LUCAS LOPES

RESUMO

O presente estudo tem o viés de estudar e analisar quais os requisitos essências para a realização de uma remessa de royalties ao exterior. Denotar as origens históricas do instituto, seu surgimento e, evolução no direito brasileiro através dos diplomas que regram as normas tributárias e de imposto de renda, é mister nesta pesquisa. Cumpre, também, evidenciar os passos que conduzirão a perfectibilização de uma compensação financeira ao exterior, desde a celebração de contrato objetivando a cessão de privilégios oriundos da Propriedade Industrial, onde figurarão as partes intituladas cedente e cessionário, bem como da posterior e indispensável averbação do Contrato no Instituto Nacional da Propriedade Industrial - INPI, completando-se o ciclo com o Registro Declaratório Eletrônico de Operações Financeiras, modalidade ROF, em consonância com todos os diplomas pátrios que abarcam a matéria. Indispensável, da mesma forma, identificar a carga tributária incidente nas remessas ao exterior, como o Imposto de Renda Retido na Fonte - IRRF, a Contribuição de Intervenção de Domínio Econômico - CIDE, bem como a possível incidência de outros tributos no envio de divisas ao exterior. Posteriormente, caberá referir as autorizações legislativas que dispõe sobre a dedutibilidade dos valores pagos a título de Imposto de Renda, obedecendo aos percentuais estabelecidos na Portaria do Ministério da Fazenda nº. 436/1958, da mesma sorte que a possibilidade do creditamento dos valores recolhidos pela CIDE, de acordo com os termos da Medida Provisória nº. 2.159-70, de 24 de agosto de 2001. Por derradeiro, indicar-se-á as demais aplicações do Instituto dos Royalties, como por exemplo, na área dos recursos naturais e energéticos como o petróleo, recursos minerais e, àqueles advindos da exploração dos potenciais hidráulicos, assim como os creditados em decorrência do licenciamento dos direitos autorais. A pesquisa encontra como desafio, igualmente, buscar traçar um paralelo que se assenta entre as nações que preferem pagar o preço de uma inovação tecnológica e, daquelas que são ou, objetivam alcançar, a sua auto-suficiência por intermédio da valorização de suas potencialidades internas.

Palavras-chave: Royalties - Compensação Financeira - Propriedade Industrial - Remessas ao Exterior - Transferência de tecnologia - Tributação da Propriedade Industrial - Regalias.

ABSTRACT

The present degree's dissertation aims to study and analyze the essential requirements to bring an overseas royalties remittance to completion. Another aim is to indicate the historical origin of the institute, its arise and evolution in the Brazilian law through the rules of taxation and the income tax are of supreme importance in this work. This dissertation intends to evidence the steps that will lead to a better overseas financial clearing since the celebration aiming the cession of privileges originated from the Industrial Propriety, where shall be exposed the so-called grantor and grantee as well as the latter and indispensable register of the parts in the Brazilian National Institute of Industrial Propriety (INPE), closing the cycle with the ElectronicRegister of Financial Operations (ROF) in compliance with all the native charters comprised. Essential, as well, is to identify the tax weight on the overseas remittance, such as the Withholding Income Tax (IRRF) and the Economic Dominium Intervention Contribution (CIDE) and other possible taxes in the foreign exchange. Later, a reference to the legislative authorizations are to be made on the possibility of deducing Income Tax, obeying the percentage established on the Treasury Ministry Directive number 436/1958 in the same way as the crediting possibility of the gained values through the CIDE according to the Temporary Directive number 2.159-70 made on 24 August 2001. Finally, will be indicated further uses of the Royalties Institute, for example, in the area of natural and energetic resources such as petroleum, ore, and those obtained from the hydraulic potential exploitation as well the ones credited as authorial rights licensing. The research is challenged to trace a parallel to what lies between the nations preferring to afford a technological innovation and those that are or aim to reach its self-sufficiency through the value of its inner potentialities.

Key-words: Royalties – Financial Clearing – Industrial Propriety – Foreign Exchange – Technology Exchange – Industrial Propriety Taxation – Regalia.

1 Introdução

O presente Trabalho de Conclusão de Curso tem o escopo de demonstrar quais são os requisitos essenciais para a realização de uma remessa de royalties ao exterior. A preocupação e motivação com o instituto em tela justificam-se, tendo em vista a constatação da complexidade da matéria e, haja vista, que raramente é versada pelos juristas e doutrinadores pátrios.

Desse modo, desenvolver-se-á uma metodologia de pesquisa calcada na verificação e análise dos inúmeros diplomas legislativos nacionais que compõe o bojo do tema em referência, objetivando a apresentação das diversas peculiaridades que cercam esta espécie de compensação financeira.

De inegável importância para a sociedade brasileira, assim como para a atual organização econômica e comercial mundial, os royalties podem ser vislumbrados como uma excelente fonte recursos para as nações que exportam tecnologias, investindo vultosas somas de recursos financeiros no desenvolvimento da ciência, em contraposição aos países que não optam em fazê-lo e, por conta disso, recorrem ao mercado externo à aquisição das inovações de que carecem.

No Capítulo inaugural deste estudo, será abordado o histórico dos royalties, seu surgimento e, evolução legislativa no Brasil, bem como a delimitação de seu conceito, amparado nos textos que versam sobre os regramentos do imposto de renda e proventos de qualquer natureza.

O Capítulo Segundo é reservado à apreciação, passo a passo, de todos os procedimentos que devem ser seguidos, desde os elementos básicos objetivando a celebração do Instrumento de Contrato que tem por desígnio a cessão dos direitos oriundos da propriedade industrial, de determinada criação advinda do intelecto humano, ao cessionário do ajuste. Evoluirá a pesquisa, na medida em que ficar aclarada a necessidade da averbação da avença, no Instituto Nacional da Propriedade Industrial, seguido do obrigatório Registro Declaratório Eletrônico de Operações Financeiras, no Banco Central do Brasil. Haverá, ainda nesta seção, espaço para evidenciar a flexibilização ocorrida na década de noventa, quanto às remessas de royalties ao estrangeiro, onde anteriormente vigoravam vedações expressas.

Já no Capítulo Terceiro, pretender-se-á identificar a carga tributária incidente nas operações de envio de divisas ao exterior destacando-se, de plano, o Imposto de Renda Retido na Fonte, e a Contribuição de Intervenção de Domínio Econômico - CIDE, além da possível aplicação de outros impostos na operação. Cumpre, também, denotar a relevância das normas autorizadoras do creditamento de parcela dos valores recolhidos para pagamento da CIDE, prestando-se à compensação de remessas futuras. O encerramento deste tópico ocorrerá com o apontamento das prescrições legais pertinentes para a dedutibilidade de percentual das importâncias recolhidas a titulo de IRRF, quando das declarações de renda.

O desfecho desta pesquisa será concretizado com a determinação de diferentes modalidades para a aplicabilidade do instituto dos royalties, como em decorrência da utilização de recursos naturais e energéticos, a exploração dos recursos minerais, a utilização dos potenciais hidráulicos, da mesma forma que a compensação financeira pertinente aos privilégios conferidos na seara dos direitos autorais.

A investigação encontrará como desafio, igualmente, traçar paralelo entre o desenvolvimento autônomo nacional, ante a importação de tecnologias, fundamentado nos dizeres de renomados advogados, articulistas, e, doutrinadores, especialistas na matéria.

Isto posto, com o desenlace de cada lauda desta Monografia buscar-se-á trilhar caminhos pouco explorados, mas, indubitavelmente de extrema relevância, visando trazer à baila questões afetas ao interesse coletivo, dando azo a importantes aspectos dos royalties, constituindo-se em elementos indissociáveis ao progresso dos países.

2 ROYALTIES

Em sede prefacial, torna-se fundamental para a correta compreensão deste estudo, bem como sua evolução de maneira coerente e didática, identificar as origens históricas do instituto dos royalties, assim como sua evolução e conceituação no Sistema Jurídico Brasileiro trazendo, inclusive, contribuições identificadas no direito tributário internacional.

2.1 ORIGENS DO INSTITUTO

Segundo o advogado João Henrique Fragoso, podemos depreender que:

A palavra royalty, literalmente realiza, tem o sentido original de prerrogativa ou privilégio real, ou seja, a concessão pelo monarca, de um direito de cópia (copyright) de uma determinada obra literária, pelo qual pagava-se uma determinada importância que, ao fim e ao cabo passou a se designar como royalty.[1]

A primeira legislação dispondo sobre o direito de cópia surge no início do século XVIII, na Inglaterra, no período de coroa da Rainha Anne. Além de abarcar a proteção das obras literárias, conforme o disposto acima, prestava-se os primeiros diplomas legais a resguardar os autores de peças teatrais e compositores musicais, quando da encenação ou execução de suas obras. Assim, a Monarca criou as regalias, que receberam o nome de royalties por ser uma concessão real, no ano de 1710. A partir de então, os autores passaram a receber uma espécie de remuneração sempre que suas obras eram utilizadas.[2]

Hodiernamente, a palavra regalia não mais se presta para sintetizar o sentido da expressão, sendo o termo compensação financeira, detentor de significado apto a traduzir a verdadeira essência dos royalties, conforme se demonstrará adiante.

2.2 EVOLUÇÃO NO DIREITO BRASILEIRO

Examinando o desenvolvimento legislativo sobre a transferência de tecnologia no Brasil, cuja importância pode ser comprovada na medida em que a partir de seu regramento surgirão às hipóteses de pagamento de royalties, assim como seus requisitos, traz-se à baila o pensamento do renomado advogado Gabriel Francisco Leonardos, prestando essencial contribuição ao desdobramento deste estudo:

O marco inicial da regulamentação legal da transferência de tecnologia no Brasil foi o Código de Propriedade Industrial aprovado pelo Decreto-Lei nº 7.903, de 27.08.1945 (CPI/45) que estabeleceu como condição de eficácia perante terceiros dos contratos de licença de exploração de patentes e de uso de marcas a anotação dos mesmos junto ao Departamento Nacional de Propriedade Industrial-DNPI.[3]

A exigência então estabelecida estava disposta no artigo 52 do diploma regulamentador inaugural, com a seguinte redação:

Art. 52. O ato concessivo da licença para a exploração do invento privilegiado só produzirá efeito, em relação a terceiros, depois de anotado no Departamento Nacional de Propriedade Industrial, onde, para esse fim, o interessado deverá apresentar o título hábil que ali ficará arquivado. [4]

Por oportuno, transcreve-se o artigo 147 do mesmo texto legal, que tratava sobre a concessão de autorização de uso, pelo titular de marca registrada no Brasil, a terceiros:

Art. 147. Os titulares de marcas registradas no Brasil poderão autorizar o seu uso por terceiros, devidamente estabelecidos, mediante contrato de exploração.

§ 1º. O contrato só produzirá efeito depois de averbado no Departamento Nacional de Propriedade Industrial, onde ficarão arquivados os documentos.

§ 2º. O concessionário da licença, sem alterar as características da marca, deverá incluir no respectivo cliché, para fins de publicação, o seu nome, como fabricante autorizado do produto.[5]

Cumpre mencionar que a averbação de contrato junto ao Departamento Nacional de Propriedade Industrial objetivava exclusivamente o registro público do Instrumento, de modo que uma eventual alienação da propriedade de marca ou patente industrial, obrigaria o adquirente a respeitar as licenças concedidas pelo titular anterior, fossem elas exclusivas ou não.

Assim, com relação ao sistema legislativo vigente até então, não se pode depreender que o ato da averbação de um determinado contrato seria necessário para fundamentar a dedutibilidade fiscal de pagamentos, tutelar remessas ao exterior, ou, para constituir prova de uso do licenciado, em processos de caducidade de marca ou patente.[6]

Objetivando elucidar as lacunas evidenciadas, colaciona-se o pensamento de Denis Borges Barbosa, um dos maiores mestres na área de Propriedade Intelectual e, cujo aporte de conhecimento foi e continua sendo de incomparável valia à nação. Destarte, transcreve-se trechos extraídos do livro Tributação da Propriedade Industrial e do Comércio de tecnologia, in verbis:

A primeira norma a regular os pagamentos ao exterior dos frutos do capital estrangeiro aplicado no Brasil foi o Dec.- lei 9.025 de 1946, regulamentando somente em janeiro de 1952. Segundo as regras então baixadas, os registros de investimento estrangeiro já feitos deveriam ser revistos, de forma a limitar o repatriamento do capital a 20% anual sobre o montante registrado, assim como restringir o pagamento de juros, lucros e dividendos a, no máximo, 8% sobre o registro. Tais disposições estiveram em vigor por apenas doze meses.

A partir de 1953, o controle sobre as remessas se limitou ao aspecto cambial: as remessas dos frutos do capital financeiro e do risco registrados na SUMOC seriam convertidas a câmbio oficial, e as demais a câmbio livre.De qualquer forma, o limite para a conversão favorecida era de 8% para os juros de 10% para os lucros e dividendos.

Não havia, assim, por essa época, normas específicas seja na área cambial, seja na tributária, cobrindo o pagamento dos royalties e de assistência técnica [...].[7]

Segundo o renomado doutrinador foi no ano de 1958, com a edição da Lei nº. 3.470, que surge o primeiro diploma específico dispondo sobre a dedutibilidade de pagamentos a título de royalties e assistência técnica. A referida dedução passou a ser limitada em um valor máximo, a ser calculado sobre a renda bruta da produção.[8]

Por seu turno, deveriam ser submetidos ao DNPI, todos os contratos que versassem sobre o licenciamento de patentes e marcas, sob pena de ser aplicada a sanção de indedutibilidade dos pagamentos realizados.[9]

Deste modo, apresentam-se à análise, os dispositivos da Lei 3.470/58, conforme segue:

Art. 74. Para os fins da determinação do lucro real das pessoas jurídicas como o define a legislação do imposto de renda, somente poderão ser deduzidas do lucro bruto a soma das quantias devidas a título de "royalties" pela exploração de marcas de indústria e de comércio e patentes de invenção, por assistência técnica, científica, administrativa ou semelhantes até o limite máximo de 5% (cinco por cento) da receita bruta do produto fabricado ou vendido.

§ 1º. Serão estabelecidos e revistos periodicamente mediante ato do Ministro da Fazenda, os coeficientes percentuais admitidos para as deduções de que trata este artigo, considerados os tipos de produção ou atividades, reunidos em grupos, segundo o grau de essencialidade.

[...]

§ 3º. A comprovação das despesas a que se refere este artigo será feita mediante contrato de cessão ou licença de uso da marca ou invento privilegiado, regularmente registrado no país, de acordo com as prescrições do Código de Propriedade Industrial (Decreto-lei nº 7.903, de 27 de agosto de 1945), ou de assistência técnica, científica, administrativa ou semelhante, desde que efetivamente prestados tais serviços.[10]

Note-se que a partir da publicação da Lei em comento, os royalties passam definitivamente a figurar em nossa legislação pátria, principalmente nos diplomas que abordam as normas regulamentadoras do Imposto de Renda e Tributação, sendo que a averbação de contrato de cessão junto ao DNPI prestar-se-á ao registro público, condição para as futuras deduções, quando da realização das declarações de renda.

Importante mencionar que no mesmo ano de 1958, foi elaborado pelo Ministério da Fazenda a Portaria nº. 436, que trata sobre os coeficientes percentuais máximos para a dedução de royalties, pela exploração de marcas e patentes, de assistência técnica, científica, administrativa ou semelhante e amortização, levando-se em consideração os tipos de produção e seu grau de essencialidade. Indicar-se-á no Capítulo Terceiro deste estudo, quando da verificação da carga tributária incidente nas remessas de royalties ao exterior e suas hipóteses de dedução no Imposto de Renda, estes coeficientes, bem como das diferenças observáveis no que tange a patentes de invenção, e da dedução pelo uso de marcas de indústria e comércio, ou nome comercial.

A sistematização geral sobre a remessa de capitais ao exterior não tardou a vir. Foi com o advento da Lei nº. 4.131/1962[11], que o Brasil conheceu o seu Estatuto do Capital Estrangeiro, cuja vigência perdura até hoje.

Em seu artigo 3º, letra "b", o citado diploma instituiu a obrigatoriedade do registro das remessas feitas ao exterior, nos seguintes termos:

Art. 3º. Fica instituído, na Superintendência da Moeda e do Crédito, um serviço especial de registro de capitais estrangeiros, qualquer que seja sua forma de ingresso no País, bem como de operações financeiras com o exterior, no qual serão registrados:

a) [...]

b) as remessas feitas para o exterior com o retorno de capitais ou como rendimentos desses capitais, lucros, dividendos, juros, amortizações, bem como as de "royalties", ou por qualquer outro título que implique transferência de rendimentos para fora do País;

[...]

Cumpre, também, mencionar as modificações introduzidas pela Lei nº. 4.390/64, que deu nova redação aos artigos 4º, 5º, 7º, 9º, 10, 11, para o parágrafo único do artigo 25, e aos artigos 28 e 43 do Estatuto do Capital Estrangeiro. Desse modo, faz-se alusão à escrita dos seguintes artigos da Lei 4.131/62:

Art. 9º. As pessoas físicas e jurídicas que desejarem fazer transferências para o exterior a título de lucros, dividendos, juros, amortizações, royalties assistência técnica científica, administrativa e semelhantes, deverão submeter aos órgãos competentes da SUMOC e da Divisão do Imposto sobre a Renda, os contratos e documentos que forem considerados necessários para justificar a remessa. (Redação dada pela Lei nº 4.390, de 29.8.1964)

§ 1º. As remessas para o exterior dependem do registro da empresa na SUMOC e de prova de pagamento do imposto de renda que for devido. (Renumerado do parágrafo único pela Lei nº 4.390, de 29.8.1964)

[...]

Art. 14. Não serão permitidas remessas para pagamentos de "royalties", pelo uso de patentes de invenção e de marcas de indústria ou de comércio, entre filial ou subsidiária de empresa estabelecida no Brasil e sua matriz com sede no exterior ou quando a maioria do capital da empresa no Brasil, pertença ao aos titulares do recebimento dos "royalties" no estrangeiro.[12]

[...]

Verifica-se, por óbvio, que a vedação expressa no artigo 14 da Lei supramencionada representou durante a sua vigência atroz restrição às empresas estrangeiras com subsidiárias no Brasil. Estas se viam impedidas de remeter quaisquer compensações pelas marcas e patentes licenciadas, a suas matrizes no exterior.

Avançando, mira-se no Decreto nº. 55.762/65, que estabeleceu a regulamentação do Estatuto do Capital Estrangeiro. Na lição de Gabriel Francisco Leonardos, temos:

o art. 20, parágrafo único, do Dec. nº. 55.762/65 definiu o conceito de "subsidiária" para os fins do decreto, inclusive para a aplicação da proibição da remessa de royalties entre a subsidiária brasileira e a matriz estrangeira. Segundo tal dispositivo, "considera-se subsidiária de empresa estrangeira a pessoa jurídica estabelecida no país, de cujo capital com direito a voto pelo menos 50% (cinqüenta por cento) pertençam, direta ou indiretamente, a empresa com sede no exterior".

Assim, a proibição de remessa de royalties contida no art. 14 da Lei nº. 4.131/62 era aplicável para empresas estrangeiras que detivessem 50% ou mais do capital votante da empresa brasileira. Não obstante, a sanção da indedutibilidade existia somente para pagamentos ao controlador estrangeiro, aplicando-se tanto no caso de pagamentos de royalties quanto de pagamentos por assistência técnica, científica, administrativa ou semelhante (conforme previsto nos arts. 52 e 71 da Lei nº 4.506/64).[13]

O Capítulo seguinte apontará diversos outros artigos deste importante Estatuto, pertinentes aos requisitos à remessa de royalties ao exterior, demonstrando também, a flexibilização ocorrida na década de 90 quanto às possibilidades de envio, e seus reflexos positivos imediatos na quantidade de divisas remetidas.

2.3 DA DEFINIÇÃO DE ROYALTIES

2.3.1 Na Legislação Ordinária Brasileira

Curiosamente, a definição de royalties, não acompanha o início do processo legislativo brasileiro que estabelece e disciplina suas possibilidades de remessa ao exterior. A próxima etapa evolutiva do Instituto no Brasil e, aquela que começa a determinar o conceito dos royalties, faz-se presente na Lei nº. 4.506/64, que versa sobre alterações no imposto de renda e proventos de qualquer natureza.

A seguir, indicam-se os artigos 22 e 23 da Lei 4.506/64[14], sobre o significado de royalties:

Art. 22. Serão classificados como "royalties" os rendimentos de qualquer espécie decorrentes do uso, fruição, exploração de direitos, tais como:

a) direito de colhêr ou extrair recursos vegetais, inclusive florestais;

b) direito de pesquisar e extrair recursos minerais;

c) uso ou exploraçâo de invenções, processos e fórmulas de fabricação e de marcas de indústria e comércio;

d) exploração de direitos autorais, salvo quando percebidos pelo autor ou criador do bem ou obra.

Parágrafo único. Os juros de mora e quaisquer outras compensações pelo atraso no pagamento dos "royalties" acompanharão a classificação dêstes.

Art. 23. Serão classificados como aluguéis ou "royalties" tôdas as espécies de rendimentos percebidos pela ocupação, uso, fruição ou exploração dos bens e direitos referidos nos artigos 21 e 22, tais como:

I - As importâncias recebidas periòdicamente ou não, fixas ou variáveis, e as percentagens, paticipações ou interêsses;

II - Os pagamentos de juros, comissões, corretagens, impostos, taxas e remuneração do trabalho assalariado, autônomo ou profissional, feitos a terceiros por conta do locador do bem ou do cedente dos direitos;

III - As luvas, os prêmios, gratificações ou quaisquer outras importâncias pagas ao locador, ou cedente do direito, pelo contrato celebrado;

IV - As benfeitorias e quaisquer melhoramentos realizados no bem locado, e as despesas para preservação dos direitos cedidos, se de acôrdo com o contrato fizeram parte da compensação pelo uso do bem ou direito;

V - A indenização pela rescisão ou término antecipado do contrato;

VI - o valor locativo do prédio urbano construído, quando cedido seu uso gratuitamente.

§ 1º. O preço de compra de móveis ou benfeitorias, ou de qualquer outro bem do locador ou cedente, integrará o aluguel ou "royalty", quando constituir compensação pela anuência do locador ou cedente à celebração do contrato.

§ 2º. Não constitui "royalty" o pagamento do custo da máquina, equipamento ou instrumento patenteado.

[...]

Assevera Gabriel Francisco Leonardos que:

A enunciação do art. 22 da Lei 4.506 é exemplificativa, cabendo a caracterização como royalty também para qualquer rendimento decorrente da exploração de direitos que não esteja mencionado em suas alíneas. Esse artigo não limita expressamente o conceito de royalties aos pagamentos por marcas e patentes, mas tendo em vista que estes são os únicos institutos que dão ensejo à concessão de direito de uso, pode-se concluir que dentre os direitos relativos à propriedade industrial, apenas eles são considerados royalties.[15]

Leciona ainda, que os pagamentos devidos em decorrência da licença concedida por marca ou patente industrial, podem ser calculados com base em percentual obtido na venda de produtos comercializados com a marca licenciada, ou naqueles produtos fabricados através da concessão de uma patente de invenção. A compensação financeira pode se estabelecer, igualmente, tomando-se por base um valor certo por unidade de produto comercializado ou fabricado, simplesmente por uma importância fixa, ou através de combinações.[16]

Diverge o eminente Professor José Carlos Tinoco Soares quando conceitua os royalties como pagamentos que na verdade não existem. Seu entendimento é de que a maciça maioria das patentes de invenção que obtêm privilégios no país, não foram reivindicadas em tempo hábil, de acordo com o artigo 4º da Convenção União de Paris.

O texto do artigo 4º da citada Convenção estabelecia o prazo de um ano para privilégios de invenção e de seis meses para modelos e desenhos industriais. Este período seria contado a partir da data do depósito do pedido inaugural em qualquer país participante da União. Por conseguinte, todo e qualquer requerimento de privilégio de invenção, modelo ou desenho industrial, deveria observar rigorosamente os períodos estabelecidos sob pena de carecerem da novidade exigida para a concessão das prerrogativas, bem como serem suscetíveis de ação de nulidade.[17]

Prossegue seu raciocínio aduzindo que:

Se, durante a tramitação do pedido de patente estrangeira, nada foi possível demonstrar contra a sua concessão e se após a verificação desta, nenhuma providência fôr cabível e se ainda a prioridade no país de origem foi rigorosamente observada pela comprovação de documento hábil, deverá ter o seu titular todo o amparo de nossas leis que possibilitam o livre exercício de qualquer atividade e o estabelecimento de contratos para a sua exploração. Neste último caso pagaremos conscientemente o preço de nosso progresso e nos vangloriaremos dos benefícios que os alienígenas podem nos prestar.[18]

Gize-se, por oportuno, a relevância de traçar comentários acerca do Diploma concebido no ano de 1883, e cujos objetivos essenciais eram a proteção aos privilégios de invenção, dos modelos e desenhos industriais, das marcas de indústria e comércio e do nome comercial.

Seu texto fora aperfeiçoado em seis oportunidades: em Bruxelas, no ano de 1900, em Washington, em 2 de junho de 1911, em Haia, no ano de 1925, na cidade de Londres, em data de dois de junho de 1934, seguindo-se Lisboa em 1958 e Estocolmo em 1967. Cabe destacar que o Congresso Nacional Brasileiro aprovou no ano de 1974, por intermédio do Decreto Legislativo nº. 78, a Convenção de Paris, revisada em Estocolmo.

Desta feita, ainda em 1974, foi depositado o Instrumento Brasileiro de Adesão junto à Organização Mundial de Propriedade Intelectual – OMPI.

Visando ratificar os ensinamentos de José Carlos Tinoco Soares, quanto aos prazos estabelecidos para a concessão de privilégios às patentes de invenção, aponta-se o art. 4º da Convenção União de Paris – com o texto revisto em Estocolmo, publicada no Diário do Congresso Nacional, em 01/11/1974, a partir da página 5060, assim redigido:

Art. 4º. A. - 1) Aquele que tiver devidamente apresentado pedido de patente de invenção, de depósito de modelo de utilidade, de desenho ou modelo industrial, de registro de marca de fábrica ou de comércio num dos países da União, ou o seu sucessor, gozará, para apresentar o pedido nos outros países, do direito de prioridade durante os prazos adiante fixados:

[...]

3) [...]

C. - 1) Os prazos de prioridade acima mencionados serão de doze meses para as invenções e modelos de utilidade e de seis meses para os desenhos ou modelos industriais e para as marcas de fábrica ou de comércio.

2) Estes prazos correm a partir da data da apresentação do primeiro pedido: o dia da apresentação na é contado.[19]

[...]

2.3.2 No Direito Tributário Internacional

Todos os conceitos existentes, nos acordos e convenções internacionais sobre royalties, acrescem sobremaneira à abrangência deste estudo. Vejamos os dizeres de Denis Borges Barbosa:

A matriz dos acordos, a Convenção Tipo da OCDE, entende, como royalties, as remunerações de qualquer natureza pagas pelo uso ou pela concessão do uso de direitos de autor sobre obras literárias, artísticas ou científicas (inclusive dos filmes cinematográficos, filmes ou fitas de gravação de programas de televisão ou radiodifusão), de patentes, marcas de indústria ou de comércio, desenhos ou modelos, planos, fórmulas ou processos secretos, bem como pelo uso ou concessão do uso de equipamentos industriais, comerciais ou científicos e por informações correspondentes à experiência adquirida no setor industrial, comercial ou científico (art. 12 da Convenção Modelo).

Em alguns casos (como o do Acordo com a República Federal da Alemanha), o protocolo de assinatura inclui especificamente como royalties também os pagamentos resultantes de serviços técnicos e de assistência técnica.[20]

A sigla, indicada acima, representa a Convenção - Modelo da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico. A OCDE foi criada em 1960, objetivando alcançar níveis seguros de crescimento econômico sustentável, aumento da geração de empregos, estabilidade financeira aos países membros, de modo a proporcionar o gradativo e hígido desenvolvimento da economia mundial.

A Organização originalmente tinha como participantes a Alemanha, Áustria, Bélgica, Canadá, Dinamarca, Espanha, Estados Unidos, França, Grécia, Holanda, Irlanda, Islândia, Itália, Luxemburgo, Noruega, Portugal, Reino Unido, Suécia e Suíça.[21]

Entretanto, este tipo de convenção - modelo não é dotada de efeito vinculante, ou seja, prestar-se-á primordialmente para fins exemplificativos de como dois países poderão estabelecer um tratado bilateral.

Há, além do texto da CM - OCDE, diversos documentos de convenções - modelo, oriundos de estudos elaborados isoladamente por país ou por grupos de países, como a CM - ONU, a CM adotada pelos Estados Unidos, a Convenção - Modelo adotada pelos países pertencentes ao Pacto Andino, e a CM desenvolvida pela Associação Latino-Americana de Livre Comércio - ALALC.[22]

A orientação adotada pelo Brasil é a CM - ONU, onde o conceito de royalties é praticamente idêntico aos entendimentos do artigo 12 da CM - OCDE, apenas fazendo menção expressa da incidência de royalties devidos pela utilização de filmes ou fitas empregadas para transmissões de rádio e televisão.[23]

Acrescenta Gabriel Francisco Leonardos que:

percebe-se, portanto, que são atualmente tratados como royalties os pagamentos por direitos autorias em geral (incluindo os relativos a filmes e fitas e cinematográficos, para televisão e radiodifusão), bem como os pagamentos por marcas e patentes e transferência de tecnologia não patenteada, independentemente de esta tecnologia estar protegida segundo o regime de segredo de fábrica ou de negócio ou estar em domínio público e, finalmente, os pagamentos pelo uso de equipamentos industriais.[24]

De todo o exposto assenta-se na compreensão de que os royalties, espécie de compensação financeira, serão devidos sempre que os detentores de criações oriundas do intelecto humano, protegidas por título de propriedade que no Brasil configura-se com o registro competente no INPI, e da conseqüente expedição de carta-patente, celebrarem e averbarem contratos de cessão ou, de licença de seus direitos, com as figuras jurídicas intituladas cessionários ou licenciados.

Para que a cobrança possa incidir, é primordial que o criador de uma determinada marca, patente de invenção, modelos de utilidade, desenhos industriais ou qualquer outra inovação, seja efetivamente proprietário ou titular de sua invenção, para que reste exitosa a eventual exclusão de terceiros, em relação às incipientes criações.

Porém, denota-se que a evolução do Instituto proporcionou a ampliação das hipóteses de incidência que foram descritas acima. Os royalties serão devidos também, em decorrência da exploração de recursos naturais, como os hídricos, os recursos minerais, do petróleo, ou ainda, de qualquer outro que se extraia da natureza. Sabidamente no Brasil tais recursos são consagrados, pela Constituição Federal de 1988, como propriedade da União Federal.

Conseqüentemente, tratará o próximo Capítulo, sobre os passos que deverão ser percorridos até a perfectibilização de uma compensação financeira em contrapartida ao uso, gozo ou fruição, de um título de propriedade regularmente constituído, por seu detentor.