Nesse artigo, o enfoque é dado para a questão das qualidades exigidas contemporaneamente para o papel do administrador. O direcionamento dado à pesquisa trata de forma mais evidenciada sobre a Gestão por Competência, considerando-se a relevância que esse tema tem apresentado na discussão acerca do papel do administrador na atualidade. Com base em um suporte literário consistente e substancial, pôde-se elencar várias considerações acerca desse modelo de gestão e particularmente as qualidades necessárias para que o administrador nos tempos atuais possa atuar com desenvoltura e desempenho, tornando-se, ao mesmo tempo, um forte diferencial competitivo para o alcance dos objetivos organizacionais.

Introdução

Uma das funções primordiais de um administrador diz respeito ao gerenciamento e liderança de pessoas. Esta atividade envolve aspectos relacionados com diversas áreas do conhecimento, como competências, capacidade de agregar pessoas em torno dos objetivos delineados pelas organizações, sensibilidade para obter a cooperação e o comprometimento de seus subordinados na consecução daquilo que foi planejado, entre outros.

As habilidades em administrar pessoas são vistas como um conjunto de competências e conhecimentos que podem ser inatos, aprendidos, desenvolvidos e aperfeiçoados, tal qual apregoam as teorias que tratam da temática. Porém, esse conjunto deve ser incrementado com a apropriação de teorias administrativas que possam favorecer o bom desempenho da gestão.

Na contemporaneidade, percebe-se que a Gestão de Pessoas passou a ser um importante foco diferencial para a obtenção de resultados pelas empresas, configurando-se, inclusive, como um diferencial competitivo para estas, já que as atitudes de um líder influem no desenvolvimento e crescimento da organização.

Atualmente, uma das propostas que mais tem sido evidenciada é o da Gestão por Competências, isso porque, no ambiente organizacional moderno, já não se concebe a idéia de se ter vários tipos de liderança - como um líder autocrático e coercitivo ou um líder democrático, por exemplo - o que leva a uma discussão acerca dos novos modelos de liderança exigidos pelas organizações.

Com base nesses pressupostos iniciais, verifica-se o interesse pelo tema ora abordado, na medida em que a discussão que se promove nesta pesquisa perpassa por vários contextos no que diz respeito às qualidades do administrador no momento atual, mas principalmente evidenciando a Gestão por Competências.

Para tanto, traçou-se o objetivo geral da pesquisa, que consiste em apresentar elementos literários que comprovem e/ou reforcem a concepção sobre o a qualidade do administrador exigida no contexto de gestão atual, com enfoque para a Gestão de Competências.

Para o alcance desses objetivos, estruturou-se a metodologia da pesquisa como sendo de cunho essencialmente bibliográfico, justificado pelo fato de existirem inúmeras obras sobre o assunto, o que permite uma discussão mais substancial e consistente sobre o direcionamento da pesquisa.

1 A ÓTICA CONTEMPORÂNEA SOBRE O PAPEL DO ADMINISTRADOR

A Gestão de Pessoas nas organizações é a função que permite a colaboração eficaz das pessoas – empregados, funcionários, recursos humanos ou qualquer denominação utilizada – para alcançar os objetivos organizacionais e individuais. Os nomes – departamento de pessoal, relações industriais, recursos humanos, desenvolvimento de talentos, capital humano ou intelectual – são utilizados para descrever a unidade, o departamento ou a equipe relacionada com a gestão das pessoas (CHIAVENATO, 1999).

Ainda segundo o autor citado, o contexto de Gestão de Pessoas é formado por pessoas e organizações. As pessoas dependem das organizações onde trabalham para atingir seus objetivos pessoais e individuais, assim como as organizações dependem direta e irremediavelmente das pessoas para operar, produzir seus bens e serviços, atender seus clientes, competir nos mercados e atingir seus objetivos gerais e estratégicos.

Como apregoa Marras (2000), o setor encontra-se em evidência por estar focado nas pessoas, descobrindo e explorando seu potencial como uma troca, dando-lhes benefícios e aproveitando seus benefícios. As pessoas são parceiras da organização e cada um está disposto a continuar investindo seus recursos na medida em que obtém retornos e resultados satisfatórios de seus investimentos. Através de seus resultados, a organização pode proporcionar um retorno às contribuições efetuadas e hoje o parceiro mais interno da organização é o colaborador, que está dentro da empresa dando vida e dinamismo.

Colabora também Vieira (1996), quando destaca que, dependendo da maneira como as pessoas são tratadas, elas podem ampliar ou limitar as forças e fraquezas de uma organização. Pelo exposto, infere-se que a Gestão de Pessoas na organização é a função que permite a colaboração eficaz das pessoas para alcançar os objetivos organizacionais e individuais.

Nesse sentido, Chiavenato (1999), diz que esses objetivos obedecem a certas prioridades na organização, como: ajudar a organização a alcançar seus objetivos e realizar sua missão, proporcionar competitividade à organização, proporcionar à organização, colaboradores bem treinados e bem motivados dando reconhecimento às pessoas; aumentar a auto-atualização e a satisfação dos colaboradores no trabalho por serem fontes determinantes do sucesso organizacional; e desenvolver e manter qualidade de vida no trabalho.

Para uma melhor elucidação, Chiavenato (2000, p. 145) define que a moderna Gestão de Pessoas consiste em várias atividades, denominadas políticas e práticas, que podem ser resumidas em alguns processos, como:

a) Processos de agregar pessoas: utilizado para inclusão de novas pessoas na empresa, através do Recrutamento e Seleção;

b) Processos de desenvolver pessoas: utilizados para capacitação e incrementação do desenvolvimento profissional e pessoal, por meio de treinamentos;

c) Processos de recompensar pessoas: utilizado para incentivar as pessoas e satisfazer suas necessidades individuais, através da remuneração e dos benefícios e serviços;

d) Processos de aplicar pessoas: utilizado para o desenho das atividades que as pessoas irão realizar na empresa, orientar e acompanhar seu desempenho, por meio do Desenho de Cargos, da Avaliação de Desempenho e da Cultura Organizacional;

e) Processos de manter pessoas: utilizado para criar condições ambientais e psicológicas satisfatórias para as atividades das pessoas, através de Higiene; Segurança e Qualidade de Vida.

Portanto, é nesse sentido que se diz que as empresas, para funcionarem, requerem um conjunto de recursos. O ser humano é um desses recursos. E é um recurso com características bastante exclusivas - possui capacidade de pensar, imaginar, julgar e decidir (PALADINI apud CRAWFORD, 1994).

Segundo Likert e Likert (1999, p. 110), “[...] não podemos pensar em negociação ou gestão de pessoas sem considerar as dimensões culturais nas quais os grupos encontram-se imersos”. Por conseguinte, entende-se que a Gestão de Pessoas requer profundo conhecimento, por parte dos administradores, dos fatores que mobilizam o grupo ou que podem estagnar e estereotipar o trabalho.

O conceito de administração de RH foi construído sobre as bases de otimização dos recursos, em que as pessoas eram vistas como uma parte do funcionamento da engrenagem. Como afirma Fischer (2001, p. 19), “otimizar máquinas, equipamentos, materiais, recursos financeiros e 'pessoas' sempre foi seu grande objetivo”. A emergência do termo Gestão de Pessoas, segundo Fischer, envolve transformações significativas e estruturais, como destaca mais além:

Embora os conceitos de administração e de gestão sejam utilizados como sinônimos, em geral considera-se “gestão” uma ação para a qual há menor grau de previsibilidade sobre o resultado do processo a ser gerido. Isso acontece porque gestão implica considerar o caráter humano, ou seja, numa relação em que se admite que ambas as partes são conscientes e possuem vontade própria (FISCHER, 2001, p. 18).

O termo “Gestão de Pessoas” não é um modismo ou um novo jargão do dicionário administrativo. Na verdade ele implica o reconhecimento dos interesses e valores tanto da instituição quanto do grupo e se relaciona ao modelo sistêmico de relações menos diretivas, que prevê senso ético, autonomia e responsabilidade nas decisões. A gestão de pessoas, então, passou a ser um importante foco diferencial para obtenção de resultados pelas organizações, fazendo crer que se constitui em um poderoso fator no desenvolvimento e crescimento da mesma.

2 O ADMINISTRADOR NO COMANDO DE PESSOAS

De acordo com Golemann (1999), o comando de pessoas tem pelo menos dois significados. O primeiro refere-se à ampla classe de atividades pelas quais os administradores estabelecem o caráter e a tônica de sua organização. Essas atividades incluem a articulação e exemplificação de valores e estilos distintos da empresa.

O segundo significado de administrador refere-se ao processo interpessoal de influência através do qual os gerentes se comunicam com os subordinados sobre a realização do trabalho. O progresso é facilitado quando a informação relevante sobre a tecnologia, coordenação e motivação é trocada.

Os estilos de administração e poder tem gerado vivo interesse, debate e, ocasionalmente, confusão através de toda a evolução do pensamento administrativo. A arte de administrar pessoas é tipicamente definida como o processo de influenciar as atividades de um indivíduo ou grupo num esforço para a realização de objetivos. Esse processo está intimamente ligado com o poder, ou o potencial de influência do líder, como recurso que o capacita a induzir consentimento de influência dos seguidores.

Conforme apregoam Spencer e Pruss (1994), diversas bases de poder foram identificadas ao longo dos anos como meios potenciais de influenciar com sucesso o comportamento de outros, classificadas em sete, como definidas a seguir:

a) Poder Coercitivo: é baseado no medo. Um líder com alto poder coercitivo é visto como induzindo consentimento, porque o não consentimento resultará em punições tais como execução de tarefas de trabalho indesejáveis, reprimendas ou demissão;

b) Poder de Conexão: é baseado nas “ligações” do líder com pessoas importantes e influentes dentro ou fora da organização. Um líder com elevado poder de conexão induz o consentimento dos outros porque eles almejam ganhar o favor ou evitar o desfavor da conexão poderosa;

c) Poder de Especialista: é baseado na posse, pelo líder, de especialização, habilidade ou conhecimento, que, pelo respeito suscitado, influenciam os outros. Um líder com alto poder de especialista é visto como possuindo especialização suficiente para facilitar o comportamento de trabalho dos outros. Este respeito leva ao consentimento para com os desejos do líder;

d) Poder de Informação: é baseado na posse ou acesso, pelo líder, da informação que é percebida como valiosa para os outros. Esta base de poder influencia os outros porque eles necessitam esta informação ou querem estar “por dentro das coisas”;

e) Poder Legítimo: é baseado na posição mantida pelo líder. Normalmente, quanto mais alta a posição, mais alto tende a ser o poder legítimo. Um líder com alto poder legítimo induz ao consentimento ou influencia os outros porque eles sentem que essa pessoa tem o direito, em virtude da posição na organização, de esperar que suas sugestões sejam seguidas;

f) Poder de Referência: é baseado nos traços pessoais do líder. Um líder com grande poder de referência é geralmente admirado e apreciado pelos outros por sua personalidade. Essa admiração pela identificação com o líder influencia os demais;

g) Poder de Recompensa: é baseado na capacidade do líder em prover recompensas para outras pessoas. Elas acreditam que sem consentimento irá levá-las a ganhar incentivos positivos, tais como pagamento, promoção ou reconhecimento.

Essas bases de poder são encontradas em qualquer registro literário, compondo uma sustentação teórica que perdura através do tempo. No entanto, outras correntes que abordam a temática liderança evidenciam que a verdadeira liderança não está baseada no poder emanado, mas sim em “[...] desenvolver o talento que existe nas empresas, os verdadeiros exploradores do potencial de outras pessoas” (PETERS, 2002, p. 1).

Isso implica em determinadas qualidades competências que devem ser atributos exclusivos dos administradores, razão pela qual os atuais conceitos de liderança enfocam bastante essa condição.

3 A QUESTÃO DAS COMPETÊNCIAS

Nas últimas décadas, em virtude das mudanças que vêm ocorrendo no ambiente empresarial, ganhou expressão um novo conceito sobre Administração de Recursos Humanos: o Sistema de Gestão de Pessoas por Competências.

Este sistema pode substituir os sistemas tradicionais, baseados no cargo, que ainda hoje são largamente adotados apesar de suas deficiências e desvantagens em relação ao sistema baseado nas competências individuais. A forma de gerir pessoas vem-se aprimorando lado a lado com as diversas práticas de gestão empresarial, sofrendo os impactos das crises econômicas mundiais do crescente aumento da competição entre as empresas e da globalização.

O sistema de gestão baseado no cargo tem sofrido muitas críticas, já que foi concebido em um mercado com baixa variabilidade de produtos e ganhos de escala, e que se caracterizava por exibir mão-de-obra abundante, com baixa exigência de qualificação, e atividade de produção rotineira e estruturada (DUTRA, 1999).

Entre as limitações dos sistemas tradicionais apontadas pela literatura, podem-se citar: falta de flexibilidade do sistema baseado nos cargos, que está se tornando obsoleto, dadas as condições atuais em muitos mercados, tais como a reestruturação organizacional, o downsizing[1], a reengenharia[2], a introdução de novos produtos no mercado, e até mesmo o surgimento de novas formas de organização do trabalho, como as equipes virtuais. Em virtude dessas mudanças, os funcionários têm trabalho a ser feito, mas muitos não terão um cargo certo e bem definido por muito tempo (LAWLER III, 1998).

O sistema atual, na visão de Hipólito (2000, p. 81) acaba por apresentar “baixa flexibilidade, reduzindo a agilidade organizacional”, promovendo um “estilo burocrático de gestão”. Desse estilo, o autor considera que o sistema tradicional de liderança não recompensa os funcionários pelo que realmente se espera que eles façam, já que as faixas salariais, nos sistemas baseados no cargo, tendem a reproduzir o valor de mercado: média, valores máximo e mínimo. Raramente os líderes têm permissão para remunerar o indivíduo acima das faixas salariais, não importa quanto o desempenho esteja acima da média.

De acordo com Emerson apud Albuquerque e Oliveira (2001, p. 102), dado o uso dos cargos, geralmente reconhece-se o tempo e não a contribuição dos funcionários quando da tomada de decisões. Assim, o sistema não “encoraja o desenvolvimento de habilidades e competências”.

Dessas percepções é que, a partir dos anos 1990, se começou a formar um modelo estruturado de gestão de pessoas, que tem como peculiaridade considerar a participação dos funcionários como sendo essencial para que a empresa implemente sua estratégia e crie vantagem competitiva.

Segundo Lawler III (1998), esse é o chamado Modelo de Gestão por Competências, que é uma tendência apontada na gestão de pessoas para os próximos anos e à qual muitas empresas já se adaptaram.

3.1 O que vem a ser competências

Inicialmente, o conceito de competência surgiu com base nas core competencies, ou competências essenciais, conceito desenvolvido por Prahalad e Hamel apud Fleury (1999). De acordo com esses autores, o aumento de competição entre as empresas, conhecimentos altamente perecíveis, principalmente sobre a tecnologia, e grande instabilidade são alguns dos fatores que fizeram – e fazem – com que as empresas passem de uma perspectiva de estrutura estável para a de instabilidade e generalidade, orientadas por um conjunto de competências que as diferenciem da concorrência.

As posições defensivas dão lugar a um desenvolvimento de vantagem competitiva que se sustente, e a estratégia alinhada ao mercado passa a ser uma estratégia onde se pressupõe que o mercado apresenta tantas mudanças e possibilidades que torna necessária uma visão consistente para “criar” as oportunidades de realização.

Assim, Ledford apud Albuquerque e Oliveira (2001) explica que esse é um sistema que se liga menos às atividades cotidianas e operacionais do que os sistemas que ainda têm por base o elemento cargo, e que está mais voltado para o futuro da organização como um todo, para a sua estratégia.

De acordo com Fleury (1999), vários autores têm tentado definir o conceito de competência, e isso hoje representa uma das dificuldades encontradas para a difusão do sistema: sua difícil conceitualização. Os primeiros conceitos definiram competência como o conjunto de habilidades e tecnologias necessárias para agregar valor a uma organização.

As competências devem, portanto, ser um parâmetro norteador das políticas da empresa em geral. Sob o ponto de vista da Gestão de Pessoas, as competências tendem a estar relacionadas com os indivíduos que fazem parte da organização. Assim, as competências individuais devem ser decorrentes das core competencies, que são atribuídas à organização.

Uma das definições mais conhecidas e aceitas sobre o conceito de competência, já no sentido mais individualizado, é dada por Fleury (1999, p. 51): “Competência é um saber agir responsável e reconhecido, que implica em mobilizar, integrar, transferir conhecimentos, recursos, habilidades que agreguem valor econômico à organização e valor social ao indivíduo”.

Outros autores também contribuíram com sua definição para a significação de competência, e foram de grande valia para a compreensão do assunto. Lawler III (1998), a exemplo, enfatiza, em sua definição, a importância de relacionar competências com a performance individual. Para o autor, competências são “características demonstráveis de um indivíduo, que incluem conhecimentos, habilidades e comportamentos, ligados diretamente com a performance” (p. 67).

Esse conceito, que se refere diretamente ao indivíduo, é importante, já que uma pessoa pode demonstrar as mesmas competências independentemente de seu cargo atual. Parry apud Dutra (1999) acrescenta mais três aspectos à definição de competências: para ele, as competências não deveriam refletir meros traços de personalidade mensuráveis através de padrões usualmente aceitos e passíveis, portanto, de serem desenvolvidas por meio de treinamento e desenvolvimento.

Quanto à sua classificação, Fleury (1999) indica que as competências podem ser: a) Competências técnicas/profissionais: específicas para uma operação, ocupação ou tarefa (desenho técnico, operação de um equipamento, finanças); b) Competências sociais: saber ser, incluindo atitudes e comportamentos necessários para o relacionamento entre pessoas (comunicação, negociação, trabalho em equipe); e c) Competências do negócio: compreensão do negócio, seus objetivos, relações com o mercado, ambiente sociopolítico (conhecimento em negócio, planejamento, orientação para o cliente).

3.2 O porquê da preocupação com as competências

Conforme salientam Marquardt e Engel apud Sant´Anna et al. (2005), em nenhuma outra época na história das organizações, as pessoas com suas competências e talentos foram tão valorizadas como atualmente. De fato, se há um ponto em relação ao qual poucos se opõem é que, com o intuito de fazerem frente às atuais transformações do mundo dos negócios, as empresas têm necessitado de indivíduos cada vez mais talentosos e competentes.

Essa argumentação é reforçada por Hamel e Prahalad (1995), quando discutem que, na medida em que fontes tradicionais de vantagem competitiva, tais como tecnologia e mão-de-obra barata, não mais se revelam suficientes para proverem uma posição competitiva sustentável, os indivíduos e suas competências passam a ser enfatizados como elementos centrais de diferenciação estratégica.

Os autores acima chegam mesmo a afirmar que as organizações, que agora concorrem entre si por clientes e mercados, em escala jamais vista, têm sido levadas a competirem também pelo recurso elevado à categoria de o mais importante de todos: o talento humano.

Como já observado no tópico anterior, a inexistência de um consenso quanto ao conceito de competências, além de divergências de caráter filosófico e ideológico podem, também, ser atribuídas à adoção da expressão com diferentes enfoques, em diferentes áreas do conhecimento (MANFREDI, 1998).

Não obstante a inexistência de um consenso quanto a seu conceito, alguns pontos comuns em relação a essa noção podem ser identificados. Em primeiro lugar, a competência é comumente apresentada como uma característica ou conjunto de características ou requisitos - saberes, conhecimentos, aptidões, habilidades - indicados como condição capaz de produzir efeitos de resultados e/ou solução de problemas.

Outro ponto comum às diversas acepções contemporâneas de competência é a elevada conformidade desse conceito com o discurso empresarial vigente, bem como com as demandas advindas dos processos de reestruturação e de modernização produtiva em voga, que remetem à questão da garantia da qualidade total (HIRATA, 1994).

Portanto, a compreensão sobre competência a estrutura como uma resultante da combinação de múltiplos saberes - saber-fazer, saber-agir, saber-ser - capazes de propiciarem respostas efetivas aos desafios advindos do atual contexto dos negócios.

Perrenoud (2001) sistematizou os conceitos de competência, para identificação das competências individuais mais enfaticamente requeridas pelas organizações contemporâneas. São elas: domínio de novos conhecimentos técnicos associados ao exercício do cargo ou função ocupada; capacidade de aprender rapidamente novos conceitos e tecnologias; criatividade; capacidade de inovação; capacidade de comunicação; capacidade de relacionamento interpessoal; capacidade de trabalhar em equipes; autocontrole emocional; visão de mundo ampla e global; capacidade de lidar com situações novas e inusitadas; capacidade de lidar com incertezas e ambigüidades; iniciativa de ação e decisão; capacidade de comprometer-se com os objetivos da organização; capacidade de gerar resultados efetivos e capacidade empreendedora.

4. COMO OPERACIONALIZAR UM SISTEMA DE GESTÃO POR COMPETÊNCIAS

O processo de operacionalização de um sistema de Gestão por Competências passa, necessariamente, pela definição e detalhamento da estratégia da empresa. Dessas informações, pode-se construir um modelo que transforme necessidades de mercado em respostas para o mercado, gerindo recursos humanos de maneira competitiva (HIPÓLITO, 2000).

O primeiro passo consiste, portanto, na identificação das competências organizacionais que adicionem valor à estratégia da organização. Esse processo considera algumas questões, como o número de competências a serem listadas e a melhor forma de identificação das competências.

No ponto de vista de Wood Jr. e Piccarelli Filho (1999), é um erro muito comum a definição de listas enormes de competências, que, com freqüência, confundem competências com traços e características de personalidade.

O processo de identificação das competências, obtidas as informações sobre a intenção estratégica da empresa, passa por três fases, como aponta Kochanski (1998): definição das competências essenciais da organização, desdobramento em competências coletivas por áreas ou grupos e, por fim, detalhamento das competências individuais.

Após levantar as competências organizacionais e individuais, dá-se início à elaboração dos níveis de complexidade do trabalho - work levels - alinhados às competências individuais. Na seqüência, elabora-se o modelo de competências e as respectivas ferramentas – remuneração, treinamento, recrutamento e seleção, programas de carreira.

De acordo com Kochanski (1998, p. 27), “existem várias maneiras de desenvolver um modelo de competências; todas, porém, estão fundamentadas na descoberta, uma vez que as competências não são uniformes”. Assim, existem alguns parâmetros que devem ser considerados pelas organizações por determinarem os pontos que mais se adequam à realidade da empresa e, dependendo do seu porte, até mesmo à realidade de partes da organização.

Cada parâmetro, de acordo com Lawler III (1998), deverá ser analisado para formar o sistema que mais se adeque a cada organização, conforme segue:

a) Especificidade x Generalidade: quanto mais atreladas a um cargo específico, menos gerais se tornam as competências. Elas podem ser determinadas dessa maneira quando dizem respeito a certo cargo ou área da empresa. Já com relação aos objetivos estratégicos, as competências tendem a ser menos específicas, e se aplicam a todos os funcionários da organização;

b) Tradicionalismo x Modernidade: o sistema pode também dar ênfase às competências que já existem na organização, apresentadas por indivíduos de alta performance, ou então enfatizar novas competências, ainda por serem desenvolvidas, que estejam ligadas ao plano futuro da empresa. A vantagem de utilizar competências já existentes é que elas são familiares à organização e se aplicam bem a organizações estáveis. Porém, em alguns casos é necessário prever as necessidades futuras.

c) De baixo para cima x De cima para baixo: pode-se determinar as competências com base no que os indivíduos utilizam para desempenhar seus papéis, para então chegar à estratégia da empresa, no topo da estrutura organizacional. Esse método é muito parecido com o desenho dos sistemas tradicionais, portanto já conhecido e mais fácil de ser aplicado. Quando se parte da estratégia para as funções, tem-se como base a premissa de que as competências são mais relacionadas à estratégia da empresa do que ao que se pratica atualmente.

5 COMPETÊNCIAS DOS ADMINISTRADORES DE RECURSOS HUMANOS

As empresas são desafiadas, constantemente, a desenvolverem e a utilizarem instrumentos de gestão que garantam sua competitividade no mercado atual e futuro. A busca da competência no mercado é o objetivo pelo qual as pessoas compreendem e controlam seus ambientes.

Liderar uma ação cria novas realidades; compartilhar as idéias e elaborar cenários motivam e estimulam a criação de novas formas de pensar e influenciam o futuro da empresa. Assim, os colaboradores ficam motivados a investir tempo e energia para realizar mudanças significativas nas competências.

Gestão estratégica de recursos humanos, gestão de competências e gestão do capital humano, apesar de diferentes semânticas, caminham na mesma direção, enfatizando as pessoas como determinantes do sucesso organizacional. As organizações precisam contar com profissionais capacitados, aptos a enfrentar as ameaças do mercado, assim como saber aproveitar as oportunidades dadas por ele. Com essa idéia, é possível visualizar a gestão de competências como instrumento que fornece alternativa eficiente para as organizações, conforme sugere Brandão e Guimarães (2002).

5.1 A aplicação das competências no desenvolvimento de habilidades de liderança

Brandão e Guimarães (2002) sugerem que a gestão de competências pode ser visualizada como uma tecnologia derivada da Resource-Based Management Theory. Essa teoria argumenta que certos atributos organizacionais (recursos) são condicionantes do sucesso da empresa com relação à concorrência. O pressuposto é o de que o domínio de recursos raros, valiosos e difíceis de serem imitados confere à organização certa vantagem competitiva.

De acordo com os autores supracitados, essa corrente sugere, ainda, que a gestão estratégica de recursos humanos contribuiu para gerar vantagem competitiva sustentável por promover o desenvolvimento de habilidades, produzir um complexo de relações sociais e gerar conhecimento, ou seja, desenvolver competências.

Ienaga apud Nisembaum (2000) sugeriu um modelo que permite identificar o gap (lacuna) de competências. O processo consiste em descrever os objetivos e as metas a serem alcançadas conforme estabelecido na empresa e, depois, identificar o gap entre as competências necessárias para executar o trabalho e as competências existentes na empresa. Os próximos passos são o planejamento, a seleção, o desenvolvimento e avaliação de competências, para que os gaps encontrados possam ser eliminados. Normalmente, por meio de ações como treinamento, recrutamento e seleção, gestão de carreira, alianças estratégicas, entre outros, é encontrado o mecanismo de desenvolvimento de competências que supre as necessidades da gestão organizacional.

É fundamental que se formule um planejamento estratégico para a organização e que a área de recursos humanos defina e possua a sua própria estratégia de ação, podendo, assim, acompanhar a implantação do planejamento estratégico e medir a aquisição das competências que foram identificadas no processo para que, cada vez mais, possam ter novos desafios a serem alcançados.

A exemplo do que sugere Davenport (2001), a competência pode afetar o investimento de capital humano de duas formas. A primeira: trabalhadores com competências em alta dispõem de mais capital para investir. Tanto os indivíduos como as organizações estão em condições de ganhar quando aumentam os ativos que são investidos, gerando maior retorno. A segunda forma: as oportunidades para aumentar a competência atuam como poderoso catalisador de investimento efetivo de capital humano.

A Fireman´s Fund apud Senge (1997, p. 181) faz uma citação que vale ressaltar:

Quando você melhora sua experiência e suas habilidades profissionais, pode tomar decisões melhores que a concorrência, contribuir mais para a equipe e propiciar melhor atendimento aos clientes. Isso ajudará a melhorar e manter um crescimento lucrativo na busca de nossas metas organizacionais. De sua parte, você constrói uma carteira diversificada de habilidades, conhecimento e experiência, e poderá melhorar seu desempenho no atual emprego e ajudá-lo a ser bem sucedido na carreira.

Segundo Nisembaum (2000), o que caracteriza a competência é a integração e a coordenação de um conjunto de habilidades, conhecimentos e atitudes que na sua manifestação produzem uma atuação diferenciada. Ela não se restringe a uma área especifica da empresa, está difundida, de forma ampla, por toda a organização. As competências decorrem da aprendizagem, promovendo o envolvimento e o comprometimento de todos os participantes nos negócios da organização.

Portanto, pode-se inferir que a Gestão por Competências representa uma espécie de estratégia empresarial voltada para o alcance dos objetivos organizacionais, em que o enfoque principal se dirige à questão das qualidades de um administrador para conduzir os recursos humanos em estreita sintonia com esses objetivos, minimizando os pontos de conflitos e obstáculos a esse alcance, e propiciando às pessoas dentro da organização um direcionamento mais dinâmico e condizente com as necessidades destas.

CONCLUSÃO

Nas mudanças promovidas nos modelos de gestão, os estilos de gerenciamento e liderança foram acrescentando novos argumentos. O líder estilo “feitor”, que comandava tudo e centralizava todas as tomadas de decisões começou a dar lugar para um estilo de liderança onde a preocupação com o bem-estar e a qualidade de vida dos indivíduos seriam vistos como fundamentais para que estes desenvolvessem suas atividades atrelados aos propósitos organizacionais, e não apenas buscando a sua remuneração pelo trabalho executado.

Para que esse comportamento fosse modificado, as empresas começaram a adotar políticas de recursos humanos focadas para a seleção e recrutamento de indivíduos com competências (conhecimentos, habilidades e atitudes) que facilitem o trabalho das lideranças.

Nesse ponto, percebe-se que o administrador passa, inclusive, a ter um papel de facilitação para o desempenho, na medida em que sua atribuição maior é a de conduzir para o alcance dos resultados previstos, dependendo da cultura organizacional e do seu modo de enxergar como os resultados serão alcançados.

Dessa feita, o posicionamento acerca das qualidades do administrador também mudou. Ser um administrador, no contexto organizacional contemporâneo, onde as empresas buscam o crescimento de seus funcionários, significa essencialmente desempenhar o papel de servidor. O verdadeiro administrador sabe que sua função não é executar tarefas, mas auxiliar e apoiar as pessoas para que elas possam executar suas tarefas dentro das expectativas da organização. Para tanto, precisa fundamentalmente aprender a delegar, a educar, a comunicar-se e a reconhecer as conquistas.

A revisão literária ora finda trouxe a demonstração de ser válida a proposta de aplicação da Gestão por Competências como fundamento para a motivação dos quadros operacionais em qualquer organização. Isso porque, nesse âmbito, quanto maior o nível de maturidade do administrador, maior sua disposição e capacidade, mais alta sua motivação e maior sua contribuição para o alcance dos objetivos pela empresa.

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[1] Segundo Silva (2001), significa redução do tamanho da estrutura das empresas; “enxugamento”; atualização da tecnologia com ganhos de espaço e otimização de funções

[2] Ainda segundo o autor acima, reengenharia (do inglês reengennering) caracteriza uma transformação, ou uma reforma radical na estrutura organizacional da empresa.