BAGNO, Marcos. Preconceito Linguístico: o que é, como se faz. 49ª ed. São Paulo: Loyola, 2007.

O livro apresenta-se dividido em quatro capítulos, mais um anexo ? carta do autor à revista Veja. O primeiro divide-se em tópicos que apresentam mitos sobre a língua portuguesa. Num total de 185 páginas, o autor apresenta um trabalho, por vezes com expressão indignada, sobre o preconceito linguístico (sociopolítico) na sociedade brasileira.
Preconceito linguístico trata em seus capítulos da exposição de mitos frequentemente adotados como verdade na fala dos brasileiros. O autor discorre sobre a não homogeneidade da língua falada no Brasil e suas variações que decorrem, entre outros fatores, das divergências sociais e da posição geográfica do indivíduo. Adota um discurso incisivo no tocante às diferenças dialetais existentes entre Brasil e Portugal que, segundo o autor, não devem ser levadas em conta no sentido de "inferiorização" de determinados grupos sociais. Bagno afirma que "o brasileiro sabe português" porque consegue estabelecer práticas comunicativas, afirmação que quebra a suposta teoria de que falar português é muito difícil.
É levantada a questão da "gramática intuitiva do falante", termo cuja idealização foi proposta por Noam Chomsky e que é caracterizador da capacidade do nativo conseguir comunicar-se pela intuitividade que lhe é nata desde tenra idade independentemente de uma escolarização. A prática preconceituosa se dá a partir do momento que um falante coloca outro (de forma singular ou em grupo) num patamar inferior pela sua incapacidade de entender o idioma brasileiro seguindo os "dogmas" da gramática normativa e do triângulo ESCOLA-GRAMÁTICA-DICIONÁRIO, como acontece na prática do fenômeno linguístico, comum às classes sociais menos abastadas, chamado de rotacismo.
Outros pontos importantes também são relatados, inclusive a determinação de que nesta ou naquela região o português é "melhor falado", na ocasião em que o autor cita o estado do Maranhão como modelo dialetal mais idealizado pelo senso comum e desvirtua essa corrente quando afirma que "não é essencial falar do jeito que se escreve" porque a fala é inevitavelmente distorcida por transformações decorrentes da sua prática ao longo do tempo e estas não se enquadram nos padrões gramaticais que devem ser exigidos apenas para a escrita, resgatando o seu valor originário a partir do pensamento grego de que a gramática é a arte de escrever bem.
Na obra ainda há uma referência à falsa ideia de que há relação entre boa locução verbal e escrita com ascensão social: os argumentos dispostos nesta parte do livro tentam provar que nem sempre o primeiro serve de alavanca para o segundo, pois há exemplos de seres sociais que tem prestígio sem necessariamente serem eloquentes e com plenas capacidades de escrita e oratória e vice-versa.
Como trata curiosamente em seu artigo "Brasileiro fala português", Gilvan Müller de Oliveira utiliza o termo "glotocídio" para caracterizar as tentativas de "assassinar" as línguas que sejam diferentes do que se tem como língua-padrão. O mestre em história e filosofia, graduado em linguística pela UNICAMP, aborda a ideia de que sempre foi essa a política do Estado, desde os tempos da colonização brasileira, quando o interesse maior era o de fazer o português superior, em detrimento dos idiomas indígenas. Alocando esta concepção dentro da temática de Bagno, notamos aí um pesado preconceito linguístico de caráter histórico que é, em parte, uma das razões motivadoras dessa problemática da sociedade atual.
A linguagem utilizada por Marcos Bagno durante todo o texto tem uma intenção provocativa e de convencimento. Seus argumentos são coerentes e caracterizam bem a sua discussão. O leitor, especialmente os licenciandos, é levado a se questionar, muitas vezes, do quanto se encaixa como praticante dos preconceitos e mitos destacados na obra. Obviamente, existem situações menos genéricas nas quais não se pode ignorar o fato de que a gramática normativa existe e, como o seu próprio nome determina, é a ela que se deve recorrer para a instituição de regras de base para a construção do pensamento, da escrita e da oralidade em determinados ambientes, como o acadêmico, por exemplo. Todavia, no espaço interpessoal é muito mais confortável e amigável aceitar e respeitar a fala do outro, ainda que a consideremos deficiente em um ou outro aspecto, para que as relações sociocomunicativas se tornem possíveis.
Marcos Bagno é um tradutor, escritor e linguista mineiro, doutor em filologia e língua portuguesa pela USP. Atua nas áreas de sociolinguística e literatura infanto-juvenil. Bagno leciona na Universidade de Brasília. Autor de títulos como "A língua de Eulália" (1997) e "Português ou Brasileiro?" (2001).
Daniel David e Vinícius Sampaio são acadêmicos do curso de Letras-Inglês pela Universidade Tiradentes, Aracaju/SE.

REFERÊNCIAS

BAGNO, Marcos. Preconceito Linguístico: o que é, como se faz. 49ª ed. São Paulo: Loyola, 2007;

OLIVEIRA, Gilvan Müller de. Brasileiro fala português: monolinguismo e preconceito linguístico. Publicado em MOURA, H. M. de M.; SILVA, F. L. da (Org.). O direito à fala: a questão do preconceito linguístico. Florianópolis: Insular, 2007. 127 p. Disponível em http://www.letras.ufscar.br/. Acessado em: 16 abr. 2010.

MARTUSCELLI, Sonia Mariza. Gramática Normativa e Gramática Intuitiva. Disponível em http://personalescritor.blogspot.com/. Acessado em: 16 abr. 2010.