Estamos em 2010, em plena era democrática, e ainda é muito comum nos depararmos com cenas que nos remetem à triste época da Ditadura Militar e aos seus Atos Institucionais (AI), atos que suprimiram os direitos políticos, civis e sociais de nossa sociedade por 21 anos.
Na noite do dia 15 de fevereiro deparei-me com uma cena, em pleno canteiro central da Avenida Presidente Vargas (na altura do prédio sede do Metrô Rio, sentido Leopoldina), que me fez refletir sobre a qualidade da ação policial que temos.
Três agentes do Estado (um oficial e dois praças PM), praticando violência gratuita e desmedida contra dois cidadãos já imobilizados, sob os olhos de todos que ali passavam. Digo cidadãos, pois entendo que qualquer que tenha sido o suposto delito daqueles jovens, a condição de cidadão deles não foi suprimida, sendo, portanto, sujeitos de direitos.
A violência gratuita e desproporcional dos agentes do Estado sobre o cidadão nos remete aos tempos da ausência dos direitos. Como conceber a existência de tal ato nos tempos de democracia?
A Nossa Carta Magna de 1988, garante a todos os cidadãos o direito a, ainda que tendo cometido um delito/crime, ter preservada sua integridade física, psicológica e moral; a ser submetido a julgamento justo; e caso condenado, que tenha uma pena proporcional à ação cometida. Tudo isso estando previsto em lei, pois não há crime/delito, sem que haja uma lei que o defina como tal.
Analisando todo este breve percurso entre um delito e seu julgamento em uma sociedade democrática que acreditamos viver, não consegui identificar em que momento a lei garante ao policial o direito à prática do achaque, da violência física e psicológica gratuitas que testemunhei ali, em pleno Carnaval, numa via tomada por outros cidadãos, o que infelizmente parece não ser um ato isolado na Cidade do Rio de Janeiro.
Fica o questionamento: "Quem vigia o vigia?"
Se o Estado Democrático de Direito foi implantado no Brasil e confirmado por nossa Constituição Federal de 1988, por que ainda nos dias de hoje, passados quase 22 anos, nossa polícia ainda se vale das "liberdades" da Ditadura para agir de forma truculenta? Por que nossa estrutura de segurança pública ainda está arraigada à violação de direito para empregar a execução da lei? Não seria um contra-senso se valer da violação do direito para se garantir a aplicação da lei?
Paula Poncione , em seus estudos sobre a polícia no Estado do Rio de Janeiro, aponta a falta de mudanças na estrutura de formação profissional desta instituição como uma das causas e cita também a resistência destes profissionais ao ajustamento de suas ações em conformidade com respeito aos Direitos Humanos. Sendo uma carência já no processo formativo do profissional, a culpa recai sobre o Governo do Estado, que não tem desenvolvido ações eficazes para a mudança de paradigma constitucional do papel da polícia.
E nós sociedade? Por que presenciamos tais atos e, ainda que reprovemos, nos mantemos calados? Mantemos-nos calados porque temos medo desta polícia que deveria nos causar orgulho e sensação de segurança.
Não é esta a estrutura policial que queremos!
Queremos a estrutura de polícia descrita na Constituição Federal de 1988! A estrutura policial que se estabeleça para a manutenção da ordem e em defesa do cidadão, com respeito irrestrito aos Direitos Humanos.
O que falta para que ela seja efetivada? Não lutar para que tais mudanças aconteçam é aceitar a forma desrespeitosa com que a ação policial vem se dando e legitimar a violência. Pense nisso. Não lutar por uma polícia cidadã é autorizá-la a desrespeitar os nossos direitos constitucionais.
Sou João Silva, Bacharel em Serviço Social.

*Bacharel em Serviço Social
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