Economista, sociólogo e filósofo alemão, Weber nasceu em Erfurt em 1864, falecendo em Munique, em 1920. Embora nacionalista, era contrário ao racismo e imperialismo, temas ecoantes de seu período. Acreditava que o objeto da sociologia seria reconstruir o sentido subjetivo original da ação e reconhecer a parcialidade da visão do observador, e esta contemplação taxaria sua sociologia de compreensiva. Weber acaba por destacar-se pelos seus estudos de história comparativa e principalmente pelos estudos sobre o surgimento e funcionamento do capitalismo e da burocracia, bem como, sobre a sociologia da religião. Da junção de dois longos artigos publicados pelo autor nos anos de 1904 e 1905, dá-se “A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo” onde, longe de ser uma obra detalhada sobre o protestantismo, é instrumento para que o autor investigue quais foram às razões que levaram o capitalismo a se desenvolver inicialmente na Inglaterra e na Alemanha, contemplando que as habitualidades (éticas e idéias puritanas) destes países, instigados pelo protestantismo, ocasionaram estas mudanças. Em outras palavras, o que acirrou Weber nesta busca ferrenha foi desvendar o motivo que teria levado a Igreja Católica (antes contrária á qualquer tipo de assunto mundano) á abrandar suas interjeições face ao protestantismo. E ainda, por que em determinado momento da história do ocidente aparece uma cultura que se pretende universal? Weber observa que na pós-reforma, a maior parte dos homens de negócio, grandes capitalistas e famílias bem sucedidas pertenciam á religião protestante, em especial, á linha calvinista. Estes indivíduos, no isolamento de suas características próprias, apresentavam um tipo ideal de conduta religiosa que consistia em santificar a vida diária em oposição ao apregoado pela Igreja Católica, que instigava a idéia de piedade popular no aguardo de uma recompensa na vida após a morte. No contexto Calvinista, as pessoas já nasciam predestinadas, com um futuro pré-determinado, e nada podiam fazer para alterar o futuro traçado. (...) Considerava-se na época e de modo geral se considera ainda hoje a doutrina da predestinação como o mais característico dos dogmas do calvinismo. (...) Por decreto de Deus, para a manifestação de sua glória, alguns homens (...) são predestinados (predestinated) á vida eterna, e outros preordenados (foreordained) á morte eterna. (WEBER, 2004, p. 90-91). Nesta conjuntura, os sacramentos da Igreja católica mostravam-se inócuos, pois o monosticismo passaria a pertencer á todos, a vocare (antes própria dos monges), doravante seria um chamado para qualquer pessoa. Baseada em uma filosofia totalmente voltada para o ascetismo, usa-se a potência para o labor, sacrifica-se os desejos e as vontades em prol á produção e ao acúmulo de riquesas. Como os calvinistas, (porém menos radicais), os luteranos dispunham do entendimento de que os homens já nascem salvos, e portanto o acúmulo de riquesas não consistia em nenhum ato pecaminoso, beneficiando deste modo os ideais da burguesia. Assim, o trabalho constante e o acúmulo de riquesas não eram mais motivo de vergonha e pecado para o homem. Com efeito, a ascese ligava-se a uma concepção de subjetivação, articuladora do espírito capitalista, pois permitiria a contemplação e constituição da subjetividade. A vocare sendo disponibilizada ao homem comum, permitiria que grupos sociais dessem a volta ao mundo para se estabelecer em localidades recém descobertas, como a chegada dos puritanos na América do Norte, em detrimento da América do Sul, tomada pela cultura da Igreja Católica Espanhola e Portuguesa. Neste interim, contempla o autor que o capitalismo teria ressoado devido ao surgimento de afinidades eletivas próprias daquela sociedade em um contexto histórico determinado, ou seja, ao sabor de uma nova concepção de religião e trabalho, que ao se juntarem, teriam um interesse comum e se tornariam dependentes entre si. A partir de então, o trabalho dignificaria o homem, e o tempo não pertenceria mais á Deus, pois perder tempo seria perder dinheiro. E é nas consepções de Benjamin Franklin que o autor irá se embebedar: Lembra-te que tempo é dinheiro; aquele que com seu trabalho pode ganhar dez xelins ao dia e vagabundeia a metade do dia, ou fica deitado em seu quarto, não deve, mesmo que gaste apenas seis pence para se divertir, contabilizar só esta despesa, na verdade gastou, ou melhr, jogou fora, cinco xelins a mais. (...) Lembra-te que o dinheiro é procriador por natureza e fértil. O dinheiro pode gerar dinheiro, e seus rebentos podem gerar ainda mais, e assim por diante. (...) Lembra-te que – como diz o ditado, “um bom pagador é senhor da bolsa alheia”. (...) Quem desperdiça seu tempo no valor de cinco xelins, prede cinco xelins e bem que os poderia ter lançado ao mar. Quem perde cinco xelins não perde só essa quantia, mas tudo o que com ela poderia ganhar aplicando-a em negócios – o que, ao atingir o jovem uma certa idade, daria uma soma bem considerável. (FRANKLIN apud WEBER, 2004, p. 42-44). Deste recorte histórico em diante, o trabalho é uma atitude benéfica, o ócio é que se torna pecaminoso. O que antes era exteriorizado pela Igreja Católica, agora se internaliza pelo Protestantismo. A mendicância, o desperdiçar oportunidades, o ato de vadiar, são oportunidades que contrariam aos desígnios de Deus. Doravante, quem trabalha e evolui materialmente, possui evolução humana e espiritual. Weber contempla então em sua obra que o capitalismo equipara-se a um espírito, e embora já ter ocasionado uma mentalidade parecida em países como Egito e Índia, foi no campo fértil da racionalização e do instrumentalismo do ocidente que o capitalismo deu frutos nunca antes verificados. Somente nesta região do globo foi possível esta perfeita afinidade eletiva, com a contemplação de mão de obra livre e qualificada, (aparelhada com conceitos tecnológicos inovadores), com detentores de um volumoso poder capital, amparados pelo fator da religiosidade protestante. Este fator cultural/religioso seria o estopim para o perfeito desenvolvimento do espírito capitalista do Ocidente. Com efeito, a doutrina protestante (em especial, a calvinista) transformaria a moral religiosa e cultural existente, dando mantimento ao capitalismo ocidental, reforçando-o e dando ao mesmo a originidade necessária. Direciona o crente predestinado para as atividades econômicas, fazendo com que o trabalho fosse produtivo e contínuo. Com a condenação do ócio, eis que as crianças iniciam o seu labor mais precocemente, usando os horários de descanso para pureza, com abstinência total aos prazeres da carne e bens materiais. A riqueza tinha que ser cumulativa, pois caberia ao homem somente administrar os bens materiais terrenos, frutificando-os. Eis a ética protestante calvinista: incentivar o crente a trabalhar para enriquecer, com uma valorização voltada ao conhecimento. Desta feita, cria-se um capitalismo selvagem e extremamente materialista, que construído socialmente, volta sua mira para o acúmulo de riquesas (riquesas estas destinadas as gerações vindouras), e contrárias ao que se apregoa, possui fundamentação desprovida de instintos religiosos, pois é extremamente egoísta e individualista em seu contexto, onde o homem é engolido pelo desejo de produção, e as riquesas, antes destinadas a sustentação das necessidades, agora possuem finalidade em seu próprio conceito. A idéia de profanação do ócio acabou por transformar os momentos de lazer em atividades utópicas, aí sim, dignas de vidas futuras. Mata-se o desejo e criam-se máquinas, eis o legado.

WEBER, Max. A ética protestante e o espírito do capitalismo; Tradução de José Marcos Mariani de Macedo. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.