Introdução ao tema:

Os autores iniciam sua matéria indicando ao leitor que a mesma é fruto das pesquisas desenvolvidas ao longo de 5 anos de docência no curso de Mestrado em Educação e em cursos de especialização, ministrados na Universidade Federal de Pernambuco – UFPE, além do necessário trabalho de pesquisa em material especializado.

Para contextualizar sua matéria, os autores – em 2004 – colocam o sistema capitalista como sendo o grande sistema perverso que contamina o globo, ainda mais, colocam-no como cambaleante, a beira do colapso que deixará em dúvida todo o sistema social produtivo e consequentemente o sistema de ensino baseado no capital e na preparação da mão de obra para o trabalho. nesse sentido, o texto nos remete à seguinte questão: "como educar e formar docentes para as IES no interior da crize agudizada, frente à exaustão das possibilidades civilizatórias do capitalismo?"

Assim, embora sem resposta iminente, o texto explora a crise do capital nos seguintes 5 âmbitos: (I) no padrão de produção de bens, que se alicerça sobre a superexploração do trabalho humano; (II) nos padrões de dominação e exploração da América Latina que se construíram historicamente pela colonização europeu/ocidental e mais recentemente pelo imperialismo americano; (III) na caracterização do imperialismo senil, como modelo arcaico de "dominação global"; (IV) no complexo econômico atual, onde estão presentes todos os males do capital e da dominação econômica e (V) nos ajustes e reformas necessárias para manutenção da hegemonia de poder e controle do capital, ou seja, o texto coloca como grande male do mundo a ser extirpado para felicidade de todos o "perverso" sistema capitalista.

Os autores são obrigados a reconhecer que a referência da realidade atual é norteadora das "decisões científicas e pedagógicas, e deve implicar não apenas o entendimento geral dos efeitos da planetarização do capitalismo, manifestados no aumento das mazelas da classe trabalhadora".

Para os autores, tal relevância ganha contornos de política social a ser seguida, "tomando para si a tarefa de interpretar as relações sociais de uma sociedade historicamente determinada para transformá-las". Ainda para os autores, "o professor necessita orientar-se no conhecimento da luta ideológica contemporânea".

No texto, vemos que deve ser papel do docente situar-se em relação a um "projeto histórico não capitalista", projeto este que deve ser combativo à cultura hegemônica praticada pelo "Estado capitalista", assim, para os autores, o projeto histórico deve ser o centro do trabalho docente, em torno do qual as orientações pedagógicas devem centrar-se em uma verdadeira transformação revolucionista, e não meramente uma reforma da vida social.

A teoria pedagógica enquanto ponto de encontro:

Os autores estão corretos ao afirmar que a "Teoria Pedagógica" é o ponto de encontro e construção da unidade metodológica entre as áreas do conhecimento e campos de saberes que são referências para as disciplinas escolares. Temos aqui que o pensamento dos autores volta-se para o campo conhecido como transposição didática introduzida por Michel Verret (1975) e depois utilizada por Yves Chevallard em sua obra "La Transposicion Didatique". Contudo, os autores vão além, e sugerem que a teoria pedagógica seja utilizada como forma concreta de transformação da realidade social, talvez se considerarmos a importância do ensino e da educação enquanto ferramentas de inclusão social e de disseminação de cidadania.

Outrossim, para os autores, a técnica docente tem sido utilizada ao longo dos anos como forma de orientar a produção e a formação da classe trabalhadora, e disso não se eximiria também a educação superior.

No texto, temos também inúmeras perguntas que são feitas ao leitor, e que merecem destaque, à saber: "como podemos contribuir para uma visão articulada e densa da teoria educativa, superando o ativismo desvairado de práticas aleatórias, isoladas, desconexas, que são verdadeiros engodos do tempo pedagógico dos estudantes no ensino superior? Como contribuir para ampliar a capacidade reflexiva crítica dos estudantes (...)?"

Para os autores estas e outras questões de mesma importância tem sido respondidaspor todas as áreas de referência das disciplinas do currículo da universidade e implica em concepções diversas e de diferentes enfoques.

Conforme indicam os autores, a elaboração da teoria pedagógica é matéria de pesquisa e segundo FREITAS (apud) implica interação intensa com a prática pedagógica. Levanta-se assim, como hipótese de elementos da teoria pedagógica à organização do trabalho no trato com o conhecimento, nos objetivos – a avaliação, pois para os autores, todo o sistema encontra-se voltado para a avaliação: é ela quem legitima – mesmo que de maneira informal – a validade dos processos sociais e culturais, e consequentemente também os processos acadêmicos e de ensino. A avaliação é sempre a última fronteira a ser perseguida pelos indivíduos: todos querem obter êxito, e quando livres da prática avaliativa desconectam-se de sua obrigatoriedade, afinal, se não há a presença da avaliação, não estará presente também o empenho do indivíduo em fazer o seu melhor.

Contudo, tais questões não são suficientes para o esgotamento do tema: temos que observar também que a formação social da consciência humana deve ser também utilizada neste contexto, e assim, os autores fazem uso das idéias de Marx quando este levanta questionamento de grande importância: "será preciso grande perspicácia para compreender que (...) a consciência do homem se modifica com toda mudança (...) em suas relações sociais (...)?" tais teorias centradas na modificação do homem pelo meio e pelas relações sociais mais tarde serão abordados por outros célebres estudiosos, dentre os quais, podemos destacar Jean Piaget, grande médico suíço. Contudo, e de volta ao tema central, temos que as universidades estão entrelaçadas ao sistema capitalista de manutenção do poder pois "o conhecimento do ponto de vista de uma determinada ordem social vem sendo tecida no interior das universidades" graças à forma como ocorre o "trabalho pedagógico e o trato com o conhecimento".

Os dados empíricos – a construção da hegemonia:

Os autores asseveram que o meio utilizado para reconhecer a forma de ensino dos profissionais de IES, como forma de contribuição para o enfrentamento dos problemas sociais e do ensino, faz-se necessária a utilização de procedimentos próprios de uma abordagem focada na qualidade da pesquisa e do ensino, por meio de concepções voltadas para o núcleo do ensino problematizador. Desta arte, para os autores, a fim de alcançar tal objetivo, deve o pesquisador utilizar-se dos seguintes procedimentos:

análise da literatura atualizada;

análise do ordenamento legal;

análise de práticas utilizadas nas IES;

Tais ferramentas de análise são, de acordo com o texto, fundamentais para a avaliação do trabalho pedagógico realizado nas Instituições de Ensino Superior no país. Assim, a apreciação dos textos de caráter acadêmico, nos permite verificarmos quais são as teorias adotadas para o assunto, podemos desta forma observar e qualificar qual é o entendimento predominante no meio científico-acadêmico.

A análise do ordenamento legal, e aqui se subentende também a avaliação da prática de governo e das políticas de Estado, bem como o entendimento das classes operárias formadas basicamente pelos sindicatos e associações, que acabam por produzir um entendimento mais crítico sobre as políticas públicas do setor de ensino.

Por último, a análise das práticas adotadas efetivamente nas Instituições de Ensino, e a observação destes dados, permitiram aos autores uma análise documental e de formulação de entrevistas que permitiram o total questionamento dos rumos dados ao ensino e à pesquisa no Magistério Superior, onde nota-se uma vinculação das demandas atrelada à lógica de mercado que é baseada no lucro.

Isto posto, o texto nos faz a seguinte crítica-questionamento: "Qual é, hoje, a função da Universidade? Como ela realiza as concepções de educação universal e a formação cultural, intelectual e moral?".

Para os autores, resta nítido que não estamos no ensino superior (e nos atrevemos a dizer que também em todas as camadas inferiores do ensino) buscando o conhecimento científico, mas tão somente baseamos nosso trabalho em pseudoconceitos. Estes falsos conceitos, no entendimento do texto e dos autores seriam frutos de uma sociedade voltada tão somente para o lucro das camadas dominantes da sociedade, que aliena seus dominados com assuntos de menor importância e que são objeto do simples cotidiano.

Assim, o texto nos coloca outra exigência – fundamental – para o entendimento e compreensão do trabalho pedagógico no ensino superior, centra-se na análise das políticas públicas para a educação superior, que ao longo dos anos tem apenas trazido prejuízo para os "operários do sistema de ensino", com o aviltamento do salário dos professores, suas péssimas condições de trabalho, a dinâmica curricular e outras atividades docentes prejudicada.

Outra questão levantada pelos autores do texto diz respeito ao desafio que o ensino superior deve enfrentar para tentar superar uma visão humana global voltada para relações e significados que são considerados como produtos de mera aparência do homem social, onde o próprio homem se revela com sujeito real do mundo social. Aqui, temos a idéia da práxis humana, que encontra significado na filosofia marxista, como sendo o conjunto de atividades que visam a transformar o mundo e, particularmente, os meios e as realizações de produção, sobre a qual repousam as estruturas sociais, contudo, os autores suscitam que as práticas sociais devem voltar-se para a revolução da sociedade, como uma "práxis revolucionária", que em grande parte pode e deve ser capitaneada pelo ensino superior e por seus ministros, que são os docentes e pesquisadores.

Tudo isso só será possível, de acordo com o texto, se a didática utilizada pelos professores no ensino superior superar a práxis utilitária, que é aquela centrada na simples necessidade cotidiana do homem, necessária para sua "subsistência", pois os dados relacionados no texto acadêmico apreciado demonstram a necessidade da crítica radical das práticas docentes.

As concepções presentes nos trabalhos acadêmicos, sejam nas monografias e nas dissertações, sejam nas teses e nas aulas podem ser tomadas como indicadores da "visão de mundo" dos profissionais do ensino superior; esta considerada de forma mais abrangente é a justificativa pela escolha de método utilizada por cada professor/pesquisador, contudo, de acordo com os autores, esta concepção não pode ser observada do ponto de vista individual, mas sim por um plano coletivo, onde as escolhas são feitas de acordo com um processo natural de evolução histórica e social deste extrato da sociedade, como coletividade e decorrente de práticas reiteradas transmitidas sequencialmente.

Isto posto, temos que "uma visão de mundo manifesta um conjunto de aspirações, idéias e sentimentos que reúne os membros de uma classe ou grupo social e os distingue de outras" que se desenvolveram a partir de métodos da "investigação científica e do trabalho pedagógico".

Para os autores, as observações da prática pedagógica dos professores nas salas de aula e em outras atividades curriculares permitiram reunir evidências de que a organização geral da escola é a intermediação entre as relações sociais e aquilo que é desenvolvido em sala de aula pelo profissional docente, e que as escolas moldadas no sistema capitalista são caracterizadas como impositivas ao trabalho docente.

Conclusão dos autores: enfrentando a organização do trabalho capitalista.

Os autores concluem seu texto considerando que como meio para superar e transformar a didática de hoje, "será necessária uma nova qualidade no desenvolvimento da prática pedagógica do professor", calcada em teorias revolucionárias de trabalho, e encontram respaldo em outros autores como Luis Carlos Freitas, ao afirmar que "a categoria mais decisiva para assegurar a função social que a escola tem na sociedade capitalista seja a da avaliação."

Afinal, para os autores, enquanto os objetivos sociais podem ser inúmeros e confusos, apenas a avaliação é "sistemática" e age em estreita relação com os próprios objetivos, pois no cotidiano das IES os objetivos estão centrados nas práticas de avaliação.

Finalmente, para os autores, faz-se necessário reconhecer as contradições da organização do trabalho pedagógico, no trato com o conhecimento e da avaliação/objetivos da prática concreta e da auto-organização do coletivo de professores pesquisadores do ensino superior.

Considerações pessoais:

Somos obrigados a tecer algumas considerações pessoais, decorrentes da leitura do texto, em especial no que tange à sua contextualização: os autores colocam, de modo um tanto quanto desproporcional para a questão, situações econômicas (até de caráter global), como precursoras das mazelas encontradas no sistema de ensino superior brasileiro, como se todos os problemas enfrentados pelos docentes e pesquisadores das IES fossem frutos das escolhas econômicas sociais e do sistema capitalista vigente no ocidente, como grande dragão que deve ser combatido pelos paladinos do ensino (em especial os do ensino superior público).

Entendemos que as questões econômicas são importantes determinadores da sociedade, afinal, as relações de consumo nos moldes tradicionais, que se iniciaram basicamente na revolução industrial e encontram-se ampliadas nos tempos atuais, formaram a sociedade como a mesma encontra-se atualmente; e embora problemas existam – dos quais não podemos nos furtar – o sistema da livre iniciativa nos parece ser o mais indicado, pois até mesmo aquelas sociedades que se calcaram nas últimas décadas dentro dos princípios socialistas, renderam-se à idéia do capital, ou ao menos tentam ingressar em tal estilo de vida (v.g.[1] Cuba, China e os inúmeros países da Europa Oriental).

É claro que devemos considerar que nos dias atuais o sistema econômico capitalista demonstra sinais de quebra, com uma ruptura não antes vista por esta geração, contudo, devemos considerar que o texto apresentado para estudo remete-nos a 2004, ou seja, à 4 (quatro) anos atrás, período em que não se vislumbrava qualquer forte turbulência econômica, ao contrário, quase todas as sociedades do globo demonstravam nítidos sinais de crescimento social e prosperidade econômica.

Outra questão que deve ser suscitada e discutida com a leitura do texto acadêmico proposto traz referência com a "Teoria Pedagógica" apresentada: em certa parte do texto temos a seguinte narrativa "nenhum dos problemas que hoje reconhecemos como específicos da Didática poderá ser tratado adequadamente fora desta referência – a teoria pedagógica que se desenvolve como categoria da prática" (p. 232).

Somos obrigados a discordar frontalmente desta questão! Ao longo dos últimos anos, a metodologia do ensino progrediu muito, graças ao aprimoramento das práticas de ensino, contudo e infelizmente, em detrimento da didática enquanto ramo da ciência como meio de reflexão e aprimoramento docente. Em nosso entendimento, o que falta não apenas nas cadeiras do magistério superior, mas como em todos os níveis do ensino, é o autoconhecimento do docente, enquanto instrumento auxiliador na construção do conhecimento e de qualificador da sociedade na qual ele está inserido.

Da mesma maneira, somos forçados a considerar – diferentemente do texto – de que não é função precípua das IES confrontarem o "sistema". Elas devem dotar seus educandos de de elementos críticos que permitam uma boa avaliação social; e estes elementos são fornecidos pelos docentes. Os alunos é que devem escolher os rumos a serem adotados pelos mesmos, sob pena de se partidarizar ou então politizar as IES de forma prejudicial, em especial no seu núcleo mínimo pulsante e central que é a sala de aula.

Outra questão que merece destaque é a de que "os dados demonstram a necessidade da crítica radical das práticas docentes" (p. 239), e embora a premissa esteja correta, a idéia decorrente e defendida no texto não é a mais adequada: ao invés de as instituições de ensino – e principalmente os professores e pesquisadores – voltarem-se para "revoluções idealizadas pelos docentes" os mesmos deveriam centrar seus esforços numa mudança de enfoque: centremo-nos nos alunos, como objetivo principal das IES e dos professores, em um sistema de ensino que privilegie a construção do conhecimento e a valorização própria deste aluno, pois como trazido pelo próprio texto, a idéia que permanece é a da avaliação (FREITAS): e não há melhores resultados para a avaliação das práticas de ensino do que encontrarmos alunos egressos capazes de interpretar a sociedade e o meio em que vivem, e ao mesmo tempo serem suficientemente críticos para apresentarem soluções adequadas para as transformações sociais; e desta forma, automaticamente (e também imperceptível, mas muito eficaz!), estaremos revolucionando as metodologias do ensino.



[1] Abreviação para verbi gracia, expressão latina de significado "por exemplo".