A Educação, desde que o homem se tornou consciente da transmissão de valores e conhecimentos já na Antiguidade, desempenhou um papel de suma relevância no que se refere ao processo de formação dos indivíduos. Isto torna-se muito claro se se observar o mundo helênico e a sua valorização do ensino, principalmente para preparar o homem livre para a participação política na polis. Todavia, nem sempre foi a Educação utilizada para a manutenção do bem comum e tornar os sujeitos do ensino mais humanos. O legado do conhecimento técnico-científico obtido e aperfeiçoado ao longo de toda a história do ser humano não poucas vezes foi utilizado e transmitido a serviço de interesses individuais ou que desvirtuaram a sua própria essência de humanizar o homem. De fato, todo esse conhecimento adquirido precisa ser ensinado por um mestre com a cabeça feita como diria Montaigne, afim de que, com responsabilidade, seja utilizado pelo educando para uma boa finalidade.

Quando a base da busca pelo conhecimento transferiu-se da esfera cosmológica para o homem, constituindo assim uma antropologia primeira e o início do pensamento filosófico, a preocupação com a Educação visando o autoconhecimento também surge. Sócrates afirma ser o princípio de qualquer conhecimento o próprio "conhece-te a ti mesmo". De fato, sem isto não há como se ter garantia de que o processo de transmissão, pela Educação, do conteúdo seja lúcido, com vistas ao Belo e que desemboque no oceano do prazer pelo saber. Não há como o homem conhecer (no sentido mais profundo do termo) algo de fato, se não se conhecer por primeiro, aceitar-se como ser em construção, inacabado e, consequentemente, poder ensinar com responsabilidade os conteúdos que formam o indivíduo para a vida.

Tal é o papel do professor: levar o aluno a um despertar para o conhecimento, para o saber; é ser o facilitador do desabrochar de motivações e incentivos que se encontram adormecidos no indivíduo. É a maiêutica que o próprio Sócrates utilizava como processo dialético para se chegar à verdade das coisas.

Ora, sem um autoconhecimento pleno, como é possível reconhecer-se como não sendo o detentor de toda verdade e, consequentemente, distorcer a busca pelo conhecimento, gerando caminhos subjetivistas cego, levando até mesmo a um relativismo moral capaz de produzir atrocidades tenebrosas? O mesmo conhecimento, a mesma técnica podem ser utilizadas para favorecer a vida como para destruí-la. É o caso do avião: inventado para facilitar a vida do homem, foi utilizado como instrumento bélico na Primeira Guerra Mundial, causando mortes e mais do que perdas numéricas, mas perdas irreparáveis de pessoas únicas retiradas violentamente de suas vidas e deixando chagas em famílias inteiras, deixando saudade, dor e desconfiança no próprio homem que destrói a vida de seu semelhante.

Sem a auto-consciência que verdade transcende o indivíduo e que o saber e a ciência devem estar a serviço do homem, a educação jamais conseguirá ser capaz de poder ajudar o ser humano a contemplar o sentido último da sua vida, que consiste em descobrir algo que valha a pena colocar toda a substância de sua vida e, por ela, realizar sua existência como indivíduo. É sempre com o auxílio de alguém que outra pessoa aprende algo, desde livros escritos por pessoas que queriam deixar um ideal a se seguir, àquela conversa informal na qual alguma novidade pode ser passada; e é essa pessoa que marcará vidas positivamente ou não de acordo com aquilo que ela ensinar, pautado naquilo que ela tomou como verdade para si. Eis que cada ser humano tem sua parcela de contribuição para a disseminação d valores, de ensino de saberes que levem a um norte; e cabe ao próprio ser humano realizar a reflexão sobre si e ver o que, de fato, esta ensinando direta ou indiretamente às novas gerações, àqueles que tem sede de conhecimento.

A Educação não deve ser um instrumento que aliena o indivíduo da busca pelo bem, mas antes deve levar, por meio da dialética que filtra e retira excessos e subjetivismos infundados, o homem a confrontar-se com suas realidades e ser capaz de transformá-las, guiá-las para um processo de auto-criação permanente. Tal é a proposta da escola crítico-social que visa colocar o aluno e os conteúdos apreendidos em relação, em confronto com o seu contexto histórico-cultural-social.

Aprender a formar-se deve ser o intuito primeiro e fundamental de qualquer pessoa que deseja ser um educador. Ora, toda pessoa é inevitavelmente um educador, fazendo com que o processo de "aprender a formar-se" seja um processo comum a todos. É certamente interessante retermo-nos aqui, por um instante no aspecto linguístico deste termo: "aprender a formar-se". Não se deve dizer que o educador deve formar-se apenas, mas aprender a formar-se, pois a palavra aprender implica o processo de contínua auto-criação impedindo, assim, a significação que o educador/professor já está formado e nada mais precisa aprender, o que abriria espaço para que o mesmo se fechasse em uma ideologia reducionista como, por exemplo, aconteceu co professores nazistas alemães que ensinavam seus alunos a utilizarem seus conhecimentos e técnicas para fins maléficos.

Considerar-se-á necessário, entretanto, que nenhum ser humano em sã consciência, buscaria fazer o mal pelo mal; contudo, o fechamento num ideal reducionista, que não tolerava as diferenças e que se esvaziara do sentido de aprender a formar-se levou a essa cegueira.

O ser humano é, pois, um ser educador por natureza e, consequentemente, marcará outros com aquilo que for transmitido. Disto nasce a responsabilidade com a verdade e o Bem (aquilo que ultrapassa o plano material e que para nós, cristãos, é chamado Deus) para a reta transmissão de conteúdos capazes de tornar o educando cada vez mais humano. Já era esta e intenção no mudo grego antigo e certamente deve ser a base de qualquer mestre de cabeça feita que realmente queira fazer com que seus alunos aprendam a fazer o bem com os conhecimentos adquiridos. Ou seja, tarefa de todos para todos.



Bibliografia recomendada


LIBANIO, João Batista. A arte de formar-se. 5ª. ed. São Paulo: Edições Loyola, 2002. ? (coleção CES).