REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE DOS RECURSOS DIRIGIDOS AOS TRIBUNAIS SUPERIORES: DA NECESSIDADE DO PREQUESTIONAMENTO EM RECURSOS NO ÂMBITO DO STF 

 

 

José Orlando Soares Leite Neto

Samuel Jorge Arruda de Melo

 

 

 

SUMÁRIO: Introdução; 1 Prequestionamento: forma hábil e necessária de ventilação do processo quando do recurso extraordinário; 2 A garantia constitucional do devido processo legal no recurso extraordinário e o prequestionamento como meio adequado a fomentar essa garantia; 3 Embargos de declaração: obscuridade e omissão mitigadas pelo prequestionamento;  Conclusão.

 

RESUMO

São recorrentes os debates acerca do prequestionamento, sobretudo no concernente às suas finalidades, quando do processo civil, e da questão acerca de sua recepção ou não na Constituição Federal. Sendo assim, é necessário ressaltar a importância do prequestionamento como parte necessária à eficácia do recurso extraordinário, destacando como objetivo do prequestionamento clarear a questão constitucional ao longo do processo e a promover a relação deste com a garantia constitucional do devido processo legal. Importante, ainda, realizar uma análise acerca da ligação existente entre os embargos de declaração com finalidade de prequestionamento, tratando do papel fundamental da existência de prequestionamento nos embargos, vez que propõe rediscussão de questão federal apontada quando do processo.

 

Palavras-chave: Prequestionamento. Recurso Extraordinário. Devido Processo Legal. Questão Constitucional. Embargos de Declaração.

 

 

 

 

INTRODUÇÃO

 

O processo civil materializa a disposição de alguns institutos do Direito para que tenha fruição garantida nas diversas instâncias do Poder Judiciário. Sob alicerce do duplo grau de jurisdição, os recursos no processo civil, mormente nos tribunais superiores, não podem dispensar requisitos de admissibilidade. Dessa forma, o prequestionamento constitui algo fundamental para que os recursos consigam obter sua finalidade definida pelo Código de Processo Civil.

A figura do prequestionamento está permeada por divergências doutrinárias no mundo jurídico. Sua legitimidade no processo civil é questionada por não constar na Carta Magna menção direta à sua presença. No entanto, a jurisprudência tem decidido a favor de sua imprescindibilidade quando da interposição dos recursos.

O prequestionamento é um instituto que garante a suscitação prévia da questão constitucional/federal ou que a matéria constitucional questionada haja sido decidida. É, portanto, necessário para comprovar em juízo que o que se questiona, em sede de recurso extraordinário, já foi anteriormente instruído no processo. Faz-se necessário para acolhimento do recurso.

É fundamental salientar a condição à qual o prequestionamento se submete: trata-se de um requisito de admissibilidade para os recursos no processo civil. Insta frisar, dessa forma, que sua inexistência em um determinado recurso implica rejeição futura por parte da Corte que for analisá-lo. Daí extrai-se a imprescindibilidade do prequestionamento em grau de recurso extraordinário.

No presente caso, dar-se-á ênfase ao prequestionamento no âmbito do Supremo Tribunal Federal. Isso implica dizer, grosso modo, que o alvo do artigo aqui redigido é tratar acerca do prequestionamento quando da interposição de recursos extraordinários. Ora, os recursos extraordinários são aqueles dirigidos diretamente à Corte do Supremo Tribunal Federal. Assim sendo, há que ser salientado o fato de que o prequestionamento também deve ser constituinte do processo em segundo grau de jurisdição.

Dessa maneira, o prequestionamento constitui-se como um requisito e pré-requisito para a admissão do recurso extraordinário no Supremo Tribunal Federal. Cumpre ressaltar, como será demonstrado no presente artigo, que o prequestionamento é garantido pela Carta Magna do país. É justamente a presença desse status de garantia, embora não expressa, que dá ao prequestionamento a importância que tem quando dos recursos no processo civil, mormente aqui, o recurso extraordinário.

 

1 PREQUESTIONAMENTO: FORMA HÁBIL E NECESSÁRIA DE VENTILAÇÃO DO PROCESSO QUANDO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO

 A figura do prequestionamento surge, no Brasil, baseada nos ideais do liberalismo da Lei norte-americana como um instrumento fundamental para que fossem admitidos os recursos especial e extraordinário. Com a transformação em virtude do tempo, o ordenamento jurídico brasileiro tem sofrido alteração no tratamento dado ao prequestionamento, visto que em algumas constituições esse instituto está expressamente inserido, ao passo que em outras ele sequer é mencionado. Isso acaba por demonstrar a dificuldade em definir os parâmetros e a real necessidade do prequestionamento diante de um Estado de Direito Democrático (PAVANI, 2011).

Quando da promulgação da primeira Constituição Republicana dos Estados Unidos do Brasil, em 1891, foi adotada como modelo a Lei Judiciária Norte-americana e seus princípios basilares. Data dessa época o surgimento do prequestionamento no Brasil. Baseando-se no fato de que a Constituição Norte-americana admitia o duplo grau de jurisdição e o reexame necessário das decisões prolatadas pela Justiça Estadual, além de já à época restringir a possibilidade de interposição de recursos, passou a ser aceito também no Brasil o entendimento de que as questões repassadas ao órgão superior deveriam ter sido objeto de discussão anterior. Ou seja, era necessário que houvesse o conhecimento anterior da questão diante da instância inferior para a admissibilidade do recurso no Corte Superior da época (PAVANI, 2011).

Na Constituição Republicana de 1934, percebe-se que o prequestionamento continuou possuindo fundamento legal, vez que a expressão "questionar" se manteve presente nessa Contituição. Logo, o prequestionamento era tido como um requisito fundamental para a interposição do recurso extraordinário. Na Constituição de 1946, por sua vez, em decorrência de algumas modificações, foi excluído o termo "questionar" em uma das hipóteses de cabimento do recurso extraordinário. A partir daí, o prequestionamento não possuía mais previsão constitucional, o que acaba por gerar na jurisprudência o entendimento de que esse requisito de admissibilidade não mais seria necessário para alcançar os tribunais superiores.

Para Pavani (2011), com o advento da Constituição de 1967, o prequestionamento continuou sem encontrar amparo na lei. Entretanto, em virtude disso, a doutrina se dividia entre inconstitucionalidade desse instituto, em função da ausência do termo na Constituição Federal, e aplicabilidade, pois o prequestionamento já estaria embutido na tradição jurídica do País. A questão da existência do fundamento legal do prequestionamento ainda persiste mesmo na Constituição Cidadã, de 1988, pelo fato de que o vocábulo “questionar” não estar nessa inserido.

Sendo assim, Pavani (2011) ressalta que o prequestionamento, hodiernamente, apesar de não possuir previsão legal e de ser tratado mais como uma invenção dos tribunais, não pode ser descartado, pois é um requisito indispensável à admissibilidade e conhecimento dos recursos. Todavia, decorre desse fato certa insegurança jurídica, vez que é dada margem às mais diversas interpretações dos Tribunais sem um compromisso teórico-científico. Em razão disso, o prequestionamento acaba sendo tratado de maneira inadequada em alguns casos.

Resta claro que, apesar de não estar inserido na atual Constituição Federal, o prequestionamento é um requisito essencial de admissibilidade do recurso extraordinário no Supremo Tribunal Federal. Isso conforme tem entendido a jurisprudência em conjunto com a doutrina. (NOBREGA, 2004).

Para Câmara (2009), porém, há outro entendimento quando da fundamentação legal do prequestionamento. Esse argumento não se baseia apenas no fato de que o instituto supracitado seja uma criação doutrinária e científica, mas também na própria Constituição, estando preconizado no artigo 102, III, da Constituição Federal:

Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: III - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida:a) contrariar dispositivo desta Constituição; b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição . d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal. (Incluída pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)

Isso implica dizer que, apesar de não falar expressamente em prequestionamento, ao tratar somente de causas “decididas”, há nesse ponto a fundamentação legal do referido requisito.

Após breve introdução acerca do histórico do prequestionamento, é importante buscar noções acerca do que represente. Tal requisito é um pressuposto processual anterior e externo ao ato processual. Ou seja, trata-se de um pressuposto extrínseco específico, devendo estar contido no ato de interposição dos remédios extraordinários dirigidos aos Tribunais Superiores (PAVANI, 2011).

Segundo leciona Câmara (2009, p.121):

“Por prequestionamento quer-se significar a exigência de que a decisão recorrida tenha ventilado a questão (federal ou constitucional) que será objeto de apreciação no recurso especial ou extraordinário. Em outros termos, não se admite que, no recurso especial ou extraordinário, se ventile questão inédita, a qual não tenha sido apreciada pelo órgão a quo.”

Prequestionar, então, é abordar questão federal ou constitucional, considerando que a matéria discutida já foi objeto de debate e decisão prévios, servindo, assim, para dirimir pontos controvertidos referentes à questão federal ou constitucional no âmago das relações jurídicas.

Para o cabimento do recurso extraordinário, é importante ressaltar, ainda, que a questão constitucional não deve apenas estar “prequestionada”, como também deve ter havido julgamento expresso por ocasião da decisão recorrida, como está disposto na Súmula nº282 do Supremo Tribunal Federal (STF) (SILVA, 2005).

É necessário ainda tratar sobre os tipos de prequestionamento existentes: o explícito, implícito e o ficto / numérico. Assim, resta claro que o prequestionamento explícito é aquele presente, latente, na sentença, no caso de única instancia, ou no acórdão, no caso de última instância. Ressalta-se, nesta hipótese, o entendimento de que quem prequestiona é o acórdão (ou sentença) recorrido(a), provocado por uma das partes. Já o prequestionamento implícito é aquele cuja questão encontra-se implicitamente apreciada, em razão, ou da abordagem previa sem que o Tribunal tenha se pronunciado, ou porque haja sido englobado em outro tema abordado e julgado (NOBREGA, 2004).

Nobrega (2004) afirma que os Tribunais Superiores têm sistematicamente rejeitado os recursos interpostos, cujo prequestionamento se entende que seja implícito, pois entende-se estar ausente o requisito, demonstrando, assim, certo “rigor”, por parte daqueles Tribunais, quando tratam da questão. Problema concernente a este tipo de prequestionamento é o de que, se falta decisão, não será admitido o recurso extraordinário. Como consequência, havendo uma decisão, cabe esse tipo de recurso e o prequestionamento seria explícito.

Por fim, o prequestionamento numérico é aquele onde a parte individualiza os artigos, parágrafos, alíneas de lei federal ou norma constitucional. Pode-se considerar este tipo de prequestionamento supérfluo, por apenas explicitar os dispositivos aplicados ou rejeitados, já que estes foram anteriormente tratados pelo tribunal a quo (ARAKEN, 2013).

Também este prequestionamento, feito exclusivamente pela parte, vem sendo rejeitado pelos Tribunais, ante a ausência da analise efetiva da questão pelo Julgador de Primeira ou Segunda Instancia. O que se pode entender dessa classificação dos tipos de prequestionamento é que eles se demonstram como um falso problema, pois é irrelevante saber se este requisito de admissibilidade dos recursos extraordinários é implícito ou explícito. O que importa realmente aqui, é que exista decisão, no julgado recorrido, a respeito da questão constitucional (ARAKEN, 2013).

 

2 A GARANTIA CONSTITUCIONAL DO DEVIDO PROCESSO LEGAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO E O PREQUESTIONAMENTO COMO MEIO ADEQUADO A FOMENTAR ESSA GARANTIA

 

É pouco provável que se consiga separar o conceito de Direito do que seja o devido processo legal. Há uma linha tênue que impossibilita que um surta efeitos sem que o outro coexista. Dessa maneira, o devido processo legal, consagrado no artigo 5º, LIV, da Constituição da República Federativa do Brasil, é inerente à plena fruição do Direito.  Em 1988, a Carta Magna encarregou-se de tornar o devido processo legal como a norma-mãe; o fundamento e princípio base, sobre o qual todos os outros se sustentam (DIDIER, 2006).

Acerca do devido processo legal cumpre salientar que seu status de Direito Fundamental lhe garante a eficácia de que precisa.  Assim, nenhum indivíduo pode ser privado dessa garantia enquadrada no art. 5º, rol de Direitos Fundamentais (DIDIER, 2006). Dessa forma, resta claro que o princípio do devido processo legal é um verdadeiro sustentáculo da jurisdição estatal. É por conta disso que, sendo uma garantia constitucional, o devido processo legal se faz necessário para que alguns institutos do direito consigam obter plena fruição e tenham sua utilidade maximizada. O prequestionamento é um deles.  

O requisito do prequestionamento, quando da interposição de um recurso em instâncias superiores, mormente em recursos extraordinários, constitui algo necessário para a efetivação do devido processo legal. Gilson Roberto Nobrega (2004) aduz que o prequestionamento decorre da parte haver sustentado, previamente, uma questão. Isto é, a parte poderá ter suscitado ao longo do processo, tanto na inicial como na contestação, o dispositivo constitucional que seja passível de violação ou transgressão.

 Uma outra corrente vai ainda mais longe: afirma que o prequestionamento implica decisão do aresto recorrido, e não somente a suscitação no processo (NOBREGA, 2004). Um dos corolários do entendimento do referido autor, que é convergente com o de uma Turma do Supremo Tribunal Federal, é justamente a necessidade de anterior apreciação da questão federal a ser suscitada no recurso.

 Consolidou-se em âmbito federal a necessidade de haver não apenas suscitação, mas também uma decisão apreciando tal questão constitucional para efetivar o prequestionamento. Assim, pode-se inferir que o prequestionamento constitui a comprovação ante o juízo ad quem de que a matéria constitucional foi anteriormente suscitada no processo – No presente caso, tratando-se exclusivamente no âmbito do Supremo Tribunal Federal.

O sistema de recursos brasileiro é dotado de complexidade, por definição, já que comporta vários requisitos, como o prequestionamento, tornando-os indispensáveis à plena fruição do recurso extraordinário. Faz-se necessário, portanto, ressaltar que o prequestionamento é um requisito de admissibilidade. Como tal, necessita ser cumprido e suprido. Todavia, esse suprimento necessita ser feito, por óbvio, antes do julgamento do recurso. Se não fosse assim, seria, em verdade, um pós-questionamento, e não prévio (PAVANI, 2011).

A garantia constitucional do devido processo legal está intimamente ligada ao prequestionamento. Essa garantia inclui o duplo grau de jurisdição, sem o qual seria pouco provável haver algum recurso. Inclui, ainda, o contraditório e a ampla defesa, a fim de que os consortes possam oferecer defesa processual à exaustão. Mas de que maneira isso se relaciona ao prequestionamento? Ora, todos esses aspectos e princípios constitucionais que permeiam o processo são garantias e, portanto, necessários para que haja o devido processo legal. O prequestionamento está em patamar de garantia constitucional, embora não esteja expresso na Carta Magna, como os demais supracitados (PAVANI, 2011).

É muito relevante salientar que o prequestionamento tem finalidade mais extensa do que tão somente clarear questão constitucional. Esse requisito de admissibilidade tem como função precípua evitar a supressão da instância judicial. Ou seja, conforme orienta a Súmula 281, o prequestionamento visa evitar que algum magistrado ou Tribunal se abstenha de apreciar a questão constitucional até que os autos sejam enviados ao Supremo Tribunal Federal, como é o presente caso (NOBREGA, 2004).

As incumbências do prequestionamento transcendem o evitar da supressão de instância superior. Dentre alguns desses desdobramentos, é possível mencionar a manutenção da ordem constitucional brasileira. Isto é, padronizar o sistema jurídico conforme a ordem juízes-tribunais. Além disso, o prequestionamento, no presente âmbito, visa evitar que a parte contrária seja surpreendida com a interposição do recurso extraordinário, vez que poderia não saber que a questão constitucional foi suscitada (NOBREGA,2004).

No concernente ao momento mais adequado à apresentação do prequestionamento, é importante tecer algumas considerações. Entende-se ser de curial importância prequestionar a matéria quando dos primeiros atos processuais. Sendo autor, prequestiona-se na inicial; sendo réu, a hora oportuna é a contestação. Isso permite que seja apontada ad initio a violação à norma constitucional ou federal. Essa técnica é eficaz porque permite que seja consolidada bem mais que uma suscitação, mas uma decisão do juízo de primeiro grau acerca da questão constitucional. Na verdade, forma-se entendimento acerca da matéria (NOBREGA, 2004).

Como contraponto ao relatado no parágrafo acima, há a possibilidade de não haver a violação à norma constitucional desde o início, mas apenas no decorrer do processo. Isso impede que o prequestionamento seja feito de imediato. Por conta disso, parte da doutrina entende que é quando da elaboração do\ recurso extraordinário que deve ser feito o prequestionamento. Assim, o dever de prequestionar é, primeiramente, do recorrente. O Supremo Tribunal Federal consolidou entendimento no sentido de que o momento oportuno para o prequestionamento é na apresentação do recurso, por parte do recorrente, ou das contrarrazões, se houver prequestionamento do recorrido (NOBREGA, 2004).

Levando-se em consideração todos os liames do recurso no processo civil, sobretudo do recurso extraordinário, resta comprovada a ligação e relação entre o prequestionamento e o devido processo legal. Ora, conforme supracitado, há, aqui, bem mais que um requisito de admissibilidade. Há, em verdade, uma garantia que, embora não expressa, é constitucional. Dessa forma, as partes, quando do processo, têm o direito de prequestionar a fim de fruir e gozar das garantias do devido processo legal.          

                       

3 EMBARGOS DE DECLARAÇÃO: OBSCURIDADE E OMISSÃO MITIGADAS PELO PREQUESTIONAMENTO

 

Na exata medida em que o recurso extraordinário deve ser improvido quando o fundamento suficiente não é atacado, o acórdão deve - sob pena de incidir em error in procedendo -, analisar todos os fundamentos e teses levantados pelo recorrente. Isso é, seja para acolhê-los ou para rejeitá-los e decidir acerca de cada um deles, solucionando a matéria prequestionada (BUENO, 2014).

Caso seja omissa a decisão contra a qual se queira opor o recurso extraordinário, faz-se necessária a interposição dos embargos de declaração, no intuito de prequestionar a questão federal ou constitucional. Antes da interposição desses recursos, é imperioso o exame do conteúdo da decisão e seu confronto com as alegações das partes para verificar se a decisão já está pronta para ser objeto de impugnação perante as Cortes Superiores ou se nela reside, ainda, algum vício que precisa ser sanado previamente com o esgotamento das vias recursais ordinárias (CÂMARA, 2009).

Segundo Silva (p.432, 2005), “se a parte não interpuser embargos declaratórios, para forçar o tribunal a manifestar-se sobre a questão federal prequestionada, o recurso extraordinário não será admitido”. No entanto, há uma discussão acerca do suprimento dessa omissão. No caso de ter sido suprida, o recurso extraordinário será admitido. Todavia, caso não seja, o Supremo Tribunal Federal entende que só por terem sido interpostos os embargos de declaração, independentemente do êxito desses embargos, já há o prequestionamento (nesse caso é o ficto). Já o Superior Tribunal de Justiça opta pela tese de que não haverá o prequestionamento, devendo ser interposto recurso especial por violação ao artigo 535, do Código de Processo Civil (DIDIER, 2007).

Importante ressaltar que o posicionamento do Superior Tribunal Federal, no caso em questão, parece ser o mais adequado, pois visa à manutenção da possibilidade do recorrente se valer de seu direito a utilização das vias extraordinárias (DIDIER, 2007). Os embargos declaratórios não servem para suscitar determinada “questão federal” que irá legitimar o recurso extraordinário, vez que esta questão tem de ter sido prequestionada anteriormente, para que aqueles embargos possam servir para tornar admissível o recurso extraordinário:

“As fórmulas usuais das instâncias estaduais e regionais para rejeitar declaratórios opostos com esta finalidade — ‘o Tribunal não é obrigado a responder questionários’ ou ‘o Tribunal não está obrigado a analisar todos os fundamentos das partes’ — devem ser recebidas com ressalvas e não podem ser generalizadas, isto é, aplicadas a todo e qualquer caso de embargos de declaração, mesmo àqueles confessadamente opostos para fins prequestionadores.” (BUENO, p.21, 2014).

Dessa forma, Bueno (2014) demonstra que o Tribunal não tem obrigação de dar resposta aos embargos de declaração quando os fundamentos das partes tiverem sido expostos até o julgamento do recurso do qual pretende-se recorrer extraordinariamente. Além disso, os recursos já devem ter sido analisados pelo Tribunal, servindo, nos casos dos embargos de declaração, para introduzir uma questão nova de forma tardia.  Apesar disso, é importante ressaltar que, havendo omissão, obscuridade ou contradição na decisão recorrida, caberá a interposição dos embargos declaratórios.

Cumpre salientar que uma das funções dos embargos declaratórios é a de verificar o que está ou não prequestionado (decidido) para fins de recurso extraordinário. Assim, o intuito é de suprir possíveis vícios de procedimento da decisão a ser recorrida. Porém, essas situações não podem ser tomadas como regra geral, de modo que devem ser analisadas caso a caso a fim de averiguar se foram apreciadas as questões que deveriam ter sido levadas em consideração para a decisão. Os embargos de declaração cumprem seu papel, nesse caso, de dirimir obscuridades e omissões quando do recurso extraordinário (BUENO, 2014).

Para Bueno (2014), os embargos de declaração podem ser opostos para sanar a omissão de algum dispositivo na decisão do magistrado. Nesses casos, os embargos de declaração constituem meio hábil para mitigar tal omissão. Todavia, havendo eventual rejeição desses, abre-se a possibilidade para interposição de recurso especial com finalidade de correção do possível vício (CPC, art. 535, II ou o art. 458, II). Isso ocorre justamente para que se busque a decisão da causa, algo que é constitucionalmente imposto para admissibilidade de eventual recurso extraordinário (CF, arts. 102, III).

Neste pleito, fica claro que tais embargos com o escopo de prequestionar a matéria não podem ser considerados protelatórios, conforme Sumula 98 do STJ. Eles têm função precípua, em sede de recurso extraordinário, de mitigar, em consonância com o prequestionamento, a omissão e obscuridade nas decisões do processo (NOBREGA, 2004).

CONCLUSÃO

 

                   Os recursos extraordinários são pleiteados a fim de atingir apreciação no Supremo Tribunal Federal. Conforme demonstrado no bojo do presente artigo, o prequestionamento é necessário para que o recurso extraordinário seja admitido no Tribunal ad quem. É neste ponto que reside a alma do artigo: a essencialidade do prequestionamento quando da interposição de um recurso extraordinário junto ao Supremo Tribunal Federal.

                    Uma das mais singulares utilidades do prequestionamento é a que está elencada logo no primeiro capítulo do presente escrito: a de ventilar a matéria constitucional a ser contestada em grau de recurso. Aqui, a figura do prequestionamento funciona como um “feedback” para o Ministro do Supremo que será responsável pela apreciação do recurso. É porque o prequestionamento existe que o magistrado toma conhecimento da questão constitucional suscitada e contestada no processo originário e que seguirá para análise em instância superior.

                 O recurso extraordinário, sempre que devidamente instruído com o prequestionamento, supre lacunas que dificultariam análise por parte do órgão ad quem. Todavia, faz-se necessário, por vezes, uma complementação do prequestionamento. Isso ocorre quando esse instituto não é eficaz em clarear a matéria constitucional por completo. Em casos como esse, doutrina e jurisprudência entendem que devem ser opostos embargos de declaração com uma única finalidade: mitigar omissões e obscuridades no processo de primeiro grau. Os embargos, nesse caso, constituem um meio hábil, em consonância com o prequestionamento, para buscar no processo questões que tenham sido deixadas em aberto a fim de saná-las.

                 Outro importante ponto discutido tem seu cerne na questão do devido processo legal. Consoante apresentado acima, o prequestionamento constitui elemento da garantia constitucional do devido processo legal. Discutiu-se acerca do duplo grau de jurisdição, que possibilita a existência de processos em segunda instância; acerca do contraditório e da ampla defesa, que permite aos consortes oferecer defesa processual às máximas possibilidades; e do prequestionamento como instituto dessa garantia constitucional. Isso porque, mais do que uma obrigação, trata-se de um direito dos consortes de prequestionar a matéria que se quer discutir no Supremo Tribunal Federal, quando no recurso extraordinário. Dessa forma, resta comprovada a essencialidade da escolha do presente tema para elaboração textual.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

ASSIS, Araken de Assis. Manual dos recursos. 5ª ed. São Paulo: Revista dos tribunais, 2013.

BRASIL. Código de Processo Civil. Vade Mecum Saraiva. Ed. Saraiva, 2012.

BUENO, Cassio Scarpinella. Quem tem medo do prequestionamento?. Jus Navigandi, Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3024>. Acesso em: 17 ago,  2014.

CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. 17ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.

JUNIOR, Fred Didier. Curso de direito processual civil: meios de impugnação às decisões judiciais e processo nos tribunais. 3ª ed. Salvador: juspodivum, 2007.

__________________. Curso de direito processual civil: Teoria Geral do Processo e Processo de conhecimento. 6ª ed. Salvador: juspodivum, 2006.

NOBREGA, Gilson Roberto. Prequestionamento – aspectos fundamentais. Disponível em: http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/1743/Prequestionamento-Aspectos-fundamentais. Acesso em: 18 ago, 2014.

PAVANI, Vanessa Roda. O prequestionamento. Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=9489. Acesso em: 16 ago, 2014.

SILVA, Ovídio Araújo Baptista da. Curso de Processo Civil. 7ª ed. v. 1. Rio de Janeiro: Forense, 2005.

                                                                                                                       


[3] Professor da disciplina Recursos no Processo Civil da UNDB.