SINOPSE DO CASE: RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO[1]

Natacha Aimeé Santana de Almeida[2]

Thiago Fernandes[3]

1 DESCRIÇÃO DO CASO

Um cidadão realizou uma compra por intermédio de terceira pessoa, a qual foi enviada pela empresa Correios e Telégrafos. Percebendo a demora na chegada de seu produto, o cidadão buscou os correios, quando recebeu a notícia de que o caminhão no qual estava a sua mercadoria havia sofrido um acidente, tombando na estrada (MA-215). Porém, os correios não souberam informar as condições do bem, porque este foi furtado por delinquentes enquanto o caminhão ficou horas virado. É mister que a Ma-215 é temida pelos motoristas, uma vez que possui péssimas condições de via, a qual está cheia de buracos, ocasionando assaltos constantes.

2 IDENTIFICAÇÃO E ANÁLISE DO CASO

2.1 Descrição das decisões possíveis

Levando em consideração os relatos acima narrados, é mister chegar a duas possíveis decisões; 2.1.2 Responsabilidade dos Correios e Telégrafos; 2.1.2 Responsabilidade do Estado.

3 ARGUMENTOS CAPAZES DE FUNDAMENTAR CADA DECISÃO

3.1 Responsabilidade dos Correios e Telégrafos

É mister salientar que “a natureza jurídica dos correios é de empresa pública federal, tratando-se pois de pessoa jurídica de direito privado, a qual é prestadora de serviço público - serviço postal -” (GOMES, 2003, p. [?]). Dessa maneira, entende-se ser aplicável o artigo 37, § 6º da Constituição Federal (CF), o qual consagra que “as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa” (BRASIL, 1988).

Diante disso, cabe ressaltar a Teoria da Responsabilidade Civil Objetiva “essa forma de responsabilidade dispensa a verificação de culpa em relação ao fato danoso [...] bastando que o interessado comprove a relação causal entre o fato e o dano” (CARVALHO FILHO, 2012, p. 546). Isso porque essa Teoria necessita da existência de três pressupostos, quais sejam “ocorrência do fato administrativo considerado como qualquer conduta comissiva ou omissiva, legítima ou ilegítima, singular ou coletiva atribuída ao Poder Público [...] ocorrência do dano podendo ser tanto o moral quanto o patrimonial e pôr fim a ocorrência do nexo causal entre o fato administrativo e o dano, cabendo ao lesado apenas demonstrar que o prejuízo sofrido se originou da conduta estatal” (CARVALHO FILHO, 2012, p. 554). Diante disso entende-se não ser preciso a configuração de dolo ou culpa para que as empresas públicas sejam responsabilizadas.

  Ademais, é mister que “desde que a administração defere ou possibilita ao seu servidor a realização de certa atividade administrativa, a guarda de um bem ou a condução de uma viatura, assume o risco de sua execução e responde civilmente pelos danos que esse agente venha a causar injustamente a terceiro” (MEIRELLES, 2012, p. 718).

 É importante ressaltar que houve negligência por parte dos correios com a escolha da estrada, já que a MA-215 é temida pelos motoristas justamente pela grande quantidade de assaltos, isso porque se os correios tivessem tomado o devido cuidado na escolha da estrada tal fato não teria ocorrido. É mister que dentre “as excludentes da responsabilidade civil objetiva, citadas pela doutrina, encontram-se o caso fortuito, a força maior e o fato de terceiro” (GOMES, 2003, p. [?]), a pesar da existência de tais excludentes não há que se falar na sua configuração neste caso. Os correios poderiam tentar acionar a excludente força maior a qual significa “acontecimento originário da vontade do homem” (CARVALHO FILHO, 2012, p. 557), mas tal excludente não encontra sustentação uma vez que “a atividade de transporte traz consigo o risco de acidente, notadamente em face das estatísticas que assustam os condutores de veículo automotores nas estradas brasileiras, por outro lado não há que se falar e caso fortuito ou força maior sem a imprevisibilidade que lhes é típica” (GOMES, 2003, p. [?]).

Cabe ainda desconstruir a possibilidade dos correios alegarem a excludente de fato de terceiro uma vez que a mercadoria foi furtada por delinquentes, isso porque “a atividade dos correios não se restringe ao transporte, antes cuidando do serviço postal constituído pelo recebimento, expedição, transporte e entrega de objetos de correspondência, valores e encomendas conforme disposto no artigo 7º da Lei nº 6.538/78” (GOMES, 2003, p. [?]), dessa forma entende-se que “a conservação do bem é indispensável para a entrega deste, e está inserida, por óbvio, nos deveres da empresa pública [...] demostrada a previsibilidade do evento acidente, esvaziados estão a força maior e caso fortuito [...] a ação de delinquentes só foi viabilizada pelo acidente, de forma que cabe à ECT, responsável pelo acidente, responsabilizar-se, também, pelos furtos, por ter falhado em sua obrigação de vigilância da mercadoria sob sua guarda” (GOMES, 2003, p. [?]).

Cabe ainda ressaltar que “a ação dos delinquentes só foi possível por causa de um evento anterior, o acidente e consequentemente tombamento, pelo qual a empresa pública federal é responsável, diante da sua previsibilidade, intocável permanece, assim a sua responsabilidade” (GOMES, 2003, p. [?]).

Diante disso é notório a existência da responsabilidade objetiva dos correios, mas ocorre que os correios podem acionar de forma subsidiaria o estado, uma vez que a manutenção das estradas estaduais é de sua inteira responsabilidade, bem como podem ainda demandar o condutor do veículo. Cabe ainda ressaltar que “a reparação do dano causado pela administração a terceiros obtém-se amigavelmente ou por meio da ação de indenização, e uma vez indenizada a lesão da vítima, fica a entidade pública com o direito de voltar-se contra o servidor culpado para haver através da ação regressiva” (MEIRELLES, 2012, p. 723). No caso em análise é perfeitamente possível presença do dano moral, bem como a cumulação deles tendo como fundamento a Súmula 387 do STJ, ademais ficou caracterizado a ocorrência desses danos, uma vez que o cidadão não recebeu notificação do acidente pela empresa pública, bem como o dano material, uma vez que teve seu produto furtado enquanto estava sobre os cuidados e vigilância da empresa pública.

3.2 Responsabilidade do Estado

De acordo com o caso exposto anteriormente é nítido que trata-se de responsabilidade civil do Estado. Para embasar tal perspectiva se faz mister a compreensão da Teoria da Culpa Administrativa, a qual consagra que “o lesado não precisaria identificar o agente estatal causador do dano, bastava-lhe comprovar o mau funcionamento do serviço público, mesmo que fosse impossível apontar o agente que o provocou” (CARVALHO FILHO, 2012, p. 545). É mister que a falta de serviço pode ocorrer de três formas “inexistência do serviço, mau funcionamento do serviço ou retardamento do serviço [..] em qualquer dessas formas a falta de serviço implica o reconhecimento da existência de culpa” (CARVALHO FILHO, 2012, p. 546).

No caso em análise pode-se alegar a Teoria da Culpa com respaldo no mau funcionamento, uma vez que o Estado tem o dever de manter suas estradas em perfeitas condições de trafego, o que não aconteceu, visto que encontravam-se completamente cheias de buracos facilitando a ação de bandidos. Ademais cabe ressaltar que “o estado causa danos a particulares por ação ou omissão [...] a conduta omissiva retrata um desleixo do Estado em cumprir um dever legal” (CARVALHO FILHO, 2012, p. 560-561). Além disso, é importante ressaltar que de acordo com o caso narrado o caminhão da Empresa Pública Federal de Correios e Telégrafos ficou por inúmeras horas virado no local do tombamento, demostrando total negligência por parte do Estado.

É notório a presença da culpa do Estado por meio de omissão, é sabido que “a culpa origina-se na espécie do descumprimento do dever legal atribuído ao Poder Público [...] nas omissões estatais, a teoria da responsabilidade objetiva não tem perfeita aplicabilidade” (CARVALHO FILHO, 2012, p. 563). Isso porque “a responsabilidade por falta de serviço, falha do serviço ou culpa do serviço não é de modo algum, modalidade de responsabilidade objetiva, ao contrário é responsabilidade subjetiva porque baseada na culpa [...] em face da presunção de culpa, a vítima do dano fica desobrigada de comprová-la” (MELLO, 2006, p. 957-958).

 Cabe ainda fundamentar a Responsabilidade do Estado tomando como pressuposto a Teoria do Risco Administrativo, uma vez que “o estado tem maior poder, o indivíduo ao contrário, tem posição de subordinação, mesmo que protegido por inúmeras normas do ordenamento jurídico [...] sendo assim, não seria justo que, diante de prejuízos oriundos da atividade estatal, tivesse que empenhar para conquistar o direito de reparação” (CARVALHO FILHO, 2012, p. 546). Dessa maneira “por mais poderoso, o Estado teria que arcar com um risco natural decorrente de suas numerosas atividades, visto que à maior quantidade de poderes haveria de corresponder a um risco maior” (CARVALHO FILHO, 2012, p. 546). De acordo com Hely Lopes essa Teoria “faz surgir a obrigação de indenizar o dano do só ato lesivo e injusto causado à vítima pela administração [...] não se exige qualquer falta de serviço público nem de seus agentes, basta a lesão, sem o concurso do lesado, basta que a vítima demostre o fato danoso e injusto ocasionado por ação ou omissão do Poder Público” (MEIRELLES, 2012, p. 714).

Ademais se faz mister que é dever do estado prestar a segurança pública necessária nas estradas de seu território. É mister que o Estado tendo como fundamento o artigo 37, § 6º da CF terá direito de regresso contra os Correios se ficar provado que o acidente ocasionou-se por culpa do condutor do veículo e não pelo estado em que se encontrava a estrada, por esse direito entende-se que “é assegurado ao Estado no sentido de dirigir sua pretensão indenizatória contra o agente responsável pelo dano, quando tenha agido com culpa ou dolo” (CARVALHO FILHO, 2012, p. 578).

REFERÊNCIAS

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2012.

GOMES, Alzeni Martins. Breves estudos sobre a responsabilidade civil objetiva do estado, trazendo à baila um interessante caso que movimentou o aparelho judiciário. Disponível em: http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/1214/A-responsabilidade-civil-do-Estado-aplicada. Acesso em: 04 out, 2015.

MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2006.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2012.


[1] Case apresentado à disciplina Processo de Execução, da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

[2] Aluna do 7º Período, do Curso de Direito, da UNDB.

[3] Professor, Especialista e Orientador.