RELAÇÃO EXISTENTE ENTRE PSICOMOTRICIDADE E APRENDIZAGEM:

UMA VISÃO PSICOPEDAGÓGICA

 

Greice Herédia dos Santos Moura

Resumo: O presente artigo apresenta uma analise feita sobre a Psicomotricidade e a Aprendizagem. O objetivo da pesquisa é descobrir o que há de relevante no registro bibliográfico sobre a relação existente entre as habilidades motoras e o desenvolvimento cognitivo, verificando a hipótese levantada de ser o corpo um fator que limita ou possibilita a aprendizagem. Trata-se de uma pesquisa bibliográfica que busca uma maior conscientização e ampliação de conhecimentos teóricos sobre a temática, contribuindo para uma prática educacional e psicopedagógica mais fundamentada cientificamente, visando um trabalho preventivo ou reeducativo de qualidade.

Palavras chave: Psicomotricidade.  Aprendizagem. Psicopedagogia.

RELATION EXISTENT BETWEEN PSYCHOMOTRICITY AND LEARNING: a vision psychopedagogical

Abstract: This article presents an analysis made on the Psychomotor and Learning. The objective of the research is to find out what's relevant in the bibliographic record of the relationship between motor skills and cognitive development, verifying the hypothesis of being the body a factor that limits or enables learning. It is a literature that seeks greater awareness and expansion of theoretical knowledge on the subject, contributing to educational and pedagogical practice more scientifically based, seeking a preventive or re-education of quality.

Key-words: Psychomotricity. Learning. Psychopedagogy.

A Psicomotricidade como ciência estuda as relações e influências recíprocas entre o corpo e a psique, de um indivíduo que é total nas suas múltiplas e complexas manifestações biopsicossociais, afectivo-emocionais e psicosóciocognitivas. Parte da ideia que para dar conta do mundo em transformação e adaptar-se a ele, os recursos de que a criança dispõe, primeiramente, são as condutas motoras. A inteligência não é exclusivamente racional, pois antes que surjam as primeiras representações mentais, já se manifestou a inteligência corporal, que serve de apoio para o pensamento estruturar-se. (FREIRE, 1997)

Baseando-se nesta hipótese, o presente artigo de natureza bibliográfica, apresentará os tópicos de modo a proporcionar ao leitor uma sequencia lógica e um crescendo no conhecimento da temática “Psicomotricidade”. Por último, veremos a relação entre o desenvolvimento psicomotor e a aprendizagem.

Breve panorama histórico da Psicomotricidade

 

O termo “psicomotricidade” aparece a partir do discurso médico na área de neurologia. Entretanto a relação entre o corpo e a mente, como pressupõe a terminologia deste termo, vem desde que o homem surgiu fazendo uso de uma mente que pensa, sente e fala sobre o seu corpo. (LEVIN, 1995)

Segundo Levin (1995), foi a partir do século XX que a psicomotricidade passou a ser vista como uma prática independente, fruto de um longo processo, contemporâneo dos trabalhos de Dupré. Foi ele “quem definiu com rigor, baseado em estudos clínicos, a debilidade motora, a instabilidade, e isolou perturbações tais como os tiques, as sincinesias, as paratonias” (COSTE, 1992, p. 14), estando estas desvinculadas de uma lesão ou dano extrapiramidal, que tornam inábeis e desajeitados esses indivíduos na vida cotidiana, na execução de movimentos delicados, rápidos ou complicados.

A partir desse momento muitos teóricos e seus estudos contribuíram para a consolidação e fundamentação da Psicomotricidade como ciência, adquirindo esta sua própria especificidade e autonomia. Destacamos aqui Piaget (1968), que em seus estudos sobre a cognição humana, descreve a importância do corpo e da ação deste sobre o mundo no desenvolvimento da inteligência. Henry Wallon que, em 1925, ocupa-se do movimento como um instrumento na construção do psiquismo, relacionando-o as emoções, ao meio ambiente e aos hábitos da criança (OLIVEIRA, 1996). Ajuriaguerra, cujos estudos continuam sendo um referencial:

...definiu com precisão certos aspectos menos claros da obra de Henry Wallon, enfatizando, por exemplo, a função central de comunicação do tono (o diálogo tônico). Por outro lado, aperfeiçoou um método de relaxação em que os fatores relacionais, utilizados e analisados com a ajuda de conceitos psicanalíticos, desempenham um papel determinante na progressão da cura (a reeducação psicotônica). (COSTE, 1992, p. 16)

Outros estudiosos contemporâneos trazem contribuições para a Psicomotricidade, dentre estes destacamos Le Boulch, Freire e Fonseca. Le Boulch (1984) fala em educação pelo movimento, ou seja, a aprendizagem cognitiva e socioafetiva tendo como intermediário o corpo em movimento. Freire (1991) inclui a educação do movimento como forma de aperfeiçoamento das habilidades psicomotoras para uma melhor performance na esfera escolar. Fonseca (1988) “toma por base os estudos de Piaget para analisar as operações como um conjunto de coordenações, de ações organizadas segundo uma lógica e uma intenção de movimentos (significativos)”. (OLIVEIRA, 1996, p. 179)

Ao discorrer sobre a história da Psicomotricidade podemos especificar, segundo Levin (1995, p. 32) diferentes transições:

Do motor ao corpo, e deste ao sujeito com um corpo em movimento. Já não é possível confundir o corpo com o sujeito, ou o sujeito com o corpo. Eles não são sinônimos, nem tampouco equivalentes, e é justamente porque tampouco podem ser desamarrados um do outro que a psicomotricidade é nomeada e, portanto, existe.

Essas transições descritas por Levin ocorrem não apenas no aspecto histórico, mas também nas esferas da prática psicomotora e os questionamentos que essa foi gerando acerca de um sujeito que chega provido de um mente e um corpo que se relacionam.

 

Habilidades psicomotoras

 

Como podemos perceber através da história da Psicomotricidade, o ser humano é complexo, provido e funcionando através da relação harmônica entre corpo, intelecto, emoções e com estes mantendo relacionamento com o mundo, tanto influenciando como sendo influenciado. Segundo Fonseca (2010, 42) a Psicomotricidade é o campo que investiga essas “relações e as influências recíprocas e sistêmicas, entre o psiquismo e o corpo, e, entre o psiquismo e a motricidade, emergentes da personalidade total, singular e evolutiva que caracteriza o ser humano”.

Veremos a seguir as peculiaridades de cada uma das habilidades motoras, tão importantes para o desenvolvimento psicomotor.

Coordenação global, fina e óculo-manual

Segundo Oliveira (1997), a coordenação global diz respeito ao trabalho dos grandes músculos do corpo e depende do ajustamento postural e equilibração do indivíduo. Boulch concorda com este ao afirmar:

Toda praxia supõe a atuação de um conjunto de contrações musculares de caráter fásico, coordenadas em função do objetivo a ser alcançado. Entretanto, esse aspecto dinâmico da praxia, que é sua manifestação mais evidente, só é possível graças ao acompanhamento tônico do qual dependem o ajustamento postural e as reações de equilibração (...) As regulações posturais e de equilibração estão constantemente implicadas na coordenação dinâmica geral. (BOULCH, 1987, p. 134-135)

Quanto maior o ajustamento postural e a capacidade de equilibração, mais coordenada a ação do sujeito e menos esforço despenderá para realizar a atividade utilizando-se ou não, conforme a necessidade, da dissociação dos movimentos. Correr, saltar, sentar e outros são exemplos de atividades que dependem da coordenação global e destes ajustamentos. (OLIVEIRA, 1997)

A coordenação fina diz respeito a destreza e habilidade manual. Oliveira (1997) diz que uma destreza nos dedos das mãos facilita a aquisição de novos conhecimentos. Para ele é através da preensão que a criança descobre o mundo a sua volta. Mas acrescenta “só possuir uma coordenação fina não é suficiente. É necessário que haja também um controle ocular” (OLIVEIRA, 1997, p. 43), que seria os olhos acompanhando a manipulação. Esse controle ocular é a coordenação óculo-manual, tão importante para o desenvolvimento da escrita e para que se tenha precisão nos gestos executados.

Esquema corporal

Para Wallon (1968) o esquema corporal é um elemento básico indispensável para a construção da personalidade do indivíduo, sendo esta a representação relativamente global, científica e diferenciada que a criança tem de seu próprio corpo.

Segundo Boulch (1987, p. 177) essa estrutura é que irá globalizar e unificar as informações vindas do corpo, sendo, portanto, “a base fundamental da função de ajustamento e o ponto de partida necessário de qualquer movimento”. Esse ajustamento, depende da “função de interiorização, isto é, de uma forma de atenção perceptiva centrada no próprio corpo” que é facultativa, e que vai permitir a conscientização do esquema corporal. Este autor divide o desenvolvimento do esquema corporal em três etapas que, se devidamente estruturado, seguirá aproximadamente a seguinte ordem cronológica conforme as idades:

- Corpo Vivido (de 0 a 3 anos): corresponde a fase de desenvolvimento cognitivo sensório-motor descrita por Piaget, onde a criança descobre o mundo e seu corpo inserido no espaço através da pura experimentação. Neste período, a criança não percebe seu corpo separado do espaço, portanto esta fase só terminará quando esta identificar a imagem do seu corpo como sendo o próprio Eu, fazendo a separação deste do mundo a sua volta pela ação e aquisição das habilidades motoras. (OLIVEIRA, 1996)

- Corpo Percebido (de 3 a 7 anos): corresponde a fase de desenvolvimento cognitivo pré-operatório descrito por Piaget, onde a criança passa a criar uma imagem mental daquilo que já experimentou através de seu corpo. Nesta fase a criança organiza seu esquema corporal a partir da maturação da função de interiorização, dessa forma desenvolve a imagem mental de seu próprio corpo. Segundo Oliveira (1996, p. 59) essa função permite a criança ações pensadas, o que “propicia um maior domínio do corpo, culminando em uma maior dissociação dos movimentos voluntários”. Com isso a criança aprimora seus movimentos deixando-os mais coordenados dentro de um espaço e tempo determinados.

- Corpo Representado (7 a 12 anos): Corresponde a fase de desenvolvimento cognitivo Operatório Concreto descrito por Piaget, onde a criança adquire o pensamento lógico. Nesta fase o esquema corporal está estruturado, a criança já possui a imagem mental completa do seu corpo como um todo e de suas partes. Consegue, portanto, movimentar-se no espaço com o completo domínio das habilidades psicomotoras.

Lateralidade

Lateralidade é a escolha que um indivíduo faz em utilizar preferencialmente um lado do corpo para iniciar e executar a ação principal, enquanto o outro lado o auxilia, complementando esta ação. Esse lado dominante irá apresentar uma maior força muscular, precisão, destreza e rapidez. São três os níveis de dominância, mão, pé e olho.

Correspondendo a dados neurológicos, mas também influenciada por certo hábitos sociais,.as dominâncias podem ser dos tipos: Destro, o indivíduo com dominância pelo lado direito. Canhoto, o indivíduo com dominância pelo lado esquerdo do corpo. Ambidestro, o indivíduo que desenvolveu a dominância espontânea pelos dois lados do corpo. Quando a criança contraria sua tendência natural e passa a utilizar seu lado não dominante em detrimento do outro desenvolve o que conhecemos como lateralidade cruzada, o que prejudicará seu desenvolvimento motor e, consequentemente, o cognitivo.

Uma lateralidade bem definida é importante esta é a “base da estruturação espacial e é através dela que uma criança se orienta no mundo que a rodeia” (OLIVEIRA, 1997, p. 74), estando apta para identificar não apenas os conceitos de direita e esquerda, mas para tirar conclusões sobre o seu corpo em relação ao espaço, seu corpo em relação aos objetos, dos objetos no espaço e dos objetos entre si.

Estruturação Espacial

A estruturação espacial é a tomada de consciência da situação do seu corpo em relação ao espaço e o que nele contém, e dos objetos entre si. Esta habilidade deve permitir ao sujeito organizar-se perante o mundo circundante e movimentar-se, organizar as coisas entre si e movimentá-las. (MEUR & STAES, 1989)

Boulch (1987, p. 223) diz que para que a criança possa desenvolver sua estruturação espacial deve ter desenvolvido sua dominância lateral estável, conforme descrevemos acima, e dispor de uma imagem estática do corpo operatório, dessa maneira “estará apta a reproduzir mentalmente seu corpo de acordo com três eixos: alto-baixo, frente-atrás, direita-esquerda. O corpo será então um fator de referência e de orientação, permitindo a estruturação do espaço circundante”.

A estruturação espacial é, portanto, uma elaboração mental construída através da experimentação motora do sujeito em relação aos objetos que estão situados no espaço. É através desse espaço e dessas relações estabelecidas, que somos capazes de fazer observações, inferências, comparações, combinações, classificações, generalizações e abstrações em relação a tudo o que nos cerca, conceitos, esses, tão necessários a nossa sobrevivência no mundo e a aprendizagem matemática e da escrita como afirma Oliveira (1997, p. 74-75):

A aritmética lida com o fenômeno do agrupamento e para isto é necessário que tenha sido desenvolvida a noção espacial, visto que os objetos só existem dentro de um espaço determinado. (...) muitas da atividades realizadas em sala de aula, como a escrita, dependem da manipulação das relações espaciais entre os objetos. As relações espaciais, por sua vez, são mantidas por meio do desenvolvimento de uma “estrutura” de espaço.

Estruturação Temporal

A estruturação temporal é a capacidade do corpo de situar-se em função do tempo, onde os principais conceitos que as crianças precisam adquirir para desenvolver esta habilidade são a simultaneidade, a ordem e a sequencia em relação a uma série de eventos (antes, depois, durante), a duração dos intervalos (curto, longo, acelerado, demorado, rápido, lento), a renovação cíclica (dias, meses, anos, semanas, estações), o ritmo e a percepção do caráter irreversível do tempo. (MEUR & STAES, 1989)

Não podermos conceber a ideia de espaço sem abordar a noção do tempo, estes são indissociáveis. Oliveira (1997, p. 85-86) declara:

As noções de corpo, espaço e tempo têm que estar intimamente ligadas se quisermos entender o movimento humano. O corpo coordena-se, movimenta-se continuamente dentro de um espaço determinado, em função do tempo, em relação a um sistema de referência.

Esta é uma habilidade que a criança precisa construir, exigindo um esforço maior, pois requer uma abstração maior do pensamento, visto que o conceito de tempo seja muito subjetivo.

Discriminação visual e auditiva

Quando falamos sobre discriminação visual e auditiva devemos ter em mente que isto de difere de acuidade, ou seja, da capacidade de ouvir e ver com precisão por possuir um aparelho sadio. A discriminação tem a ver com a intencionalidade e o controle que o sujeito faz desses aparelhos no sentido de ajudá-lo em suas tarefas motoras, sociais e cognitivas como, ler, escrever, locomover-se, conversar com outras pessoas entendendo o que ouve e se fazendo entender.

Esses aparelhos amadurecem juntamente com o sistema nervoso do indivíduo, entretanto para que essa habilidade de construa “é necessário construir um padrão de impulsos neurológicos que a capacitará a controlar esse mecanismo com precisão” (OLIVEIRA, 1997, p. 100).

Relação entre psicomotricidade e aprendizagem

 

No decorrer de nosso estudo nos deparamos com teóricos que apontam a importância do corpo na aquisição do conhecimento. Surge então, neste momento a seguinte questão: Qual a relação existente entre a psicomotricidade e a aprendizagem ou a não-aprendizagem?

Os transtornos psicomotores correspondem não apenas a funções neurológicas congênitas, mas também a funções psíquicas, além de um atraso no desenvolvimento das funções neuropsicológicas, causada por fatores exógenos como a falta de interação do sujeito com o meio, o que prejudicaria o processo de mielinização[2], ou uma crença negativa acerca do que se é capaz de criar através de seu corpo. Isso provoca problemas afetivos e, também, problemas de aprendizagem. (PORTO, 2011; OLIVEIRA, 1997)

Pain (1985, p. 70) fala de um corpo como fator que limita ou possibilita a aprendizagem. O sujeito constrói sua auto-eficácia, sua auto-imagem a partir de um corpo pelo serviço que presta, pelo que este lhe possibilite realizar. “O organismo é possibilidade, mas também limite; o limite produz dependência caso não seja compensado adequadamente em outros níveis da competência”.

A educação psicomotora é, portanto de grande importância e serve como base para as aprendizagens escolares. Uma criança precisa experimentar tudo o que é capaz de fazer com seu corpo, a partir do momento em que nasce, pois este naquele momento é tudo o que ela tem para utilizar de modo a se apropriar do mundo que a cerca. Através dessa experimentação ela alcançará os pré-requisitos para a aquisição da leitura, da escrita, da aritmética e todas as outras aprendizagens formais.

Segundo Porto (2011, p. 64), para a criança conquistar a leitura e a escrita é necessária a ação conjunta das seguintes habilidades:

a)    discriminação auditiva;

b)    composição e decodificação dos sons;

c)    discriminação visual;

d)    organização e orientação dos elementos no espaço;

e)    sequencia temporal;

f)     coordenação dos movimentos finos;

g)    conhecimento e controle do próprio corpo;

h)    noção de lateralidade.

Como podemos perceber, todos as habilidades citadas são de âmbito psicomotor. Oliveira (1996), Meur & Staes (1989), Boulch (1987), Freire (1997), Pain (1985) também apontam as estruturas psicomotoras como condições mínimas necessárias para uma boa aprendizagem.

É necessário que a criança tenha domínio do seu corpo, de seus gestos, de seu tônus para conseguir antecipar e intencionalizar suas ações de aprendizagem. Ao usar as mãos para a construção da escrita, por exemplo, será preciso uma boa coordenação motora fina, uma pega no lápis adequada, um tônus equilibrado, uma dissociação dos movimentos do braço, pulso e mão, uma coordenação óculo-manual adequada para acompanhar essa escrita e leitura.

Frequentemente as desordens específicas na aprendizagem encontram-se ligadas a uma indeterminação na lateralidade do sujeito. “A dificuldade de orientação e o problema de leitura não passam de dois sintomas ligados à mesma causa” (BOULCH, 1987, P. 33). A criança quando não possui sua lateralidade bem definida, não deixa apenas de distinguir a esquerda e a direita, ela é incapaz de seguir a direção gráfica ao fazer uma leitura ou escrita, poderá apresentar a escrita espelhada, não terá precisão e rapidez ao executar os exercícios propostos por falta de especialização em um dos lados do corpo, apresentará sincinesias e consequentemente terá dificuldades na estruturação espacial, já que estas habilidades estão intimamente ligadas.

Diante das dificuldades na estruturação espacial, a criança na escola não será capaz de orientar-se e orientar sua escrita e leitura. Apresentará confusão na ordem das palavras e dos símbolos gráficos, não conseguirá discriminar esses símbolos, montar cálculos nas fileiras do QVL (quadro-valor-lugar), além de se tornar dispersa pela falta da internalização do ambiente a sua volta.

Os problemas quanto à estruturação temporal acarretam confusão da criança na ordenação das sílabas em uma palavra, dos fatos em uma narrativa, da análise gramatical, falta de ritmo ao fazer uma leitura e falta de organização do uso do tempo na realização das atividades escolares.

Segundo Boulch (1987, p. 35) “seria limitar a importância da educação psicomotora o reduzi-la a um simples meio de prevenir as dificuldades de aprendizado da leitura”. Os problemas que surgem pela falta de estruturação espaciotemporal desempenham um papel fundamental na gênese das dificuldades em matemática. O trabalho psicomotor tem portanto o dever...

De fazer com que a criança passe da etapa perceptiva à fase da representação mental de um espaço orientado tanto no espaço como no tempo. (...) As ações coletivas que se desenvolvem em áreas amplas favorecem, evidentemente, a colocação de problemas concretos de espaço, cujas soluções anteriormente vividas, transpostas depois para o plano simbólico, servirão mais tarde de apoio à entrada da fase das operações formais. Neste nível de abstração, abandonaremos então o terreno psicomotor para ingressar no domínio da inteligência lógica. (BOULCH, 1987, p. 35 e 36)

Quanto ao esquema corporal, visto ser este o resumo internalizado de todas as outras habilidades, quando mal constituído, resulta em uma falta de coordenação e equilíbrio dos movimentos. A criança se atrasa em suas tarefas, não consegue respeitar as margens do caderno, não consegue estruturar um texto com a pontuação e armar contas matemáticas além de apresentar problemas de relacionamento com colegas e professores devido à falta de conhecimento do “eu”.

Considerações finais

 

Muitas das dificuldades apresentadas pelos alunos poderiam se sanadas facilmente na escola se o professor estivesse mais atento e consciente de sua responsabilidade e das necessidades desses alunos. O indivíduo é indissociável nas suas múltiplas e complexas manifestações entre o corpo e a psique, e precisa-se de um olhar sistêmico e multifatorial sobre este.

A Psicomotricidade, como campo que investiga essas relações, parte da ideia de que são as condutas motoras que irão dar suporte para o desenvolvimento cognitivo estruturar-se, sendo o corpo um fator que limita ou possibilita a aprendizagem.

A educação psicomotora, portanto, deve ser considerada como a base da educação nas séries iniciais, e o ponto de apoio nas séries seguintes, bem como área de investigação minuciosa do indivíduo na clínica psicopedagógica. Visto que a criança não conduz as aprendizagens escolares de modo satisfatório se não tiver tomada a consciência de seu corpo e estruturado suas habilidades psicomotoras.

REFERÊNCIAS

 

BOULCH, Le. Educação psicomotora: A psicocinética na idade escolar. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 1987.

COSTE, J. C. A Psicomotricidade. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1992.

FONSECA, Vitor da. Psicomotricidade: uma visão pessoal. Constr. psicopedag. [online]. 2010, vol.18, n.17, p. 42-52. ISSN 1415-6954.

FREIRE, J. B. Educação de corpo inteiro: Teoria e prática da Educação Física. São Paulo: Scipione, 1997.

LEVIN, S. A Clínica Psicomotora: o corpo na linguagem. 6. ed. Petrópolis: Vozes, 1995.

MEUR, A de; STAES, L. Psicomotricidade:educação e reeducação. São Paulo: Manole, 1989.

OLIVEIRA, G. C. Contribuições da psicomotricidade para a superação das dificuldades de aprendizagens. In: SISTO, F. F. Atuação psicopedagógica e aprendizagem escolar. Petrópolis: Vozes, 1996.

OLIVEIRA, G. C. Psicomotricidade: educação e reeducação num enfoque psicopedagógico. 9. Ed. Petrópolis: Vozes, 1997.

PAIN, S. Diagnóstico e tratamento dos problemas de aprendizagem. 4. ed. Porto Alegre: Artmed, 1992.

PORTO, O. Bases da Psicopedagogia: Diagnóstico e Intervenção nos problemas de aprendizagem. 5. ed. Rio de Janeiro: Wak, 2011.

WALLON, H. Évolution psychologique de l’efant. Paris: COLIN, 1968.



[1] Graduada em Pedagogia pelo UNASP – Centro Universitário Adventista de São Paulo. Pós-graduada em Psicopedagogia Institucional e Clínica no UNASP e Aconselhamento Educacional e Familiar pelo UNASP. E-mail: [email protected]

[2] A velocidade dos impulsos nervosos se faz através do revestimento da bainha de mielina encontrada nas fibras nervosas. A criança nasce com a bainha de mielina por fazer, ou melhor, “com o seu sistema nervoso por (e para) aprender!” (FONSECA E MENDES, 1987, apud OLIVEIRA, 1997, p. 18)