Numa sociedade que já passou e continua passando pelas grandes transformações (mudanças profundas nos costumes, valores e princípios, hábitos e o estilo de vida em geral) provocadas por três revoluções industriais regadas a grandes inovações tecnológicas, só agora mais recentemente começamos a nos preocupar mais com a saúde dos trabalhadores dos mais variados setores profissionais.
No nosso atual mundo globalizado, onde as pessoas são cobradas cada vez mais cedo por atitudes que as possibilitem garantir futuramente uma vaga no mercado de trabalho e uma vida financeira estável, torna-se cada vez mais freqüente o surgimento de doenças relacionadas ao estresse, em especial o estresse ocupacional. A LER (Lesão por Esforço Repetitivo), atualmente chamada mais frequentemente de DORT (Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho) é uma das doenças mais comuns que têm relação direta com o ambiente de trabalho e a função exercida pelo profissional.
O objetivo do presente estudo é relacionar o estresse provocado por rotinas e hábitos no ambiente profissional, de trabalho, com os princípios da Ecologia Humana. Para tanto torna-se necessária uma breve abordagem à trajetória da Ecologia Humana e a algumas das suas linhas de pensamento.

ECOLOGIA HUMANA

Segundo Machado (1984), as interações do homem com seu meio-ambiente só foram ressaltadas de uma forma científica no século XX, apesar de sempre ter havido um grande número de literaturas a respeito dessas interações.
Por exemplo, em 1923, Barrows falava de Ecologia Humana com uma visão reducionista, porém, identificando-a como Geografia Humana. Em 1925, Bernard "discute uma classificação de ecossistemas, distingue os fatores biossociais e os psicossociais e reconhece a sua interdependência". Em 1936, Robert Ezra Park, assim como alguns outros autores, subestimaram o ambiente físico-químico e biológico da Ecologia Humana e a reduziram a um componente da Sociologia. Bews apareceu com a nova concepção expansionista de uma Ecologia Humana que era uma síntese de todas as ciências humanas. Em 1945, Wirth afasta-se das visões reducionistas e expansionistas quando "situa a Ecologia Humana em áreas limitadas de relação entre as diversas ciências".
Finalmente, Machado (1984) fala de uma quinta tentativa de definir a Ecologia Humana que superou as quatro anteriores porque excluíam o meio abiótico de suas teorias. Esta refere-se à Ecologia Humana como um nível superior de pensamento e nunca como uma disciplina isolada. Pelo contrário, a Ecologia Humana seria o "estudo interdisciplinar das interações entre o homem e o meio ambiente", cujos objetivos nunca serão preditivos ou determinísticos.

"A Ecologia Humana tem como objeto as interações entre o homem e o meio ambiente. Considera-se o homem como um todo, um sistema de órgãos e funções, dotado de instintos e de inteligência, com um patrimônio genético e cultural. Considera-se meio ambiente o sistema constituído pelo universo biótico, abiótico e social em relação ao homem. Dois sistemas em interação constante: o homem e seu complexo meio ambiente(...)
(...) O sistema homem é dependente do sistema meio ambiente. O sistema homem é equipado com sensores que recebem como informações as alterações que ocorrem o meio ambiente (...) Ambos os sistemas estão em evolução e somente um acidente desorganizador, destruidor, poderia reduzi-los à estagnação" (Machado, 1984, p. 32).

As interações entre o homem e o meio ambiente disparam mecanismos de auto-regulação que conduzem não só à momentânea estabilidade, mas à reorganização e adaptação em sentido evolucionário. Segundo Machado, a análise sistêmica dessas interações é o objetivo da Ecologia Humana.
As interações são substancialmente trocas de informações. Por exemplo, o represamento de um rio é uma informação que o meio ambiente recebe e decodifica e, em troca, emite outras informações que podem vir a repercutir sobre o próprio homem.
A Ecologia Humana é extremamente complexa, e isso não se deve somente ao fato do objeto de estudo da disciplina referir-se à espécie humana, pois todas as disciplinas que estudam as populações biológicas, como a Ecologia, enfrentam essa complexidade enorme quanto ao entendimento das interações biológicas. Certamente, o fato da Ecologia Humana ser melhor analisada e estudada levando-se em consideração a interdisciplinariedade que deve haver entre os profissionais das mais diversas áreas torna-se outro fator agravante dessa complexidade, mas que mostra-se extremamente necessário para a elucidação máxima das relações do ser humano com o ambiente que o circunda e o influencia.
Demonstrando a complexidade da "interdisciplina" em foco, Kormondy e Brown (2002) em sua obra intitulada Ecologia Humana evidenciam e explicam sucintamente algumas abordagens à Ecologia Humana.
A Antropologia Ecológica define a primeira linha de pensamento referente às interações do homem com o seu meio-ambiente, o determinismo ambiental. Sua característica essencial é o estabelecimento de uma possível relação causal entre características ambientais de uma região e a presença de traços culturais específicos.
Hipócrates foi um dos primeiros a teorizar sobre essas relações. Em sua teoria do humor, ele dizia que as pessoas eram compostas de quatro humores (sangue, pigarro, bile amarela e bile negra). A personalidade, saúde e aparência de cada um seriam determinados pelo equilíbrio entre esses quatro humores, os quais seriam influenciados pelas características específicas do ambiente no qual cada um está inserido. Isso explicaria as diferenças biológicas nas pessoas de região para região, bem como as diferenças culturais existentes entre os povos de diferentes áreas. Esse é um dos primeiros relatos de uma Ecologia Humana.
Mas o que é será afinal Ecologia Humana? Há várias abordagens diferentes ao assunto e todas têm diferenças em suas respectivas perspectivas sobre o assunto. Porém, algo de comum elas devem ter para serem consideradas parte da Ecologia Humana. Provavelmente estamos falando da relação primordial que existe entre o homem e o ambiente em que vive, em que habita, em que mantém relações com outras pessoas, com outras espécies, e do qual ele próprio faz parte e para o qual ele faria falta se já não fizesse mais parte dele.
Continuando com o determinismo ambiental, esta teoria foi muito difundida através dos séculos (Montesquieu, no século XVIII, exaltou o clima como influenciador direto do comportamento e da personalidade) (Honigmann, 1976), só vindo a perder a sua força teórica no século XX, quando Franz Boas abriu olhos e horizontes acusando deterministas ambientais de terem visões completamente etnocêntricas em suas composições teóricas. Dessa forma, ele lançava mão da importância do relativismo cultural que deveria estar presente nas observações objetivas dos estudiosos e pesquisadores sobre a cultura dos povos.
Assim, o possibilismo ambiental de Boas surgiu criticando as relações causais simplistas entre ambiente e cultura evidenciadas pelo determinismo ambiental. O possibilismo ambiental "enfatizava a importância primária dos eventos históricos específicos na criação das culturas através de constantes mudanças ao longo do tempo (...) a causa imediata de caracteres culturais específicos eram outros caracteres culturais. O ambiente era importante apenas ao limitar as possibilidades de uma cultura ? por isso o termo possibilismo ambiental" (Kormondy e Brown, 2002).
A Ecologia Cultural de Julian Steward, na qual o núcleo cultural de um grupo (as maneiras que esse grupo tem de obter alimentos) influencia diretamente a organização cultural e social do mesmo. Porém, entre o ambiente e o núcleo cultural existe uma influência mútua, bilateral, uma conexão de duas mãos entre cultura e ambiente.
Ainda temos a Ecologia Sociológica, que faz analogias entre um ecossistema e a sociedade urbana, abarcando os principais conceitos na Ecologia como competição, simbiose, dominância, etc, existentes em um ecossistema, para explicar processos análogos que ocorrem nos ambientes urbanos.
Duas abordagens são utilizadas dentro da Psicologia para o estudo da Ecologia Humana: a psicologia ecológica de Baker, a qual "tenta prever os comportamentos baseada em observações cuidadosas, geralmente quantitativas, do ambiente no qual o comportamento ocorre" (Kormondy e Brown, 2002); a psicologia ambiental, definida por Heimstra e Mcfarling como "a disciplina que trata das relações entre o comportamento humano e o ambiente físico do homem", focaliza as percepções dos indivíduos acerca de seus ambientes, "como esses indivíduos se relacionam com os recursos, as ameaças e os problemas ambientais" (Bennett, 1976).
A complicada Etnoecologia, cujos pesquisadores tentam "observar o mundo de um indivíduo através dos olhos do próprio indivíduo", concentra-se na maneira como as pessoas classificam as coisas em suas línguas, para então construir taxonomias principalmente de elementos ambientais, atividades de subsistência e afins. Porém, para tanto, torna-se necessário um conhecimento vastíssimo da língua do povo da cultura em estudo, o que pode acabar tornando-se uma grande dificuldade para os etnoecólogos.
Após a apresentação ao mundo da teoria evolucionária de Darwin, os profissionais denominados de ecólogos humanos passaram a integrar a idéia de adaptação ao ambiente dessa teoria ao estudo das culturas humanas. Para Leslie White, a cultura de um povo é, em primeiro lugar, a sua forma de captação de energia, a qual será utilizada em suas mais variadas atividades, e que é um fator importantíssimo na organização social desse povo e no constante desenvolvimento dessa sociedade. "A evolução cultural ocorre conforme a cultura se torna mais efetiva, ou mais eficiente, na aquisição de energia" (Kormondy e Brown).
O paradigma da "Nova-ecologia" surgiu da tentativa de explicar conjuntamente os processos adaptativos culturais e biológicos das populações humanas (ressaltando as possíveis relações que devem existir entre os dois processos), haja vista que até então os estudos concentravam-se em explicar os aspectos evolutivos dos mesmos separadamente. Por exemplo, a genética de populações, uma subdisciplina da biologia humana, e tantas outras limitavam-se à análise dos caracteres biológicos populacionais, sem menção às características culturais. Esse é um exemplo da integração entre os conceitos da ecologia e as idéias da evolução e da biologia humanas.
Este paradigma introduziu o estudo das populações ao invés do estudo focalizado somente nas culturas, como acontecia anteriormente, o que permitiu que os ecólogos humanos utilizassem conceitos e métodos da ecologia biológica ao analisar a Ecologia Humana.
A Nova-ecologia concentra-se nos problemas ambientais (que estão relacionados aos recursos naturais, à subsistência e a estressores ambientais e que podem ser respostas às ações humanas ou simplesmente fazer parte de um ecossistema "natural"), nos efeitos que eles causam sobre as populações humanas e as respostas das mesmas a esses problemas (Vayda e Rappaport, 1968).

ESTRESSE OCUPACIONAL

A apresentação do conceito de estresse ocupacional será feita em seguida, com a contribuição de alguns dos autores mais citados com relação a esse assunto.
Lazarus (1995) propõe que o estresse ocupacional ocorre quando o indivíduo avalia as demandas do trabalho como excessivas para os recursos de enfrentamento que possui. O estresse não seria uma propriedade da pessoa ou do ambiente, mas poderia se desenvolver a partir da conjunção de um tipo particular de ambiente com um tipo determinado de pessoa. A simples presença de eventos que podem se constituir como estressores em determinado contexto, no qual o indivíduo esteja inserido, não caracteriza um fenômeno de estresse. Para que isto ocorra, é necessário que o indivíduo perceba e avalie os eventos como estressores, o que quer dizer que fatores cognitivos têm um papel central no processo que ocorre entre os estímulos potencialmente estressores e as respostas do indivíduo a eles.
O estresse ocupacional, na teoria cibernética, pode ser entendido como uma discrepância entre uma situação percebida pelo empregado e uma situação desejada, desde que a presença da discrepância seja considerada importante pelo empregado (Edwards, 1992).
Paschoal e Tamayo (2004) conceituam o estresse ocupacional como um processo em que o indivíduo percebe demandas do trabalho como estressores, os quais, ao exceder sua habilidade de enfrentamento, provocam no sujeito reações negativas. Nota-se na conceituação dos autores acima a grande importância dada à percepção das demandas como estressores.
Paschoal e Tamayo (2005) falam que se tem constatado um consenso entre os estudiosos da área do estresse ocupacional de que as percepções dos indivíduos são mediadoras do impacto do ambiente de trabalho sobre o indivíduo; para algo na organização ser um estressor, ele precisa ser percebido como tal pelo empregado. "O estresse ocupacional pode ser definido, portanto, como um processo em que o indivíduo percebe demandas do trabalho como estressores, os quais, ao exceder sua habilidade de enfrentamento, provocam no sujeito reações negativas".

VARIÁVEIS INFLUENCIADORAS DO ESTRESSE OCUPACIONAL: OS ESTRESSORES OCUPACIONAIS

Estressores ocupacionais estão freqüentemente ligados à organização do trabalho, como pressão para produtividade, retaliação, condições desfavoráveis à segurança no trabalho, indisponibilidade de treinamento e orientação, relação abusiva entre supervisores e subordinados, falta de controle sobre a tarefa e ciclos trabalho-descanso incoerentes com limites biológicos (Carayon, Smith & Haims, 1999).
Estudos apontam que a presença de redes sociais que oferecem suporte ao trabalho melhora a avaliação do empregado sobre sua saúde e correlaciona-se negativamente com o estresse (Browner, 1987; Iwata & Suzuki, 1997). Quando o suporte social está bem desenvolvido na organização, ele tem um efeito protetor que se manifesta em baixos níveis de estresse, ou seja, quanto maior o nível de suporte social no ambiente organizacional, menor o nível de estresse no trabalho. Por outro lado, quando o suporte social é inexistente ou deficitário na organização, este fator transforma-se num estressor. Porém, outras variáveis (situacionais) não tão diretamente relacionadas ao ambiente e circunstâncias organizacionais podem também ter influências sobre o estresse ocupacional.
Trabalhadores que não praticam exercícios físicos regularmente tendem a apresentar um nível de estresse superior. O exercício físico regular desenvolve o condicionamento cardíaco que provoca, na corrente sanguínea, uma redução de substâncias associadas ao estresse (Tamayo, 2001).
Também, aspectos da relação entre trabalho e família podem ser tratados como variáveis que influenciam o estresse ocupacional. Isto porque não se restringem a demandas do ambiente de trabalho, mas podem influenciar a percepção dos estressores. A interferência da família no trabalho está positivamente relacionada com o estresse ocupacional, ou seja, a interferência família-trabalho estaria favorecendo, diretamente, o aparecimento de estressores organizacionais (Paschoal e Tamayo, 2005).
Quanto às variáveis pessoais que influenciam o estresse ocupacional, o estilo de enfrentamento (estilo de coping) do empregado frente aos eventos estressores consiste na principal variável individual, representando ainda, um ponto central de muitos estudos. Como variáveis pessoais ainda temos o locus de controle , o padrão de comportamento tipo A e a auto-estima que também têm chamado a atenção dos pesquisadores. Destas, a que me parece dever ser dada ênfase é a auto-estima, já que esta tem sido vista nos estudos sobre estresse como um recurso para o processo de enfrentamento, capaz de influenciar a avaliação dos eventos e os comportamentos emitidos para lidar com os estressores. Segundo Tamayo (2001), "a auto-estima desempenha uma função importante na proteção do self e, quando elevada, constitui-se num filtro protetor que seleciona as informações referentes ao indivíduo". Parece haver uma correlação positiva entre baixa auto-estima e altos níveis de estresse ocupacional.


ECOLOGIA HUMANA E ESTRESSE OCUPACIONAL

Agora que já temos explicitados os dois conceitos individualmente, é chegada a hora de relacioná-los.
Se a Ecologia Humana se concentra nas relações mútuas estabelecidas entre o homem e o seu meio-ambiente, é bastante óbvio que podemos conceber o tema estresse ocupacional como estando circunscrito na disciplina da Ecologia Humana e, portanto podendo perfeitamente ser relacionado ou explicado sob a ótica da mesma.
Ora, desde o século XVIII o homem vem construindo esse ambiente organizacional altamente industrializado que a cada dia que passa fica mais e mais informatizado, sem falar do ambiente urbano que sempre o acompanhou. Agora esse homem sofre as conseqüências dessa sociedade com tecnologia de ponta nas suas indústrias e sua livre concorrência de mercado. O acúmulo de tarefas, a jornada de trabalho excessiva e a pressão para atingir metas estão entre os fatores que podem desencadear a doença mais popular do século XX e que promete ainda mais para o século XXI: o estresse.
As pessoas que mais sofrem com o estresse são definitivamente os trabalhadores, é aí que o chamamos de estresse ocupacional. Segundo pesquisa da International Stress Management Association (Isma), 70% dos brasileiros sofrem de estresse, porcentagem semelhante a de países como Inglaterra e Estados Unidos ("Mal atinge 70% dos trabalhadores brasileiros", Jornal O Liberal, Belém, 6 de setembro de 2004, Caderno Painel).
Os ambientes "naturais" de quais são tiradas vantagens e aqueles propriamente construídos pelos homens (no presente caso os ambientes organizacionais) promovem um feedback na sua relação com o homem e provocam danos à saúde dos trabalhadores como perda de apetite, insônia, irritabilidade, dificuldade de concentração, distúrbios de memória, depressão e os mais variados sintomas psicossomáticos, como dificuldade respiratória e dor de cabeça.
Numa época de intensa competitividade, tanto entre organizações quanto entre profissionais, muitas pesquisas sobre o tema do estresse ocupacional têm sido realizadas. Esse fato deve-se provavelmente ao impacto negativo do estresse ocupacional na saúde e no bem-estar dos empregados e, conseqüentemente, no funcionamento e na efetividade das organizações. Na economia, o impacto negativo dessa variável tem sido estimado com base na suposição e nos achados de que trabalhadores estressados diminuem seu desempenho e aumentam os custos das organizações com problemas de saúde, com o aumento do absenteísmo, da rotatividade e do número de acidentes no local de trabalho (Jex, 1998).

É muito provável que as patologias associadas à atividade de trabalho apresentem um maior índice de incidência em países em desenvolvimento como o nosso, ainda mais quando nos damos conta de que programas de manejo de estresse ocupacional (reconhecidos por promoverem a segurança e saúde do trabalhador, manter os níveis de produtividade organizacional e reduzir custos com seguros de saúde e indenizações para o poder público) são raramente oferecidos pelas organizações para os seus funcionários. (Hurrel & Murphy, 1996; Ivancevich & cols., 1990).
Nunca poderíamos falar de estresse ocupacional e suas mais prováveis influenciadoras variáveis ambientais sem mencionar a Síndrome de Burnout. De acordo com Oliveira1, o termo de origem inglesa burnout designa "algo que deixou de funcionar por exaustão de energia".
O conceito de Burnout surgiu nos Estados Unidos em meados dos anos 70, para dar explicação ao processo de deterioração nos cuidados e atenção profissional nos trabalhadores de organizações.
De acordo com Salomão Kahwage Neto (autor do artigo "Síndrome do Desgaste Profissional" do dia 1º de janeiro de 2005 do Caderno Atualidades do Jornal O Liberal), alguns sintomas são comuns da Síndrome:
- Manifestações emocionais: falta de realização pessoal, tendências a avaliar o próprio trabalho de forma negativa, sentimentos de vazio, esgotamento, fracasso, impotência e baixa auto-estima. É freqüente irritabilidade, inquietude, dificuldade para a concentração, baixa tolerância à frustração, comportamento agressivos para com os clientes, companheiros e para com a própria família.
- Manifestações físicas: como qualquer tipo de estresse, a Síndrome de Burnout pode resultar em transtornos psicossomáticos. Estes, normalmente se referem à fadiga crônica, freqüentes dores de cabeça, problemas com o sono, úlceras digestivas, hipertensão arterial, arritmias cardíacas, perda de peso, dores musculares e de coluna, etc.
- Manifestações comportamentais: consumo aumentado de café, álcool, fármacos e drogas ilegais, absenteísmo, baixo rendimento pessoal, distanciamento afetivo dos clientes e companheiros, aborrecimento constante, impaciência e irritabilidade, freqüentes conflitos interpessoais no ambiente de trabalho e dentro da própria família, incapacidade de concentração e sentimentos depressivos.
Entre os profissionais mais acometidos dos males da Síndrome de Burnout encontram-se policiais, médicos, enfermeiras e professores, bem como terapeutas ocupacionais, psicoterapeutas e bombeiros.
Policiais, em especial, são uma categoria que lida com o estresse extremo todos os dias, em serviço ou de folga, e recebem salários que não condizem com suas responsabilidades.
A assistente social Verônica Couto coordenou uma pesquisa sobre o perfil da atividade policial civil no Estado do Pará. A pesquisa mostrou que "97% dos policiais civis já foram acometidos de doenças graves, muitas delas provocadas por fatores como o estresse, o nervosismo e a insegurança profissional. Entre os entrevistados, 9% desenvolveram doenças mentais, 21% sofreram traumas físicos, 8% têm hipertensão e 14% têm gastrite ou úlcera, além de outras doenças, citadas em 36% das fichas funcionais. Outros 31% apresentaram ocorrência de alto estresse no trabalho e 13% já haviam precisado se afastar das funções para tratamento médico. Segundo a Delegacia Geral de Polícia Civil, quase 1,5 mil policiais civis procuraram tratamento psicológico no ano passado e 305 tiveram que ir ao psiquiatra no mesmo período" (Almeida, Jaqueline. "Pressão e riscos deixam a polícia doente", Jornal "O Liberal", Belém, 26 de junho de 2005, Caderno Polícia).
Outro profissional bastante atingido pelo estresse ocupacional é o motorista de ônibus. Esta é a segunda atividade profissional mais estressante no Brasil. Esta foi a constatação do segundo estudo sobre as profissões mais desgastantes no país realizado pela International Stress Management Association ("Estresse no trânsito afeta motoristas", Jornal O Liberal, Belém, 27 de maio de 2004, Caderno Automóvel).
Esse fato deve-se provavelmente à falta de planejamento do espaço viário das grandes cidades, o que acaba tornando-se um dos principais fatores responsáveis pelo surgimento do estresse nessa categoria.
Engarrafamentos quilométricos diários, poluição sonora passando dos limites, calor causado tanto pelos fatores climáticos como pelos motores sem vedação no interior dos veículos e pressões para cumprir os horários estabelecidos pelas empresas de ônibus: esse é o retrato do ambiente de trabalho de um motorista de ônibus no Brasil. Como fugir do estresse provocado por essas características do seu ambiente ocupacional? O psicólogo especialista em trânsito, Carlos Valente, destaca "O ideal era que todos trabalhassem em ônibus com ar-condicionado, isolamento acústico e bancos ergométricos. É importante também que as empresas invistam cada vez mais em equipes de recursos humanos que disponham de psicólogos e assistentes sociais para acompanhar a rotina de seus profissionais".



CONSIDERAÇÕES FINAIS

Fica clara a complexidade e a interdisciplinariedade persistente de que fala Machado (1984) na sua "quinta concepção" sobre a Ecologia Humana. Pudemos relacioná-la, mostrar que ela existe, que está presente num assunto onde predominam estudos realizados por profissionais da saúde como psicólogos, médicos, terapeutas ocupacionais e assistentes sociais. O estresse ocupacional se mostra cada vez mais para a humanidade como um dos males mais perniciosos à saúde do homem do novo século. Esse homem altamente informado, atualizado e aliado às tecnologias de ponta e que, ao mesmo tempo, sucumbe pouco a pouco à sua necessidade de labutar e labutar para despontar no mercado selvagem de trabalho.
Haja vista que este estudo tenha sido realizado essencialmente por pesquisas bibliográficas sobre o estresse ocupacional e Ecologia humana, fica aqui registrada a intenção de se realizar posteriormente um estudo mais abrangente com a devida manipulação de variáveis sobre este interessante assunto de policiais ou motoristas de ônibus como vítimas do estresse ocupacional.
E dizem que "o trabalho dignifica o homem"...























BIBLIOGRAFIA


? ARAUJO, Tânia Maria de, GRACA, Cláudia Cerqueira e ARAUJO, Edna. Estresse ocupacional e saúde: contribuições do Modelo Demanda-Controle. Ciênc. saúde coletiva, 2003, vol.8, no.4, p.991-1003. ISSN 1413-8123.
? BENNETT, J.W. The ecological transition: Cultural anthropology and human adaptation. Pergamon Press Inc., New York, 1976.
? BERNARD, L.L. "A Classification of Environments". In The American Journal of Sociology, julho de 1925, p. 318-332.
? BERTALANFFY, L. von. General System Theory. George Braziller Inc., New York, 1975.
? BOAS, F. The limitations of the comparative method of anthropology. Science 4. Reprinted in High points in anthropology, 2d ed., P.Bohannan and M.Glazer, eds, 85-93. Alfred A. Kopf, New York, 1896.
? BROWNER, C. H. Job stress and health: The role of social support at work. Research in Nursing and Health, 10(1), 93-100, 1987.
? CARAYON, P., SMITH, M.J. & HAIMS, M.C. Work organization, job stress, and work-related musculoskeletal disorders. Human Factors, 41, 644-663, 1999.
? EDWARDS, J. R. A cybernetic theory of stress, coping, and well-being in organizations. The Academy of Management Review, 17(2), 238-274, 1992.
? HEIMSTRA, Norman W. & McFARLING, Leslie H. Psicologia Ambiental. E.P.U. EDUSP, São Paulo, 1978
? HONIGMANN, J.J The development of anthropological ideas. The Dorsey Press, Homewood, IL, 1976.
? HURRELL, J.J. & MURPHY, R.L. Occupational stress intervention. American Journal of Industrial Medicine, 29, 338-341, 1996.
? IWATA, N. & SUZUKI, K. Role stress ? mental health relations in Japanese bank workers: a moderating effect of social support. Applied Psychology: An International Review, 45(2), 207-218, 1997.
? JEX, S. M. Stress and job performance. London: Sage Publications, 1998.
? KORMONDY, E.J. & BROWN, D.E. Ecologia Humana. Ed Atheneu, São Paulo, 2002.
? LAZARUS, R. S. Psychological stress in the workplace. Em R. Crandall, & P. L. Perrewé (Orgs.), Occupational stress: a handbook (pp. 3-14). Washington, USA: Taylor & Francis, 1995.
? MACHADO, Paulo A. Ecologia Humana. Ed. Cortez, São Paulo. CNPq, Brasília. Ed. Autores Associados, São Paulo, 1984
? MORIN, E. La Méthode ? Tome I ? "La Nature de la Nature. Ed. Du Seuil, Paris, 1977.
? MURTA, Sheila Giardini e TROCCOLI, Bartholomeu Torres. Avaliação de intervenção em estresse ocupacional. Psic.: Teor. e Pesq., jan./abr. 2004, vol.20, no.1, p.39-47. ISSN 0102-3772
? OLIVEIRA, JR. A Síndrome de burnout nos cirurgiões-dentistas de Porto Alegre - RS [tese]. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 2001.
? PARK, R.E. "Human Ecology". In The Am. J. Sociology, vol. XLII, nº 1, julho 1936, p. 1-15.
? PASCHOAL, T. & TAMAYO, A. Validação da Escala de Estresse no trabalho. Estudos de Psicologia, 9(1), 45-52, 2004.
? PASCHOAL, Tatiane e TAMAYO, Álvaro. Validação da escala de estresse no trabalho. Estud. psicol. (Natal), jan./abr. 2004, vol.9, no.1, p.45-52. ISSN 1413-294X.
? PASCHOAL, Tatiane e TAMAYO, Alvaro. Impacto dos valores laborais e da interferência família: trabalho no estresse ocupacional. Psic.: Teor. e Pesq., maio/ago. 2005, vol.21, no.2, p.173-180. ISSN 0102-3772.
? SILVEIRA, Núbia de Mesquita, VASCONCELLOS, Silvio José Lemos, CRUZ, Leila Poitevin et al. Avaliação de burnout em uma amostra de policiais civis. Rev. psiquiatr. Rio Gd. Sul, maio/ago. 2005, vol.27, no.2, p.159-163. ISSN 0101-8108
? TAMAYO, A. Prioridades axiológicas, atividade física e estresse ocupacional. Revista de Administração Contemporânea, 5(3), 127-147, 2001.
? VAYDA, A. P. & RAPPAPORT, R. Ecology, cultural and noncultural. In Introduction to cultural anthropology, J. Clifton, ed., 477-97. Houghton Mifflin Company, Boston, 1968
? WIRTH, L. "Human Ecology". In The American Journal of Sociology,vol. 50 nº 6, maio 1945, p. 438-488.