UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E ECONÔMICAS

FACULDADE DE DIREITO

 

 

 

 

 

 

REGULAÇÃO DA ATIVIDADE DOS PROFISSIONAIS DO SEXO

PL 4.211/12

 

 

 

 

André Guimarães

Eduardo Albuquerque

Eliezer Silva

Fabiano Cabral

Gabriel Ribeiro

Vinícius Quaresma

Victor Lopez

 

 

 

 

 

 

RIO DE JANEIRO

                                                           2013

André Guimarães

Eduardo Albuquerque

Eliezer Silva

Fabiano Cabral

Gabriel Ribeiro

Matheus Trigo

Vinícius Quaresma

Victor Lopez

 

 

 

REGULAÇÃO DA ATIVIDADE DOS PROFISSIONAIS DO SEXO

PL 4.211/12

 

 

 

 

 

Trabalho acadêmico apresentado à disciplina Metodologia do Direito II, ministrada pela professora Cristiane Igreja, para obtenção parcial de nota no curso de graduação em Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

 

 

 

 

 

 

 

RIO DE JANEIRO 2013

Sumário

1. Introdução6

2. Os diferentes pontos de vista na sociedade.7

3. História do movimento das prostitutas9

4. Pesquisa de campo.

          4.1 Entrevista professor Siddharta Legale.......................................................10

          4.2 Entrevista com a prostituta Rafaela Nunes...............................................16

          4.3 Entrevista com o Pastor Daniel Fernandez...............................................20

          4.4 Questionário..............................................................................................22

5. Regulação Profissional

5.1 Lei Gabriela Leite....................................................................................24.

               5.2 Jurisprudência.........................................................................................27

         

          5.3 Argumentos positivos e negativos (regulação)........................................31

6. Conclusão............................................................................................................ 33

7. Referência Bibliográfica.......................................................................................35

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

1.Introdução

O foco principal deste trabalho é o estudo da regulamentação dos profissionais do sexo, a principal reivindicação do movimento em prol das prostitutas. Discorreremos sobre os fatores que impedem a discussão de propostas nesse sentido, dos impactos causados pela regulamentação ou pela falta dela, das visões de diferentes grupos sociais acerca dessa temática. Faremos também um breve resumo do movimento das prostitutas no Brasil.

 

Objetivos

 

Este trabalho pretende oferecer ferramentas, através da apresentação dos diversos pontos de vista, para que os interessados em debater a regulamentação da atividade laboral dos profissionais do sexo possam se posicionar de forma crítica perante o tema, e não apenas baseados no senso comum ou em preconceitos enraizados em nossa sociedade. Nosso grupo, por sua vez, pretende adotar um posicionamento perante o tema a partir da pesquisa bibliográfica e empírica, que constará na conclusão do trabalho.

Justificativa do tema

 

Segundo a Fundação francesa Scelles há 40 milhões de profissionais do sexo no mundo. Destes, 1,5 milhões estão no Brasil. Apesar do número expressivo de pessoas exercendo essa atividade no Brasil, tal profissão carece de regulamentação que se desdobra na exploração sexual e na falta de assistência aos que sobrevivem dessa função.

O tema ganhou visibilidade recentemente através do Projeto de Lei 4.211/12 batizada com o nome da ativista pelos direitos das prostitutas Gabriela Leite, de iniciativa do Dep. Federal Jean Wyllys (PSOL–RJ). Este projeto de lei promete “incendiar” o congresso e acirrar os ânimos entre os parlamentares progressistas e os conservadores, à medida que o projeto avança nas comissões.  A prostituição é um dos grandes tabus de nossa sociedade e, devido a grande sensibilidade moral que esta suscita, há pouca literatura que trate do tema - o que torna imperativo sua pesquisa e debate. 

 

 

 

 

Problematização

 

  • Há que se discutir a ponderação de direitos fundamentais no que tange à regulamentação da atividade dos profissionais do sexo?
  • A autonomia da vontade, que é um dos componentes fundamentais à proteção da liberdade tutelada constitucionalmente aos indivíduos, pode ser suprimida por conceitos religiosos ou de cunho moral?
  • Como eliminar os estigmas acerca da profissão na cultura social.

Referencial teórico

Para realizar nossa pesquisa, nos baseamos na linha de raciocínio adotada pela pesquisadora Aparecida Fonseca Moraes em sua dissertação de mestrado na Universidade Federal do Rio de Janeiro, com o titulo de “Mulheres da vila – prostituição e identidade social: a experiência da Vila Mimosa” e pela pesquisadora Fernanda Barbosa Nepomuceno Costa em seu trabalho de conclusão de curso na mesma universidade citada anteriormente com o titulo de” Movimento de prostitutas: história de uma luta pela cidadania, regulação da profissão e reversão do estigma. Eles adotam uma metodologia que tenta desmitificar a profissão e a vida levada por pessoas desse ramo, introduzindo uma percepção que leva em conta uma preocupação social e humana com os profissionais do sexo, entendendo que eles necessitam de uma proteção e asseguração de direitos por parte do Estado e da sociedade.

Metodologia.

Para realizar nossa pesquisa, utilizamos como fonte de conhecimento a pesquisa bibliográfica em livros, artigos acadêmicos, publicações na internet, além de incluir uma pequena pesquisa jurisprudencial em sites de tribunais acerca da temática em questão. E por último, como foco principal do nosso trabalho realizamos uma pesquisa de campo em universidades, igrejas e em áreas de prostituição, realizando questionários e entrevistas.

 

2.Os diferentes pontos de vista

 

A prostituição é um tema de muita sensibilidade moral, sobretudo pelos estigmas e preconceitos que envolvem o tema. A regulamentação dessa atividade gera um debate acalorado onde grupos polarizam opiniões sobre a legitimidade dessa atividade, realizada por milhões de pessoas no Brasil. Grupos religiosos e o movimento feminista dizem discordar da regulamentação, cada um com o seu motivo. Por outro lado, o movimento que luta pelos interesses dos profissionais do sexo considera a Lei Gabriela Leite uma conquista para a classe.

Os líderes religiosos protestantes dizem que a mercantilização do sexo fere sua finalidade dada pelas Escrituras sagradas, que é a consumação do amor entre um homem e uma mulher. Sustentam ainda que a regulamentação da prostituição fere alguns princípios morais e éticos consagrados, como a família e a dignidade. O Dep. Samuel Malafaia (PSD-RJ), graduado em Teologia pelo Instituto Bíblico Pentecostal e irmão do polêmico pastor Silas Malafaia, utilizou-se da tribuna da ALERJ em Maio deste ano para externar o seu repúdio à lei Gabriela Leite. Na ocasião o Deputado disse que “no Congresso Nacional tramita um projeto de lei que regulamenta a prostituição no Brasil. Nós estamos tratando uma vez mais de assuntos que envolvem a família brasileira de forma negativa, ao invés de usarmos nosso tempo para garantirmos às famílias segurança, conforto, saúde e outras necessidades”. Afirmou ainda que “os ativistas gays e outros movimentos querem, a meu ver, destruir as famílias”.  Os argumentos desses grupos de religiosos, onde constam políticos, é de cunho exclusivamente religioso e moral não formulando nenhum fundamento jurídico para seu posicionamento contrário à aprovação da PL 4.211/12.

O movimento feminista, por outro lado, considera que a prestação de serviços sexuais mediante remuneração coloca a mulher  na condição de objeto, o que violaria o direito á dignidade da pessoa humana, garantida pela constituição. Em entrevista publicada na OAB/RJ digital em Abril deste ano, no espaço tribuna do advogado, Alana Moraes, Antropóloga e membro da organização Marcha Mundial das Mulheres, diz que a PL 4.211/12 regulariza a função do explorador  das prostitutas, conhecido popularmente como cafetão. Afirmou que o referido projeto de lei não traz nenhum direito para os profissionais do sexo além daqueles que já existem, como o de aposentadoria e de se organizarem em cooperativa. Alana Moraes lamentou que o Dep. Jean Wyllys não tenha incluído o movimento feminista no debate anterior à proposição do projeto de lei na câmara dos deputados. Ela considera a PL um retrocesso na história da luta das mulheres por igualdade dos direitos e enxerga a prostituição como um comércio que serve para a satisfação sexual dos homens, e que só é possível porque existe uma relação desigual de poder estabelecida.

3.História do movimento das prostitutas.

O movimento das prostitutas apareceu no processo de redemocratização do país, era um movimento com a missão de criar oportunidades para o fortalecimento da cidadania das prostitutas, por meio da organização da categoria, da defesa e promoção de direitos, da mobilização e do controle social. O movimento surgiu concomitantemente a outros movimentos sociais, como por exemplo, movimento negro e feminista. Diferentes dois últimos dois citados, sua formação ocorre isolada de outros movimentos políticos e sociais, pois as prostitutas são muito marginalizadas dentro do convívio social.

As vozes do movimento das prostitutas não eram ouvidas, pois faltava e ainda falta a união dos movimentos sociais que muitas das vezes convergem um com os outros, tal como o movimento feminista, ao qual não aceita a opinião de a mulher ser um mero objeto sexual do homem, contribuindo assim, de certa forma, para a manutenção das prostitutas em ambientes de trabalho precários.

O movimento começou a ganhar força no final da década de 70. Em 1979, ocorreu uma manifestação em São Paulo a favor dos direitos das prostitutas e condenando a forte repressão policial executada na área da Boca do lixo, principal ponto de referencia de prostituição na cidade. Esse movimento teve como liderança a prostituta Gabriela Leite, a principal militante na luta pelos direitos das prostitutas no Brasil, dedicando boa parte da sua vida na luta por essa causa.

Em junho de 1982 ocorreu novamente em São Paulo, uma passeata de prostitutas e travestis visando denunciar as arbitrariedades da policia local. Após o ocorrido, lograram êxito ao conseguirem o afastamento do delegado daquela jurisdição. “Assim, a autodeterminação das profissionais do sexo tornava possível a sua organização política” (Barbará, Anna Marina & Leite, Otília Silva. As meninas da daspu).

Em 1987 ocorre no Rio de Janeiro o I Encontro Nacional de Prostitutas. O evento foi um sucesso e repercutiu positivamente no meio midiático e intelectual. Segundo Gabriela Leite: “Muita gente começou a nos procurar, universidade, sociólogos, intelectuais. Os pesquisadores de prostituição até então viam a prostituta como vítima, e tudo que eles buscavam era apenas para provar a tese deles. (...) Com o tempo as pesquisas ficaram mais sofisticadas, e acho que isso se deve a nós, à nossa iniciativa de discutir sobre nós mesmas” (Gabriela Leite, filha, mãe, avó e puta: A história de uma mulher que decidiu ser prostituta).

Após todas essas manifestações, a líder Gabriela Leite acaba fundando a ONG Davida Prostituição, direitos civis, saúde. Seus objetivos são a ampliação de mecanismos de luta, promoção de debates na sociedade, a formação de uma identidade social da prostituta enquanto mulher e profissional, a busca por direitos civis e cidadania, prevenção de DSTs, etc. Está organização também foi responsável pela criação da marca DASPU, que é uma iniciativa para dar visibilidade na mídia e angariar recursos para sustentar os projetos da ONG, além de tentar reduzir o preconceito e abolir o estigma sofrido por essas mulheres.

O movimento das prostitutas prossegue suas lutas até os dias atuais, reivindicando, em sua pauta, questões como a regulamentação da profissão, o combate ao preconceito e violência contra as prostitutas. Sua atuação se dá em âmbito nacional e cada vez mais ganha apoio em diversos setores na sociedade.

4.Pesquisa de campo.

 

4.1 Entrevista professor SiddHarta Legale

 

Entrevista realizada no dia 01/07/2013, com o Professor Siddharta Legale, departamento de teoria do estado, faculdade nacional de direito-Universidade federal do Rio de Janeiro.

Entrevista realizada no âmbito da Universidade. Assunto: Regulamentação do trabalho das profissionais do sexo.

Esta pesquisa objetiva conhecer a opinião de um jurista sobre o tema da prostituição e sua regulamentação.

Perguntas:

  1.  Sabemos que os diferentes conceitos acerca do que a prostituição representa para o estado e a sociedade influência, principalmente no Brasil, para a discriminação das pessoas que sobrevivem deste tipo de trabalho. Em sua opinião, por que, ainda no Brasil não se formou uma opinião favorável para que se reconheça a prostituição como um trabalho igual a todos os outros?
  • Não só no Brasil, mas no mundo inteiro o sexo envolve sempre um certo tabu, isto é, as pessoas têm medo de falarem do assunto, não sei explicar exatamente o porque deste medo, ela  poderia ser explicada talvez pela questão religiosa, ao qual considera que a prostituição foge da normalidade social, ou seja, é um trabalho diferente dos outros, que carrega o estigma do preconceito da sociedade. Voltando a pergunta que me foi feita, acredito que todos são carregados de preconceitos, do índio ao antropólogo e que a propósito eles sempre possuem visões que são diferentes um do outro, do tipo minha cultura é superior a sua, isto é, temos uma ambiguidade cultural, não diferente é a questão da prostituição, acredito que no Brasil exista uma base moralista cultural muito forte, e dessa forma, acaba compelindo para a manutenção da discriminação da prostituição. Este tipo de preconceito deve ser revisado pelo poder legislativo, devemos reconhecer a prostituição como um trabalho como qualquer outro, e que afinal, é uma profissão de risco, pois envolve muita das vezes doenças ao qual podem ser sexualmente transmissíveis e drogas.
  1. Você acha digno este tipo de trabalho e que mereça ser regulamentando?
  • Eu que levanto a questão a vocês, o que seria digno meus caros, Fabiano e Eliezer? É muito amplo este termo o que pode ser digno para mim pode não sê-lo para vocês, então como é em minha opinião, eu reconheço como digna sim, pois é dali que muitas mulheres, e agora para os mais modernos, até homens, tiram seu sustento, sustentam as suas famílias.  Segundo Mr. Catra “Se sua mina só reclama ela é chata demais, procura uma profissional do sexo meu mano ela sabe demais” é quero dizer com isto, que não podemos discriminar as profissionais do sexo, porque, eu estou aqui falando em um tom de brincadeira, mas a coisa é séria, elas trazem muitas alegrias para muita gente, inclusive muito amigos que tive e ainda tenho, nem lhes conto.  A profissão das profissionais do sexo não merece ser apenas regulamentado, mas também regulado, isto é, deve se propor saúde e segurança para estas mulheres. O Brasil deve ser um país sério e deve regulamentar sim, essa profissão e que alias já é reconhecia pelo governo como profissão.
  1. Qual é o posicionamento do judiciário acerca dos direitos das prostitutas e do legislativo?
  • Em relação ao judiciário, a jurisprudência é contravertida, até porque no Brasil, prostituição não é crime, crime é manter casa de prostituição ou exploração de menores para as práticas sexuais, desta forma, as casas de prostituição para o judiciário ferem os direitos a dignidade humana, segundo o direito penal, apesar de não ser penalista e não entender bastante desta área. As casas de prostituição ferem a dignidade humana, porque não ofereça um ambiente limpo para a realização do serviço, é um lugar cheio de doenças e drogas. É ai, que eu acho que o governo deveria investir para mudar as condições destas mulheres, o movimento das prostitutas é fraco, elas não conseguem ter voz para conseguir impor no congresso que seja aprovada uma lei que regulamenta a profissão. O movimento feminista neste caso poderia influenciar fortemente para a aprovação deste tipo de lei em favorecimento, ou melhor, reconhecimento afirmativo das profissionais do sexo, que são discriminadas todos os dias neste país. A profissional do sexo existe na esquina de minha rua, da sua, dos seus tios e avós, portanto elas estão em todos os lugares, e não podem continuar sendo tratadas como uma ciosa qualquer, não podem continuar vivendo as margens da lei. Em relação ao legislativo, o debate sobre este tema vem crescendo ao longo dos últimos anos, deputados como Fernando Gabeira e Jean Wyllis produziram projetos com o objetivo da regulamentação da profissão das profissionais do sexo.  O legislativo possui uma visão muito moralista, isto é, as concepções morais existentes acerca da prostituição influenciam certamente os deputados, e assim acabando descartando um tema de grande relevância para o Brasil de hoje.
  1. O projeto de lei, com o nome Gabriela Leite, que tramitar atualmente no legislativo com o foco na regulamentação e legalização dos prostíbulos, em um de seus artigos, disserta sobre uma aposentadoria especial para as profissionais do sexo. Você acha que este artigo é correto?
  • Este ponto envolve uma crítica e que a meu ver não tem cabimento, é aquela famosa crítica do privilégio, o privilégio sempre favorece um lado apenas da sociedade em detrimento de outro. É aceitável a crítica, mas aqui neste caso das prostitutas, o trabalho delas, é desgastante e que poderíamos sim comparar com outras profissões de risco, poderíamos perguntar a qualquer uma profissional do sexo, se o trabalho dela é um trabalho fácil? Acredito que todas dirão que não, pois as condições em que trabalham a baixa remuneração do seu trabalho, a não regulação de sua profissão, influencia muitas vezes no preconceito. Vocês estão hoje aqui pesquisando este tema, isto mostra que começamos a se preocupar com o preconceito que existe na sociedade sobre este tema e que a demanda social promoverá a regulação deste tipo de trabalho. Veremos um dia, e eu estarei vivo para vê, uma pessoa filho ou filha de uma profissional do sexo, gritando: “eu sou filha da puta mesmo” “não tenho medo de dizer isto é uma profissão como qualquer outra – tenho orgulho da minha mãe” pode até parecer utópico, mas lá no fundo todos se orgulhariam em vê o reconhecimento da identidade social da prostituta. Muitas prostitutas não vítimas de uma sociedade que não ofereceu igualdade de oportunidade para todos, quero dizer com isto, que existe prostituta bem instruída, bem qualificada, possuem ensino superior, elas vão para o ramo porque gostam, deve ser principalmente por causa do dinheiro, e claro este tipo de mulher “bem qualificada” são diferentes das prostitutas pobres, seus programas são caros, e chegam a ganhar mais do que eu aqui na UFRJ tranquilo (brincadeira). O artigo é válido pessoal.
  1. Você acha que este projeto de lei incentiva à prostituição?
  • Não incentiva em nada. As pessoas não resolvem irem para uma profissão só porque ela foi regulamentada, se fosse assim, a Pec das domésticas, deveriam também incentivar mais gente para trabalhar neste ramo. A pessoa não irá querer seguir o ramo da prostituição só porque ela é agora regulamentada, não é assim, “vou ser prostituta agora porque o governo regulou a profissão” a pessoa quase sempre possui a autonomia da vontade, isto é, ela vai porque foi um meio de tirar o sustento de sua família, principalmente na criação de seus filhos, então é ramo dos tipos de trabalho que existem numa sociedade capitalista.
  1. Existe uma fórmula mágica ou não para tiramos do contexto social o conceito pejorativo de prostituição?
  • Quem dera se tivesse, seriamos a sociedade perfeita, não existe uma fórmula mágica. É um plano sociológico, para tiramos o conceito pejorativo de prostituição da sociedade era preciso fazer uma lavagem cerebral em todas as pessoas, e que é inviável. Podemos amenizar o termo, tal como inserindo a regulamentação das profissionais do sexo. A regulação poderia mudar um pouco nossos conceitos sobre essas mulheres.
  1. Está lei é fere a constituição do país? No ramo da dignidade humana?
  • Não tem que falar na inconstitucionalidade, não viola a constituição é autonomia, as mulheres podem fazer o que bem entenderem com seu corpo. Deve se ter uma aceitação social: a prostituição não é mais um tabu como era encarado ha algumas décadas atrás, hoje em dia usar o corpo para conseguir dinheiro está se tornando banal (as pessoas não ligam mais se mulheres posam nuas, a toda hora em anúncios de prostitutas, revistas e etc.). Sobre a Dignidade Humana (prevista na constituição) não fere a constituição desde que a prostituta exerça a profissão por livre espontânea vontade. Por fim assim, como para ser advogado é preciso ter bacharel em direito, com as prostitutas não é diferente porque afinal para o exercício de qualquer trabalho é preciso ter qualificação. As prostitutas devem possuir qualificação para a prática de sua profissão. Não existe inconstitucionalidade, a não ser no caso em que citei.

4.2 Entrevista com a prostituta Rafaela Nunes.

Entrevista realizada no dia 03/07/2013, com uma profissional do sexo.

Entrevista realizada no âmbito de um motel, com Rafaela Nunes (nome fictício), no Rio de janeiro. Assunto: as condições de trabalho das prostitutas e o que ela sabe sobre a possível lei “Gabriela Leite”.

Esta entrevista tem o objetivo de aprofundar o conhecimento sobre as condições de trabalho das profissionais do sexo e uma breve passagem sobre a sua história de vida.

  1. Porque você escolheu esta profissão?
  • Não tive muita opção na vida, sem estudo, tive que buscar a solução que melhor se encaixava para pode me sustentar e também cuidar da minha família.
  1. Você citou sua família e que tem que sustentá-la. Você tem filhos? Se sim, quantos? O que você faria por eles?
  • Tenho sim filhos, tenho três. São dois homens, já quase adolescente e uma menina pequena. Ai meu deus! Para mim eles são tudo, só trabalho por eles, faço tudo por meus filhos. Quando me pedem alguma coisa, quero dar sempre o melhor para eles, pois quero dar para os meus filhos as oportunidades que não tive quando jovem. Quero que eles estudem que nem vocês sabem, sejam doutores, não quero que eles sejam que nem eu. Aqui na prostituição foi o meio que eu encontrei de sustentar a minha família.
  1. Assim, você disse que seus filhos são tudo na sua vida e faria tudo por eles. É interessante notar isto, pois o senso comum diz que as profissionais do sexo não são boas mães e abandonam seus filhos nas ruas. Você é casada? Se sim, ele sabe da sua profissão?
  • Eu era inclusive o pai dos meus meninos, sabe que sou profissional do sexo, ele me olha de cabeça a rabo, mas não fala nada. Ele paga pensão para os meninos, ele dar uns 50 reais por mês para cada um dos meus meninos. Hoje eu tenho um “peguete”, ele sabe que sou profissional do sexo, mas não liga. Sabe eu acho que quando as pessoas gostam uma das outras de verdade, assim, como um amor puro, não entendo muito disso não sabe, mas acredito que não importa em que a pessoa trabalha, a pessoa vai gostar dela de qualquer jeito.
  1. Em relação a sua condição de trabalho, você a considera como boa ou ruim?
  • Eu considero horrível, é muito ruim, é um pedaço de quarto dividido, por madeira e que fede. Mas isto não me impede de trabalhar, tenho que cuidar da minha família, então faço tudo por minha família.
  1.  Porque você considera a sua condição de trabalho horrível?
  • Você nunca foi num não? Aposto que sim, tão querendo me enganar, sou boba não, eu acho que já vi vocês por lá. To brincado, falando sério agora, lá é imundo, tem drogas, gente de todos os tipos, gente que não presta. Tem gente elegante também, gente fina, assim como vocês, com dinheiro, inclusive teve gente que já viu até juiz por lá.
  1. Como você vê o preconceito em relação a sua profissão?
  • Tento encarar da melhor forma possível, pois sei que eu estou trabalhando, para mim é um trabalho digno, então eu sei que o preconceito contra a minha profissão existe, mas tento não liga para isso sabe.
  1. Como que funciona a concorrência no mercado do sexo?
  • É bem complicado. Tem muita mulher pra pouco homem, todas querem o cliente quando ele chega, e usam de todas as artimanhas para conquistar o cliente. Vocês entendem por artimanhas né? Sim algumas fazem coisas que outras não fazem principalmente as mais velhas no ramo assim como eu. As meninas novas se dão bem, toda hora tem cliente pra elas, elas faturam uma boa grana.
  1. Você citou ser mais velhas que as outras profissionais do sexo neste ramo. Há quanto tempo você está neste ramo?
  • Já faz uns 10 anos, não se assustem, pois tem gente lá onde eu trabalho que tão a mais de 20 anos trabalhando, elas vão para um lugar, vão para outro lugar, eu sou nova para estas mulheres nesse ramo ainda.
  1. O que você vai fazer quando a sua idade chegar e você não aguentar mais está profissão?
  • Eu não sei, espero que o meu Deus me ajude, e me arrume uma pessoa para cuidar de mim quando tiver mais velha. Espero que eu consiga dar uma educação para os meus filhos e assim eles me ajudam.
  1. 10.  Você conhece a lei que tramita (tramita é o que está passando por algo, ou seja, ela pode ser aprovada ou não) na câmara dos deputados com o objetivo de regulamenta a profissão das profissionais do sexo?
  • Assim, nunca ouvi falar desta lei, é verdade isto?

- Sim, a lei propõe melhorar as condições de trabalho das profissionais do sexo também, e, além disso, oferecerem uma aposentadoria especial para as profissionais do sexo.

  • Que bom, vou conta para pessoal lá, depois.
  1. 11.  Você acha que essa lei, pode diminuir o preconceito com a sua profissão?
  • Assim, eu acho que pode, mas eu ainda continuarei sofrendo preconceito, mas como disse a vocês eu não ligo, tento esquecer este tipo de coisa.
  1. 12.  Você senti-se feliz na prostituição?
  • Por assim, eu tento ser feliz, faço a alegria de muita gente num dia só. Isso me alegra, pois sei que lá fundo alguém tá olhando por mim, e me sinto feliz, quando as pessoas me procuram novamente para os meus serviços, assim percebo que eles gostaram do meu serviço e voltaram para provar de novo.
  1. 13.  Percebemos que você é uma guerreira e é mais, muito mais do que uma mulher da vida, que falam pelas ruas. Você é uma heroína, luta todos os dias para manter a sua família. Uma última pergunta. Você tem vontade de sair da prostituição?
  • Tenho sim, mas eu gosto do meu trabalho. A minha formação, não me deu opção de escolha, mas não quero ser tratada como vítima, pois eu corro atrás. Estou na profissão, porque eu tiro dela o meu pão de cada dia e também porque eu gosto, eu acho que ninguém iria pra uma profissão que não gostasse.

4.3 Entrevista com o pastor Daniel Fernandez

Entrevista realizada no dia 30/06/2013.

Entrevista realizada no âmbito de uma Igreja, localizada no Rio de Janeiro.

Está entrevista tem o objetivo de conhecer uma opinião acerca da prostituição. Uma opinião religiosa sobre o assunto.

Pastor: Daniel Fernandez     Igreja: Santuário do Deus Vivo.

1-    Você considera uma Profissão Legítima a atividade realizada pelos profissionais do sexo? Por quê?

  • Pastor Daniel: Não. Porque o sexo, aos olhos de Deus e segundo as escrituras sagradas é um ato de consumação do amor, entre um homem e uma mulher. Jamais, o sexo, poderia ser considerado uma profissão, uma vez que, não existe amor.

2-Você sabia que a prostituição no Brasil não é crime?

  • Pastor: Sim

3-    Tramita no Congresso Nacional um Projeto de Lei que visa à regulamentação da atividade laboral dos profissionais do sexo garantindo-lhes, entre outras coisas, direito à aposentadoria especial e a possibilidade de manterem lugares próprios para a sua atividade- o que hoje é proibido. Você concorda com esse projeto de lei? Por quê?

  • Pastor: Não. Porque isso agride diretamente todos os princípios éticos, morais e religiosos, visto que, sendo a profissão regularizada, se transmitirá aos jovens e a sociedade em geral a ideia de vulgarização do trabalho digno e da formação profissional de um cidadão através dos seus esforços e estudos.

4- Você já viu ou sabe da existência de alguma casa de prostituição?

  • Pastor: Sim

5- Você manteria um relacionamento estável com um parceiro que fora profissional do sexo? Por quê?

  • Pastor: Sim. Porque eu acredito na regeneração total e completa do ser humano, pois o nosso Deus faz todas as coisas novas. Só depende da pessoa, realmente, buscar em Deus essa mudança, que uma vez, sendo alcançada e existindo o amor não haveria problema algum em ter uma relação estável com essa pessoa.

6- O senhor acha que a moralidade da sociedade pode intervir, de maneira significativa, na decisão de aprovar ou reprovar esse Projeto de Lei (PL)?

  • Sim. Porque, atualmente, no Congresso existem muitos cargos que são ocupados por pessoas conservadoras e cristãs, que ainda acreditam nos antigos costumes. Logo, essas pessoas devem vetar esse projeto de lei, pois ele fere os princípios éticos/ religiosos, fundamentais, da sociedade brasileira, de maioria cristã. Um desses princípios fundamentais é a Família. Sendo o PL aprovado, o termo ‘’profissionais do sexo’’ irá entrar na CBO(Classificação Brasileira de Ocupações), portanto será uma opção de profissão para as pessoas e eu acredito que ninguém sonha em ser prostituto (a), nem mesmo os pais desejam isso para os seus filhos.Imagine- se na seguinte situação, você sentado na mesa , com sua família e você pergunta para o seu filho no que ele quer trabalhar quando crescer e ele responde que quer ser prostituto ou prostituta. Logo, esse PL fere totalmente o princípio da Família, que é o do amor, carinho, cumplicidade, reciprocidade.

4.4 Questionário

O questionário abaixo tem o objetivo de saber a opinião de pessoas comuns sobre a prostituição.

Foi apresentado o seguinte modelo abaixo às pessoas.

QUESTIONÁRIO

O presente questionário é parte de um trabalho para a disciplina Metodologia jurídica I da FND/UFRJ. Não é necessária a sua identificação.

Entrevistado:________________ Idade:______________   Data:___/___/____ 

1-     Você considera uma profissão legítima a atividade realizada pelos profissionais do sexo? Por quê?

(    ) SIM                                       (    ) NÃO 

2-     Você sabia que a prostituição no Brasil não é crime?

(    ) SIM                                                                         (    ) NÃO

3-     Tramita no Congresso Nacional um projeto de lei que visa à regulamentação da atividade laboral dos profissionais do sexo garantindo-lhes, entre outras coisas, direito à aposentadoria especial e a possibilidade de manterem lugares próprios para a sua atividade- o que hoje é proibido. Você concorda com esse projeto de lei? Por quê?

(    ) SIM                                                                         (    ) NÃO

4-     Você já viu ou sabe da existência de alguma casa de prostituição?

(    ) SIM                                                         (    ) NÃO

5-     Você manteria um relacionamento estável com um parceiro (a) que fora profissional do sexo? Por quê?

(    ) SIM                                                                  (     ) NÃO

Não iremos produzir aqui todas às justificavas de todas as pessoas do questionário. Colocaremos o total de entrevistados e a porcentagem das respostas objetivas do questionário acima.

Questão 1. Você considera uma profissão legítima a atividade realizada pelos profissionais do sexo? Por quê?

40% SIM.

60% NÃO.

Questão 2. Você sabia que a prostituição no Brasil não é crime?

 60% SIM.

 40% NÃO.

Questão 3. Tramita no Congresso Nacional um projeto de lei que visa à regulamentação da atividade laboral dos profissionais do sexo garantindo-lhes, entre outras coisas, direito à aposentadoria especial e a possibilidade de manterem lugares próprios para a sua atividade- o que hoje é proibido. Você concorda com esse projeto de lei? Por quê?

30% SIM.    

70%NÃO.

Questão 4.Você já viu ou sabe da existência de alguma casa de prostituição?

100%SIM.

0% NÃO.

Questão 5. Você manteria um relacionamento estável com um parceiro (a) que fora profissional do sexo? Por quê?

30%SIM.

70%NÃO.

Foi entrevistado no total de 10 pessoas no âmbito da Faculdade Nacional de Direito – UFRJ, no dia 02/07/2013.

5.  Regulação profissional.

 

5.1Lei “Gabriela Leite”

 

          Corre no congresso um projeto de lei elaborado pelo deputado Jean Wyllys denominado “Lei Gabriela Leite” que visa regulamentar a atividade das profissionais do sexo. A seguir apresentamos o projeto completo.

Art. 1º - Considera-se profissional do sexo toda pessoa maior de dezoito anos e absolutamente capaz que voluntariamente presta serviços sexuais mediante remuneração.

§ 1º É juridicamente exigível o pagamento pela prestação de serviços de natureza sexual

a quem os contrata.

§ 2º A obrigação de prestação de serviço sexual é pessoal e intransferível.

Art. 2º - É vedada a prática de exploração sexual.

Parágrafo único: São espécies de exploração sexual, além de outras estipuladas em legislação específica:

I- apropriação total ou maior que 50% do rendimento de prestação de serviço sexual por terceiro;

II- o não pagamento pelo serviço sexual contratado;

III- forçar alguém a praticar prostituição mediante grave ameaça ou violência.

Art. 3º - A/O profissional do sexo pode prestar serviços:

I - como trabalhador/a autônomo/a;

II - coletivamente em cooperativa.

Parágrafo único. A casa de prostituição é permitida desde que nela não se exerce qualquer tipo de exploração sexual.

Art. 4º - O Capítulo V da Parte Especial do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940, Código Penal, passa a vigorar com as seguintes alterações: “Favorecimento da prostituição ou da exploração sexual.

“Art. 228. Induzir ou atrair alguém à exploração sexual, ou impedir ou dificultar que alguém abandone a exploração sexual ou a prostituição.”

“Casa de exploração sexual Art. 229. Manter, por conta própria ou de terceiro, estabelecimento em que ocorra exploração sexual, haja, ou não, intuito de lucro ou mediação direta do proprietário ou gerente.”

Rufianismo

“Art. 230. Tirar proveito de exploração sexual, participando diretamente de seus lucros ou fazendo-se sustentar, no todo ou em parte, por quem a exerça:”

“Art. 231. Promover a entrada, no território nacional, de alguém que nele venha a ser submetido à exploração sexual, ou a saída de alguém que vá exercê-la no estrangeiro.”

“Art. 231-A. Promover ou facilitar o deslocamento de alguém dentro do território nacional para ser submetido à exploração sexual.”

Art. 5º. O Profissional do sexo terá direito a aposentadoria especial de 25 anos, nos termos do artigo 57 da Lei 8.213, de 24 de julho de 1991.

Art. 6º. Esta Lei entra em vigor na data da sua publicação.

Brasília, de julho de 2012.

Em sua justificativa, o deputado afirma que a recusa, até os dias de hoje, de oferecer os direitos às profissionais do sexo é de um moralismo superficial causador de injustiças que promove a marginalização de segmento numeroso da sociedade.

Este é o segundo projeto do tipo que tenta ser aprovado. O primeiro foi elaborado pelo ex-deputado Fernando Gabeira. Este projeto foi arquivado quando o mesmo deixou o parlamento. O projeto foi escrito com a assessoria de Gabriela Leite, ex-prostituta e fundadora da ONG Davida, que defende o direito das prostitutas.

A regulamentação da profissão garantirá aos profissionais do sexo o direito à saúde, aos direitos trabalhistas, à segurança pública e, sobretudo à dignidade. Apesar dos diversos benefícios que serão concedidos às profissionais se a lei for aprovada, o conservadorismo recebeu mal o projeto, pois finge não existir o que está à vista de todos. Essa regulamentação objetiva garantir direitos fundamentais às prostitutas e descriminalizar as casas de prostituição que atualmente existem e operam no vácuo da legalidade. Permite-se, portanto, que crianças e adolescentes sejam explorados nessas casas já que não há fiscalização por parte do Estado. É preciso, portanto, para Jean, que os direitos das prostitutas sejam garantidos assim como os direitos dos clientes. O serviço deve ser prestado dentro de um local seguro.

Esse projeto visa atender uma demanda do movimento das prostitutas que existe desde o início dos anos 80. Com a regulamentação, além dos benefícios supracitados o Estado poderia levar políticas públicas de prevenção às DST´s e políticas públicas que tratem da saúde da mulher. As prostitutas atualmente estão sujeitas a redes de exploração sexual e ao tráfico humano e a maneira de enfrentar isso é legalizar as casas de prostituição e desestigmatizar o trabalho da prostituta.

Este é o segundo projeto do tipo que tenta ser aprovado. O primeiro foi elaborado pelo ex-deputado Fernando Gabeira. Este projeto foi arquivado quando o mesmo deixou o parlamento. O projeto foi escrito com a assessoria de Gabriela Leite, ex-prostituta e fundadora da ONG Davida, que defende o direito das prostitutas.

 

 

5.2 Jurisprudência

 

Aqui temos alguns exemplos de casos concretos de nossa jurisprudência. Trata-se de trechos de apelações cíveis para termos uma noção de como a justiça brasileira lida com esse tipo de caso e quais são as apelações existentes.

 Primeiro Caso

APELAÇÃO CÍVEL Nº 2000.04.01.031627-9/RS

RELATORA

:

Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER.

APELANTE

:

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

APELANTE

:

UNIÃO FEDERAL

ADVOGADO

:

Luis Henrique Martins dos Anjos

APELADO

:

MUNICIPIO DE SÃO SEBASTIAO DO CAI RS

ADVOGADO

:

Paulo Fernando Mentz e outro

Ementa

  1. Constituição atribui ao Ministério Público a função institucional de promover ação civil pública para a proteção de quaisquer interesses difusos ou coletivos por força dos artigos127caput,129, inc. III.
  2. A exigência da municipalidade - obrigar as pessoas que se dedicam ao comércio do sexo a exames de saúde para diagnóstico de HIV e DST - vulnera de forma aberta os direitos fundamentais de proteção da dignidade da pessoa humana, da intimidade, da igualdade e os princípios regedores do SUS.
  3. A norma Municipal, ao desrespeitar princípios basilares do SUS, como a autonomia do paciente, o sigilo, a intimidade, investe contra o próprio sistema público de saúde e só isto seria motivo suficiente a conferir legitimidade ao Ministério Público Federal.

Esses são os tópicos principais de que precisamos para entender que, no município de São Sebastião do Cai, no estado do Rio Grande do Sul, houve uma exigência municipal por parte do prefeito de obrigar as profissionais do sexo a fazer exames periódicos de saúde com o intuito de diagnosticar possíveis doenças sexualmente transmissíveis. Entretanto, o Ministério Público Federal julgou que essa obrigação vai contra os direitos fundamentais de dignidade da pessoa humana e da autonomia do paciente em querer ou não fazer esse tipo de exame. Para o MP a profissional que quisesse fazer os exames deveria se encaminhar para um centro de saúde e fazê-los sem que para isso, fossem obrigadas a prestar essa ordem municipal.

Segundo Caso

RELATOR

:

DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO ESPIRITO SANTO

RELATOR SUBSTITO

:

JUIZ FEDERAL CONVOCADO MAURO LUÍS ROCHA LOPES

APELANTE

:

EDUARDO BANKS DOS SANTOS PINHEIRO

ADVOGADO

:

ROBERTO MONTEIRO LITRENTO E OUTRO

APELADO

:

UNIAO FEDERAL

REMETENTE

:

JUIZO FEDERAL DA 10A VARA-RJ

ORIGEM

:

DÉCIMA VARA FEDERAL DO RIO DE JANEIRO (200351010092480)

RELATÓRIO

 

Trata-se de remessa e apelação interposta contra sentença pela qual foi declarado o autor carecedor de ação popular em face da União Federal.

O autor pretendia, com a presente ação, ver anulada portaria expedida pelo Ministério do Trabalho na parte em que enquadra a prostituição na Classificação Brasileira de Ocupações, sob o fundamento de afrontar o referido ato a moral brasileira, a par de estimular o exercício da atividade.

Na sentença, o juízo a quo entendeu ausente o interesse de agir, porquanto o autor, ora apelante, não teria esclarecido em que o patrimônio público estaria, objetiva e concretamente, sendo lesado, ou ameaçado de lesão. Aduziu ainda que a portaria impugnada não teria especificado destinatários, tendo sido expedida para a obtenção de dados com finalidade estatística.

O apelante, em seu recurso, afirma que cabe ação popular para defesa da moralidade administrativa e que, no caso, teria havido lesão ao patrimônio moral da União. Afirmou também que a portaria impugnada é ato de efeitos concretos, gerador de direitos trabalhistas às prostitutas, que acabaram equiparadas aos demais trabalhadores, inclusive ao juiz federal, cuja atividade também está arrolada na Classificação Brasileira de Ocupações.

A União Federal e o Ministério Público Federal prestigiaram a sentença.

É o sintético relatório.

 

 

MAURO LUÍS ROCHA LOPES

Juiz Federal Convocado

 

V O T O

 

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço da remessa e do recurso.

A ação popular apresentada pelo apelante não tem o menor cabimento. A Portaria nº 397/2002, expedida pelo Ministério do Trabalho e Emprego, que aprovou a Classificação Brasileira de Ocupações/2002, em cujo código 5198 encontra-se arrolada a atividade dos “profissionais do sexo”, nada tem de efeitos concretos em moldes a poder ser alvejada através da via eleita.

Ainda que tivesse o Poder Público, através do  referido ato, reconhecido direitos trabalhistas às prostitutas, equiparando-as aos trabalhadores em geral – como quer o apelante –, a ação popular não seria remédio adequado ao fim colimado na inicial, pois continuaria revestida a portaria indigitada de normatividade genérica e impessoal. Fosse diferente, normas da CLT, essas sim declaratórias de direitos trabalhistas, poderiam ser atacadas nessa via, absurdo repelido pela jurisprudência, que rejeita a propositura de ação popular contra lei em tese.

Além disso, como bem destacado no parecer do Ministério Público Federal (fl. 133), a referida portaria também não se reveste de lesividade, pois apenas reconhece o exercício do meretrício no país, dirigindo orientações aos seus exercentes, indicando inclusive instituições de apoio a essas pessoas, que muitas vezes se encontram em difícil situação de vida.

Por isso, NEGO provimento ao recurso e à remessa.

É como voto.

Rio de Janeiro, 01 de outubro de 2008.

 

 

O argumento utilizado pelo apelante nos mostra que este encara que a inserção na prostituição na Classificação Brasileira de Ocupações afrontaria a moral brasileira e estimularia o exercício da prostituição. Por isso, o apelante pretendia cancelar a portaria que inseria a prostituição na CBO. O juiz relata que a apelação não tem cabimento e que a inserção da prostituição no CBO não afetaria a moral e não estimularia em nada.

 

 

3º Caso

 

PODER JUDICÁRIO

COMARCA DA CAPITAL

JUÍZO DE DIREITO DA 43ª VARA CRIMINAL

 Processo nº 02605412-02.2012.8.19.0001

Autor: Ministério Público

Acusados: EMSR e RRP

SENTENÇA

 

          Cuida-se de ação penal proposta em face de Roberto Rodriguez Pereira e Everton Marcos de Souza Rodrigues dando-os como incursos nas sanções dos artigos 229 do Código Penal, porque, segundo a denúncia, desde abril de 2007, de forma estável e habitual, em comunhão de ações, “mantém, por conta própria ou de terceiros, estabelecimento em que ocorria e ocorre exploração sexual, inclusive, encontros para fins libidinosos, com nítido propósito de obtenção de lucro” (fl. 02).

Do contexto (em que a ação penal foi proposta)

Na atual quadra histórica, não há como desconhecer que a interpretação (e interpretar é uma função criativa, uma vez que há uma diferença ontológica entre o texto legal e a norma produzida pelo intérprete) está condicionada pelo contexto. Assim, cabe indagar o contexto em que o Ministério Público pede a condenação de Roberto e Everton pela incidência comportamental no tipo descrito no artigo 229 do Código Penal.

De início, pode-se perceber que a ação penal foi proposta em meio ao clima político-repressivo gerado a partir da adoção de medidas higienistas voltadas à preparação da cidade do Rio de Janeiro para os megaeventos esportivos de 2014 e 2016. Essa circunstância fica clara com a leitura da medida cautelar incidental de interdição judicial do estabelecimento (fls. 210/217), na qual o Ministério Público, após fazer menção ao “turismo sexual” e à proximidade com grandes eventos internacionais (“valendo citar a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016” – fl. 217), afirma que é “imperiosa a intervenção do Poder Judiciário, contribuindo para a mudança de tão pejorativa imagem” (fl. 217).

É relevante, ainda, notar que, segundo consta da própria denúncia, a investigação que deu origem à acusação iniciou-se em abril de 2007 e só em maio de 2012 a ação penal foi proposta. Diante dessa hipótese, ou seja, de que a ação penal foi proposta em meio ao projeto político de afastar da cidade “imagens pejorativas”, que não pode ser descartada em razão da manifestação de fl. 217 e do relatório de fls. 303/333 (que elenca e descreve “casas de massagem”, bares, casas de show e casas de swing situadas na zona sul da cidade do Rio de Janeiro), importa lembrar que a persecução penal não pode ser uma resposta imediata de natureza administrativa, sob pena de violação ao princípio da resposta não contingente (3), que regula a atividade de criminalização primária e secundária.

Mas, não é só. A análise do contexto em que foi oferecida a denúncia revela também que a acusação é formulada logo após a Comissão de Juristas indicada pelo Senado Brasileiro concluir, na mesma linha do que já existe em diversos países nos quais o fenômeno da secularização se fez consistente, pela desnecessidade (na realidade, inadequação constitucional) da tipificação do delito de “casa de prostituição” (atual artigo 229 do Código Penal).(4)

Poder-se-ia afirmar que a ação penal proposta em desfavor de Roberto e Everton, ainda que sem a vontade do ilustre acusador signatário da denúncia (e, aqui, se está a falar do inconsciente, aquele “saber que não se sabe”), acaba por simbolizar uma espécie de “canto do cisne”(5) dos desejos punitivos direcionados à conduta que encontra adequação típica no moribundo artigo 229 do Código Penal.

Ademais, como explicou o Professor e Desembargador Aramis Nassif, ao tratar de imputação similar a que consta da denúncia em exame, “a eficácia da norma penal nestes casos mostra-se prejudicada em razão do anacronismo histórico, ou seja, a manutenção da penalização em nada contribui para o fortalecimento do Estado Democrático de Direito, e somente resulta num tratamento hipócrita diante da prostituição institucionalizada com rótulos como ‘acompanhantes’, ‘massagistas’, motéis, etc, com tal conduta, já há muito, tolerada e publicizada, com grande sofisticação, e divulgada diariamente pelos meios de comunicação”.(6)

Como lembrou André Nicolitt, em recentes declarações veiculadas na mídia, lamenta-se que no ano em que se comemora o centenário de Jorge Amado, a crítica às tentativas moralistas de controle da sexualidade (e da população etiquetada de “excluída”), presentes no romance Gabriela, cravo e canela (1958) (7), que se passa na pacata Ilhéus em plena década de 20, ainda se mostre atual (e necessária).    

Comentário: O juiz afirma que a punição da prostituição fere o princípio da tolerância presente no Estado Democrático de Direito e se desvia do conteúdo de tipicidade, pois o ordenamento acolhe uma atividade lícita. O juiz ainda repele a repressão à prostituição no que tange a medidas higienistas preparatórias para os grandes eventos que a cidade acolherá nos próximos anos e critica a irracionalidade da persecução que ignora justamente a tutela das vítimas que supostamente pretende proteger: as prostitutas, tratadas como seres invisíveis.

 

 

O primeiro caso se encontra completo em:

http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/8867439/apelacao-civel-ac-31627-rs-20000401031627-9-trf4/inteiro-teor

O segundo caso se encontra completo em:

http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/3609412/apelacao-civel-ac-337858-rj-20035101009248-0-trf2

 

 

5.3 ARGUMENTOS POSITIVOS E NEGATIVOS

A RESPEITO DA REGULAÇÃO PROFISSIONAL DA PROSTITUIÇÃO

 

-Importância da discussão:

A regulação da prostituição como atividade profissional traz consigo aspectos positivos e negativos, que devem ser explicitados para melhor compreensão e formulação de opiniões acerca do cenário de reconhecimento profissional desta prática e efetivação de projetos de lei, como o de nº 4211/2012 do deputado Jean Willys. 

                                                                               

- Argumentos negativos:

  • A profissionalização da atividade de prostituição traz uma  maior oferta/disponibilidade desta no mercado, assim como maiores riscos de saúde ao ofertante (prostitutas/os). Ao comercializar  seu corpo para certo cliente que paga por seus serviços, a(o)  garota(o) de programa poderá estar sujeita(o) a  situações de estupro e violência, visto que muitas vezes o cliente realiza demandas contrárias ao tipo de serviço oferecido e tende a "forçar" a concretização de suas vontades, agindo agressivamente, e podendo cometer  o crime de lesão corporal, trazendo perigo de vida ou debilidade permanente de membros, previsto no art. 129, parágrafo 1º, incisos II e III do Código Penal brasileiro, com pena de reclusão de 2 a 8 anos. Segundo pesquisa realizada pela ONG europeia Coalizão Contra o Tráfico de Mulheres, profissionais do sexo tem taxa de mortalidade 40 vezes superior à população em geral.
  • Sob a ótica do movimento  feminista, a prostituição reforça o poder machista sobre a mulher, e a regulamentação da mesma traria uma espécie de confirmação  da visão de  "objeto sexual"  que se tem deste serviço,  tão difundida culturalmente  por diversas gerações e que inferioriza a parcela feminina diante da sociedade, conferindo uma possibilidade de instrumentalização do corpo das mulheres.
  • A regulamentação da prostituição beneficiaria diretamente o crime organizado - que, segundo Giovanni Quaglia, responsável pelo escritório da ONU contra drogas e crime no Brasil , funciona como uma "holding", lucrando expressivamente com o tráfico de mulheres para prostituição, juntamente às atividades de tráfico de entorpecentes e tráfico de armas.

- Argumentos positivos:

 

  • No caso de regulamentação legal da(o) profissional da prostituição - ou seja, o seu reconhecimento da  profissão como outra qualquer -, haveria a concessão de uma série de direitos trabalhistas , previstos na Consolidação das Leis Trabalhistas , que extinguiriam a exploração a qual estão submetidas(os), assumindo-se que haveria grande fiscalização das casas de prostituição para garantir o exercício pleno dos benefícios, como o direito à férias sem perda de remuneração (art. 129 da CLT), carga horária fixada coibindo abusos por parte do empregador (art. 74 da CLT), período de descanso de no mínimo 11 horas (art. 66 da CLT), etc.

 

  • A regulamentação contribui também para a reversão do estigma da profissão, ou seja, passa a ser vista de maneira mais digna e humana do que quando se encontrava na ilegalidade - onde era difamada como atividade desonesta e "suja" pelos preceitos culturais tradicionalistas de uma sociedade.

Conclusão:

Em suma, podemos concluir que, a partir da pesquisa bibliográfica acerca do tema e, principalmente, a partir dos resultados e informações obtidas na pesquisa de campo realizada pelo grupo, percebemos que, a sociedade, de um modo geral, e as autoridades competentes, ainda possuem uma base cultural e uma perspectiva ideológica enraizada em fundamentos socioculturais fortemente influenciado por valores morais e éticos de cunho religioso (dogmático), além de terem uma ótica parcialmente ou plenamente estigmatizada  e preconceituosa acerca da prostituição e dos profissionais que atuam nesse ramo, que é tão marginalizado pelos agentes sociais responsáveis por perpassarem uma visão a qual demoniza completamente este tipo de profissão, contribuindo assim, negativamente, para a manutenção de percalços obstruidores de um debate mais aprofundado sobre o tema, prejudicando os profissionais e inclusive a sociedade em geral, pois impede a formulação de propostas positivas a favor de uma melhor condição de trabalho e de vida para pessoas das quais muitas vezes se encontram em circunstâncias miseráveis, muitos abaixo da linha da pobreza.

Um debate lúcido sobre a regulamentação dos profissionais do sexo contribui intensamente para a consolidação e implementação gradual dos princípios dos Direitos Humanos, tal como o respeito a mandamentos universais básicos como a preservação da dignidade humana, da liberdade dos indivíduos, etc. Podemos observar que um estudo dedicado e aprofundado acerca do cotidiano dos profissionais do sexo, suas reivindicações, e sua identidade social, ajuda a elucidar questões intrigantes, isto é, relacionadas a estereótipos difundidos pelas relações sociais até os dias de hoje, que rotulam as pessoas ligadas a e esse meio em questão com termos pejorativos que denotam uma suposta falta de moralidade e valores desses indivíduos, transmitindo crenças distorcidas acerca da realidade, como por exemplo: “Pessoas que trabalham nesse ramo são mercenárias”, “Não cumprem efetivamente seu papel social e afetivo dentro do núcleo familiar”, etc.

Por fim, compreendemos que a falta de informações e a ignorância da sociedade, em geral, e dos responsáveis pela administração política do país, é o principal fator responsável pela escassez de uma percepção mais empática pela situação vivida pelos profissionais do sexo diariamente, os quais lidam com condições desumanas de higiene, segurança, etc. Nesse sentido, é de nosso entendimento que a pesquisa realizada contribui para a fomentação de um debate mais produtivo e do andamento da implementação gradual da regulamentação dos direitos e condições de trabalho para esses profissionais, cumprindo assim um dos principais papéis do Estado de promover o respeito à dignidade humana e a formação de uma sociedade justa e igualitária.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Referência bibliográfica.

Moraes, Aparecida Fosenca, “Mulheres da vila, prostituição e identidade social: a experiência da Vila Minosa” dissertação de mestrado.

Costa, Fernanda Barbosa Nepomuceno, “Movimento de prostitutas: história de uma luta pela cidadania, regulação da profissão e reversão do estigma” monografia de graduação.

http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/8867439/apelacao-civel-ac-31627-rs-20000401031627-9-trf4/inteiro-teor

http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/3609412/apelacao-civel-ac-337858-rj-20035101009248-0-trf2

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