AUTORAS: TAIANA LEVINE CARNEIRO CORDEIRO E NAYALLA RIBEIRO SANTOS

PARECER JURÍDICO

 

 

 

Ementa:

Redução; maioridade; penal; inconstitucionalidade; ECA; educação; criminalidade; mídia.

 

 

 

 

           

Trata-se de consulta formulada por Maria Luiza Sá Oliveira, acerca da redução da maioridade penal de 18 para 16 anos. Traz ainda a consulente, perguntas a respeito do tema supracitado, sendo elas:

 

1)    A redução da maioridade penal é constitucional?

2)    Quais são os pontos favoráveis?

3)    Quais são os pontos desfavoráveis?

4)    É necessário uma reforma no ECA?

5)    Caso ocorra a redução da maioridade penal, haverá diminuição da criminalidade?

6)    Quais as possíveis soluções?

 

 

           É o relatório. Passo a opinar.

            Durante muitos anos a redução da maioridade penal é discutida no Brasil pelo Congresso Nacional, numa perspectiva reformadora e punitiva em relação ao menor infrator. Depois de algum tempo parado, o tema voltou a ser apresentado na Câmara dos Deputados e Senado Federal. A proposta de emenda à Constituição Federal traz a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos.

Impossível falar desse tema, e não abordar sua inconstitucionalidade, objeto da primeira questão em estudo. Conforme dispõe o artigo 60 §4º, inciso IV, tal tema não poderá ser objeto de emenda constitucional, pois se trata de cláusula pétrea.

Sobre esse contexto, também diz Dallari:

 

A previsão de tratamento jurídico diferente daquele que se aplica aos adultos é um direito dos menores de 18 anos, que são pessoas, indivíduos, sujeitos de direitos. De acordo com o artigo 60, § 4º, da Constituição, não poderá ser objeto de deliberação proposta de emenda constitucional tendente a abolir garantias individuais (DALLARI, 2001, p. 25).

 

            Vale ressaltar ainda que, o Brasil é signatário dos Tratados Internacionais, como por exemplo, da Convenção sobre os Direitos da Criança da ONU de 1989, que traz os 18 anos como idade inicial para a imputabilidade.

O artigo 227, baseado nos postulados da Declaração Universal dos Direitos da Criança, estatuída pelas Nações Unidas, culminou na elaboração do ECA, que versa sobre os direitos universais da pessoa humana:

 

É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda a forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

 

            Não obstante tem a questão do sistema prisional brasileiro que atualmente está falido, levando em consideração que Brasil tem a 4ª maior população carcerária do mundo, os presídios se tornaram depósitos humanos, onde a superlotação acarreta violência sexual entre os presos, faz com que doenças graves se proliferem, as drogas cada vez mais são apreendidas nas penitenciárias e o mais forte subordina o mais fraco.

            Tudo isso prova que o sistema penitenciário não tem cumprido sua função social de controle, reinserção e reeducação desses criminosos. Sendo assim, nenhum tipo de experiência numa cadeia pode contribuir com o processo de reeducação e reintegração dos jovens infratores à sociedade.

            Esta realidade é prova suficiente para demonstrar que o sistema penal brasileiro, ainda não está preparado para se falar em redução da maioridade penal, pois está longe de ter um presídio com condições de sobrevivência humana para colocar esses jovens infratores, caso ocorra de fato esta emenda à Constituição.

            É importante salientar que, aqueles que são favoráveis ao tema defendem que, as punições atualmente para esses menores são muito brandas, levando em consideração a punição prevista no ECA que é de três anos de internação para os menores infratores, inclusive os que tenham cometido crimes hediondos.

            Inclusive, posiciona-se a favor à redução da maioridade penal, o jurista Guilherme de Souza Nucci, defendendo a possível aprovação do projeto em comento:

 

 

Não é admissível acreditar que menores entre 16 anos ou 17 anos,não tenham condições de compreender o caráter ilícito do que praticam,tendo em vista que o desenvolvimento mental acompanha como é natural, a evolução dos tempos (NUCCI, 2007, p.294).

 

            Estas pessoas que defendem a redução da maioridade penal se prendem ao argumento de que a população vive indignada por conta da ausência de punição mais severa. Desta forma,alimentam uma crença de que como esses menores infratores sabem que não podem ser presos,se aproveitam para cometer mais crimes. Além do mais, nos Estados Unidos, a maioria dos estados submetem seus jovens a processos criminais como adultos a partir dos 12 anos de idade. Uma boa parte dos países desenvolvidos já adotam a maioridade penal abaixo de 18 anos.

                        Por outro lado, é de extrema relevância lembrar que a redução da maioridade penal afetará principalmente os jovens menos favorecidos, ou seja, os pobres e negros que na sua maioria vivem nas periferias. Por sinal, este é o perfil predominante do sistema prisional.

            De acordo com ECA, já existem responsabilização e medidas socioeducativas para os jovens que cometem infrações (contravenções, crimes). Fora que, tal redução representaria um retrocesso na política penal.Segundo José Heitor dos Santos:

 

Estas medidas deveriam ser aplicadas para recuperar e reintegrar o jovem à comunidade, o que lamentavelmente não ocorre, pois ao serem executadas transformam-se em verdadeiras penas. Na verdade, as 22 medidas transformam-se em castigos, revoltam os menores, os maiores, a sociedade, não recuperam ninguém. A exemplo do que ocorre no sistema penitenciário adotado para os adultos.

 

 

 

 

            Importante enfatizar que, dados da UNICEF, revelam a experiência mal sucedida dos EUA. O país,que assinou a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança,aplicou em seus adolescentes,penas previstas para os adultos.Esses jovens que cumpriram pena em penitenciárias como um adulto qualquer,voltaram a delinquir e de forma mais violenta.O resultado concreto para a sociedade foi o agravamento da violência.      

            A retomada desta emenda à discussão na atualidade veio reforçar um oportunismo político que liga um governo com sua política defasada, que tenta levar vantagens criando leis inviáveis e inconstitucionais e a atual realidade dos presídios, que poderão futuramente receber esses condenados com idade entre 16 a 18 anos. Visto que,esses adolescentes,na realidade, são mais vítimas do que autores de violência.

            Apesar de grande parte da população se posicionar a favor do projeto em discussão, entendendo que a criminalidade diminuiria, pesquisas mostram uma posição divergente, trazendo exatamente que tal diminuição geraria um aumento considerável no número de crimes no Brasil.

            É sabido que, os adolescentes infratores que são submetidos às medidas socioeducativas, de acordo com o ECA, apresentam índices abaixo de 20% no que se refere à reincidência, isto quer dizer que, a maioria consegue se ressocializar e voltar ao convívio familiar. Visto o que foi dito anteriormente, infelizmente, o sistema carcerário brasileiro está distante de ser considerado o lugar ideal para reeducar e reinserir o individuo no ambiente social. O índice de reincidência nas prisões brasileiras é de 70%,ou seja,7 em cada 10 detentos voltam para a prisão.O mais provável é que os jovens saiam de lá mais perigosos do que quando entraram.Com a aprovação da PEC 171/93,chegaremos a conclusão de que o menor infrator não “tem jeito”,atestando assim,que o ECA é incapaz de sanar o problema da violência juvenil.

            Não obstante, os dados da Secretaria Especial de Direitos Humanos, indicam que houve uma considerável estabilização das taxas de atos infracionais privados de liberdade desde 2007: uma média de 16 mil jovens. Diante disto, a pesquisa do CNJ da série “Pensando o Direito” (2007) verificou que:

 

Os dados coletados junto aos Tribunais de Justiça e Superior Tribunal de Justiça em matéria de medida socioeducativa de internação, e posteriormente, a observação de casos junto às Varas da Infância e Juventude de São Paulo, Porto Alegre, Recife e Salvador, permitiram concluir que, apesar das propostas garantidoras do Estatuto, a prática forense nem sempre está com ela alinhada. Foi possível constatar que a medida de internação é sistematicamente imposta com baixa fundamentação legal. Em muitos casos, sem a devida consideração dos requisitos legais exigidos pelo ECA.

 

            Outro ponto importante a ser destacado, é a questão da educação, que se for colocada como prioritária e de qualidade, com certeza será uma ferramenta mais que eficiente para resolver a criminalidade, para isso, o problema da educação deverá ser superado.

            Além disto, é sabido que as causas de violência e da desigualdade social não se resolverão apenas com a criação de leis mais severas. Para tanto,a aprovação do projeto de lei em questão,traria um retrocesso para o desenvolvimento do país,levando-se em consideração que,é mais eficiente educar do que punir.

            É de suma importância não deixar de falar mais uma vez, sobre o papel da mídia na hora de influenciar as pessoas de forma negativa, fazendo com que elas entendam e aceitem apenas um lado da “história”.

 

 

 

 

 

 

 

 

CONCLUSÃO

 

           

            Diante do exposto, trago meu posicionamento de forma contrária à redução da imputabilidade penal. De modo a esclarecer que,hodiernamente, não há dados que comprovem que adotando tal medida haverá diminuição nos índices de criminalidade entre os jovens. Além do mais, os países onde a maioridade penal é inferior a 18 anos, não houve redução na prática dos delitos. Estudos no campo da criminologia,das ciências sociais e da psicologia demonstram que não há relação direta de causalidade entre a adoção de soluções punitivas e repressivas e a diminuição dos índices de violência.

            Por tanto, fica claro que são as políticas sociais, e não a repressão descontrolada que tem o potencial para diminuir o envolvimento dos jovens no “mundo” do crime. O ECA em momento algum do seu texto defende a impunidade desses jovens, muito pelo contrário, defende a responsabilização do adolescente que comete o delito através de medidas socioeducativas.

            A sociedade deveria é conhecer melhor e exigir que estas medidas sejam cumpridas de forma adequada. E para de pensar que punição (principalmente o encarceramento)é uma espécie de vingança social contra jovens infratores.Punição,seja para jovens ou adultos,não deve ter esse papel de vingança e sim um papel educativo e de reinserção dos criminosos na sociedade.

 

 

 

 

           

 

            É o parecer.

 

            Ilhéus, 04 de novembro de 2015.

 

            Nayalla Ribeiro Santos

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Parecer Jurídico- Redução da Maioridade Penal

Autora(s): Taiana Levine Carneiro Cordeiro e Nayalla Ribeiro Santos

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