Boaventura de Sousa Santos, em sua obra “Um discurso sobre as ciências na transição de uma ciência pós-moderna” faz importantes considerações sobre as ciências, mostrando a realidade da ciência moderna, a qual também chama de paradigma dominante, a crise pela qual esse paradigma está passando e pressupõe que um novo paradigma está para surgir, ou seja, a emergência de uma ciência pós-moderna. O autor propõe como deve ser este paradigma emergente que, segundo ele, é um “paradigma de um conhecimento prudente para uma vida decente”.

Em seu relato sobre o paradigma dominante, o autor se baseia na ideia central de que a ciência moderna busca ser de uma supremacia que não cabe mais aos dias de hoje, ou seja, é inflexível e não atende às reais necessidades humanas. Aliás, não considera os estudos humanos e opõe-se duramente ao senso comum por serem formas de conhecimento que não seguem seus princípios epistemológicos e suas regras metodológicas.

Portanto, a única forma de conhecimento aceita pelo paradigma dominante é aquela que segue suas doutrinas. Ademais, este paradigma científico luta contra toda forma de dogmatismo e autoridade e desconfia das evidências das experiências imediatas, considerando essas como formas de conhecimento vulgar e, portanto, ilusórias.

O instrumento de análise utilizado pela ciência moderna é a matemática, que tem por objetivo fornecer um conhecimento mais profundo e rigoroso da natureza.

As leis da ciência moderna são um tipo de causa formal, privilegiando o “como funciona” em detrimento de “qual o agente ou fim das coisas”. Por esta via o conhecimento cientifico rompe o conhecimento do senso comum.

 Segundo o autor, esse modelo de racionalidade científica está enfrentando uma terrível e irreversível crise, resultado de uma pluralidade de condições, sendo elas sociais e teóricas. Quanto as condições teóricas, o autor apresenta quatro justificativas para evidenciar tal crise: a teoria da relatividade, a mecânica quântica, os questionamentos da matemática e os avanços tecnológicos da microfísica, química e biologia.

No que diz respeito às condições sociais, essas não têm tratamento detalhado no texto. De acordo com o autor, o que a ciência ganhou em rigor nos últimos quarenta ou cinquenta anos, perdeu em capacidade de auto-regulação.

A industrialização da ciência acarretou o compromisso desta com os centros de poder econômico, social e político, os quais passaram a ter um papel decisivo na definição das prioridades científicas.

Com base na caracterização da crise do paradigma dominante, o autor propõe um novo paradigma, o paradigma emergente, que, segundo ele, ainda é mera especulação. Para justificá-lo, o autor apresenta um conjunto de teses. São elas:

1)      Todo conhecimento científico-natural é científico-social

2)      Todo conhecimento é local e total

3)      Todo conhecimento é autoconhecimento

4)      Todo conhecimento científico visa a constituir-se num novo senso comum

Para o autor, é necessário saber viver outras formas de conhecimento, e não apenas o conhecimento racional que orienta o paradigma dominante. Na ciência pós-moderna, o senso comum enriquecerá a relação do homem com o mundo.

O texto é bastante polêmico, haja vista que nos faz refletir sobre tudo o que aprendemos e sabemos sobre as ciências, com um novo olhar. O olhar da incerteza, de que nem tudo o que aprendemos e sabemos é verdadeiro ou correto.

Mas, como não traz exemplos ou argumentos, o texto também nos leva a desconfiar de alguns conceitos defendidos pelo autor, como por exemplo: será mesmo que podemos estudar as ciências sociais com a mesma objetividade que estudamos as ciências naturais?

Enfim, a obra é, de fato, polêmica, porém muito importante para aqueles que desejam estudar a fundo as ciências.

REFERÊNCIA:

SANTOS, Boaventura de Sousa. Um discurso sobre as ciências. 16. ed. Porto: B. Sousa Santos e Edições Afrontamento, 2010. 59p.