Diariamente nos deparemos com várias teorias, diálogos ou qualquer outra forma de transmissão de ideias, porém, nem sempre sabemos se determinada ideia pode ser justificado ou não como verdadeira. De que forma podemos afirmar que determinada proposição é verdadeira? O objetivo desse artigo é demonstrar as divergências e conceitos entre as teorias da justificação do conhecimento baseadas por Reneé Descartes e Paul K. Moser.

Descartes, em sua teoria fundacionista, afirma que, se houver alguma dúvida sobre a justificação de alguma proposição, essa proposição será fatalmente falsa, ou seja, não pose ser assegurado como conhecimento, como ele mesmo diz: “dedicar-me unicamente à pesquisa da verdade, achei melhor fazer justamente o contrário e rejeita como absolutamente falso, tudo aquilo em que pudesse imaginar a menor dúvida” (DESCARTES, 1973:42) assim como, toda a crença verdadeira e justificada; só é aceita se as mesmas forem concebidas indubitavelmente de forma clara e nítida, pois, “que as coisas que concebemos com muita clareza e nitidez são todas verdadeiras” (DESCARTES, 1973:44).

Descartes é muito radical sobre tudo que está relacionado com o conhecimento, pois, o mesmo pretende chegar, através de um racionalismo que duvida de tudo, a uma certeza absoluta, a uma verdade irremovível, capaz de resistir a todos os ataques dos céticos e que sirva de fundamento para construir seu edifício filosófico, em outras palavras, seria algo constante em seu método, o infalibilismo. O exemplo perfeito disso é a prova ontológica penso, logo existo, pois, o filósofo nega qualquer possibilidade de tal verdade ser negada, sendo essa, para ele, a única verdade. Com isso, Descartes (1973:43) afirma que: “Notei então que, a verdade “penso, logo existo” era tão sólida e tão certa que nem as mais extravagantes suposições dos céticos poderiam abalá-la.

A princípio, também, Descartes usa o método da auto-probabilidade (que é sustentada pelo infalibilismo) para não precisar recorrer se algo é verdadeiro ou não, ou seja, ele afirma que existe verdades que não podem ser negadas, ora, em sua antologia, eu sou, eu existo, ele deduz que é verdadeira só pelo fato de imaginar e que não precisar ser duvidada em hipótese alguma, pois “após ter pensado bastante nisto e ter examinado cuidadosamente todas as coisas, cumpre enfim concluir e ter por constante que esta proposição, eu sou, eu existo, é necessariamente verdadeira todas as vezes que a enuncio ou que a concebo em meu espírito”.(DESCARTES, 1971:100)

Assim, percebe-se tal individualidade dessa verdade, ou seja, não precisa ser provada a não ser por ela mesma. Quando ele fala do eu sou, eu existo, de fato o pensador quer dizer que se ele pensa e duvida, por mais que venha algum Deus dizer que ele não existe Descartes afirma que pode até não existir como corpo ou por qualquer outra coisa, porém ele pensa, e está duvidando, contudo, existe algo ou alguém que duvida e que pensa, se ele não pensasse ou duvidasse, ele seria o nada, mas ele não é o nada, então ele existe de alguma forma para poder duvidar. Contudo, o filósofo afirma a frase “eu sou, eu existo” é tão verdadeira, tão indubitável, que nada e nem ninguém precisar explicar essa veracidade, como ele mesmo diz: “pois é por si tão evidente que sou quem duvida, quem entende e quem deseja que não é necessário nada acrescentar aqui para explicá-la” (DESCARTES, 1971:103)

Construindo um fundacionismo mais original, Paul K. Moser entende que uma proposição não precisa ser indubitavelmente verdadeira para aceitá-la como um conhecimento verdadeiro, mas sim acreditar em alguma medida que tal proposição pode ser provável através de algum tipo de evidência, assim, de acordo com Luz (2006:41), Moser afirma que “uma crença tornada provável devido à presença de um produtor evidencial é uma crença que o sujeito epistêmico tomará ou poderá tomar como 'provavelmente verdadeiro' e que, daí, poderá tomar, por usa vez outra crença”. Dessa forma, uma sentença somente precisa de um produtor evidencial, que nada mais é do que uma proposição que possui evidências que serão capazes de torná-las provavelmente verdadeira de algum modo. Por conseguinte, consoante a Luz (2006:43) “para uma proposição poder parecer verdadeira para alguém, ela tem de parecer provavelmente verdadeira, em alguma medida. E sustenta Moser, o que torna uma proposição provável é algum tipo de evidência”. Nessas condições, necessitamos apenas de probabilidades e não de certezas para aceitar alguma proposição, contudo, percebe-se que ele utiliza-se do falibilismo como suporte de sua teoria fundacionista.

Em concordância a Moser, a tese da auto-probabilidade possui muitos problemas, visto que, é difícil definir se tal proposição é realmente auto-provável ou não, como também contraditório, pois, na tese ontológica eu sou, eu existo, para necessariamente ser verdadeira, primeiro temos que pensar, ter vontades e duvidar. Então, ela precisa de certas evidências

para ser considerada verdadeira, contudo, fica confuso se ela é uma tese de Auto-probabilidade condicionada à verdade ou precisa de evidências para se ter alguma verdade, contudo, ela não é auto-provável. Contanto, para Luz (2006:45),

 

quando consideramos uma proposição como auto-provável devido aos termos que a constituem, estamos, na verdade, considerando que esta proposição é verdadeira devido ao uso de tais e tais termos. Porém, sustenta Moser, “ não devemos confundir condições para a probabilidade evidencial com condições para a verdade”.

 

Não é difícil também entender que a tese da auto-probabilidade tende a levar ao infinitismo, vejamos um exemplo. Eu sou, eu existo, Descarte definiu essa ontologia pelo o motivo que, ele pensava, ela duvidava, ele sentia. Mas, o que me garante que ele realmente pense, duvida e sente? Assim, terá então que provar a veracidade de que ele realmente pensa, sente e duvide. Depois que achar tal resposta que prove a veracidade, o que me garante que essa resposta possui realmente verdades suficientes para afirmar que a resposta de que “ele pensa” ou “ele duvida” é realmente verdadeira? Assim, Luz (2006:46) pergunta “Alguém pode, apenas baseado nas proposições que compõem o regresso, aceitar o antecedente desta condicional?” Para Moser, dificilmente não, pois, o sujeito epistêmico necessitará da definição “pensar” e “duvidar” para só assim, justificar a crença eu sou, eu existo. Contudo, o sujeito irá querer saber também a definição da definição das proposições “pensar” e “duvidar”, e assim sucessivamente e infinitamente, levando para uma redução ao infinito.

Portanto, mesmo que Descarte se utilize de um fundacionismo extremamente radical sustentado pela auto-evidência, isto é, não aceitar qualquer dúvida, e Moser que, em um caminho inverso que parte do princípio que somente precisamos de evidências que são provavelmente verdadeiras, defende a justificação do conhecimento através de um fundacionismo mais tradicional tendo como suporte o falibilismo, não podemos afirmar categoricamente qual teoria está mais certa ou melhor, mas sim, entender que, por mais que Reneé Descartes e Paul K. Moser sejam filósofos com teses contrárias, suas ideias são sempre bem vindas ao nosso conhecimento, e que nos ajudarão a resolver ou entender melhor as dúvidas que tanto correi na alma de um filosofo ou de um estudante de filosofia.

 

 

REFERÊNCIAS

 

DESCARTES, Reneé. Discurso sobre o Método. São Paulo: Atena, 1971.

DESCARTES, Reneé. Os Pensadores. 1ª ed. São Paulo: Abril S.A, 1973.

LUZ, Alexandre Meyer. Conhecimento e Justificação: Problemas da Epistemologia Contemporânea. Não publicado.

MOSER, Paul; MULDER, Dwayne; TROUT. Teoria do Conhecimento. Martins Fontes SP. 2004.