Situado no final da Idade Moderna, onde uma das preocupações centrais dos pensadores era de como se dava o conhecimento verdadeiro, o filósofo alemão Immanuel Kant, que "preparava o terreno" para o surgimento da Idade Contemporânea, questionava-se quanto à possibilidade de ocorrer este conhecimento. Nem defensor da corrente empirista, nem adepto da corrente racionalista, este autor inova a teoria do conhecimento e inaugura uma nova corrente: o criticismo. Com este método utilizado em sua filosofia, Kant se convence de que é possível chegar a um conhecimento verdadeiro.

Para ele o centro do conhecimento não são os objetos como queriam os autores pré-cartesianos, nem mesmo o sujeito solipsista de Descartes, mas é o sujeito transcendental. Ao propor este sujeito como o centro do conhecimento, Kant realiza uma verdadeira "Revolução Copernicana" no conhecimento. Assim, o objeto passa a ser determinado pelo sujeito, e não mais o sujeito é orientado pelo objeto como queria a tradição filosófica.

É em sua principal obra, "A Crítica da Razão Pura", que este pensador discorrerá mais detalhadamente sobre a questão do conhecimento. Nesta obra, ele se coloca a examinar os limites da razão teórica e a estabelecer os critérios para determinar um legítimo conhecimento. Para isto utiliza-se da filosofia transcendental, que é onde se encontra o cerne da teoria do conhecimento de Kant. Diz ele:

Denomino transcendental todo conhecimento que em geral se ocupa não tanto com objetos, mas com o nosso modo de conhecer objetos na medida em que este deve ser possível a priori. Um sistema de tais conceitos denominar-se-ia filosofia transcendental.[1]

Kant sente-se despertado pelo inglês David Hume do "sono dogmático" em que se encontrava. Comungando do pensamento dos demais empiristas, o filósofo inglês defendia que todas as idéias sobre o real tinham sua origem na experiência sensível. E este "dogmatismo" de que fora despertado consistia na razão não analisar a sua própria capacidade de conhecer as coisas. É justamente a partir do caminho trilhado por Hume que o pensador alemão formulará a sua reflexão sobre o conhecimento. Entretanto, Kant desvincula-se em partes do empirismo proposto pelo inglês.

Kant concebe que é a partir da experiência que se dará o início de todo o conhecimento. Num primeiro momento, aquilo que se recebe pelos sentidos forma por si próprio representações no intelecto do conhecedor. Diferentemente do que se pensa a primeira vista, apesar de todo o conhecimento ter sua gênese na experiência, isto não significa dizer que todo ele origine-se da mesma.

Depois de dada esta explicitação a respeito da relação entre experiência e conhecimento, Kant apresenta os seguintes conceitos essenciais de sua filosofia: os conhecimentos a priori e os a posteriori. O primeiro tipo, os conhecimentos a priori – também designados juízos analíticos –, independem de qualquer experiência. Estes se subdividem em: a priori (onde a proposição é pensada ao mesmo tempo que a sua necessidade) e os apriori puros (são proposições necessárias e universais as quais nada de empírico está mesclado). Já o segundo tipo, os conhecimentos a posteriori – que recebem igualmente o nome de juízos sintéticos –, têm sua fonte na experiência. Sendo assim, entende-se que este tipo de conhecimento somente se dá no espaço e no tempo, pois é empírico.

Ao que se vê, no pensamento kantiano há espaço para se pensar conhecimentos que estão à parte das experiências. É a partir de então que Kant começa a questionar-se a respeito dos objetos metafísicos: Deus, alma e mundo. Seria possível a metafísica como ciência, entendendo-se esta como a preocupação pelo que é empírico e que trabalha com juízos sintéticos a priori? Como conhecer estes objetos metafísicos se eles não estão submetidos nem ao tempo nem ao espaço?

Uma condição necessária e fundamental para que a metafísica seja considerada ciência é estar situada no tempo e no espaço. No entanto, isto é impossível ocorrer, pois seus objetos não são experimentáveis. Num momento posterior a resposta a este questionamento passa a ser a prioridade de Kant na "Crítica da Razão Pura". Para obter esta solução, encontra-se diante da necessidade de tentar aplicar aos objetos metafísicos juízos sintéticos a priori, pois estes objetos são necessários ao conhecimento prático.

Analisando mais a fundo a metafísica, Kant constata que esta é antes uma disposição natural do ser humano e está impossibilitada de tornar-se uma ciência. Ela encontra-se desvinculada de toda e qualquer experiência. E como é necessário intuição sensível e conceito para que haja conhecimento, Kant vê que não se pode conhecer nem Deus, nem a alma, nem o mundo, pois estes três objetos não são passíveis de intuição sensível, mas somente podem ser formulados conceitos deles.

Kant acha uma possível saída para essas dificuldades encontradas formulando a seguinte solução: como não podem ser conhecidos, os objetos metafísicos somente devem ser pensados. Dessa forma, ele mostra que na metafísica não é possível se chegar a juízos sintéticos a priori. Deus, alma e mundo são conhecimentos que estão acima da experiência. Ao postular isto, Kant consegue desvencilhar-se da metafísica tradicional, que na sua época tinha o rótulo de ser um discurso vazio, sem realidade.

Conclui-se, portanto, que no pensamento kantiano há uma preocupação em se demonstrar a existência dos objetos metafísicos. Isto se dá pela necessidade deles na vida prática. Mesmo não tendo conseguido afirmar a metafísica como ciência, Kant a salvaguarda ao formular a idéia de que ela pode ser pensada, mesmo não sendo conhecida. E este é o lugar que o alemão encontra para a metafísica no seu pensamento.



[1] KANT, Immanuel. Crítica da Razão Pura. Seção VII, 25, p.33. (Os Pensadores)