RESPONSABILIDADE CIVIL DAS INSTITUIÇÕES BANCÁRIAS[1]

 

Ana Célia Caldas Aragão[2]

Dihones Nascimento Muniz²

Eduardo Fellipe Silva Ribeiro²

Eliza de Mesquita Lisboa²

Gessyane Rodrigues Costa²

Nayara Garcia da Costa²

Rayssa Pires Amorim Cardoso²

Rômulo Moraes Chagas²

Sérgio Silva do Nascimento²

Thassia Mendes da Silva²

Erika Campelo[3]

Sumário: 1 Introdução; 2 Responsabilidade dos seus agentes; 2.1 Responsabilidade dos diretores de banco; 2.2 Responsabilidade dos administradores e membros do conselho fiscal; 3 Responsabilidade do Bando Central do Brasil; 4 Responsabilidade das instituições bancárias em face dos clientes/consumidores; 4.1 Responsabilidade pelo pagamento de cheque falso; 4.2 Responsabilidade pelo protesto indevido de título; 4.3 Responsabilidade pela recusa de pagamento de cheque regular; 4.4 Cartão de crédito; 4.5 Responsabilidade pelo furto ou roubo de bens depositados em cofres bancários; 4.6 Responsabilidade pela segurança dos clientes; 4.7 Responsabilidade pelo fornecimento de informaçõesquebra  do sigilo bancário; 5 Responsabilidade das instituições bancárias em face de terceiros não clientes; Conclusão; Referências.

RESUMO

 

O presente estudo analisa a responsabilidade civil das instituições bancárias. Busca analisar qual a natureza jurídica dessa responsabilidade, especificando tal responsabilidade em algumas das principais operações realizadas pelo banco como, por exemplo, o fornecimento de cheques, de cartão de crédito e os depósitos bancários. Aborda de maneira separada a responsabilidade dos agentes dessas instituições, a responsabilidade em face de clientes/consumidores, e ainda a responsabilidade em face de terceiros não clientes. Objetiva ainda demonstrar a importância desse estudo e o porquê do rigor da responsabilização dessas instituições que estão presentes no cotidiano de todos os cidadãos.

Palavras-chave: Instituições bancárias; Responsabilidade; Risco; Culpa.

 

 

1      INTRODUÇÃO

Primeiramente é necessário fazer um breve panorama da responsabilidade civil das instituições bancárias, já que muitos são os aspectos a serem analisados. É importante destacar que o banco nada mais é do que uma instituição financeira que tem como finalidade realizar atividades essenciais no ramo financeiro, podendo estar tanto no pólo ativo (credor), quanto no pólo passivo (devedor) de uma relação jurídica. Caso o banco atue concedendo crédito aos seus clientes estará na qualidade de credor da relação como, por exemplo, quando realiza um empréstimo ou um financiamento. Estará na qualidade de devedor por sua vez, quando receber capital de seus clientes através de um depósito ou redesconto (DINIZ, 2010, p. 373).

De acordo com Maria Helena Diniz (2010, p. 373),todas essas operações bancárias poderão ser consideradas contratos, por haver acordo entre as partes, criando obrigações”.  Tais contratos em sua maioria são contratos de adesão, onde a instituição elabora o contrato impondo suas vontades ao cliente que por ser pólo vulnerável da relação acaba por aceitar o que lhe foi imposto.

Com a existência de um dever jurídico originário, que é a obrigação, em caso de inadimplemento surge um dever jurídico sucessivo, que é a responsabilidade civil. Por exercerem uma atividade de suma importância para o país, que acaba por acarretar um risco para população, já que dizem respeito a recursos financeiros, tais instituições bancárias acabam tendo um tratamento mais rigoroso no tocante a sua responsabilidade, seja perante seus clientes, seja perante terceiros estranhos a relação jurídica.

Diante disso, há que se esclarecer de forma sucinta alguns aspectos dessa responsabilidade, destacando alguns de seus princípios norteadores. Primeiramente deve haver uma distinção entre as responsabilidades do próprio banco (pessoa jurídica) e de seus administradores ou diretores (pessoas físicas). O primeiro tem uma responsabilidade objetiva perante seus clientes ou até mesmo perante terceiros estranhos a relação, já os segundos são responsabilizados apenas se demonstrada sua culpa ou dolo, ou seja, tem uma responsabilidade subjetiva perante os clientes. Além disso, existe entre estes uma responsabilidade solidária diante da má gestão da instituição bancária que venha trazer prejuízos aos seus clientes (DINIZ, 2010, p. 374-375).

Quanto à responsabilização do banco perante os seus clientes ou terceiros, esta é sem dúvida objetiva, já que independe do dolo ou culpa na conduta do agente, bastando que haja um nexo de causalidade entre a conduta e o dano gerado. Tal responsabilidade é pautada na ideia de risco profissional ou risco da atividade, onde essas instituições devem suportar todos os riscos inerentes à sua atividade, respondendo pelos prejuízos que causar, em razão do risco assumido profissionalmente. Tal rigor se dá com o objetivo de restabelecer o equilíbrio entre os contratantes já que existi uma vulnerabilidade técnica e econômica do cliente/consumidor perante o banco, que por ter um maior poder econômico acaba por impor sua vontade através dos contratos de adesão como já foi relatado anteriormente (DINIZ, 2010, p. 375-376).

Por outro lado, quando o prejuízo é causado por um diretor ou administrador da instituição financeira, a responsabilidade passa a ser subjetiva, devendo-se obedecer ao “princípio segundo o qual cada um responde pela própria culpa” (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2012, p. 58). Dessa forma, existem dois aspectos principais da responsabilidade civil das instituições bancárias, já que tal responsabilidade pode ser ora objetiva (fundada na ideia de risco), ora subjetiva (fundada na ideia de culpa).

Diante da ausência de legislação específica para tratar da responsabilidade das instituições bancárias, Maria Helena Diniz (2010, p. 374) destaca que devem ser aplicadas ao banco as “normas relativas ao mandato, ao mútuo, ao deposito etc.”. Outro aspecto interessante é o fato de alguns autores estarem comparando o banco às concessionárias de serviço público já que o estabelecimento bancário exerce uma função delegada do Estado (DINIZ, 2010, p. 376).

 Há ainda autores como Carlos Roberto Gonçalves (2013, p. 248) e Sérgio Cavalieri Filho (2012, p. 440) que preferem dividir a responsabilidade das instituições bancárias em contratual, quando se trata da relação entre o banco e seus clientes, e extracontratual ou aquiliana, quando se trata da relação entre o banco e terceiros não clientes. No primeiro caso a responsabilidade é contratual pelo fato de já existir um negócio jurídico firmado entre as partes. Já no segundo caso não há nada firmado anteriormente, mas diante da violação direta de uma norma legal surgi o dever de indenizar decorrente de um dever negativo, ou seja, “a obrigação de não causar dano a ninguém” (GAGLIANO, PAMPLONA FILHO, 2012, p. 61-62).

Sendo assim, diante desse breve panorama passa-se a análise dos tipos mais comuns de responsabilização das instituições bancárias, esclarecendo se estas serão responsabilizadas de forma objetiva ou subjetiva e se estaremos diante de uma responsabilidade contratual ou extracontratual.

2      RESPONSABILIDADE DOS SEUS AGENTES

 

2.1    Responsabilidade dos diretores de banco

 

2.2    Responsabilidade dos administradores e membros do conselho fiscal

As instituições financeiras privadas serão necessariamente constituídas sob forma de sociedade anônima, com exceção das cooperativas de crédito, conforme está previsto no art. 25 da Lei 4.595/64. A sociedade anônima é representada por meio dos órgãos de administração: a diretoria e o conselho de administração.

As decisões da diretoria da instituição são, em regra, tomadas de forma individual, sendo que no conselho de administração as decisões serão sempre tomadas de forma colegiada. A Lei de Sociedades Anônimas (Lei 6.404/74) estabelece que os administradores, sejam eles diretores ou conselheiros, devem observar alguns deveres legais durante o exercício do cargo, vez que estes deveres representam padrões de conduta ou standards jurídicos no que diz respeito a tomada de atos e decisões. Caso haja inobservância de tais padrões, os administradores serão responsabilizados pela conduta (FARIAS, 2013, p. 71).

Dessa forma, o administrador de sociedade anônima possui uma responsabilidade extracontratual, ex lege, vez que na análise de sua responsabilização por infração será levado em consideração a conduta culposa do administrador. Diante disso, cabe-nos enfatizar que um dos principais deveres do administrador está o dever de diligência, o qual está previsto no art. 153 da Lei 6.404/74, sendo conceituado como o “dever que o administrador possui de empregar, no exercício de suas funções, o cuidado e diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração dos seus negócios” (FARIAS, 2013, p. 72).

Ou seja, o dever de diligência nada mais é que o dever de qualificar-se, de vigiar, de investigar, de informar-se e o dever de bem administrar. É tido como um princípio geral pelo fato de atuar como um meio de integração, interpretação e delimitação. Entre outros deveres, destacam-se o dever de lealdade, prestar informações e dever de sigilo.

Por conseguinte, cabe enfatizar que o juiz poderá excluir a responsabilidade do administrador no caso deste ter agido de boa-fé e nos interesses da companhia. Assim, os atos praticados de forma diligente e leal, não sendo configurado abuso e desvio de poder, os administradores não serão responsabilizados pelo risco da atividade (FARIAS, 2013, p. 72).

De acordo com o caput do art. 158 da Lei 6.404/76 entende-se, de início, que os administradores de sociedade anônima não serão responsabilizados pelas obrigações contraídas em nome da sociedade, mas somente quando praticarem atos que causem prejuízos, conforme estabelece os incisos I e II do artigo supramencionado.

Dessa forma, quando o administrador causar prejuízos dentro de suas atribuições ou poderes, com culpa ou dolo (art. 158, I), será necessário que a vítima ou terceiro prejudicado prove que a conduta foi praticada de forma culposa e dolosa. No entanto, no que diz respeito ao inciso II (art. 158), o qual se refere à violação da lei ou estatuto específico, esta seria uma hipótese de responsabilidade subjetiva com culpa presumida, cabendo ao administrador demonstrar que agiu dentro dos limites legais, ou seja, resta ao administrador demonstrar a inexistência de culpa ou dolo em sua conduta.

Conforme dispõe o art. 138 da Lei de Sociedades Anônimas, tanto os diretores quanto os conselheiros de administração são considerados como administradores da sociedade, sendo que os diretores, por atuarem de forma individual, respondem de forma individual. Já os conselheiros, por ser um colegiado, respondem de forma solidária.

Em relação a responsabilidade civil dos administradores de bancos no regime especial de administração temporária, vale ressaltar que, como forma de medida preventiva, os arts. 36 a 38, da Lei 6.024/74, trataram acerca da indisponibilidade dos bens dos administradores em regime especial. Tal medida visa a efetivação da responsabilidade do administrador da instituição em regime especial.

Além disso, os arts. 41 a 49 da lei supracitada tratam acerca do inquérito administrativo, sob a coordenação do Banco Central do Brasil, o qual tem por objetivo apurar as causas que levaram a situação de crise da instituição, bem como a responsabilidade dos administradores e membros do conselho fiscal. Depois de realizada a apuração das causas da crise, permite-se aos administradores apresentarem suas alegações. O montante ou estimativa de prejuízos causados em cada gestão será considerado durante o período de 05 (cinco) anos anteriores a decretação do regime especial (FARIAS, 2013, p. 79).

Levando-se em consideração a discussão doutrinária e jurisprudencial acerca dos artigos 39 e 40 da Lei 6.024/74, entende-se que a responsabilidade prevista no art. 39 é de natureza extracontratual devido a relação existente entre administrador e instituição financeira, enquanto que a responsabilidade do art. 40 é de natureza contratual, na qual os administradores são responsabilizados pelo descumprimento de contratos firmados pela instituição durante a gestão. Portanto, a responsabilidade dos ex-administradores de bancos sob regime especial, no art. 39 é subjetiva, enquanto que no art. 40 é subjetiva com culpa presumida (FARIAS, 2013, p. 85).

 

3      RESPONSABILIDADE DO BANCO CENTRAL DO BRASIL

 

Primeiramente, é importante destacar que o Banco Central do Brasil (BACEN) só foi criado com a Lei 4.595 de 1964, com a finalidade de substituir o antigo órgão chamado de Superintendência da Moeda e do Crédito – SUMOC. É dirigido por uma diretoria composta por nove membros, sendo que todos são nomeados pelo Presidente da República, entretanto, tais membros devem ser brasileiros com vasta reputação e notória capacidade em assuntos econômico-financeiros (SALOMÃO NETO, 2005, p. 91).

De acordo, com o art. 8ᵒ da Lei 4.595/64, o BACEN é uma autarquia federal com sede e foro na capital da República, Brasília. Tal órgão também é considerado uma pessoa jurídica de direito público interno, com patrimônio e receita próprios para suportar as obrigações contraídas diante terceiros, podendo ser responsabilizado diretamente e civilmente por seus atos praticados (MENDONÇA, 2012, p.60).

O Banco Central do Brasil poderá ser responsável a indenizar os danos causados a terceiros aplicando-se a teoria da responsabilidade subjetiva, desde que comprovada à culpa, o dano e o nexo de causalidade, ou aplicando-se a teoria da responsabilidade objetiva, tendo que comprovar o dano e o nexo de causalidade. Nesta segunda teoria poderá vir a se apresentar de maneira integral ou baseada no risco administrativo (MENDONÇA, 2012, p.74).  

Essa imputação civil contra o BACEN se dá “em razão da não observância das obrigações legais inerentes ao exercício das suas competências institucionais de regulação e de fiscalização do Sistema Financeiro Nacional” (MENDONÇA, 2012, p.74). Assim, a responsabilidade civil do Banco Central, deverá ser apurada segundo suas atividades de fiscalização e de intervenção no mercado bancário (MENDONÇA, 2012, p.83).

Nesse sentido, é necessário analisar a responsabilidade civil do Estado por conduta comissiva, aplicando a teoria da responsabilidade objetiva, tendo que demonstrar o dano sofrido pela vítima e sua relação de causalidade com a atividade estatal, e ainda a responsabilidade civil por conduta omissiva (MENDONÇA, 2012, p.78).

Com relação à responsabilidade civil do Estado por conduta omissiva, a doutrina é um pouco divergente, pois aplica tanto a teoria subjetiva como a teoria objetiva. Para a parte da doutrina que entende que essa responsabilidade deve ser apurada pela teoria subjetiva, fundamentam sua posição na ideia de existência de culpa. Já para a outra parte da doutrina que considera que tal responsabilidade deve ser apurada mediante a teoria objetiva, fundamentam dizendo que é necessário a comprovação do dano e o nexo de causalidade com a conduta praticada pelo ente público (MENDONÇA, 2012, p.78).

Diante do exposto, deve ser mencionado como os tribunais superiores estão se posicionando em face da responsabilidade do Banco Central. O Superior Tribunal Federal vem decidindo pelo afastamento da responsabilização do BACEN por omissão na fiscalização sob os argumentos de ilegitimidade passiva do BACEN, da União Federal e dos sócios (RE 434.155/PE, relatora Ministra Ellen Gracie), e também pelo não reconhecimento da configuração do nexo de causalidade entre o evento danoso e a conduta omissiva do BACEN (RE 25.816/PR, relator Ministro Dias Toffoli), dentre outros casos (MENDONÇA, 2012, p.86).

O STF também vem decidindo pelo reconhecimento da responsabilização do BACEN por omissão na fiscalização com o fundamento de que foi configurado a relação de causalidade entre o dano e o evento danoso, sendo provado que o BACEN, constatou irregularidades e mesmo assim não adotou nenhuma medida de intervenção na instituição financeira, gerando com isso uma falha no exercício de suas obrigações de fiscalizar e de exigir a prestação de contas (RE 370.256/DF, Rel. Min. Carmen Lúcia). Deve ser mencionado ainda que o STF ainda está decidindo pelo afastamento da responsabilização do BACEN por intervenção na política cambial sob o argumento de inexistência de relação de causalidade entre o dano sofrido em razão da modificação da política de variação cambial (RE 480.971/RS, Rel. Min. Dias Toffoli).

Já o STJ vem utilizando os mesmos argumentos do STF, para decidir pelo reconhecimento do afastamento da responsabilização do BACEN por omissão na fiscalização. O STJ também está decidindo pelo reconhecimento da responsabilização do BACEN por omissão na fiscalização no “caso de conduta omissiva que impediu investidores de resgatarem suas aplicações em carteira de open market” (REsp. 866.355/PR, Rel. Ministro Luix Fux) (MENDONÇA, 2012, p.89-90).  Deve-se concluir, portanto que a responsabilização civil do BACEN é um tema muito divergente nos tribunais superiores.

 

4        RESPONSABILIDADE DAS INSTITUIÇÕES BANCÁRIAS EM FACE DOS CLIENTES/CONSUMIDORES

As Instituições Financeiras, por excelência, são prestadoras de serviço ao público, tanto na modalidade pública como privada e tem por finalidade oferecer aos seus clientes produtos e serviços de maneira correta e adequada. Por isso mesmo que a doutrina é pacífica ao entender que a responsabilidade das instituições financeiras para com os clientes é de natureza contratual, por depender livremente da vontade das partes, na qual uma declara a intenção de tornar-se cliente da Instituição, enquanto esta se obriga a prestação de serviços por meio de instrumento avençado entre elas.

Ademais, o artigo 3º, §2º do Código de Defesa ao Consumidor (Lei n. 8.078/90) incluiu os serviços de natureza bancária, financeira e de crédito como serviços de prestação ao consumidor. Ampliando ainda mais o alcance da responsabilidade objetiva trazida pelo CDC, Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona (2012, p. 385) apontam em sua doutrina que “ao conceder empréstimos e financiamentos, talvez possamos até concluir que a instituição financeira não seria um mero fornecedor de serviço, mas, sim, de um produto – o dinheiro (que é bem consumível por excelência)”.

Em razão disso, o presente trabalho visa apresentar os eventos de maior incidência em que é perquirida a responsabilidade das instituições financeiras em relação aos serviços prestados e produtos oferecidos por estas.

4.1 Responsabilidade pelo pagamento de cheque falso

O pagamento de cheque falsificado tem-se configurado um dos principais eventos suportados pelos clientes das instituições financeiras e que ensejam a invocação da responsabilidade destas. Isso porque o desconto em conta corrente do cliente em relação a um cheque por ele não emitido pode dar cabo não apenas a prejuízos pecuniários, como também a danos extrapatrimoniais advindos da inclusão do nome do correntista em cadastro de mal pagadores nos serviços de proteção ao crédito.

A Lei do cheque (Lei nº 7.357/85) em seu artigo 39, parágrafo único dispõe que “o banco sacado responde pelo pagamento do cheque falso, falsificado ou alterado, salvo dolo ou culpa do correntista, do endossante ou do beneficiário, dos quais poderá o sacado, no todo ou em parte, reaver o que pagou”.

Tal enunciado confirma a responsabilidade objetiva invocada pelo Código de Defesa do Consumidor, uma vez que o banco responde pelo pagamento de cheque falso, falsificado ou alterado, somente esta sendo ilidida em caso de culpa exclusiva do correntista, endossante ou beneficiário.

Compete ao banco sacado, conforme já normatizado pelo Banco Central, a proceder ao pagamento do cheque apresentado a conferência dos requisitos formais do título bem como a veracidade da assinatura do emitente, por meio da folha de autógrafos anteriormente preenchida pelo correntista quando da avença do contrato com o banco. A compensação do cheque falsificado decorrente da inobservância destas normas estabelecidas, enseja a responsabilidade objetiva do Código de Defesa do Consumidor por configurar-se o defeito no serviço prestado explicitada em seu artigo 14, o que pode estar justificada sob justificação do fortuito interno (GEWEHR; GOMES, 2011, p. 202).

Este é o entendimento do Supremo Tribunal Federal, na súmula nº 479: “As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito das operações bancárias”.

Outra questão a ser levantada trata-se da possibilidade de admitir a responsabilidade do banco somente em casos de falsificação grosseira. A doutrina tem entendido que a responsabilidade persiste ainda assim. Nas palavras de Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona (2012, p. 390): “Ora, sendo grosseira ou não, a obrigação de se aparelhar com o sistema técnico de segurança adequado para evitar o pagamento de cheque falso é do banco e não do correntista”.

Há que se considerar, por outro lado, a culpa exclusiva do cliente, hipótese supracitada na qual eximiria a responsabilidade objetiva do banco. Havendo prova de que o cliente agiu com culpa, por exemplo, provocando a subtração do talão de cheques ou a falsificação ou olvidou de notificar o banco quanto à tais eventos, escusou-se de promover a sustação do título, é admissível que o banco alegue em sua defesa a quebra de nexo causal por culpa exclusiva da vítima, eximindo-se portanto da obrigação de indenização (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2012, p. 387)

Tal exclusão de responsabilidade possui respaldo legal no artigo 39, caput, da Lei de Cheque (Lei nº 7.357/85) bem como no próprio Código de Defesa do Consumidor, no seu artigo 14, §3º, II.

No que tange à culpa concorrente, imprescindível apresentar o entendimento da Súmula nº 28 do STF na qual aduz que “o estabelecimento bancário é responsável pelo pagamento de cheque falso, ressalvadas as hipóteses de culpa exclusiva ou concorrente do correntista”. Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona (2012, p. 388) concluem em seus apontamentos que “a culpa concorrente do correntista não exime o fornecedor da obrigação de indenizar integralmente a vítima do dano, razão por que cremos que o mandamento legal (art. 14, §3º, II, CDC) deve orientar a interpretação da súmula”.

4.2 Responsabilidade pelo protesto indevido de título

Ao se tratar da responsabilidade do banco pelo protesto indevido de título tem-se a denominada responsabilidade aquiliana ou extracontratual, ou seja, aquela aferida desde que presente os requisitos da ação (ou omissão), dano e o nexo causal entre estas.

Sílvio Venosa (2011, p. 254) coloca que “a instituição financeira será responsável pelo envio e protesto indevido de título. Enquanto que essa responsabilidade será evidentemente do credor, que não a instituição financeira, quando ele for o responsável pelo protesto”.

A problemática que envolve o tema está pautada principalmente no desconhecimento do banco das possíveis nulidades que permeiam o título e que, no mais das vezes, são invocadas como matéria de defesa por estas instituições na intenção de escusar-se da sua responsabilidade. Neste meandro, Sergio Cavalieri (2012, p. 455) esclarece que “se o banco não tem condições de averiguar a realidade do negócio que deu causa ao título, deve, pelo menos nas operações de desconto, ter a máxima cautela e só fazê-la com empresas idôneas.” Não se admite, portanto, aos bancos, a simples transferência dos riscos do negócio à terceiro de boa-fé que não realizou o negócio diretamente com o emissor do título falso.

Situação diferente ocorre quando a instituição financeira tem conhecimento da falsidade ou nulidade do título que leva à protesto. Neste caso

não pode o banco, uma vez ciente da falsidade ou nulidade do título, invocar os princípios pertinentes ao endosso para excluir a sua responsabilidade junto ao pretenso sacado (ou emitente) pelo indevido protesto. Se o reconhecimento da falsidade do título prejudica o endossatário, ainda que o tenha recebido de boa-fé, e que nenhum negócio celebrou com o falso sacador-endossante, inexistindo entre ambos qualquer relação jurídica. O mesmo já não ocorre com o banco endossatário, se assim é possível chama-lo. Embora de boa-fé, fez negócio com o falsário, foi por ele enganado, tornou-se vítima de um estelionato, devendo queixar-se de sua própria incúria por não ter selecionado rigorosamente os seus clientes (CAVALIERI FILHO, 2012, p. 455).

Os Tribunais tem-se inclinado a entender pela responsabilidade civil dos bancos nos casos de protesto indevido de título, principalmente no que tange aos danos extrapatrimoniais também incidentes no caso concreto, mesmo nas hipóteses de conhecimento posterior dos vícios do título. O banco que realiza o protesto indevido deve se responsabilizar pelos riscos da sua atividade, imprudência e negligência. Neste sentido os julgados: REsp 112.236, REsp 830.657, REsp 549.766 e o acórdão 0282514-5 do Tribunal de Alçada do Paraná.

 

4.3 Responsabilidade pela recusa de pagamento de cheque regular

A recusa de cheque regular se dá quando o banco, indevidamente, devolve o cheque do cliente por insuficiência de fundos, ocasionando uma série de problemas ao cliente.

Tem se tornado cada vez mais comuns demandas judiciais pedindo a reparação dos danos morais e materiais decorrentes desse tipo de conduta, pois muitas vezes, o cliente acaba tendo deu nome incluso na lista de proteção ao crédito e fica impedido de obter crédito.

O banco por sua vez e sua defesa alega que esses transtornos se dão por falhas no sistema operacional do banco, contudo, Sérgio Cavalieri Filho (2012, p. 444) enfatiza que isto não é suficiente para elidir a responsabilidade da instituição bancária. Isto por que, nos termos do CDC, o banco só irá se eximir nos casos em que provar que o defeito não existiu ou, então, a culpa exclusiva do cliente ou terceiro.

Cumpre, destacar que a relação entre o banco e o correntista é uma relação de consumo e, por isso, a instituição financeira responderá objetivamente pelo fato do serviço. A falha no sistema do banco, como bem leciona Cavalieri Filho (2012, p. 445), configura-se como um defeito do serviço, devendo o banco, independente de culpa, indenizar o cliente em virtude da indevida devolução do cheque.

4.4 Cartão de crédito

A utilização do cartão de crédito como meio de pagamento envolve uma complexa rede de empresas e contratos, onde se destacam a instituição financeira que figura como emissora e administradora do cartão de crédito, o titular do cartão e o estabelecimento comercial credenciado. Nessa relação, o emissor do cartão se coloca entre o titular do cartão e o estabelecimento credenciado tornando viável a compra e vendo de um produto ou a prestação de um serviço. De um lado o emissor se compromete a pagar a as dívidas contraídas pelo titular que por sua vez se obriga ao pagamento de uma contraprestação (CAVALIERI, 2012).

Há ainda uma relação contratual firmada entre o emissor do cartão e os estabelecimentos filiados, onde aquele se compromete honrar a dívida contraída pelos titulares do cartão e o vendedor ou prestador de serviços deve cumprir com o seu dever de aceitar o cartão como forma de pagamento sem que isso implique em acréscimo no preço dos produtos e serviços.

Note-se que as relações decorrentes do contrato de cartão de crédito possuem natureza de prestação de serviço. Assim, embora o ordenamento pátrio não disponha de legislação específica que discipline a matéria, essas relações deveram ser regidas pelo Código de Defesa do Consumidor, tanto no que diz respeito aos limites das cláusulas contratuais como no que toca a natureza da responsabilidade das partes envolvidas (CAVALIERI, 2012).

Nesse sentido, o art. 14 do CDC, preceitua que o fornecedor de serviços, responde independente de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores. Trata-se, portanto de responsabilidade objetiva pelo fato do serviço, fundada na teoria do risco. Por está teoria o empreendedor responde pelos riscos do seu negócio, devendo, a administradora, neste caso, sofrer os riscos decorrentes de sua operação. Ressalta-se ainda que o ônus de provar a culpa exclusiva do consumidor, para se exonerar da responsabilidade civil, deve ser transferida para a entidade emissora ou para o fornecedor (OLIVEIRA, 2012).

Por outro lado, na relação que se estabelece entre o estabelecimento credenciado e a administradora do cartão, é importante mencionar o dever de cuidado que o vendedor dever ter. É muito comum as lojas deixarem de conferir a assinatura do titular ou exigir um documento de identificação o que acaba facilitando o uso indevido do cartão de crédito. Nestes casos, como bem aponta Cavalieri (2012, p. 449), o titular não pode responder pelo ato culposo do vendedor, isto por que, o vínculo contratual existente é com o emissor do cartão, perante o qual o vendedor deverá responder por sua falta de cautela. O risco de aceitar o cartão sem adotar as medidas de segurança faz com que o dono do estabelecimento tenha o dever de suportar os danos decorrentes de seus atos, podendo o emissor recusar pagar a dívida devido a má utilização do serviço.

Como se pode perceber, os riscos do negócio sempre vão correr por conta do empreendedor, devendo este suportar os prejuízos decorrentes da atividade desenvolvida.

 

4.5 Responsabilidade pelo furto ou roubo de bens depositados em cofres bancários

Faz parte das prestações de serviços fornecidas pelos bancos, o aluguel de cofres, normalmente para a guarda de jóias, pedras e metais preciosos, documentos, ou seja, bens que exigem um cuidado maior.

Segundo Arnaldo Rizzardo (2007, p. 559),

Não se ostenta a feição de uma locação pura e simples, porquanto a finalidade objetivada está na segurança e proteção absoluta visada pelo que busca o serviço. Não se tem como fito o mero uso do cofre, ou sua fruição, porquanto não é isso que buscam os usuários do serviço, e sim a absoluta garantia de custódia e segurança de bens contra a perda, a subtração, o incêndio, o furto, o roubo.

Ao contratar tal prestação de serviço, o locatário busca colocar em segurança os objetos que deseja ali depositar e, a instituição financeira, ao oferecer esse serviço de guarda, assume um dever ininterrupto de vigilância, sendo portanto, uma obrigação de resultado e não simples obrigação de meio. Ao fazê-lo, passa a responder, portanto, pelo conteúdo do cofre. (GONÇALVES, 2013).

Levantando a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, Silvio de Salvo Venosa (2011, p. 256), ensina que

nessa hipótese, estabelece-se uma relação contratual entre o fornecedor de serviços e o consumidor, e é inafastável que existe um dever de guarda e custodia oferecido pelo banco. Há um contrato atípico, misto, que utiliza princípios do depósito, da locação e da prestação de serviços.

Confirmando a aplicabilidade do CDC nestes tipos de contrato, confirmando a responsabilidade objetiva das instituições financeiras, o STJ assim decidiu

 No que concerne ao depósito bancário, deduz-se naquela Corte Superior que “Ainda que os bens comprovadamente depositados no cofre roubado sejam de propriedade de terceiros, alheios à relação contratual, permanece hígido o dever de indenizar do banco, haja vista sua responsabilidade objetiva frente a todas as vítimas do fato do serviço, sejam elas consideradas consumidores stricto sensu ou consumidores por equiparação” (STJ, REsp 1045897/DF, Terceira Turma, Rel. Ministra Nancy Andrighi, julgado em 24/05/2011, DJe 01/06/2011).

4.6    Responsabilidade pela segurança dos clientes

 

A responsabilidade civil por danos sofridos aos clientes/consumidores das instituições financeiras é contratual e objetiva adotando-se a teoria do risco integral ou o risco da atividade previsto no art. 927 parágrafo único do Código Civil. De acordo com Pablo Stolze (2012, p. 384), o cliente do banco é consumidor e, portanto desnecessária é a utilização das Resoluções 2.878 e 2.892/2001 do BACEN, “Código do Cliente Bancário”, visto que o mesmo foi afastado pelas normas protetoras do CDC.

A aplicação do CDC às instituições financeiras decorre da previsão prevista no art. 3, § 2º do CDC que define o fornecedor consumerista e equipara as atividades bancárias como fornecedoras de serviços. Além do serviço as instituições financeiras também oferecem produto, qual seja, “o dinheiro que é o produto por excelência” (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2012, p. 385).

Dessa forma como as instituições financeiras desenvolvem suas atividades pautadas no risco excessivo, tem o dever de prestar segurança aos clientes/consumidores que utilizam-se dos seus serviços.

O dever de segurança decorre de dois pressupostos, primeiro as instituições financeiras devem zelar pela segurança do dinheiro, dos bens guardados nos cofres dos bancos e das informações de dados cadastradas nos registros das instituições e segundo pela segurança pessoal, integridade física dos clientes, que é o tema que será abordado neste tópico.

Destarte, os bancos por lidarem com dinheiro terminam por atrair pessoas mal intencionadas, “bandidos”, que põem em risco a segurança dos clientes consumidores e de todos os usuários do sistema financeiro resultando, portanto pelo grau de risco de sua atividade o dever de segurança.

A disposição legal que regulamenta o dever de segurança das instituições financeiras esta previsto na Lei 7.102/83, com redação dada pela Lei 9.17/95, devendo possuir pessoal treinado para segurança, sistema eletrônico de proteção e alarmes eficientes para identificar e monitorar ações de possíveis assaltantes.

Todavia o que se observa é que as instituições financeiras muitas das vezes estão preocupadas com a segurança de seu patrimônio que propriamente com a segurança dos consumidores, no entanto muita coisa já mudou diante das decisões judiciais que responsabilizaram as instituições financeiras por falha na prestação do serviço, nos moldes do art. 6º, I do CDC.

Dessa forma se for comprovado que o banco não agiu com o devido cuidado na prestação do serviço ele pode ser responsabilizado pelo infortúnio denominado “saidinha de banco”, vejamos os pressupostos jurisprudenciais:

INDENIZAÇÃO - DANO MORAL E MATERIAL - ASSALTO NO RECINTO DE AGÊNCIA BANCÁRIA - DEVER DO BANCO DE ZELAR PELA SEGURANÇA DE SEUS CLIENTES - DANO MATERIAL COMPROVADO - CONFIGURAÇÃO DE DANO MORAL - REDUÇÃO DO MONTANTE - APELAÇÃO EM PARTE PROVIDA.(TJ-SP - APL: 991080912622 SP , Relator: Matheus Fontes, Data de Julgamento: 24/02/2010, 22ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 18/03/2010)

                                                                                                                        

"APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. RELAÇÃO DE CONSUMO. ASSALTO A CLIENTE APÓS A SAÍDA DA AGÊNCIA."SAIDINHA DE BANCO ". AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO QUE NÃO AFASTA O DEVER DO AUTOR DE PROVAR O FATO CONSTITUTIVO DE SEU DIREITO, OS DANOS E O NEXO DE CAUSALIDADE. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA (TJ-RJ - APL: 1789971720118190001 RJ 0178997-17.2011.8.19.0001, Relator: DES. LETICIA SARDAS, Data de Julgamento: 25/04/2012, VIGESIMA CAMARA CIVEL, Data de Publicação: 04/05/2012).

Diante disso, a jurisprudência ainda não firmou entendimento sobre o tema, devendo no caso concreto o autor provar que a instituição financeira teve falha na prestação do serviço expondo o consumidor ao risco de ser assaltado, facilitando que outras pessoas no recinto da instituição financeira pudessem visualizar a operação realizada pelo cliente e avisassem a seus comparsas que se encontravam fora da instituição para a realização do crime.

4.7  Responsabilidade pelo fornecimento de informações - quebra do sigilo bancário

A natureza da atividade bancária proporciona um frequente contato com clientes, em razão disso, vão, os bancos, armazenando vários dados e informações a respeito de cada um desses clientes e, inclusive de terceiros. Sob a égide do sigilo profissional, essas informações, como regra, devem ser salvaguardadas do meio público.

Tal regra encontra respaldo no direito à intimidade e a vida privada, petrificado no artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal brasileira, e pelo artigo 1º caput, da Lei Complementar 105 de 2001.

Contudo, deve-se ressaltar que o sigilo não é, exclusivamente, hegemônico. Nesse liame, a quebra do sigilo bancário pode ser feito nos casos específicos previstos pela Lei Completar 105/2001, como também poderá compor a atividade realizada pelos bancos como serviço acessório, inclusive mediante pagamento, sob a tutela da prevenção aos riscos de crédito. Antes de explanar a responsabilização dos bancos, vale observar as exceções legais e naturais ao sigilo bancário.

Basicamente, o sigilo das operações descritas só pode ser quebrado mediante solicitação judicial, ou em benefício de comissão parlamentar de inquérito, segundo os artigos 3º e 4º da Lei Complementar nº 105/01.

[...] Em todos esses casos, só para a finalidade específica para a qual foi determinada a quebra de sigilo poderá a informação ser usada. [...] A quebra de sigilo deve, dada sua interferência com um direito fundamental dentre os elencados na Constituição, ser interpretada restritivamente, ou seja, ocorrer só para a finalidade para a qual foi determinada. Mais ainda, o órgão beneficiado pela quebra continua obrigado a resguardar a vida privada e intimidade do beneficiário do sigilo (SALOMÃO NETO, 2005, p.495).

Além dos casos supracitados, a Lei Complementar nº 105/01, em seu artigo 1º, parágrafo 3º, abarca outros casos em que o fornecimento de informações não violará ao sigilo bancário. Podem ser citados os seguintes casos em que o fornecimento de informações é permitido: troca de informações entre instituições financeiras para fins cadastrais; fornecimento de informações sobre emitentes de cheques sem provisão de fundos e devedores inadimplentes a entidades de proteção de crédito; fornecimento de informações para Receita Federal; prestação de informações ao Banco Central quando este atuar em suas funções de fiscalização, entre outros.

Afora essas exceções legais, podemos destacar outros casos em que o sigilo bancário poderá ser quebrado. Trata-se de permissões justificadas pela necessidade.

Assim, é desnecessário que a lei diga que o sigilo bancário pode também ser quebrado quando a parte a ele obrigada precisa usar as informações para a defesa de legitimo interesse seu, por exemplo, cobrando crédito não quitado pelo cliente nos tribunais. Igualmente justificável é a concessão de informações sobre a operação efetuada a terceiro que dela seja garantidor, seja para cobrá-lo em caso de inadimplemento do devedor principal, seja para mantê-lo informado do desempenho do devedor principal preparado para honrar suas obrigações. De forma mais evidente, não se aplica ao sigilo em relação ao próprio cliente cuja movimentação bancária esteja em questão, que tem pessoalmente ou através de seus representantes legais ou procuradores direito à obtenção das informações relevantes. O mesmo pode-se dizer em relação aos co-titulares de conta corrente, caso em que não se pode omitir em relação a qualquer deles informações sobre a totalidade da conta. [...] O cliente pode também autorizar a divulgação de informações pela entidade obrigada ao sigilo (SALOMÃO NETO, 2005, p.500-501).

No plano geral, observa-se que a obrigação de indenizar surge da mera culpa, ressaltando-se a disposição do artigo 927, parágrafo único, do Código Civil de 2002, em que estabelece a obrigação de reparo do dano independentemente de culpa nos casos pautados em lei ou quando a natureza da atividade desenvolvida pelo autor do dano aludir risco aos direitos de outrem. Emerge, então, do fornecimento de informações a possibilidade de responsabilização dessas instituições financeiras em relação ao solicitante, ao solicitado que tenha ou não autorizado o fornecimento, isto porque se autorizou o fornecimento e o banco não o fez e isso suscitou um dano o banco será responsável, e em relação ao terceiro, que não matem nenhum tipo de relação contratual.

Em relação ao solicitante das informações, tratando-se de um serviço prestado pelo banco a título oneroso, fica caracterizada uma avença, isto é, uma relação contratual entre as partes, da qual se extrai a responsabilidade contratual do banco pelos eventuais prejuízos causados ao solicitante, em razão de incúria do banco. Quando essa relação se dá de forma gratuita, costuma-se fazer uma distinção entre o solicitante cliente e o não cliente; no que diz respeito ao primeiro, a responsabilidade será contratual, isto porque o fornecimento das informações será entendido como uma das operações executadas pelo banco em beneficio do seu cliente. Em relação ao não cliente, Nelson Abrão (2009) diz que a responsabilidade será, presumidamente, contratual, uma vez que precede um acordo de vontades.

Ainda no que tange à responsabilidade para com o solicitante,

é pacífico que a responsabilidade do banco decorre da inexecução de uma obrigação de meio, e não de resultado, isto é, da falta de diligência. Isto significa que o banco não pode garantir a exatidão das informações prestadas, mas deve haver-se com o necessário empenho. [...] A vítima da informação equivocada deve demonstrar que o banqueiro não despendeu a diligência requerida chegar a exatidão. Sob esse aspecto, o banqueiro responde por sua culpa leve (ABRÃO, 2009, p.270).

Em relação à responsabilidade sobre o repasse de informações dos clientes, observa-se que é comum troca de dados de clientes entre essas financeiras, principalmente quando militam na área de crédito em virtude de tentarem diminuir o risco do negócio a partir da constatação da situação patrimonial daquele. Contudo, devem respeitar as regras do sigilo, pois se os dados vierem à divulgação, poderá ensejar responsabilização na modalidade indenizatória. De qualquer modo, é necessária a comprovação do nexo causal a ensejar o dano, pois a simples cogitação desprovida de resultado não é suficiente ao questionamento do prejuízo declarado.

Ainda nesse liame, destaca-se que é possível o repasse de informações de clientes inadimplentes e de emissores de cheques sem fundos às empresas de proteção de crédito. Essa possibilidade repousa no entendimento de que é necessário proteger a saúde do sistema financeiro nacional, isto porque não permitir a inscrição dos inadimplentes em cadastros de proteção de crédito seria protegê-los em detrimento dos pagadores adimplentes. Isso pode ser visualizado, por exemplo, na formação das taxas de juros, que inclui o índice compensatório da inadimplência.

Em caso de existir ação judicial pela qual o devedor pretenda discutir o crédito, não poderá ocorrer tal apontamento às protetoras de crédito.

Tal situação, na verdade, deve ser considerada caso a caso. Ou seja, não pode haver uma regra proibindo a inscrição do devedor em cadastro de inadimplentes, pelo só simples fato de haver ação judicial em que se discute o débito, devendo o Juíz, caso a caso, e a luz do o art. 273 do CPC, decidir se existe consistência nos argumentos do devedor, para que se considere sustentável a sua tese de proibição de apontamento da dívida (BUSSAB, 2008, p.15)

Por fim, a responsabilidade civil dos bancos em relação ao fornecimento de informações de terceiros, estranhos à relação contratual do banco não é abrangida pela Lei Complementar nº 105/01, pois se restringe a “operações ativas e passivas e serviços prestados”. Essa responsabilização encontra respaldo na Constituição Federal, no direito a vida privada e a intimidade. Em razão disso, paradoxalmente, o terceiro se beneficia de forma mais abrangente das regras de sigilo, do que os abarcados pela Lei Complementar supracitada, pois esta admite uma série de exceções, que, simplesmente, não existem quando a proteção tem base unicamente constitucional.

5      RESPONSABILIDADE DAS INSTITUIÇÕES BANCÁRIAS EM FACE DE TERCEIROS NÃO CLIENTES

 

Ao falar em responsabilidade civil das instituições bancárias também se faz necessário ressaltar a responsabilidade em se tratando de sua relação com terceiros, aqui entendidos como indivíduos com os quais o banco não possui qualquer relação, ou seja, com os quais não há um vínculo contratual.

Os bancos respondem extracontratualmente por danos que venham a causar aos terceiros. Conquanto tal responsabilização não seja observada com frequência, não se exime de culpa o banco pelos atos abusivos cometidos por seus prepostos. Dentre os atos aos quais recaí responsabilização estão os atos ilícitos que na doutrina de Maria Helena Diniz: “é o ato praticado em desacordo com a ordem jurídica, violando direito subjetivo individual, causando dano a outrem, criando o dever de reparar tal prejuízo” (2010, p. 41). 

Nos termos do artigo 186 do Código Civil o ato ilícito ocorre quando o agente por ação ou omissão dolosa ou culposa, viola direito e causa dano a outrem, mesmo que no âmbito da seara moral, bem como quando excede manifestamente os limites impostos pelo fim econômico ou social, agindo com abuso de direito ou ato contrário à boa-fé, consoante artigo 187, do referido código.

Observa-se que Código Civil de 2002 prevê pari passu à responsabilidade civil subjetiva das instituições bancárias, a responsabilidade civil objetiva em decorrência do risco inerente ao negócio. Todavia, requer-se, para determinar a responsabilidade, uma análise no intuito de verificar a conduta a qual se atribui o cometimento da lesão.

A responsabilidade extracontratual, também chamada de aquiliana é aquela que decorre da conduta que se mostra contrária ao direito, independentemente da existência de qualquer relação entre as partes, mas tão somente que cause lesão a outrem, configurando, pois, em obrigação de indenizar.

A doutrina de Pablo Stolze Gagliano afirma que “caso seja algo decorrente da atividade habitualmente exercida, e não em função de um fato isolado no seu amplo campo de relações negociais, poderemos afirmar que a responsabilidade civil será objetiva” (2012, p. 395).

Portanto, a responsabilidade bancária será extracontratual e objetiva nos casos em que figurem direitos de terceiros não consumidores, em virtude da natureza da atividade implicar risco à direitos de outrem. Assim, em decorrência do risco da atividade bancária, aquele que por ato ilícito causar dano a outrem ficará obrigado a repará-lo, independentemente de culpa, conforme consta no artigo 927, parágrafo único, do Código Civil.

No campo da responsabilização das instituições financeiras, a jurisprudência tem sido, inclusive, bastante pródiga em ampliar o campo de responsabilidade de tais entidades, havendo acórdãos, inclusive, que lhes imputam a obrigação de reparar danos decorrentes de crimes ocorridos em suas instalações (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2012, p.396).

O entendimento jurisprudencial decorre da teoria do risco empresarial, segundo a qual o empresário deve arcar com as consequências dos riscos inerentes a sua atividade, inclusive pelas falhas de seus prepostos, equipamentos e tecnologias, uma vez que é dever da instituição financeira oferecer segurança não só a clientes, mas também a usuários dos serviços prestados, tendo o STF, na Súmula 28, reconhecido o dever do banqueiro de responder pelos danos que causar, em virtude dos riscos que assume profissionalmente.

 

6      CONCLUSÃO

 

As instituições financeiras são essenciais para o desenvolvimento do econômico do Brasil, a própria Carta Magna de 1988, estabelece os princípios de proteção e controle e por isso a Constituição esteve um passa à frente do seu tempo ao estabelecer em seu art. 1º como fundamentos da sociedade democrática no mesmo inciso IV a livre iniciativa e os valores sociais do trabalho.

Destarte observa-se que o Brasil é um Estado capitalista contudo, pautado na proteção do indivíduo consumidor frente à exploração econômica das instituições financeiras, sendo previsto a criação de um Código de Defesa Consumerista justamente para asseguram que o hipossuficiente fosse protegido.

Dessa forma conclui-se plenamente aplicável as normas protetoras do CDC na responsabilização dos danos causados pelas instituições financeiras na prestação do serviço aos consumidores, respondendo dessa forma na maioria dos casos objetivamente por força do risco da atividade prevista no parágrafo único do art. 927 do CC/2002 e principalmente pelas normas consumeristas.

Desse modo concluímos que cabe à doutrina, aos juristas e a toda a sociedade zelar pelo equilíbrio que a Carta Magna impôs promovendo a livre iniciativa como fator de crescimento e ao mesmo tempo limitando o abuso e dano causado aos clientes consumidores e a terceiros lesados pelo risco das operações financeiras.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

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BUSSAB, Marcos Roberto. Responsabilidade civil das instituições financeiras no relacionamento com seus Clientes. Disponível em: < http://bussabadvogados.com.br/docs/doc004.pdf> Acesso em: 20 de outubro de 2013.

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2012.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

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GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

GEWEHR, Mathias Felipe; GOMES, Daniela Vasconcellos. Responsabilidade civil das instituições financeiras nos danos causados pelo pagamento de cheques falsificados. Revista do Curso de Direito da FGS. Caxias do Sul, ano 5, n. 9, jan/jun 2011, p. 193-209. 

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

MENDONÇA, Vinícius de Carvalho Pires. A responsabilidade civil do banco central na visão dos Tribunais Superiores Brasileiros. Revista de direito bancário e do mercado de capitais. Ano 15, vol. 57, jul.-set 2012, p.47 – 95.

OLIVEIRA. Andrea Celestino de. Cartão de crédito e a responsabilidade civil contratual.  2012. Disponível em: <<http://www.unimar.br/pos/trabalhos/arquivos/624393AE2D9D4FA0DA5EC854C920B66D.pdf>>. Acesso em: 20 de outubro de 2013.

RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade civil. 3 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007.

SALOMÃO NETO, Eduardo. Direito bancário. São Paulo: Atlas, 2005.

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: responsabilidade civil. 11 ed. São Paulo: Atlas, 2011.



[1] Trabalho apresentado à disciplina de Responsabilidade civil, da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

[2] Alunos do 9º período, do Curso de Direito Noturno, da UNDB

[3] Professora, Orientadora.