, incompatível com a pena de morte.

Na atualidade, o regime penitenciário e os métodos de tratamento dos reclusos mudaram completamente. Os instrumentos técnicos substituíram os velhos métodos de vigilância e controle, e as velhas estruturas arquitetônicas maciças e antigas fortalezas e castelos foram substituídos por tipos de edifícios, mais habitáveis e funcionais. Assim, o status jurídico do indivíduo condenado a cumprir uma pena foi modificado completamente em relação a épocas anteriores.

O fundamento teórico das instituições penitenciarias foi de grande importância para a ideia de ressocialização dos autores dos delitos.Neste contexto, a lei de execução penal[3] moderna contêm uma série de preceitos que vinculam o sistema penitenciário com essa meta.[4]

Todavia os problemas do conceito de ressocialização ainda permanecem e começam com a falta de consenso sobre a sua própria meta, dos preceitos do Direito Penal material que regulam a reincidência como circunstância agravante e que fazem depender dela ou da sua habitualidade a concessão da suspensão condicional da pena de prisão ou da sua substituição por outra pena.

O que interessa ao legislador é que o autor do delito não volte a praticar novos delitos, ou que, uma vez cumprida a pena não volte a reincidir, porque se o faz, será castigado com uma pena mais grave, com regime de cumprimento mais gravoso ainda. Não interessa ao Direito Penal, portanto, as causas pelas quais o autor do delito não voltou a reincidir, tampouco a sua mudança futura de conduta.

Nota-se que Lei Geral Penitenciária[5], norma que regula a vida do cidadão enquanto detento ao sistema prisional não questionam os numerosos preceitos que fazem referência ao tratamento na execução da pena, entretanto, espera-se algo mais que o simples abster-se de cometer ilícitos, isto é, que o delinquente não volte a delinquir, ao passo que a responsabilidade da reinserção social obedece a critérios de um estágio prévio ao comportamento legal, buscando garantir que ao ser reinserido, o delinquente não volte a delinquir.[6]

Vale destacar que o Direito Penitenciário pretende lograr mais que a simples legalidade externa, isto é, retirar o acusado/condenado do convívio social assegurando a segurança da sociedade. Vislumbra ainda assegurar apossibilidadede tratamento aos necessitados para que não sejamsubmetidos a intervenções desproporcionais.[7]

            Neste contexto, dificilmente há um conhecimento confiável em relação ao êxito da ressocialização.Isso implica afirmar que o conceito de ressocialização[8], tão ambicioso como o almejado pela teoria preventiva especial não prospera, pelo fato de que durante a sua permanência no cárcere, o condenado não muda realmente a atitude que o levou a praticar um delito, sendo que o mais provável seja o retorno, em liberdade, às mesmas condições que o possibilitou de agir de forma ilícita, ou seja, ele voltará aprática dos delitos.

Segundo Cezar Roberto Bitencourt (2001, p. 139):

Um dos grandes obstáculos à idéiaressocializadora é a dificuldade de colocá-la efetivamente em prática. Parte-se da suposição de que, por meiodo tratamento penitenciário – entendido como conjunto de atividadesdirigidas à reeducação e reinserção social dos apenados -, o terno se converterá em uma pessoa respeitadora da lei penal. E, mais, por causa dotratamento, surgirão nele atitudes de respeito a si próprio e de responsabilidade individual e social em relação à sua família, ao próximo e à sociedade. Na verdade, a afirmação referida não passa de uma carta de intenções, pois não se pode pretender, em hipótese alguma, reeducar ou ressocializar uma pessoa para a liberdade em condições de não liberdade, constituindo isso verdadeiro paradoxo.

 

            Aduz ainda o autor:

É preciso reconhecer que a pena privativa de liberdade é um instrumento,talvez dos mais graves, com que conta o Estado para preservar a vida  social de um grupo determinado. Esse tipo de pena, contudo, não resolveuo problema da ressocialização do delinqüente: a prisão não ressocializa. Astentativas para eliminar as penas privativas de liberdade continuam. Apretendida ressocialização deve sofrer profunda revisão. (BITENCOURT,2001, p. 141).

 

Não obstante, o conceito de ressocialização flutua sobre o fato de não poder revelar resultados mensuráveis sobre o efeito realmente ressocializador das penas privativas de liberdade.Ademais, em uma cultura jurídica orientada para soluções rápidas, permanece muito prejudicada uma instituição que, precisamente, utiliza como lema os efeitos comprováveis empiricamente da ressocialização da pena e, por conseguinte não pode justificar com precisão tais efeitos.

            Cabe destacar que no Direito Penal Moderno a situação torna-se mais latente, já que a necessidade de buscar uma justificativa aumenta com o grave peso que o fim da pena impõe ao condenado para conseguir os efeitos por ela propostos.Assim, essa inexistência de base empírica segura também aumenta a polêmica sobre o conceito prevenção, da sua consistência e as possibilidades de relacionar entre si as concretas contribuições a essa discussão.

            Atualmente, existe unanimidade no entendimento de que se devem buscar alternativas às penas privativas de liberdade[9], e isso fundamentalmente porque as penas privativas de liberdade, inclusive as executadas com todas as garantias dos melhores programas ressocializadores, estigmatizam[10] e dessocializam os indivíduos.Assim, não apenas servem para prender o interno em um espaço determinado, senão também para isolá-lo socialmente, pois é difícil educar em um espaço de não liberdade para um espaço de liberdade.

            Deve-se salientar que as condições materiais de vida na prisão não são as mais idôneas para levar o interno a se sentir como um ser humano.    Assim, nota-se que o amontoado humano no cárcere foi sempre uma de suas piores marcas e agora é, além disso, a consequência lógica do aumento da aplicação da pena de prisão.Não diverso é o caso do sistema prisional brasileiro, em que o agrupamento provoca contínuos protestos e rebeliões, problemas de saúde, de higiene, promiscuidade homossexual, altos índices de suicídio e consumo de drogas. Podemos citar aqui o que ocorre no presídio de Pedrinhas no Maranhão, onde morreram 62 presos, somente em 2013.[11]

 

            Diante deste cenário, verifica-se que o ambiente carcerário é pouco propício para a ressocialização, pois, no cárcere, o interno geralmente não aprende a viver a vida em liberdade, senão que, pelo contrário, aprende uma forma de via distinta, e muitas vezes prosseguem e ainda se aperfeiçoam com o contato e o aprendizado com outros internos. Obviamente que o cárcere modifica o indivíduo, geralmente, para uma transformação negativa em face dos valores aprendidos. Ao sair do cárcere, o indivíduo encontra-se completamente alheio à vida em sociedade, estigmatizado, incapaz de levar uma vida sem a prática de novos delitos. Além disso, enquanto sujeito marcado pelo estigma de ex-detento, ex-presidiário, o indivíduo egresso será visto pela sociedade e ele mesmo terá a sua autoimagem ligada ao passado como uma condicionante do que será feito no futuro.

Nesse sentido Arruda[12] ao retratar o sentimento que assola a realidade do sistema prisional brasileiro:

A desestruturação do sistema prisional traz à baila o descrédito da prevenção e da reabilitação do condenado. Nesse sentido, a sociedade brasileira encontra-se em momento de extrema perplexidade em face do paradoxo que é o atual sistema carcerário brasileiro, pois de um lado temos o acentuado avanço da violência, o clamor pelo recrudescimento de pena e, do outro lado, a superpopulação prisional e as nefastas mazelas carcerárias.

 

Ainda sob a mesma ótica Araujo (2014)[13] ao afirmar que:

Que o sistema prisional brasileiro há muito deixou de ser um instrumento eficaz de recuperação se é que um dia foi não é novidade. O nosso atual sistema prisional é, sem hesitação, uma das mais sérias dívidas sociais que o Estado brasileiro e a sociedade, como um todo, tem. Uma fatura em aberto, pronta para ser cobrada. Uma situação alarmante e de impacto profundo e eminente no cotidiano do nosso país.

 

            Destaca-se que as leis penitenciárias e a prática dos centros penitenciários procuram, de diversas formas, facilitar o passo para a liberdade, facilitando o paulatino retorno, por exemplo, como as autorizações penitenciárias e o regime de semiliberdade dos sistemas  abertos antes de conceder a liberdade condicional e, posteriormente, a liberdade definitiva, porém isto não é suficiente para obter uma plena reinserção social daquele que acaba de sair de um centro penitenciário depois de ter passado um longo período no cárcere.

            A tais problemas, referentes à pena de prisão, deve-se acrescentar ainda osproblemasem torno da ideia de ressocialização, isto é, de integração do autor do delito a uma sociedade que é, em sua natureza, criminalizadora e preconceituosa, ou seja, sem que se mudem ascausas exógenas que o levaram o indivíduo ao delito.Em síntese, a ressocialização supõe um processo de interação social, pois pela própria natureza dos condicionamentos sociais, o indivíduo está obrigado a um intercambio e à comunicação com os seus semelhantes.

            Deve-se destacar que em toda a sociedade, por mais fechada e coesa que seja, coexistem conjuntos normativos, distintos sistemas de valores e distintas concepções de mundo. Tal diversidade, ainda mais evidente em uma sociedade pluralista e democrática, produz inevitavelmente conflitos quando se contrapõem os distintos sistemas.A tarefa democrática consiste precisamente em lograr um sistema de convivência em que se dê uma identidade entre aqueles que criam as normas e os seus destinatários.

            A ressocialização perfeita ou ideal, entendida não só como a abstenção de cometer delitos no futuro, senão como assunção das normas fundamentais que regulam a convivência, só é possível quando um indivíduo a ressocializar e o encarregado de ressocializá-lo tem ou aceita o mesmo fundamento moral que a norma social de referência.Assim, uma ressocialização sem essa base é pura sujeição, domínio de uns sobre os outros e um grave lesão da autonomia individual.

            Cabe destacar que o sistema penitenciário só pode modificar questões marginais da vida ou atitudes da personalidade, mas não a estrutura social, nem os problemas de socialização pelos quais o indivíduo foi levado a delinquir, a crítica ao mesmo, como instituição que mais do que prevenir ou solucionar a criminalidade a provoca, produzindo novos conflitos parece incontestável.

            Para esta teoria critica defendida pelos partidários do abolicionismo[14] e pelos mais destacados representantes da Criminologia Crítica, toda a sociedade estratificada ou de classes, tem que distribuir na hierarquia social as posições inferiores e manter e controlar os que estão situados nessas posições.O sistema penitenciário é a instituição utilizada para cumprir essa tarefa: isolar o detendo do mundo exterior e neutralizá-lo social e politicamente.

            O sistema penitenciário é nos ensinamentos de Foucaultin Vigiar e Punir, um sistema de controle e vigilância total que garante que a população marginal dos reclusos seja numericamente pequena, confirmando praticamente as mesmas pessoas em sua atitude criminal e vinculando-as entre si, separando-as do resto que não delinque.[15]

A pena serve para responsabilizar os infratores com proporcionalidade diante do delito praticado. Assim, o sistema jurídico deve buscaro equilíbrio com conceitos normativos e axiológicos, com fulcro nos princípios e objetivos do Estado Democrático de Direito, superando os conceitos de política criminal reducionista.

Vale destacar que se encontra a realidade contemporânea esta diante de uma criminologia da mídia, conforme os ensinamentos do ilustre doutrinador Eugenio RaúlZaffaroni[16] no livro A palavra dos mortos: Conferências de Criminologia Cautelar, no qual é um dos maiores trabalhos editoriais da vida do jurista argentino, que reúne três décadas de estudo e reflexão e responde a anseios acadêmicos ao analisar a denominada “criminologia da mídia”.

O respeitado autor aduz que a criminologia da mídia, ou midiática, é construída através dos meios de comunicação a serviço do Poder, trata-se em suma de um fruto do modelo de estado policial que alarga a sensação de medo dos indivíduos. O que em determinado momento vai denominar de mundo paranóide no qual se torna indispensável um bode expiatório adequado para lhe imputar os crimes que se projetam como fonte de insegurança existência.

Assim, a criminologia midiática instaurada deixa a coletividade em pânico e cria uma nova categoria de direito, não elencado no rol de direitos fundamentais, a saber: direito à segurança.

Vale destacar ainda, que a criminologia estudada e aplicada nos países da América Latina são frutos de estudos relacionados a outra realidade, outro cenário, outras questões que envolve e caracterizam a delinqüência em países ditos de primeiro mundo.

Não é possível aferir e utilizar técnicas em locais com características diferentes, ou seja, cada sociedade tem suas especificidades e não se pode agir de forma genérica em um contexto multifacetado.

O que a criminologia midiática procura é a instauração do medo e da insegurança para forçar o entendimento de que somente a repressão e a única forma de garantir a ordem pública, todavia esquecem que no que concerne a violência, formas de delinqüência, etc, envolvem outras formas de agir.

Assim, como o modelo médico, a criminologia contemporânea procura uma verdade real ilusória e desconexa.

Ademais, as palavras dos meios de comunicação de massa constrói uma criminologia que configura as atitudes da média das pessoas e sobre as quais costumam montar-se as decisões políticas que se traduzem em leis penais.

Ocorre que tais leis penais são reflexos das inseguranças trazidas a través de espetáculos na mídia.

Assim, faz-se necessário agir com prudência, cautela diante do histerismo comum e cada vez mais balizador de medidas penais totalmente incoerentes com a especificidade que a criminologia deve se preocupar.

Vale destacar que a teoria e a política criminológica são âmbitos autônomos, logo, para melhor solução da problemática da violência evidente que se instaure um diálogo, com política de Estado e não de Governo, adequada institucionalização de acordo com cada estrutura institucional.

Obviamente que não se pode rechaçar toda e qualquer criminologia anglo-saxônica, todavia, deve-se verificar que tal criminologia fora concebida e articulada em face de características pertencentes a outras realidades, por conseguinte, vislumbra-se outro cenário em cada sociedade a ser analisada, ou seja, uma medida aplicada em um determinado local não necessariamente será bem sucedida em outro, justamente porque cada lugar é único, cada lugar tem a sua especificidade, suas características que as tornem exclusivas, assim com ajuste de medidas que se adaptem as peculiaridades do local.

Cabe salientar ainda que mais do que atacar as consequênciasas políticas devem ser preventivas, isto é, que agem na causa e não nos efeitos.

Sendo assim, após a abordagem do presente trabalho, percebe-se que a crescente violência no Brasil está atrelada ao senso de justiça (injustiça/falta de justiça), ao que se entende por punição. Vê-se ainda que o sistema de penas, presente no ordenamento jurídico, não atende a sua finalidade de prevenir que novos delitos venham a ser cometidos pelos delinquentes punidos, uma vez que a realidade do sistema prisional é incapaz de ressocializar um detento.

 

Referência:

ARAUJO, Carlos. Sistema Prisional Brasileiro: A busca de uma solução inovadora. Disponível em http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI197374,81042-Sistema+Prisional+Brasileiro+A+busca+de+uma+solucao+inovadora. Acesso em: 23 maio 2014.

 

ARRUDA, Sande Nascimento de. Sistema Carcerário Brasileiro:A ineficiência, as mazelas e o descaso presentes nos presídios superlotados e esquecidos pelo poder público. Disponível em: <http://revistavisaojuridica.uol.com.br/advogados-leis-jurisprudencia/59/artigo213019-1.asp>> Acesso em: 20 maio 2014.

 

 

BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas.  2. ed. São Paulo: Saraiva, 2001.

 

____________________. Tratado de direito penal: parte geral, volume 1.  9. ed. São Paulo: Saraiva, 2004.

 

____________________. Tratado de direito penal: parte geral, 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

 

FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: Teoria do Garantismo Penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.

 

FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. 33. ed. Petrópolis:  Vozes, 2007.

 

GROKSKREUTZ, Hugo Rogério. Das teorias da pena no Ordenamento Jurídico Brasileiro. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=7815#_edn15> Acesso em: 03 julho. 2014.

 

LANZA, Karina Ferreira. Acerca da relação dúbia entre prevenção e retribuição na pena criminal: Uma análise sobre o sincretismo teológico da individualização da pena e seus reflexos na legislação pena brasileira recente. Disponível em: <http://www.ambitojuridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=10967&revista_caderno=3>. Acesso em: maio. 2014.

 

ZAFFARONI, Eugênio Raúl. Manual de direito penal brasileiro: parte geral/ Eugênio RaúlZaffaroni, José Henrique Pierangeli – São Paulo : Revistas dos Tribunais, 2004.

 

______________________. Manual de Direito Penal Brasileiro. São Paulo, Revista dos Tribunais, v.1, ed. 7ª, 2008.

 

______________________. Em busca das penas perdidas. Trad. Vânia Romano Pedrosa e Amir Lopes da Conceição. Rio de Janeiro: Revan, 1991.

 

______________________.  A palavra dos mortos: conferências de criminologia cautelar. São Paulo: Saraiva, 2013.



[1] Extraído de sitio da internet. Âmbito Jurídico.

[2] Extraído de sitio da internet. Âmbito Jurídico.

[3] Lei 7.210, de 11 de julho de 1984.

[4] No Brasil o número da Lei de Execuções Penais- LEP é Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984. Vale destacar que no presente capítulo não está sendo analisada a LEP brasileira apenas e sim trata-se de estudo do sistema de execução penal mundial no qual preconiza a ressocialização do apenado em instituições penitenciárias.

[5]A Lei Geral Penitenciária aqui descrita não se refere a uma norma específica, mas aos preceitos que circundam as execuções penais mundiais em que, conforme já mencionado em nota explicativa anterior, trata-se de uma metodologia aplicada em que as instituições penitenciárias revelam-se como única fonte de solução dos conflitos penais sem verificar os outros fatores que interagem e são motores da delinqüência.

[6] O que se quer dizer com tal afirmativa refere-se ao fato de que ressocializara pós o agir ilegal revela-se como mecanismo “curativo” e não preventivo da delinqüência, ou seja, atualmente os fatores externos, o que leva a delinqüir, entre outros, não são objetos de análise e estudo, vive-se em um cenário de agir na conseqüência e não na causa.

[7]Segundo o relatório do Departamento Penitenciário Nacional – Depen, 52% dos presos brasileiros cumprem pena por algum tipo de crime contra o patrimônio. As estatísticas se referem ao total de presos das penitenciárias brasileiras: 417.112. São 212.213 homens e 5.564 mulheres encarcerados por subtração de coisa alheia. Nessa categoria, a modalidade mais praticada é a do roubo qualificado, mediante uso de arma, às vezes por mais de um agente, sendo muito comum o roubo de veículos. Por esse tipo de crime, estão presos 73.267 homens e 1.421 mulheres. O relatório do Depen mostra que 31.956 presos cumprem pena por furto simples, 32.863 por furto qualificado e 41.058 por roubo simples. Os demais crimes contra o patrimônio foram praticados por 23.603 condenados, sendo 12.537 receptadores, 5.673 estelionatários e 2.566 presos por extorsão mediante seqüestro. Os demais foram presos por extorsões e apropriações indébitas. O tipo criminal individual mais comum nas cadeias, contudo, é o do condenado por tráfico de entorpecentes. São 78.735 homens e 12.312 mulheres, que somam 22% da população carcerária. Disponível em  http://dp-pa.jusbrasil.com.br/noticias/2141521/depen-traca-perfil-dos-presos-no-brasil acesso em 19/06/2014. Neste contexto, nota-se quea maioria dos presos encontram-se no cárcere devido a crimes de cunho socioeconômico, logo, a ressocialização não deve ocorrer no sistema penitenciário e sim no cenário de desenvolvimento social integral e não paliativo.

[8] A definição literal da palavra ressocializar segundo (FERREIRA, 1999, p.1465): “Tornar a socializar (-se)”. Segundo Clovis Alberto Volpe Filho “O termo ressocializar traz em seu bojo a ideia de fazer com que o ser humano se torne novamente social (ou sócio). Isto porque, deve-se ressocializar aquele que foi dessocializado”. Na concepção de Cezar Roberto Bitencourt (2001, p. 139) “[...] o objetivo da ressocialização é esperar do delinqüente o respeito e a aceitação de tais normas com a finalidade de evitar a prática de novos delitos”.

[9]Já Eugênio RaúlZaffaroni (2001, p. 135) enfatiza que a prisão é uma “máquina deteriorante”. Acrescenta, ainda, que nas prisões: [...] o preso é ferido na sua auto-estima de todas as formas imagináveis, pela perda de privacidade, de seu próprio espaço, submissões a revistas degradantes, etc. A isso juntam-se as condições deficientes de quase todas as prisões: superpopulação, alimentação paupérrima, falta de higiene e assistência sanitária, etc., sem contar as discriminações em relação à capacidade de pagar por alojamentos e comodidades. (ZAFFARONI, 2001, p. 136).

[10]“O sistema penal atua sempre seletivamente e seleciona de acordo com estereótipos fabricados pelos meios de comunicação de massa. Estes estereótipos permitem a catalogação dos criminosos que combinam com a imagem que corresponde à descrição fabricada, deixando de fora outros tipos de delinqüentes (delinqüência de colarinho branco, dourada, de trânsito etc.). Nas prisões encontramos os estereotipados. Na prática, é pela observação das características comuns à população prisional que descrevemos os estereótipos a serem selecionados pelo sistema penal , que sai então a procura-los. E, como a cada estereótipo deve corresponder um papel, as pessoas assim selecionadas terminam correspondendo e assumindo os papéis que lhes são propostos”. (Eugenio Raúl ZAFFARONI, Em busca das penas perdidas, 1991, p. 130)

[11]  No Brasil, recentemente ocorreu umas das maiores rebeliões, no Presídio de Pedrinhas no Maranhão: Após violentas rebeliões no final de 2013, integrantes da Comissão de Direitos Humanos do Senado visitaram o Complexo Penitenciário no mês de janeiro. A presidente da comissão, senadora Ana Rita (PT-ES), apresentou no dia 14 de março um relatório da visita, que defendeu a realização de concursos para defensores públicos no estado a fim de atenuar um dos principais problemas constatados durante a diligência: a superlotação e o convívio de presos provisórios com detentos já condenados. O déficit de vagas nas unidades prisionais e nas delegacias do Maranhão, segundo dados apresentados no relatório, é de 2.554 vagas; 70% dos funcionários que trabalham com os presos são terceirizados. Além da contratação de mais agentes, a comissão defendeu a realização de mutirões carcerários com auxílio de outros estados. Disponível em http://g1.globo.com/ma/maranhao/noticia/2014/04/presidio-de-pedrinhas-registra-sexta-morte-de-detento-em-2014.html acesso em 19/06/2014.

[12] Extraído de sitio da internet. Revista Jurídica.

[13] Extraído de sitio da internet. Migalhas.

[14] A Criminologia Abolicionista é uma vertente da Criminologia Crítica, que tem como escopo abolir as prisões, bem como o próprio Direito Penal, substituindo-os por ações baseadas no diálogo e na concórdia.  Para os abolicionistas, o Direito Penal é considerado como um mau causador de dificuldades, constituindo assim, uma máquina impossibilitada de solucionar os litígios de uma coletividade abarrotada de desigualdades. Para os adeptos deste movimento o sistema penal, ao contrário de ressocializar o agente delitivo, prolifera a violência. Seuslíderesforam Foucault, Thomas Mathiesen, LoukHulsman e Nils Christie.

[15] , Michel Foucault (2007, p. 221) comenta que a pena privativa de liberdade não ressocializa o preso, pelo contrário é visível o aumento da taxa de reincidência (“criminosos permanece estável”), eis que “[...] depois de sair da prisão, se têm mais chance que antes de voltar para ela, os condenados são, em proporção considerável, antigos detentos [...].“

[16] ZAFFARONI, Eugenio Raúl. A palavra dos mortos: conferências de criminologia cautelar. São Paulo: Saraiva, 2013.