Há várias décadas tem-se discutido a formação dos docentes no Brasil e também no restante do mundo (Cf. Ludke & Boing, p. 1160).
Aspecto crucial neste debate é a profissionalização dos professores, caracterização e aspectos que elevam um grupo à categoria de "profissional" e, neste trabalho, associamos a isso, o que a formação do professor de literatura, como leitor privilegiado, tem a ver com esta constituição/ restauração profissional docente.
Deste modo, um dos anseios dos professores parece ser justamente a busca por uma identidade profissional, ou seja, um maior reconhecimento perante a sociedade dos serviços a ela prestados, além de uma maior unidade categorial, no que tange aos objetivos e metas a se alcançar com o trabalho nas escolas .
A situação profissional do professor é paradoxal, na medida em que é notória a degradação da função docente, ao mesmo tempo em que o processo educativo, ou mais amplamente, o processo de conhecimento é cada vez mais valorizado pelo modelo de desenvolvimento capitalista atual, tendo com pano de fundo a premência por mão-de-obra especializada que deve ser cada vez mais apta para manipular as ferramentas tecnológicas.
Este quadro não deixa de ser uma crise aguda na identidade profissional e reforça um conflito profundo na autoimagem do professorado, pois ele acompanha a supervalorização dos processos de conhecimento e informação, mas também observa o esfacelamento de sua profissão e o aumento de um certo descrédito social e, assim, não se vê reconhecido como agente social deste novo processo de conhecimento , sendo que este não se confunde com o novo processo informacional também trazido pela atual era tecnológica; torna-se, assim, socialmente, um sujeito invisível.


INTRODUÇÃO/ PROBLEMATIZAÇÃO

Há várias décadas tem-se discutido a formação dos docentes no Brasil e também no restante do mundo (Cf. Ludke & Boing, p. 1160).
Aspecto crucial neste debate é a profissionalização dos professores, caracterização e aspectos que elevam um grupo à categoria de "profissional" e, neste trabalho, associamos a isso, o que a formação do professor de literatura, como leitor privilegiado, tem a ver com esta constituição/ restauração profissional docente.
Deste modo, um dos anseios dos professores parece ser justamente a busca por uma identidade profissional, ou seja, um maior reconhecimento perante a sociedade dos serviços a ela prestados, além de uma maior unidade categorial, no que tange aos objetivos e metas a se alcançar com o trabalho nas escolas .
A situação profissional do professor é paradoxal, na medida em que é notória a degradação da função docente, ao mesmo tempo em que o processo educativo, ou mais amplamente, o processo de conhecimento é cada vez mais valorizado pelo modelo de desenvolvimento capitalista atual, tendo com pano de fundo a premência por mão-de-obra especializada que deve ser cada vez mais apta para manipular as ferramentas tecnológicas.
Este quadro não deixa de ser uma crise aguda na identidade profissional e reforça um conflito profundo na autoimagem do professorado, pois ele acompanha a supervalorização dos processos de conhecimento e informação, mas também observa o esfacelamento de sua profissão e o aumento de um certo descrédito social e, assim, não se vê reconhecido como agente social deste novo processo de conhecimento , sendo que este não se confunde com o novo processo informacional também trazido pela atual era tecnológica; torna-se, assim, socialmente, um sujeito invisível .
A reivindicação por um piso salarial para o magistério já era pauta de diversos segmentos da intelectualidade brasileira, entre elas Brzezinski (2002),
Acredito que a oferta de cursos de qualidade, que garantam a articulação entre ensino e pesquisa e a remuneração dos profissionais, definida a partir de um piso nacionalmente unificado, levariam a uma certa autonomia profissional para a atualização e aperfeiçoamento auto-financiados. Desse modo, os professores teriam condições de ampliar sua formação e de alargar seus horizontes culturais (p. 17).
Diante desta incipiente abordagem da problemática da profissionalização docente, este pré-projeto visa pesquisar de modo exploratório os impactos da implantação do piso salarial nacional dos professores da educação básica na formação literária continuada dos docentes de língua portuguesa, e, destarte, situar os aspectos envolvidos na leitura literária destes profissionais, sejam eles promotores ou empecilhos do ato de ler do professor.
Nossa tese é de que o elemento financeiro e temporal são os grandes vilões do aperfeiçoamento profissional o que pode está prejudicando a profissionalização de professores da rede pública municipal do entorno do Distrito Federal.

JUSTIFICATIVA

Tal abordagem se justifica na medida em que é postulado o pouco contato de professores de literatura com leituras de aprofundamento teórico e/ou culturais, sobretudo após a conclusão dos cursos de graduação, cursos estes majoritariamente voltados para o ensino da historiografia tradicional da literatura.
Aliado a isso, o acesso aos livros é tradicionalmente encarado como algo restrito às elites culturais e intelectuais, não apenas pelo seu elevado preço, mas também porque, em geral, os professores da educação básica não dispõem de tempo suficiente para fazer leituras e releituras imprescindíveis ao bom andamento de seu trabalho e também de sua formação pessoal, hipótese que poderá ser confirmada ou não após a conclusão da pesquisa.
Com a instituição do FUNDEB (Fundo Nacional de Educação Básica), aliado a um importante desdobramento seu: a instalação do piso salarial nacional dos professores da educação básica, o governo espera e a sociedade almeja e torce para que a qualidade da educação no país melhore. A formação dos professores deve logicamente acompanhar esta melhora. Mesmo que o piso salarial ainda não tenha sido implantado, já é mote de muitas discussões no Congresso Nacional e na sociedade como um todo .
É inegável que mesmo sendo um aumento salarial pífio num primeiro momento, não resta dúvida que ajuda a trazer o problema para uma discussão social mais ampla. Por este viés, deve se recolocar a dimensão social e política da importância da atuação docente.
Outro fator agravante da situação destes profissionais do entorno, refere-se a uma situação econômica ambígua, tendo em vista que recebem remuneração dentro de uma situação social subjugada pela realidade socioeconômica do DF, ou seja, por conta de uma extrema dependência destas regiões em relação ao DF, nas mais variadas necessidades, o professor recebe remuneração exígua, porém tem despesas diretamente influenciadas pelo contexto econômico brasiliense.
Assim, com essa realidade econômica, como é possível o professor ler mais, estudar mais, preparar-se mais dentro das novas exigências e perspectivas profissionais? Como é possível o professor montar uma biblioteca particular que sirva de referência básica para seu trabalho?
Neste trabalho, pretende-se perceber de forma inicial, um possível progresso dos níveis de formação leitora dos docentes após a implantação do piso salarial nacional, pois acreditamos que o fator econômico é que determina a desqualificação profissional e não o contrário como apregoam os discursos mais tradicionais e conservadores .
Deste modo foram, em grande medida, as constantes políticas públicas equivocadas (sobretudo no período ditatorial de 1964-85) que promoveram a crescente desvalorização e precarização profissional e remuneratória do professorado brasileiro. Atualmente as políticas públicas parecem tomar diretrizes um pouco mais coerentes neste sentido, fato que somente poderá ser comprovado após afastamento histórico razoável.
Assim, a razão de ser deste trabalho se traduz no anseio de colaborar para o aperfeiçoamento do trabalho docente, mas, sobretudo, almeja lançar mais luz ao problema remuneratório do professorado, que, se bem remunerado, terá mais chances de se formar/ transformar continuamente e saberá conduzir adequadamente seus alunos no universo fantástico da leitura de livros e da leitura do mundo.

REFERENCIAL TEÓRICO

A idéia é construir um aporte teórico que englobe sociologia da educação, sociologia da leitura (fatores que levam a determinada leitura; estuda assim, os mediadores sociais de leitura, foca por isso seu interesse no leitor e os fatores extrínsecos), sociologia do trabalho (para discutir a profissionalização do professor) e teoria literária (analisar especialmente a estética da recepção, ou seja, como o leitor recepciona a leitura), dado o aspecto multidisciplinar e multifacetado que o estudo do ato de ler exige.
No que respeita ao processo de aprendizado e desenvolvimento da leitura, já é clássica a abordagem de Freire (1982) em que "uma compreensão crítica do ato de ler não se esgota na decodificação pura da palavra escrita ou da linguagem escrita, mas se antecipa e se alonga na inteligência do mundo. A leitura do mundo precede a leitura da palavra" .
De acordo com BOURDIEU , a formação do indivíduo em um leitor passa pelas condições econômicas e educacionais permitidas pela classe dominante e pelo o acesso aos bens culturais e, para se inserir nos círculos ditos cultos, é necessário ter um certo nível de poder econômico para adquirir o código, a fim de circular no habitat natural do capital cultural. Deste modo, a definição da distribuição das parcelas do poder econômico, como também do que é o capital cultural cabe à classe dominante ou burguesa, por conseguinte, é ela quem dita as regras das trocas sociais.
No entanto, o acesso ao capital cultural, por meio do poder econômico, não garante que o sujeito esteja em condições de usufruí-lo.
Esta análise nos leva a crer no dinamismo intrínseco do ato de ler e num aprendizado dentro de um continuum de estratégias e modos de se ler, a depender de fatores internos do sujeito, bem como de condições ambientais que promovam ou que garantam o sucesso da leitura empreendida.
Assim o caráter dialógico da leitura é ponto crucial desta análise, pois, a partir desta concepção compreende-se que há uma fusão entre sujeito-leitor e obra lida, na medida em que as experiências pessoais do leitor se aliam às experiências dos outros sujeitos, além de se estender este dialogismo para a relação entre aspectos internos e externos do processo de leitura.
Para o professor TINOCO (s/d), a leitura literária serve a dois grandes propósitos: "Adaptação produtiva, no sentido de renovar a crítica aos costumes, aos valores, aos preconceitos; de redirecionar o olhar do aluno à função cultural da leitura literária como veículo de conscientização social e fonte de prazer estético".
Pensar no leitor como sendo um agente consciente, pressupõe, segundo Tinoco (s/d), pensar nas intenções da linguagem escrita:
Às intenções da linguagem escrita cabe cumprir o papel, entre outros, de transformar a pessoa em um leitor consciente na medida em que ele exerce a atividade de ler de maneira produtiva (produzindo conhecimento adquirido) e reveladora (revelando informações culturais, sociais, políticas etc. então desconhecidos); na medida em que, mais que a obra, ele "lê", por meio dela, o(s) mundo(s) do autor e dele próprio, leitor.

Para TINOCO (s/d), o processo dialógico é basilar na construção do leitor-consciente desde a sua vida escolar. Tal parâmetro pode, a nosso ver, ser ampliado para a formação leitora do docente de Literatura compromissado com a grande dimensão sóciopolítico-ideológica que a literatura engendra,
Assim conscientizada num processo dialógico de desenvolvimento sóciointelectual pelas experiências vividas, uma pessoa pode, quando da fase de sua vida escolar, enquanto leitor, realizar uma leitura mais produtiva no que dizem respeito à apreensão das informações subjetivas ? suporte das chamadas informações essenciais (FIORIN, 1997). Leitura produtiva que se torna um prazer quando a produtividade do leitor se manifesta, ou seja, quando os textos oferecem a possibilidade de ele exercer suas capacidades, dialógicas, de apreensão de mundo (do texto, da sociedade etc.). Nesse processo a pessoa se aprimora enquanto desenvolve sua capacidade de refletir, questionar, descobrir ? aprimoramento promovido pela conscientização de um sujeito-agente consciente de si e do mundo, em suas inúmeras variantes, que o cerca. Por esse processo se tem um leitor consciente, com senso de aprimoramento da leitura numa percepção estética e ideológica mais aguda. Além disso, tal leitor revela visão crítica sobre sua atuação e a de seu grupo, tornando-se agente de aprendizagem e determinando, ele mesmo, a continuidade do processo, num constante enriquecimento cultural e social (AGUIAR e BORDINI, 1988). Tem-se um leitor-agente "ágil" na apreensão do texto implícito diluído no texto apresentado pela mensagem escrita. Ágil no exercício da reflexão, da descoberta, da análise comparativa e na relação entre informações relevantes ou não para a compreensão, por exemplo, de uma obra literária. Ágil na disposição pessoal para realizar uma leitura pelo próprio prazer de ler.

Ainda focando as idéias de Tinoco (s/d), ancorado em "ZILBERMAN (1989), que discutindo a Teoria da Recepção de Robert Hans Jauss, argumenta que "o leitor é sujeito social transformador de seu meio, fonte constante de acumulação de suas próprias experiências de vida articulada às das outras pessoas faz do mundo seu objeto de existência e comunicação".
Segundo BAKHTIN (1997) não se pode negar a dialogicidade do ato de ler. De igual modo, é importante destacar que o processo dialógico bakhtiniano contribui decisivamente para a construção identitária dos sujeitos por meio da linguagem. Assim, a leitura empreendida pelos professores de literatura é marcada pelo seu horizonte sócio-histórico. Esta premissa é o cerne de nossa análise.
Para JAUSS é importante verificar as condições históricas e as evidências que influem na atitude do receptor do texto em relação ao contexto social.
De acordo com ISER, o papel do leitor é evidenciado na medida em que surgem os pontos de indeterminação do texto, sendo que para interpretá-lo, é mister haver uma interação no polinômio Autor-Obra-Leitor para a consecução e efetivação da leitura. O leitor atua projetando e seguindo os elementos intrínsecos e extrínsecos ao texto.

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