READAPTAÇÃO E DESVALORIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO 

Autoras:

Isabel Cristina Corrêa Ribeiro

Maria Auxiliadora de Oliveira

(Professoras da Rede Municipal de Ensino) 

No mundo atual o ser humano está mais preocupado em prejudicar do que ajudar o outro, no ambiente escolar isso muitas vezes se transforma em perseguição. Os favorecidos são sempre os bajuladores, o que não é culpa só destes, pois se existe esse tipo de pessoa, é porque também existem aquelas que se sentem realizadas sendo bajuladas. É triste admitir, mas a educação está falida em todos os aspectos e os gestores não tem preocupação nenhuma com os seus profissionais, ainda mais quando esse adoece, ele perde toda a sua dignidade, que muitas vezes é a única coisa que resta, isso quando não lhe é tirado isso também.

O professor quando adoece e não está de licença médica ele é readaptado ou o chamado “desvio de função”, uma invenção que deveria ajudar na sua recuperação, mas infelizmente serve para a sua degradação maior.

Passar na perícia, muitas vezes, somos vítimas de humilhação, o médico mal olha ou fala conosco, ficamos menos de um minuto na sala e ainda diminui o tempo que o médico que nos acompanha escreveu no laudo, temos que ouvir que estamos boas para trabalhar, mesmo sem termos condições nenhuma. Será que o médico da perícia está mais apto a fazer uma avaliação do que o próprio colega que nos acompanha? Isso é vergonhoso e revoltante. Temos que percorrer médico, secretaria, perícia em curto espaço de tempo, pois é cortado o tempo que você necessita para se tratar, o que para quem está doente é muito estressante e para quem está substituindo é preocupante, pois se a perícia demora o profissional não recebe o seu salário e esse vai e vem na perícia que está constantemente lotada, não ajuda em nada na nossa recuperação, só aumenta o gasto com transporte e no tratamento.

A readaptação gera desrespeito, desvalorização profissional, sofrimento, exclusão, restrição de atividades, mudança de função ou de local de trabalho dentre outros obstáculos para o desenvolvimento da identidade profissional docente. Além disso, ficamos sujeitos ao preconceito já enraizado na cultura escolar. O processo de readaptação, como tem se realizado, não promove uma efetiva readaptação, mas novos fatores de sofrimento que geram angústias, exclusão, frustração. 

Somos readaptadas, temos as nossas limitações de saúde, mas nunca fomos relapsas ou negligentes com o nosso trabalho, levamos o que fazemos com maior seriedade e isso não é de hoje, pois já estamos há mais de 20 anos na educação e temos a certeza que nesse tempo fizemos a diferença.

Sabemos que em toda nossa sociedade existem pessoas que tiram proveito de seus direitos, como em qualquer profissão ou segmento da sociedade (médicos, políticos, gestores...), mas não devemos penalizar a todos e nem generalizar. Será que por causa dos aproveitadores aqueles que necessitam devem passar por tamanha humilhação? É crueldade o que fazem com os seus profissionais doentes. Temos muitas vezes 25 a 30 alunos em uma sala, além da jornada de trabalho acontecer além do espaço escolar, deixamos de atender nossa família, fazemos o papel que o psicólogo e os pais de nossos alunos deveriam fazer, pois estamos lidando com vidas que merecem ser bem cuidadas. E assim, o profissional que adoece, por não ter condições física ou mental, prefere sair da sala de aula para não prejudicar os seus alunos e não agravar ainda mais a sua saúde. Até quando a nossa sociedade vai ter esse comportamento degradante?

Somos readaptadas e sentimos essa cultura preconceituosa na pele, enquanto estávamos na sala de aula não faltávamos, chegávamos no horário, preocupávamos em desenvolver um bom trabalho, em primeiro lugar sempre estavam os nossos alunos, recebemos inúmeros prêmios em reconhecimento ao trabalho realizado, adoecemos no exercício da nossa profissão, mas não temos do que nos envergonhar, temos a consciência tranquila pelo trabalho realizado, mas a injustiça nos revolta e nos deixa indignadas, pois nunca lesamos ninguém, atualmente precisamos trabalhar respeitando a nossa restrição médica, mas não negamos a fazer o que nos é proposto e continuamos assíduas e compromissadas com o nosso trabalho.

Quando a pessoa está readaptada sempre é vista com um olhar reprovador, seguido de você está tão bem, nem parece doente... como se tivéssemos a obrigação de estar "acabada" para mostrar para o outro. O preconceito existe por parte de todos os segmentos. Quando está arrumada questionam se você realmente está doente, se não se arruma dizem que se faz de vítima, se você está com uma doença física termina ficando com o emocional abalado, se está com problema emocional termina em suicídio (como já vimos acontecer com colegas de trabalho). Muitas vezes não gostamos de reclamar ou falar em doença para não entristecer aqueles que estão perto, preferimos falar de coisas boas, mas se você não reclama não está doente, quem reclama mais da doença esse sim precisa e é merecedor, como se a doença fosse um prêmio. No meio de tantos profissionais presenciamos que em seu planejamento escreve em tornar os alunos críticos, mas nos perguntamos como ele quer isso se nem mesmo ele é assim?

Não temos culpa dos rombos e fraude nas previdências por parte daqueles que administram, somos trabalhadores e merecemos respeito. A aposentadoria de professores que acontecia quando estes completavam 25 anos de profissão e 48 anos de idade, depois passou para 50 anos de idade (isso porque é considerada aposentadoria especial), mas o professor tem seu prazo de validade, não aguenta tanto tempo em sala de aula, pois o desgaste físico e mental é grande, o que faz que esse profissional termine doente. Dessa forma, a readaptação é apenas um dos indicadores do processo de degradação da saúde dos trabalhadores das escolas. Entretanto, os órgãos governamentais enfrentam essa questão como um problema burocrático e não como uma questão de saúde coletiva dos trabalhadores da educação. Nós, profissionais somos vítimas primeiramente das condições e da organização de trabalho que nos adoecem e depois da falta de uma política clara de readaptação. 

Contudo, o que nós consideramos mais importante do que qualquer discussão sobre a readaptação é o fato de que ela não deveria ser necessária mesmo que funcionasse, ou seja, o trabalho não deveria estar produzindo tantos adoecimentos, tantos readaptados. Essa é a face mais indesejável do trabalho, prevalecendo e favorecendo o aparecimento de patologias, que por sua vez geram a necessidade de afastamentos dos trabalhadores de suas funções.

Somos readaptadas sim, mas não incapazes de contribuir com uma educação realmente de qualidade!